Não tão clichê escrita por Apaixonada por palavras


Capítulo 11
Dez.


Notas iniciais do capítulo

OOie amores
Não demorei tanto dessa vez, né? Duas semanas. 15 dias, sendo mais exatas. Mas estou dentro do que eu - acho - prometi para vocês. Já que as aulas voltaram e eu to fazendo um moonte de coisas, fica mais dificil postar uma vez por semana que nem eu gostaria. Mas eu sempre estou tentando postar o mais rápido possível.
Eu não sei se é porque eu estou postando menos ou o nível da história caiu, mas vocês estão comentando menos =( Ah, gente, eu gosto tantooo de conversar com vocês sobre a história e descobrir se esta bom,indo no rumo certo e etc...falem comigo hahaha
Mas, enfim, eu to bem orgulhosa desse capítulo pq ele ficou o maior da fic, eu acho.
Espero que vocês gostem
Beijo Beijo ;)



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3 MESES ANTES

5 de agosto de 2015, Quarta-feira, 9:53

 – Você acha que ela vai ficar com o Bernardo?

Inclino minha cabeça levemente para o lado. Como eu poderia explicar para o Matheus que as chances da Lívia ficar com o Bernardo eram menores do que as chances dela ficar comigo, devido ao pequeno fato da sexualidade e a coisa toda que ela não queria que o Matheus soubesse ainda?

— Ele não faz o tipo dela – respondo, simplesmente.

 – E quem faz o tipo dela?

“Meninas, querido” tenho vontade de responder, mas não posso. Lívia tinha me contado que era gay 2 anos antes, mas prometi que nunca contaria para ninguém. Ela não queria que ninguém soubesse ainda, não se sentia confortável. Não estava pronta para contar nem para o Matheus. Então eu simplesmente evitava esse assunto, ou tentava desviar a verdade.Mas não era fácil;

 – O último garoto que a Lívia ficou foi há tipo um ano e pouco. E foi o primeiro beijo dela... – ele continua.

Quando ela descobriu que era gay.

 – ... E tipo, ela não pode ser tão exigente assim, né? A Lívia não é assim.

Reviro meus olhos.

 – Porque você se importa tanto, hein, Matheus? – pergunto. Ele cora. Que fofinho. Tenho vontade de apertar suas bochechas.

 – Ela é minha amiga – ele responde.

O olho desconfiada.

 – É. Mas às vezes você é mais menina que e... – arregalo meus olhos – Meu Deus, você é gay?

 – Quanta sutileza – ele ironiza.

Pega meus braços e os tipo de seus ombros. Se afasta um pouco e olha para mim intensamente, talvez um pouco com raiva. Justo. Mas foi só uma pergunta, meu Deus. Que eu internamente rezava para que a resposta fosse não.

 – Não, eu não sou gay, Nina.

Ele continua me olhando um pouco ofendido, com um pouco de raiva. Reviro meus olhos. Garotos são estúpidos. Queria eu ser lésbica que nem a Lívia.

 – Eu não estou ofendendo suas masculinidade nem nada, você sabe disso – me justifico.

 – Sei? Será que eu sei? – ele levanta uma sobrancelha.

Deveria saber, querido. Deveria saber.

Abro minha boca para começar a falar, mas ele me interrompe:

 – Parece que vocês sempre esquecem que eu namorei a Karen.

Dou risada, mas sinto uma pontada no meu coração quando penso no assunto, que logo é ignorada. Eles terminaram. Não tem mais porque eu me sentir mal sobre isso. Certo?

 – A gente tenta esquecer, acredite. Pro seu bem. Ela te deu um chifre, você lembra? Foi com o seu melhor amigo – começo a rir.

A verdade era que eu precisava me lembrar que eles não eram mais nada um para o outro em voz alta. Era o jeito mais eficaz de fazer as pontadas irem embora. Não funcionava 100%, mas já fazia alguma diferença.

— Difícil esquecer  – ele fala. Me lança um olhar triste, mas logo desvia. Merda.

Eu não sou uma pessoa má. Nem um pouco. Mas eu me senti um pouco realizada quando o Matheus nos contou que a antiga namorada dele, Karen, pelo qual ele namorou por 5 meses, o estava traindo com o Jorge, antigo melhor amigo dele.

Eu parei de me sentir realiza quando ele começou a ir jogar boliche todo dia na semana e isso era um sinal claro de que ele estava deprimido.

