Shikashi!! escrita por Uma Qualquer


Capítulo 6
Fazendo um casal acontecer


Notas iniciais do capítulo

Onde criamos expectativas (inúteis), tentamos juntar dois seres perfeitos um pro outro e somos surpreendidos no festival da escola!



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Então, como deu pra imaginar se esta história for clichê o bastante, ou pra quem leu a omake do último capítulo, o alienígena conseguiu se transferir pra nossa escola. E sim, exatamente pra sala onde a Gumi e eu estudamos. Mas isso não é o mais importante agora.

O festival da escola está chegando e... O Gakupo prometeu a Gumi que vem visitar a minha barraca. O Gakupo... No festival da escola!!!

Aí você pensa: “grande coisa, Hatsune. Você só vai ficar vermelha e não vai dizer nada que preste.” E é a pura verdade. Mas pra quem não entende o que a simples visão de uma pessoa pode fazer no dia de alguém, isso tudo é o de menos. Eu vou estar num evento barulhento e desnecessário, vendendo yakisoba num uniforme ridículo e ainda assim vou ter a oportunidade de ver o homem com quem eu sonho todas as noites, cara a cara. Talvez até ele me dirija a palavra, e se meus batimentos cardíacos deixarem, talvez eu consiga até responder! Se você não entende a grandiosidade desse acontecimento, você nunca se apaixonou na vida. Meus pêsames.

Ou meus parabéns, porque né. Olha o sofrimento da pessoa e pensa bem se você quer isso pra sua vida.


O Kaito chegou na nossa escola e eu disse que isso não era importante, porque não é. Mas até que foi engraçado. Ele nunca esteve numa escola de verdade, então não sabe nada de nossa rotina. Trocar os sapatos ao chegar, ficar de pé ao sinal do líder da sala, comprar lanche na cantina, obedecer ao sinal de entrada e saída das aulas. Pra não falar no uniforme (ele continua usando aquela echarpe azul esquisita) e nas aulas, às quais ele passava boa parte dormindo.

Alguns professores não se incomodavam, já que nos testes de admissão o cara tinha mandado bem o bastante pra ser deixado em paz pelos professores de exatas, pelo menos. Mas outros achavam o exemplo dele ruim e o mandavam dormir na enfermaria, a qual ele quase nunca conseguia achar. Não era difícil passar pelo corredor e ver o coitado dormindo ali no chão mesmo, como um mendigo. Vai ver, pra ele qualquer lugar era lugar em se tratando de um cochilo.

Certa vez eu estava voltando do banheiro quando o encontrei deitado junto ao calorzinho da janela, tão relaxado como se estivesse na própria cama. A sorte dele era que nossa escola tinha uma política bem forte contra bullying, porque em outro lugar ele já teria sido chutado até dormir pra sempre. Suspirei e fui tentar acordar o cara.

— Não... – ele murmurou estremunhado, e então começou a gritar. – Não, Nozomi! Se você se atrasar, não vai poder entrar na escola!

— Isso é óbvio– resmunguei sacudindo-o pelos ombros. –E quem é Nozomi?

— Oh... Miku-chan –ele esfregou os olhos. – Estava sonhando com o meu mangá. Nozomi é um personagem novo, um aluno transferido para a escola da Maiko.

— Resumindo, o Nozomi é você– eu o ajudei a ficar de pé. – Credo, tem como ser mais clichê que isso?

— Acho que não – ele deu um risinho, seguido de um bocejo longo. – Mas todas as histórias de romance escolar já foram criadas. Só nos resta tentar fazer algo novo com elas.

— Seeei... Bom, vem comigo, vou te levar pra enfermaria. Se um inspetor passar por aqui você pode pegar uma punição, sabia?

— Oh, mesmo? Obrigado então. – Ele curvou-se levemente e levantou devagar, do jeito que os velhinhos costumam se cumprimentar.

Que cara estranho, sério.

— Mas o Nozomi não sou eu– disse enquanto me seguia. –Eu não baseio meus personagens em pessoas reais.

— É? Por que não?

— Porque seria chato pra mim. Eu... Bem, eu não conheço muitas pessoas. Então inventar uma é mais fácil.

— Mas, você não pode nem basear em si mesmo? Você não se conhece o bastante pra criar um personagem baseado em você?

— O pior é que me conheço– ele disse. –Eu daria um personagem chato demais.

