Shikashi!! escrita por Uma Qualquer


Capítulo 5
Um alienígena!


Notas iniciais do capítulo

Onde vamos a uma festa comum com gente normal, colocamos um mané no lugar dele e conhecemos um alienígena!



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Eu não sabia qual era o dress code de um evento de editora de mangá. Nem sabia se tinha algum na verdade. Decidi ir com alguma coisa que fosse formal o bastante pra uma festa de gente adulta, mas que fosse adequado a minha idade – uma blusa social branca com detalhes em salmão, uma saia de cintura alta e babados também em salmão e uma sapatilha boneca branca. Resolvi deixar os cabelos soltos e pus uma maquiagem bem leve. Me olhei no espelho e, é, até que não tinha ficado nada mau.

— Awnn, como você ficou fofa– a Gumi me deu um abraço assim que me viu, quando chegou lá em casa. – E ainda disse que não sabia o que vestir.

— Não é como se eu tivesse toda a certeza do mundo. Você também ficou linda, Gumi-chan!

Ela estava usando roupas confortáveis como de costume, mas que ficavam melhores nela que em qualquer um. Usava uma blusa cinzenta com o ombro solto e calça xadrez, com uma sandália de tirinhas. Tinha feito uma trancinha de lado com a parte mais longa da franja. Ela disse que o Gakupo falou que ela estava arrumada demais, provavelmente algum otaku ia se apaixonar por ela na festa.

— Se ele te visse ia dizer a mesma coisa!

— Ah, imagina... – Não era bem um otaku que eu queria que se apaixonasse por mim, mas deixa quieto.

O evento era no salão de festas de um hotel perto da editora. Nós duas pegamos um táxi e chegamos mais ou menos na hora marcada.

Eu não sabia muito bem o que esperar de uma festa do tipo. A Gumi convivia mais com esse pessoal, então eu só podia imaginar quem seriam os outros convidados. Mangakás, editores, assistentes, o staff da revista... Imaginei que seria um monte de caras esquisitos, mas até que eles eram normais e estavam até bem vestidos pra um evento social. Comecei a me sentir meio preconceituosa. Afinal, trabalhar com mangá era uma profissão como qualquer outra, certo?

A Gumi cumpriu o que prometeu e não saiu do meu lado. Mas como ela tinha dito, sempre dava pra conhecer pessoas novas, então ela fez questão de socializar e me carregar junto. Até que foi legal, conheci um monte de pessoas simpáticas, que adoravam Cannonball e admiravam o esforço da Gumi em desenhar aquele mangá.

A única parte desagradável da noite foi quando conheci o editor da Gumi, o cara responsável pela supervisão da história no geral e de cada capítulo lançado toda semana. Não por ele, o cara era muito gente fina. Mas aparentemente, editores não trabalham supervisionando um único mangaká. E o outro mangaká com quem o editor da Gumi trabalhava estava junto com ele quando vieram nos cumprimentar. Era um cara mais velho e experiente no ramo dos mangás. E um tremendo babaca. Ficou tirando sarro do editor, dizendo que o verdadeiro autor de Cannonbal não tinha conseguido ir à festa e mandou suas duas assistentes. Ele dizia que era impossível alguém como a Gumi ser a responsável por uma história sobre carros de corrida, afinal ela era só uma garota do colegial. O editor já estava de saco cheio e mandou o cara calar a boca, mas não adiantou.

Então não aguentei.

— Deve ser difícil, aceitar que uma garotinha do ensino médio pode fazer algo que um tiozão acha que entende. E fazer ainda melhor.

Ele parou de rir e me olhou com cara de ‘quem é essa pirralha?’.

— Como assim, ‘o que eu acho que entendo’? –ele perguntou todo arrogante. –Acha que não sei nada sobre carros?

— Não, é sobre mangás mesmo.

Ele inflou e ficou vermelho feito um tomate maduro. É, acho que tem coisas que você não pode dizer pra um mangaká experiente, ainda mais quando você é só uma mera assistente de 16 anos de idade.

Mas ele tava pedindo.

