Gasoline escrita por jupiter


Capítulo 4
I Want You To Kiss Me;


Notas iniciais do capítulo

Ei, nos encontramos nas notas finais, ok? Aproveitem!



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As paredes do quarto de Carter eram cobertas do chão ao teto com pôsteres de bandas, filmes, jogos e modelos de biquíni. Aquele era seu mais desorganizado e secreto refúgio, ninguém estava autorizado a entrar ali sem a sua supervisão e autorização. E, acredite, ele realmente sabia quando alguém tentava desorganizar sua bagunça.

Em um dos cantos do quarto, o que antes havia sido uma escrivaninha para estudos, agora havia sido transformada em um depósito de garrafas e copos vazios, amontoados de papéis rabiscados que deslizavam para o chão e pilhas desordenadas dos discos que ele mais escutava.

Em outra parte, no que poderia ser considerado um altar, estava apenas uma fotografia solitária de seu pai. Tocos de velas apagados formavam um semicírculo diante dela, e uma camélia branca que Carter havia surrupiado do jardim da Sra. Mills estava posta em um pequeno jarro ao lado.

Era sábado, e nos dois dias que haviam sucedido seu encontro no Lollipop com Cassie, eles haviam se encontrado. Na quinta-feira ele a levou a uma festa num galpão abandonado, ela estava meio fora de si porque havia brigado com os pais para poder sair, e isso resultou no seu primeiro porre de verdade. Às quatro da manhã Carter teve que parar o carro no meio de uma rua deserta para que ela pudesse vomitar. Na sexta, mesmo reclamando de dor de cabeça, ela o levou para conhecer um de seus lugares favoritos quando decidiram matar aula. Era um jardim abandonado nos limites do bairro que parecia um cenário extraído de um filme de terror, mas que ainda assim era bonito o suficiente para fazer com que Carter se sentisse acolhido.

Lá Cassidy lhe contou entre risos que seus pais haviam ficado furiosos, e que não conseguia explicar o quão orgulhosa de si mesma ela estava. Carter não pôde deixar de reparar no brilho malicioso que resplandecia em seus olhos enquanto ela contava tudo detalhadamente, e também não pôde deixar de se sentir mais confuso ainda com relação ao emaranhado complexo que ela representava.

Às vezes, nos momentos em que nenhum dos dois dizia nada, ela simplesmente parecia não estar lá. Seu olhar se tornava distante e, quando abria a boca para dizer algo, suas frases eram profundas e reflexivas, sempre o conduzindo a pensar em tudo o que acontecia a sua volta.

Agora, esticado sobre a cama encarando o teto, ele ainda se pegava pensando nela. Não adiantava o quanto tentasse, simplesmente não conseguia encontrar um argumento justificável para tudo o que ela vinha fazendo nos últimos dias. Desde a manhã em que ela adentrou a detenção, Carter sabia que algo estava errado. No jardim Cassie havia lhe dito que o mundo não era justo, e ele concordava! Baixando os olhos para a fotografia do pai, pelo menos aquele ponto, ele conseguia compreender.

Fazia três anos. Três anos desde que aquele policial simpático bateu na porta de sua casa tarde da noite. Ele estava sendo gentil. Gentil até demais. Mas Carter sabia que havia algo mais na maneira como ele os encarava, e simpatia nenhuma é capaz de encobrir uma notícia ruim. Porque, de uma maneira ou de outra, elas sempre chegam.

Fizeram de tudo para salvá-lo, mas infelizmente não foi possível...”, ele havia dito.

Carter se lembrava da noite fria que estava fazendo, se lembrava de como as ruas estavam vazias quando, em completo choque, saiu correndo de casa vestindo uma blusa regata e uma calça de moletom. As palavras “briga”, “bar” e “esfaqueamento” ecoavam como uma melodia odiosa e torturante em seus ouvidos. Seu pai, o homem que havia sido o responsável pelas melhores memórias que ele possuía, havia sido morto enquanto tentava ajudar a um amigo. Realmente, Carter precisava concordar, o mundo era mesmo muito injusto.