Não Kaito-kun, você daria um personagem bizarro demais.

Mostrei a porta da enfermaria, ele se curvou daquele jeito estranho e eu o deixei com seu sono e seus devaneios. Sério, ainda bem que a Gumi foi a primeira mangaka que conheci na vida. Esse Kaito teria me deixado uma impressão muito esquisita...

A Yukari, claro, adorou a ideia de mais um mangaka na escola, de modo que o Kaito foi praticamente arrastado pro nosso clube. Eles iam reinventar algumas pinturas famosas em forma de mangá, e Kaito e Gumi trabalharam bastante nas pinturas. Adorei ver os dois se divertindo no clube e matando meio mundo de garotas de inveja, já que o Kaito é inegavelmente bonitinho e ganhou um fandom antes do primeiro dia de aula dele acabar. Quem eu percebi não estar gostando muito daquilo foi a Rin, que pelo jeito tinha batido os olhos no alienígena e gostado do que viu.

— Muda de clube, ué– Len zombou displicente. – Sempre vai encontrar o seu cavaleiro azul todo sujo de tinta.

— Fique você no seu clube – Rin retrucou azeda. – E corra atrás da sua princesa suja de tinta.

Opa, agora temos mais pistas. No clube só temos eu, a Gumi e a Yukari... De quem será que o Len...

— Ele fica assim o tempo todo – Gumi comentou preocupada, se aproximando de nós três no terraço da escola.

Estava falando de Kaito, que dormia junto à grade metros adiante. O sorvete no potinho ao lado dele já tinha virado um creminho azul.

— Também, ele dá conta de dois mangás sozinho – eu disse. –Não tem como não estar sempre acabado.

— Com a grana desse cara eu já tinha comprado um estúdio inteiro– Len resmungou.

— Sei lá, ele gosta de cuidar de todos os detalhes. – Gumi sentou-se perto de nós. – Mas com as obrigações da escola e do clube, fica difícil pra ele...

— Talvez... – Rin murmurou devagar – Se ele perdesse só alguns dias pra adiantar os mangás, e alguém fizesse as anotações da escola pra ele...

— Ou talvez se você levasse um cascudo e deixasse de ser uma stalker – Len ergueu uma sobrancelha pra ela. – “Fazer as anotações da escola?” Sério, consegue ser mais previsível que isso? Além do mais, até onde eu sei, o cara é um gênio nos mangás e na escola. Ele só não se dá bem com obrigações.

— Olha sóooo – A Rin sorriu maldosa. – Parece que temos alguém no fandom do Kaito-kun! O que diremos às nossas fãs agora? Que elas precisam virar fujoshis e shipar vocês dois?

Enquanto eles discutiam bobagens como sempre, fiquei olhando a expressão de Gumi para o Kaito. Senti que, se ela mesma não estivesse atolada de trabalho com seu próprio mangá, ela podia fazer aquilo por ele.

Pobre Gumi. Será que estava se apaixonando sem perceber? Quis alertá-la, dizer que aquele era um caminho espinhoso e sem volta, mas só o que consegui dizer foi:

— Eu faço.

Todos se voltaram pra mim, sem entender. E sem dar explicações eu peguei a sopa de sorvete azul, joguei no lixo e bati de leve no ombro do alienígena.

— Você veio de onde, do planeta Sono?– perguntei impaciente. –Levanta aí. Temos que ir na coordenação da escola agora mesmo.

Ele acordou desorientado, procurando ao redor. –Meu sorvete?

— Já era– sentenciei.


O coordenador da escola permitiu que Kaito ficasse uns três dias afastado, já que o rendimento dele nas atividades era aceitável (exceto em educação física, onde ele passava o tempo todo cochilando no banco). Todos os dias em que ele não foi, um carro de entregas trouxe pinturas dele para o clube de artes. Mesmo que aquele tempo fosse só para se dedicar aos mangás, ele ainda se preocupava com o clube! Aquilo devia estar tocando bastante o coraçãozinho da Gumi. E da Rin também, fazer o que... O cara tinha conseguido seu próprio triângulo amoroso.

— Você podia ir lá entregar – eu disse a Gumi, lhe estendendo as anotações daqueles dias de aula.

— Não... Eu tenho muito trabalho pra fazer– ela murmurou, decepcionada. – Ainda não terminei meu storyboard e...

