Serena escrita por Maria Lua


Capítulo 6
Desastroso




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O dia dos professores, segundo as próprias professoras, foi feito para se trancar no quarto e rezar para não encontrar com nenhuma aluna o dia inteiro. Era o dia de tirar um peso das costas, de deitar e relaxar, de ligar para os amigos, ver televisão, esquecer que tem provas para corrigir e, acima de tudo, esquecer que é um professor. Eu acho incrível todas as pessoas que se sentem assim, e acho que um dia ainda vou me sentir, quando me acostumar com a idéia de ser professor. Mas, por enquanto, só penso em sair do quarto e ir atrás de determinada aluna. Esse ano o dia dos professores caiu em uma sexta-feira, o que fará com que muitos alunos e professores vão para casa passar três dias, para matar a saudade.

Eu não iria. Não sentia saudades. Serena não iria. Não tinha para onde ir. Apesar de ser repulsivo admitir isso, eu imaginei mil situações nossas durante o fim de semana. Sonhei com nossos toques da noite anterior, com seu calor, sua voz mais próxima que nunca de mim. Sonhei com a sua pergunta. Quem eu era para ela? Ah, como gostaria de ser Chuck... Mas devo ser Humphrey. Ou melhor: professor Humphrey. É o meu dever moral, não poderia infringir minha ética dessa maneira. Que vão pensar de mim? Ela tem catorze! Se ainda fosse dezessete, dezoito, eu poderia esperar ela se formar. Mas é tão nova... Tão ingênua... E, claro, levemente perturbada.

Logo cedo eu saí do quarto, em meu horário habitual. Disseram que em feriados grandes eles liberam algumas funcionárias e cozinheiras, e nós professores temos que ir ao refeitório das alunas, comer entre elas. Ao entrar lá entendi o motivo do colégio ser tão exclusivo: a mensalidade deveria custar uma fortuna! O saguão era muito parecido com o dos filmes do Harry Potter – enorme, majestoso! Caminhei até uma mesa vazia, mais afastada, e comecei a me seguir. Era cedo, portanto estava bem vazio. Conseguia contar pouco mais de dez alunas muito bem espalhadas e nenhuma professora conhecida por mim.

Após alguns minutos comendo, olhos fixos no chão e o pensamento distante, pernas semi-expostas com meias azuis marinhas até os joelhos e tênis totalmente brancos param em minha frente. Meus olhos sobem e reconhecem o joelho, a saia, o cinto, os casacos tão diferentes e, enfim, aquela expressão angelical e diabólica simultaneamente. Era um teste divino... Só poderia ser.

– Charles. – ela sorriu e sentou-se ao meu lado. Poderia ter se sentado mais longe ou em minha frente, mas fez questão de encostar as nossas coxas.

– Srta. Doolitle. – a cumprimentei, nervoso, forçando-me a fixar os olhos em minha salada de frutas.

– Serena. Você pode não saber o que quer em relação a mim, mas eu sei muito bem. Serena. A não ser que invente um apelido mais íntimo. – ela disse em tom mais baixo, e me pegou de surpresa ao pousar sua mão em minha coxa. Até então ela estava parada, mas com certeza deve ter sentido todo o magnetismo que causou. Arrepiei-me por inteiro, prendendo a respiração para controlar qualquer excitação indevida e que poderia me causar algum problema. Sentia o meu órgão pulsar. Ela, de fato, notou isso. Olhou para minhas calças e sorriu de uma maneira maliciosa. Então com a outra mão mexeu no cabelo, trazendo todo o se cheiro para mim.

Ergui os olhos para ela por um segundo, e então olhei em volta para conferir se alguém nos observava ou se haviam notado o lugar onde a mão dela estava repousando. Por sorte, do ângulo em que os outros estavam nada podiam ver.

– Serena, por favor... – tentei implorar para ela parar com aquelas provocações. Mas não pude encontrar as palavras: ela sabia o que eu queria. O que eu desejava.