Ele era péssimo no boliche. Karen era ótima.

Eu tinha vontade de torcer o pescoço do Matheus às vezes.

 – Desculpa. A Karen era uma vadia. Você sabe disso, não? – pergunto.

Ele tem que saber, meu Deus, por favor!

 – Eu sei, mas...sei lá, Nina. Eu realmente gostava dela, você sabe disso. E com meu melhor amigo? Porra.

 – Agora você sabe que as únicas melhores amigas que você precisa nessa vida somos a Lívia e eu – faço uma observação.

Ele passa um dos braços pelos meus ombros, me abraçando de lado.

 – Quando eu contei para vocês duas o que tinha acontecido, você disse “eu te avisei” – ele me lembra, em tom acusatório.

 – Eu sou maravilhosa, não é mesmo?

Ele ri.

 – Iludida.

Antes que eu pudesse responder, Lívia veio chegando correndo em direção a arquibancada para perto de nós dois. Matheus tira o braço de cima dos meus ombros e mal tenho tempo para me sentir frustrada, quando Lívia senta-se ao meio de nós dois.

 – Credo, você tá suada – Falo. Me afasto um pouco. Eca.

 – É o que acontece quando você joga futebol. Você saberia se levantasse essa sua bunda gorda da arquibancada de vez em quando.

Aponto para Matheus.

 – Ele quebrou o pé e não pode fazer educação física. Tô apenas sendo uma boa amiga e fazendo companhia. Culpe o Matheus, não eu e minha bunda gorda. Deixa nós duas em paz.

 – Eu nunca pedi para você me fazer companhia – Matheus fala.

 – Ingrato – acuso – Olha o esforço que eu faço para ficar cinquenta minutos olhando para sua cara feia e não correndo com essas lindas pessoas da nossa sala feito condenados.

 – Esforço? Você é a pessoa mais sedentária que eu conheço. Tá só me usando para a professora te livrar da aula nas últimas três semanas.

Dou ombros.

 – Talvez.

 – Mas enfim – Lívia nos interrompe – Eu tenho que voltar daqui a uns 5 minutos e jogar. Não tenho tempo. Do que vocês estão falando?

 – Sexualidade do Matheus e a vadia da Karen – respondo.

 – Minha sexualidade está ótima, vocês não precisam falar sobre isso. Obrigado – ele fala.

 – Ah...a gente tem que deixar ele se assumir sozinho, Nina – Lívia provoca.

Nós duas rimos.

 – Eu juro que se pudesse deixar vocês duas sozinhas aqui, eu deixaria – Matheus fala.

 – Deixaria nada – respondemos juntas.

Nós três sabemos que é verdade.

10 de Novembro de 2015,Terça-feira, 15:30

Leitor, eu nunca tinha visto minha mãe usar uma roupa como aquela antes. Jalecos? Várias vezes, ela era enfermeira. Vestidos de igreja? Todo domingo de manhã. Mas terninhos? Nem em festa a fantasia.

Minha mãe sempre gostou de cores e de estampas, por mais comportadas que as roupas fossem. Mas naquele dia, ela usava um terninho cinza tão sem graça que me faria duvidar que fosse ela mesmo. E um batom vermelho, é claro. Mas minha mãe nunca usou maquiagem, nem mesmo no próprio casamento.

Fiquei analisando- a por alguns segundos, um pouco chocada com sua vestimenta. Caraca!

 – Estou aprovada? – ela perguntou.

Eu estava prestes a responder quando processei o tom irônico na pergunta.

Dei um sorriso amarelo e me afastei um pouco, me apoiando na parede. Minha mãe fechou a porta atrás de si com cuidado.

Deus, será que ela ia gritar?

Provavelmente.

Eu não merecia isso. As cordas vocais da minha mãe eram ótimas.Ela conseguia gritar muito alto. Ainda mais depois de anos de prática no hospital gritando coisas como “ esse cara tá morrendo” ou “Já morreu”. Eu acho. Não sei o que médicos e enfermeiros gritam em hospitais. Parei na primeira temporada de Grey’s Anatomy.Mas enfim, ela conseguia gritar extremamente alto, ainda mais quando estava zangada. O que provavelmente era a situação naquele dia.

— Onde você estava? – perguntou, me analisando dos pés a cabeça.