Anos mais tarde sua mãe se tornaria o tipo de mulher que não consegue viver só, que passa horas no salão de beleza e que tem dois namorados diferentes por semana. Carter passaria a ocupar o posto de garoto problema infernizando a vida dos vizinhos, exibindo baseados por aí e transando com garotas diferentes em campos desérticos.

Se Lincoln Young estivesse vivo, ele não se orgulharia nem um pouquinho do rumo que a família que tanto lutou para manter levou.

Ainda fitando um dos últimos resquícios do que um dia fora o sorriso do pai, Carter não precisava admitir em voz alta o quanto ele fazia falta. Bastava olhá-los para saber. A família Young estava em ruínas. E seu declínio havia começado três anos atrás, quando um policial gentil bateu em sua porta tarde da noite.

***

Uma semana e meia depois, quando os deuses finalmente haviam ficado de bom humor e mandado os dias de chuva embora, Carter levou Cassie para um passeio no Maverick pela cidade. Com as janelas abaixadas, eles riam enquanto lançavam para a rua latas vazias e amassadas de cerveja. Cassidy constantemente colocava os braços finos para a fora e mostrava um par de dedos indecentes para quem estava nas calçadas. Ela parecia diferente desde a primeira vez que haviam andado naquele carro juntos, mas Carter acreditava que era porque finalmente estava se acostumando com ela. Cassie não era como as outras garotas, ela não precisava fazer o menor esforço para fazer com que gostassem dela. Era algo natural, que acontecia sem que suas vítimas pudessem se dar conta que estavam sendo cativadas.

Quando enjoaram do que estavam fazendo, Carter estacionou o carro nos fundos do estacionamento de um mercado quase falido. Com os bancos reclinados e cigarros entre os dedos, eles observavam em silêncio os poucos carros que passavam ao longe. Um sorriso satisfeito insistia em surgir no canto de seus lábios, e antes que pudesse pensar em qualquer coisa inteligente para dizer, Cassie lançou o cigarro pela janela e se voltou para ele.

— Posso perguntar uma coisa?

— Acabou de perguntar.

Ela revirou os olhos.

— Como uma pessoa igual a você, com toda essa popularidade, fica só na maior parte do tempo?

— Ultimamente as pessoas não tem valido muito à pena — Carter respondeu, encarando o estofado do teto do carro. — E você?

Cassie mordeu o polegar, o avaliando com curiosidade. Aquela era uma das coisas que parecia não deixá-la nunca, ela sempre parecia estar ansiando por captar e compreender todos os detalhes a sua volta. Ela era uma amante incontrolável dos enigmas, e encontrava um em cada pessoa que conhecia.

— Eu tenho um amigo — ela respondeu, por fim. — Nós não nos encontramos com muita frequência. Faz dois meses que eu o vi.

— Ele é de outra cidade? — indagou Carter, e ela negou com a cabeça. — Então, porque diabos vocês demoram tanto pra se ver?

— Ele é paciente de uma clínica de intervenção. Tem sessenta anos, mas é viciado em álcool. O nome dele é Bruce, uma ótima pessoa. Meus pais não gostam muito de me levar pra ver ele, por isso a demora.

Carter a encarava com o cenho franzido e uma expressão de total descrença.

— Seu único amigo está em uma clínica de intervenção e tem sessenta anos? — ele assobiou. — Ual! Srta. Underwood, o que mais eu preciso descobrir a seu respeito? Que era uma paciente?

Ela sorriu.

— Você nunca irá saber tudo sobre mim, Sr. Young. E, acredite, você ainda vai desejar desvendar todos os meus segredos.

Carter permaneceu em silêncio, a analisando com cautela. Ele se lembrou da última reunião particular na casa de Holly Daniels. Ela havia lhe perguntado na frente de todo mundo o porquê dele estar andando com “a esquisita sabe-tudo”, e sua resposta havia sido que ela não tinha amigos, e que isso o motivava a tentar descobrir o motivo. Mas, agora, vendo a meia com listras amarelas que escapava para fora de seu coturno empoeirado, ele se questionava se era mesmo esse seu único propósito.

— Carter?

Ele ergueu os olhos para o rosto dela rapidamente, temendo que ela o tivesse visto a observando daquela maneira que fazem as pessoas se sentirem desconfortáveis quando são pegas.