– Com todo prazer. – ela me cortou e logo apertou a parte interna de minha coxa, esfregando sua mão até o meu órgão. Ela o apertou e passou sua mão por ele bem devagar, o que me fez furar minha mão ao apertar o garfo, e ergueu minha perna em uma falha tentativa de não me contrair. Tentei falar, pedir para ela parar, mas não queria nem conseguia. Ela havia me dominado. Era como se eu fosse um animal amordaçado, ela tinha o meu controle tanto quanto a flor controlava o Pequeno Príncipe. Quando estamos longe eu posso jurar a mim mesmo que é só atração sexual. Posso jurar! Mas, ao seu lado, eu realmente sinto que é mais. Nada justifica essa obsessão toda por uma menina dessa idade. Não digo que estou apaixonado, mas... Todo esse mix de sensações está além da excitação.

Meus olhos, que já são pequenos e semicerrados, se fecham em busca de conforto no prazer inesperado e em má hora. Eu lutava contra isso. Tentava abri-los tanto quanto tentava não apertar o garfo e me martirizar com isso. E, por sorte ou azar, ao abrir levemente um dos olhos, tive um vislumbre de uma morena que muito conheço. Meus olhos arregalaram-se de repente, meu corpo tremeu assustado, afastando Serena de perto de mim. Ambas as garotas pareciam assustadas, e quando Serena notou que eu encarava Violet menos de cinco metros de distância, nos olhando, elas passaram-se a se olhar. Serena sorriu, tentando passar a mão por baixo da mesa novamente.

E essa foi a primeira vez que me opus a Serena Doolitle. O momento em que tudo passou muito rápido: Serena estava mantendo os contatos mais próximos, quentes e proibidos da minha vida; Violet, de quem eu já estava quase esquecido, ressurge de repente no colégio – muito longe de nossa cidade natal – em que eu estou ensinando; Violet assiste a cena afastada e quase sexual entre mim e minha aluna; Serena não se importa, prossegue; Violet, enfurecida, sai de cena batendo o pé – furiosa!; e eu, por outro lado, invadido pelo medo do meu futuro ser estragado, empurro um pouco exagerado a garota que tem perseguido meus sonhos para, justamente, perseguir a garota que eu dava tudo para manter distância nesse momento... E em qualquer outro do meu futuro próximo. Corri atrás dela, chamando por seu nome.

Procurei, procurei. Procurei durante vários minutos por Violet, invadido de preocupação e terror. Tudo que se passava por minha cabeça era “meu futuro acabou”, “ela vai contar para a diretora”, “vou ser preso”, “nunca mais vou poder ensinar”, “todos os meus anos de estudo precoce foram jogados no lixo” e, infelizmente, “nunca mais verei Serena”. Serena... Com toda essa confusão mal tive tempo para pensar nela. Hoje avançamos tanto. Eu a desejei mais que nunca, e ela a mim. Eu tinha agora a certeza de que qualquer avanço seria bem sucedido, não haveria negação da parte dela. Mas a certeza que eu não tinha era se haveria, ainda, uma chance de eu poder tentar algo. Mesmo que seja em meus sonhos. E toda a esperança se esvaiu quando vi aqueles cabelos castanhos cacheados conversando sorridente com a diretora Wilkes.

Mesmo receoso, me aproximei quando me avistaram.

– Juliet! – exclamei, com um sorriso tímido e temeroso. Ela expandiu um sorriso enorme.

– Ainda bem que o encontramos, Sr. Humphrey! Fiquei muito feliz quando soube que o senhor convidou a sua estagiária para aprender na prática com você. Estava indo agora mostrar à Srta. Bolton os quartos e todos os aposentos. Tenho certeza de que se adaptará rápido e, quem sabe, poderá ter um emprego permanente aqui na Marie Curie? Com licença. – ela sorriu, arrastando a Violet.

Fiquei estupefato. Imóvel. Violet não havia me dedurado. Ótimo. Violet mentiu para a diretora. Bom, falando de maneira egoísta. Ela conseguiu um estágio. Imparcial. Um estágio em meu colégio, perto de mim, me observando. Péssimo. E ela tem um segredo meu, que a magoou, e, conhecendo-a como conheço, eu não estou em boas mãos nesse semestre...

Desastroso.


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