Por um segundo, associei o gesto com os das meninas mais esnobes da minha escola durante a manhã: o nariz empinado, os ombros jogados para trás, o olhar minimalista e os lábios comprimidos.

 – No banho. Antes disso, num lago aqui perto – respondi.

 – Achei que tivesse dito que não queria mais você indo lá – Ela cruzou os braços em frente ao peito.

Será que era por isso que ela estava tão brava?

Encolho os ombros.

 – Me esqueci. Desculpe.

Ela assentiu com a cabeça, mas não falou nada.

Ficamos em silêncio por alguns segundos e me perguntei se aquilo era comum entre nós duas. O silêncio, o estranhamento. Minha mãe sempre foi faladeira, mesmo quando estava completamente cansada devido aos turnos do hospital, ela abria a boca e reclamava. Mas nunca ficava em silêncio, guardando os pensamentos para si própria. Aquele jeito de agir era muito diferente do qual eu estava acostumada.

Eu não sabia se conseguiria aguentar ainda mais mudanças depois daquela. Já tinham sido mudanças demais por um dia só.

Eu havia pedido três coisas só. Só três coisas. Como minha vida tinha mudado tanto por causa de três frases?

Era surreal demais pensar sobre isso.

E eu não conseguia mais suportar aquele silêncio.

 – Você ia me dizer alguma coisa? – pergunto.

Ela balança a cabeça de um lado para o outro, como se estivesse acordando de um transe.

 – Sim, desculpe-me. O seu vestido chegou.

Levanto uma sobrancelha.

— Vestido?

 – Sim. Branco, como você sempre prefere. Vamos. A costureira está esperando há tempo demais.

Ela abre a porta e se vira, indo para o corredor da casa. Quando se vira, vejo que cortou o cabelo em estilo channel. Ela parecia uma executiva agora.

Ela tira um celular do bolso e começa a digitar, me esperando sair do quarto.

 – Han...mãe?

 – Sim? – Ela não levanta a cabeça.

 – Hum...ah...Qual é a ocasião, mesmo?

Agora ela levanta a cabeça.

Minha mãe sorri de forma irônica e responde:

 – O aniversário da sua madrasta, é claro.

Abaixa a cabeça,volta a digitar no celular e começa a andar pelo longo corredor ao outro lado da porta.

Fico parada por alguns segundos, em estado de choque.

Madrasta?

Meus pais tinham se divorciado?

(...)

Pela primeira vez naquelas 24 horas, consegui analisar detalhadamente a casa enquanto seguia minha mãe pelos corredores.

Leitor, a minha conclusão imediata foi que minha mãe deveria ter ganhado um sorteio acumulado ou algo do tipo. Porque, olha, tinha dinheiro para caramba investido naquela casa.

Os corredores eram largos e extensos, cobertos por quadros meio macrabos – na minha opinião, pelo menos. Praticamente nenhuma luz entrava pelas janelas, todas cobertas por cortinas pesadas e de cores escuras que iam do teto até o chão. A iluminação do corredor era composta por lustres grandes e algumas velas espalhadas por criados-mudos espalhados metodicamente.Eu confesso, Leitor, que me sentia em alguma mansão de um velho amargo que aparecia em um filme. Era tudo tão escuro por ali.

O tapete que corria por toda a extensão dos corredores, ligando um a outro,era de uma cor vermelha escura com pontos em dourado.

Eram muitas portas de madeira espalhadas, todas largas e extremamente altas.

Aquela casa – minha casa – era o oposto da minha que eu realmente costumava conhecer.

Minha casa antiga era localizada em um bairro residencial simples nos limites da cidade, com dois andares e um telhado que eu costumava deitar quando precisava pensar. Aquele lugar...era exatamente o oposto.

Depois de alguns minutos, minha mãe ( que andava e mexia no celular ao mesmo tempo) guardou o aparelho e parou em frente a uma porta. Bateu elegantemente duas vezes e, em resposta, alguém gritou de dentro do cômodo.

Nós duas entramos em uma sala grande e bem mais clara que os corredores. De uma janela branca no oposto do quarto, vi a paisagem de toda a fazenda e fiquei impressionada com a vista. Aquele lugar era imenso!

 – Ai – reclamei assim que entrei no cômodo. Senti algo espetando meu pé.

 – Seja cuidadosa, querida – uma velhinha me alerta.