— Miku-chan, melhor a gente ir pra outro canto– a Gumi murmurou e agarrou minha mão.

Cumprimentamos o editor e nos afastamos às pressas, enquanto ele batia boca com o tio arrogante. A Gumi me puxou pra o lado do bufê e eu agradeci internamente: lidar com babacas acaba com minhas energias.

— Não precisava ter feito aquilo Miku-chan – ela dizia enquanto a gente ia experimentando os salgadinhos da mesa. –Embora tenha sido lindo ver ele inchar como um baiacu.

— Você é minha amiga, é meu dever sagrado te defender de um mané daqueles. Mas por que você não falou nada na hora, Gumi-chan? Se você não se impor, esse pessoal vai achar que tá com a razão.

— Bem que eu queria, mas as coisas não são fáceis assim. No fim das contas eu sou só uma novata, não posso desrespeitar um veterano.

— Ah, e ele pode te desrespeitar? –perguntei indignada.

— Ninguém disse que a vida era justa– ela deu um sorrisinho.

— Mas vocês têm que admitir. É difícil acreditar que uma garota do colegial faz um mangá como Cannonbal, não é?

Nos viramos para o outro lado da mesa. Era um garoto da nossa idade, usando um terno azul-escuro, echarpe azul, olhos azuis, o cabelo curto e azul. Até o sorvete que ele segurava numa tacinha era azul. Fiquei encarando aquela criatura, tentando lembrar de onde eu já tinha visto.

— Realmente é– a Gumi sorriu, simpática como sempre.

Mas eu não estava mais pra simpatias naquela noite.

— Ainda mais se soubessem o esforço dela pra deixar um capítulo nas bancas toda semana– retruquei.

— Ah sim– ele concordou enfaticamente. –Isso é o mais inacreditável. E o mais digno de respeito também.

Estava pronta pra rebater, quando perdi as palavras.

— Você é Shion Kaito, certo? – Gumi indagou enquanto eu tentava me recuperar. – Meu irmão gosta muito de seus mangás. Sou Kamui Megumi.

Ela se curvou e me empurrou de leve com o cotovelo. Resolvi me apresentar também, meio a contragosto.

— Assistente? –ele me fitou sem entender. –O que exatamente você faz?

Será possível que ele não soubesse o que era um assistente? Expliquei qual era a minha parte no mangá da Gumi, e por via das dúvidas, contei sobre a parte que Gakupo ajudava também. Ele prestava bastante atenção enquanto tomava aquele sorvete esquisito, e então sorriu.

— Então é isso... Bom, eu não tenho assistentes.

— Mas você está escrevendo dois mangás mensais, certo? – a Gumi o olhou confusa. –Consegue desenhar e finalizar tudo sozinho?

— Sim– ele deu um sorriso inocente. –Sempre fiz toda a arte do mangá sem ajuda.

— Mas a sua agenda não fica apertada? Digo, cada capítulo de seus mangás têm 50 páginas. Como você faz pra, sei lá, ter uma vida?

Ele nos olhou sem a menor ideia do que estávamos falando.

— Você não estuda? –Tentei indagar. –Não tem provas, trabalhos, atividades do clube, essas coisas? Não sai com os amigos?

Kaito baixou a cabeça e olhou para o seu sorvete azul. Eu e a Gumi ficamos sem entender nada. Então, um senhor de meia idade, vestido um terno preto e luvas brancas, aproximou-se dele.

— Jovem mestre, está quase na hora de voltar para a mansão.

Um... Mordomo?

Então liguei uma coisa à outra. Como eu podia ter esquecido? Shion Kaito, o jovem prodígio dos mangás shoujo, era aquele carinha de azul. Tão rico que carregava um mordomo quando saia pra uma festa! Uau.

— Eu... Estudo, sim– ele finalmente disse, sem nos encarar. – Mas em casa. Tenho professores particulares.

Uau.

— Desde que idade? – A Gumi quis saber.

— Desde sempre.