— O que é?

— Posso te pedir uma coisa? — ela aprumou-se no banco.

— Depende. O que você quer? Dinheiro? Mais cigarro? Roubar esse mercado que está fodido?

— Eu quero que você me beije.

Os zumbidos no ar ficaram completamente audíveis naquele momento. Carter pensou que não havia escutado muito bem o que ela havia acabado de lhe pedir, por isso apenas a encarou sem dizer absolutamente nada, com a boca entreaberta.

— Você quer um beijo? — finalmente indagou, prendendo uma mecha do cabelo comprido atrás da orelha.

— Um beijo — ela repetiu, deslizou de seu lugar e se sentou sobre as pernas dele.

— Você é louca? — Carter a encarou incrédulo.

— Talvez, mas podemos discutir isso depois. Agora, vai me dar um beijo ou não?

Carter engoliu em seco. Já havia beijado muitas outras garotas, se envolvido com diversos tipos, mas jamais havia sido abordado daquela maneira. Depois, ele nem sabia se queria realmente beijá-la. Sentada sobre seu colo, Cassie era leve como uma pluma, e para qualquer outro rapaz ela seria minimamente atraente. Não era dona de atributos invejáveis e muito menos uma típica modelo de revista adolescente. Numa escala de possíveis garotas com que se poderia ficar, ela certamente não estaria entre as primeiras.

Mas havia algo. Havia algo na maneira como ela agia e se portava que o deixava atônito por dentro. Cassidy Underwood estava fazendo algo com ele, mexendo em uma parte de seu interior que a muito havia sido trancafiada a sete chaves.

— Não sou o tipo de cara ideal pra uma garota como você.

Ela segurou o rosto dele entre suas mãos, e Carter reparou que de perto seus olhos pareciam ainda maiores.

— Não estou pedindo pra você ser meu namorado ou meu amigo com benefícios. Eu só quero um beijo, Carter. Um beijo. Se desejar, ninguém precisa saber que isso um dia aconteceu. Pode ser um segredo só nosso, e aí um dia você poderá dizer aos outros que sabe algo sobre mim que mais ninguém sabe.

— Por que você fala assim?

— Faz diferença?

— Não.

Ela abriu um pequeno sorriso, desenhando círculos invisíveis na bochecha dele. Carter segurou o rosto pequeno dela com cuidado, temendo que um movimento brusco seu fosse capaz de quebrá-la. Sentiu a textura áspera da pele dela e o cheiro adocicado que provinha de seus cabelos.

— Você tem cheiro de chiclete de morango e cigarros — observou ele, respirando fundo e armazenando aquele aroma no fundo de sua mente.

— Isso é ruim?

— Não. Definitivamente não. — ele a encarou, enxergando seu próprio reflexo nos olhos dela. Ele viu também o brinco de estrelinha que ela estava usando e perguntou: — Nosso segredo?

— Nosso segredo.

Então ele a beijou. Um beijo molhado e com gosto de cerveja, regado a uma pitada de nicotina e perigo. Aquela era a junção improvável do certo com o duvidoso. O encontro audacioso do pequeno rio com o mar aberto.

Em algum lugar, dentro de Carter, alguma coisa nova havia acendido. Ele queria mais, queria chegar ao topo da montanha e sentir o ar puro em seus pulmões. Aquela parecia ser a primeira coisa sólida que ele tinha em meses. Nada jamais se assemelharia ao que sentiu naquele momento, e principalmente ao que sentiu poucos dias depois, quando encontrou o furacão chamado Cassidy pelo o que seria a última vez.


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Notas finais do capítulo

Bem, eu particularmente demorei muito com esse capítulo, e ele está bem longe de ser um dos melhores. Como vocês puderam perceber no fim, a fic não está muito longe de seu encerramento. Eu imagino que ainda vão haver mais dois capítulos e só, essa não é uma história para ser alongada.
Depois, espero que tenham curtido esse momento açucarado, foi um tanto complicado conseguir chegar até ele. Quero agradecer pelos últimos comentários e pedir para que me alertem sobre qualquer erro aqui presente, ok? Beijos e até o próximo!