Uma senhora usando um uniforme meio brega de empregada ( igualzinho aqueles dos filmes de hollywood), carregando nos braços um monte de tecidos e entrando na sala logo atrás de mim.Sorri em agradecimento depois de ver que tinha pisado em alguns alfinetes.

Quem deixa alfinetes jogados perto de uma porta, meu Deus?

Ou melhor, jogados por qualquer lugar disponível no chão. Aquele lugar estava uma bagunça. Havia alfinetes e roupas espalhadas por todo canto. Literalmente. Penduradas em araras, saindo de dentro de armários, empilhadas nas cadeiras, nas barras das janelas...era muita roupa.

No meio daquele espaço, estavam sentadas minhas três irmãs: Mariana,que me olhava com preocupação; Áurea, que parecia querer estar dormindo; e Elisa, que...me olhava com o olha:

“O que a vadia mirim tá fazendo aqui?”

Engoli em seco. Aquilo não seria nada agradável.

 – Anda, Severina.

 – Oi? – Eu estava muito concentrada na Elisa e na questão toda de eu estar ferrada,

 – Senta – minha mãe ordenou depois de revirar os olhos com impaciência.

Mariana se afastou um pouco de Aurea, me dando espaço para sentar entre as duas em um estofado vermelho.Agradeci mentalmente por não ter que sentar do lado de Elisa.

 – Então – minha mãe começa a falar – a festa da madrasta de vocês será antecipada para sexta-feira devido acontecimentos recentes – ela me lança um olhar tão rápido que quase não consigo notar – e precisamos tirar os olhares de cima de nós depois deles.

— Achei que os olhares sobre nós era sempre o objetivo.

 – Não os negativos, Mariana.

 – E como você pretende tirar os olhares negativos? Os jornais só falam sobre isso no Brasil, imagine na Europa.

 – Mariana, pelos Céus, me deixe terminar.

Europa?

Porque falariam sobre nós na Europa?

 – Vocês quatro – minha mãe fala, apontando o dedo indicador para nós – vão ser as 4 irmãs perfeitas nessa festa. Vão sorrir, se abraçar, rir e conversar. E se tiverem que atuar pra conseguir fazer isso, que atuem! E atuem bem. Posem e acenem. Sejam nada menos que perfeitas .

Fico surpresa. O quanto a mídia se importava com a minha família? Porque minha mãe estava agindo daquela forma?

 – Elisa e Nina – ela continua – fiquem juntas. Não importa o quanto não consigam olhar uma para outra, fiquem grudadas nessa festa. E eu juro, se uma foto sequer de uma sem a outra aparecer, haverá consequências. E serão severas. Para as duas.

Engulo em seco, nervosa.

 – Agora – ela continua – preciso ir embora. As quatro vão terminar de experimentar os vestidos e eu voltarei em uma hora para ver se tudo está certo.

Ela vai embora.

E eu fico de boca aberta.

O que diabos tinha acontecido com a minha mãe?

(...)

Uma das coisas mais importantes que deveriam ser ditas a você quando alguém te oferece três desejos é : “Haverão consequências”

E quase sempre te dizem isso.

E nunca você realmente escuta. Porque as consequências nunca são tão pequenas que nem você imaginava que elas seriam.

Meus tios ressuscitarem? 2 pessoas a mais pegando no meu pé sobre as provas da escola e faculdade.

Minha mãe rica? Uma família um pouco mais metida e bem de vida.

Melhor amigo nunca conhecido? Uns 5 quilos a mais, já que a mãe dele era nutricionista.

É isso que você imagina. Consequências simples.Que você pode lidar com o tempo e um pouco mais de esforço. Você nunca imagina uma vida completamente diferente por causa de três frases.

Uma família que te acha completamente vadia. E talvez eles estejam certos.

Uma mãe fria. Muito fria. Relação péssima com a irmã mais velha. E pais divorciados.

Um melhor amigo a menos que me diria o que fazer quando eu precisasse de ajuda.

Eu nunca imaginei que as consequências seriam assim. Tão...gigantescas.E horríveis. E complexas. E, meu Deus, eu ainda não havia nem tido tempo para pensar em tudo o que estava acontecendo.

Primeiramente:eu tinha beijado o noivo da minha irmã no meio do casamento deles. E parece que eu amava ele e ele me amava. Se nós gostávamos um do outro... porque ele estava se casando com Elisa?