Uau. Uaaau. Esse cara é rico de um jeito que não dá pra imaginar. Estudar em casa! Isso nem é mais luxo, já é coisa de outro mundo! Por isso o Kaito gosta tanto de azul, ele é um alienígena.

— Hm. – Ela cruzou os braços e murmurou pensativa. –Isso explica algumas coisas.

— Perdão? –Kaito finalmente olhou para ela, interessado.

— Bom, eu li seus mangás. Não sou uma grande fã de shoujo, então eu não podia dizer com certeza. Mas eu sentia que faltava alguma coisa no jeito que você escreve suas histórias. Como se não soubesse como é estudar numa escola de verdade.

Kaito parecia um pouco decepcionado ao ouvir isso. Mas não exatamente ofendido. A Gumi não estava criticando o trabalho dele no fim das contas, só apontando uma coisa óbvia.

Como é que você escreve uma história escolar sem nunca ter estado numa escola?

— Bom, eu fiz minhas pesquisas– ele tentou se defender. –Se você escreve um mangá sobre carros, também precisa pesquisar sobre eles, certo?

— Certo, mas muitos de meus leitores nem sabem dirigir. Eu ainda nem tirei minha habilitação, pra falar a verdade. Mas uma coisa que os meus leitores e os seus têm é comum, é que todos eles frequentam a escola desde crianças.

Ugh. Isso deve ter doído. Olho para o Kaito, que está de ombros caídos e absolutamente derrotado.

Não que ele parecesse vitorioso desde o começo. Por algum motivo, desde que li a bio dele no mangá semanas atrás, não pensei nele como um cara arrogante, mesmo com a fama de prodígio e aquela riqueza obscena.

Ele parecia ser apenas como a Gumi. Alguém que adorava fazer mangás.

— Isso é um problema, certo? –ele indagou.

— Bom, talvez não seja agora, já que você acabou de iniciar sua carreira com tanto sucesso. Mas a longo prazo, seus próprios fãs vão notar que falta alguma coisa em suas histórias. Algo com que eles possam se identificar, além do romance.

Eu estava admirada. A Gumi podia até dizer que era só uma novata, mas me dava orgulho ver ela dando conselhos a um colega de trabalho daquele jeito. O Kaito pareceu entender também. Quando o mordomo dele lhe avisou que era hora de voltar, ele curvou-se num cumprimento respeitoso, agradeceu a nossa companhia e disse que iria pensar no que a Gumi falou.

Estava ficando tarde para nós duas também. Mais alguns minutos e alguns petiscos depois, nos despedimos do editor da Gumi (o mangaká babaca tinha ido embora) e pegamos um táxi.

— Dá pra imaginar, passar a vida toda estudando com professores em casa? –eu falei no caminho, ainda impressionada. –Não me admira que ele consiga comandar dois mangás sozinho.

— Ele deve fazer muitas outras coisas sozinho– a Gumi refletiu.

Era mesmo. Se ele não tinha colegas de escola... Será que ele tinha um amigo que fosse? Além dos professores (professor é amigo de alguém?). E daquele mordomo.

Lembrei do olhar dele, quando perguntei sobre os compromissos com a escola e os amigos. Ele pareceu bem vazio naquele momento.

— Deve ser muito triste – concluí.



Omake!

No banco de trás de seu carro, Shion Kaito ainda está pensativo. O mordomo ao volante percebe quando o rosto do rapazinho se ilumina e olha para ele pelo retrovisor.

— Aquela garota com que conversei, a mangaká – disse ele, levemente empolgado. – Kamui Megumi. Descubra onde ela estuda.

Yes, my lord.


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Notas finais do capítulo

Kaito stalker? XDDDD
Não, o mordomo não é o Sebastian, a menos que Sebastian possa ficar mais velho. (Pior que ele pode, mas ainda assim não é ele. Sorry)
O apelo é o de sempre: comentem, favoritem, acompanhem, enfim. Se você chegou até aqui e acha que a história merece, mostre que de algum jeito você tá lendo a fic! Eu agradeço, e meu coraçãozinho de autora carente também. Té maisinho:****