— Nesse caso... – A Rin já ia pondo as mãos nas anotações, quando o Len puxou ela pra trás.

— Nem se atreva.

— Você podia ir lá – a Gumi me sugeriu.

Eu, no Planeta Sono Azul? Fiz uma careta de desgosto.

— Quer saber? Me dá isso aqui.

Len apanhou as folhas e foi pro portão da escola.

Então ia ser ele a entregar as anotações? Cadê o fandom fujoshi que não estava ali pra testemunhar aquilo?

Minutos depois ele voltou com um tubo de projeto nas mãos, se despedindo do motorista do carro de entregas. A solução dele foi bem simples: mandar as anotações para Kaito pelo mesmo veículo que ele usava pra mandar as pinturas.

— Quem é o gênio? Eu sou o gênio – Len me entregou o tubo, todo sorridente. – Agora nem você nem a destrambelhada aí tem que se deslocar até a mansão daquele maluco.

— Achei que o Kaito fosse o gênio– eu dei de ombros. – Mas enfim. Vamos deixar essa pintura com a Yukari. Só temos mais um dia até o festival!


E o dia logo chegou. Como meu talento com pintura se resumia a preencher esboços em vez de criar alguma coisa de fato, preferi ir para a barraquinha de yakisoba fazer algo mais fácil e útil, embora extremamente embaraçoso: ficar chamando clientes numa roupinha de lolita cheia de babados, mostrando toda minha energia e a desafinação da minha voz enquanto sufocava a vontade de me enfiar num buraco. Mas bem, os fregueses estavam vindo, e isso era o que importava.

Ao longe eu podia ver Gumi e Kaito trabalhando junto com a Yukari na exposição de pinturas, que também estava bem movimentada. Os dois se davam tão bem juntos, eu pensava, suspirando feliz. Era tão bom ver um casal que eu gostava prestes a dar certo! Me fazia esquecer por um momento que o meu não daria nem em um milhão de vidas.

Uma moça elegante se aproximou de Kaito, cumprimentando-o com um abraço. Mesmo daquela distancia, eu podia ver ele corar até as orelhas. A tal moça era muito bonita afinal, usava um vestido envelope com motivos indianos e tinha longos cabelos rosados. Por algum motivo ele olhou pra fora da galeria, apontou para a barraquinha e veio na nossa direção.

É isso! Acabei de encontrar uma moça linda, vou comprar um pouco de yakisoba. Por que não, né?

Esse Kaito é uma comédia.

— Aqui, sensei – ele veio direto na minha direção, o que me pegou totalmente de surpresa. – Essa é a Hatsune Miku, minha outra colega de sala. Foi ela quem falou com o coordenador pra que eu conseguisse faltar aqueles dias, e ainda fez as anotações dos dias em que não fui à aula.

Falava com uma admiração e uma afobação extremas, mas era bem óbvio que era por causa da moça em questão. Ela era muito linda. Magra e alta mas cheias de curvas, favorecidas pelo corte do vestido. Seu rosto era doce e gentil, de olhos azul-claros que me observavam com gratidão.

— Você cuidou muito bem do meu aluno –disse numa voz suave. – É bom saber que ele tem pessoas para o ajudar a se adaptar a esse novo ambiente.

— Aluno? – inclinei a cabeça sem entender.

— Ela foi uma de minhas professoras particulares– Kaito explicou, o rosto vermelho de animação. – Megurine Luka-san.

Megurine...Luka?

Como se o nome dela fosse uma invocação, vi Gumi e Gakupo chegarem pelo outro lado da barraquinha. Ao nos ver ele congelou, ela congelou, Luka congelou, eu congelei.

Só Kaito ficou olhando praquela que era a situação mais bizarra possível. Sem entender nada, pra variar.



Omake!

“Venham! Venham! Yakisoba quentinho, feito na hora! Nutritivo e delicioso! Venham! Uma delícia quentinha e baratinha! Venham e ainda ganhem um sorriso meu!”

Por dentro: “Venham e me matem por favor!”


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Notas finais do capítulo

Desculpas pela demora como sempre, e obrigada aos leitores que estão se manifestando! Por favor leitores fantasmas, apareçam também, nem que seja pra dizer 'odiei, nota 10'. Bom feriadao a todos, beijas e té maisinho :***