Segundo: minha mãe era rica e morávamos numa casa que parecia uma mansão de algum vampiro de 300 anos mal-humorado. Minha família era famosa, por algum motivo e a mídia estava sempre de olho em nós. Meus pais tinham se divorciado e meu pai já estava casado novamente, morando na Europa. Porque eles tinha se divorciado? E porque ele tinha ido para a Europa se os 7 filhos dele moravam no Brasil? Por amor a uma outra mulher? Não...isso não fazia sentido nenhum na minha cabeça.

E Elisa me odiava. É claro. Era bem compreensível. E eu não tinha ideia de como iria lidar com essa situação, muito menos revertê-la. Minha família também não estava em tempos felizes comigo. Eles todos me odiavam.

Terceiro: Eu não tinha mais o Matheus sendo meu melhor amigo.

Nem seus conselhos, nem sua implicância, nem as mensagens, nem as conversas durante a aula de educação física. Eu não tinha mais ele.

Leitor, eu comecei a me perguntar se os meus três desejos tinha valido a pena.

(...)

 – Ai – reclamei.

 – Desculpe querida. A idade prejudica a visão de uma velha senhora como eu

“Então porque diabos você está manuseando alfinetes perto da minha pele?” Foi o que eu tive vontade de perguntar, mas tive que calar a boca já que minha mãe me ensinou a não discutir com idosos, usando o exemplo da minha vó Judith que achava que meu vô estava numa colônia de férias há 13 anos e não simplesmente que ele tinha largado ela pela minha outra avó.

Fico curiosa se aquela minha mãe atual ainda pensava da mesma maneira. Sobre não discutir com os idosos, é claro, não sobre a vó Judith. Vó Judith...será que alguma coisa na vida dela tinha mudado também com meus desejos?

— O vestido é vermelho, Dona Clementina. Não se importe em espetar a Nina quantas vezes quiser – Elisa resmungou, com a cara enfiada em uma revista.

Dona Clementina me olhou como se dissesse “ sinto muito pela sua situação com a sua irmã, querida”. Ok. Ela era uma idosa fofa. Um idosa fofa que já tinha me feito perder quase um litro de sangue, mas fofa. E isso que importa, não é mesmo?

Sorrio um sorriso amarelo em agradecimento.

Quando Elisa me chama de “Nina”, por um milésimo de segundo chego a pensar que estávamos bem. Afinal, Nina é um apelido carinhoso. Mas talvez tenha perdido esse significado.

 – Você quer que eu aperte mais na cintura, querida? – Dona Clementina me perguntou.

Estou prestes a responder quando Elisa fala novamente:

— Aperte o máximo possível. Nina engordou uns cinco quilos no último mês. A cintura dela está parecendo uma bola de basquete inchada, aperte o máximo possível para afiná-la, por favor.

Respirei profundamente novamente, tentando conter as lágrimas que estavam chegando aos meus olhos. Eu não iria chorar. Nem mesmo de raiva. Não daria aquele gostinho para Elisa.

Dona Clementina me lançou aquele olhar de novo, mas não sorri daquela vez.Eu não consegui.

Ela apertou um pouco mais o vestido na região da cintura e eu me olho de lado no espelho. Eu realmente tinha engordado ou Elisa estava apenas me alfinetando?

Aperto os lábios e faço um sinal de positivo com a cabeça, indicando que estava bom. Apenas de me sentir morrendo de raiva e outras dezenas de coisas por dentro,eu me sentia bonita naquele vestido. Era um vestido longo – eu nunca tinha usado um vestido longo antes – feito de seda. A parte de cima era bem vermelha e um pouco justa, o que valorizava meu corpo. As mandas eram de alças grossas e o decote em V não era tão grande. A saia era linda, um pouco bufante, como de uma princesa, mas não muito. Ela era dégradé, começando com um tom escuro de vermelho igual ao da parte de cima e ia se clareando até um vermelho bem claro no final do vestido.

Era lindo.

— Então, o que achou? – Dona Clementina

Sorrio.

 – Eu adorei.

 – Não acho que vermelho combine com seu tom de pele. Você tomou muito sol, sua pele tá parecendo terra e está toda descascada. Parece um peixe – Elisa fala.

Três vezes. Eu poderia aguentar duas alfinetadas, mas não três. Três já era demais. Eu realmente odiava muito o número três.

Me virei para encarar Elisa,que estava sentada perto de Mariana e Áurea, e estava pronta para responder, quando Mariana largou com força a revista que estava lendo e disse:

 – Elisa, já chega!

 – Chega de quê, Mariana? – Elisa responde.

 – De agir como uma vadia coma Nina. Cala a porra da sua boca. Agora. Você tá me entendendo?

Fico aliviada. Sempre fui independente, nunca dependi de nenhum dos meus irmãos, mas sempre me alegrei quando um deles me defendia. Era bom. Eu me sentia protegida.

 – Eu estou agindo como uma vadia? Eu? – Elisa começa a se enfurecer também – Ela beijou o meu noivo na frente da igreja inteira! Saiu nos jornais!

 – Eu sei! E também sei que você não se importa nenhum pouco dela ter beijado a porra do seu noivo e sim com o fato de ter saído uma foto no jornal.

 – Ela estragou a minha vida!Ela foi uma vadia, Mariana!

 – Você foi a porra de uma vadia primeiro, Elisa. E sabe muito bem disso! – Mariana responde.

Nesse momento, Áurea interfere:

 – As duas podem calar a boca, por favor? O sol está se pondo e eu estou tentando assistir.

Olhei pela janela. Era verdade. O sol estava se pondo. Seria uma visão linda para observar, se eu não estivesse tão preocupada com...bem, milhares de coisas.

 – Vai se fuder, Áurea – Elisa manda.

Tenho vontade de rir. Elisa sempre foi a mais paciente com Áurea, nunca a xingou ou xingou qualquer um. Parece que as coisas estavam mudando até nos detalhes mais simples.

 – Quer saber, eu vou mesmo. O meu namorado está na cidade e eu vou ir fazer isso com ele, enquanto as duas, ou melhor, as três – ela me olha – ficam brigando feito minha gata e aquele rato que mora no porão.

Tenho muita vontade de rir.

Áurea deixa a sala.

Ela estava namorando? Com quem?

Vi Mariana prendendo o riso e Elisa bufando, nervosa.

— Dona Clementina, o vestido de Nina já está pronto? – Mariana perguntou depois que Áurea deixou a sala.

— Já sim – a velhinha respondu..

 – Ótimo – Ela se levantou e puxou meu braço – Vamos embora, Nina. Você pode se trocar no seu quarto.

Agradeci a dona Clementina antes de começar a andar em direção a porta com Mariana.

 – Aonde vocês duas vão? – Elisa perguntou. Ela ainda não tinha terminado de arrumar seu vestido.

— Embora. Você conseguiu espantar as suas três irmãs, Elisa. De novo. Parabéns.

Então eu e Mariana fomos embora.

(...)

Daquela sala até meu quarto são exatamente 178 segundos.Quase três minutos. Eu contei.Simplesmente porque eu e Mariana não falamos nada durante o trajeto.

Ela andava rápido, olhando para frente, com uma postura rígida.Eu andava atrás, com o coração na minha boca e contanto, tentando me distrair de pensar na realidade.

Minha vida estava uma bagunça.

Depois daqueles quase 3 minutos, Mariana parou em frente a uma porta e a abriu. Entrou naquele quarto e eu entrei atrás.

Meu quarto.

Sento na minha cama, achando que ela vai sentar ao meu lado e conversaremos um daqueles papos inspiradores de “eu estou aqui por você” e todas essas coisas. Mas Mariana não faz isso.

Ela começa a andar em direção a porta, sem dizer uma palavra sequer para mim. Respirei fundo e falei em um impulso:

 – Você também me acha uma pessoa horrível, não é?

Mariana parou na porta, com a mão direita no batente. Ela ficou de costas para mim, parada por alguns segundos. Sem dizer nada, nem se mexer. Consigo ouvir minha própria respiração por causa de tanto silêncio.

E então ela vira, e seu rosto está molhado. Duas lágrimas solitárias escorrendo pelas bochechas.

 – Você é uma pessoa boa que fez uma coisa horrível. Mas a situação é mais complicada que isso e... você e Elisa são minhas irmãs e todo mundo está defendendo ela e te atacando. Eu acho que pelo menos alguém dentro dessa casa tem que proteger você, Nina. E você é minha irmãzinha. É meu dever te proteger. Então...é...eu escolho você.

Então ela vai embora.


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