Gasoline escrita por jupiter


Capítulo 3
Playground Of Broken Souls;


Notas iniciais do capítulo

Olá, vocês! Bem, quero dizer que os comentários no capítulo anterior me deixaram muito, muito feliz. Vocês foram uns amores e espero que esse capítulo possa me deixar a par com vocês.
Não tenho muito a dizer por aqui e, a propósito, a música que me inspirou foi Boulevard Of Broken Dreams. Até o próximo!



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"Não devemos ter medo dos confrontos... até os planetas se chocam e do caos nascem as estrelas." (Charles ChaplinUh)

Carter nunca havia parado para reparar nos olhares que recebia quando passava pelos corredores. Geralmente, apenas colocava seus óculos escuros, acendia um cigarro e caminhava até seu carro ignorando tudo e todos. Contudo, quando deixou a detenção em companhia de Cassie, sentiu-se como um verdadeiro astro do rock, cercado de pessoas curiosamente incrédulas.

Com um relancear de olhos, observou que ao seu lado Cassidy caminhava de cabeça erguida. Encarando todos os outros como se os desafiasse a dizer alguma coisa, como se esperasse que eles tentassem impedi-la de se misturar com um tipinho de gente como o dele. Sendo capaz de enxergar em suas faces a surpresa por estarem dando de frente com aquela combinação estranhamente bizarra.

Carter lançou um sorriso satisfeito para Holly Daniels, que havia parado com o batom a meio caminho dos lábios exageradamente grossos, apenas para segui-los com os olhos, como um cão segue uma bandeja com um peru assado no Natal. Eles estavam sob os holofotes e não era necessário ser nenhum gênio para ver que ambos sabiam que estavam causando muito mais do que poderiam esperar.

— Deus, isso é incrível! — Cassie comentou, quando eles começaram a se aproximar do Maverick.

Carter abriu um sorriso orgulhoso.

— Você é uma celebridade agora.

Ela apoiou os braços finos no teto do carro e olhou para as outras pessoas por cima do ombro. Carter seguiu seu olhar e por um momento nenhum dos dois disse absolutamente nada. Os outros rapazes, tentando parecer descolados, prendiam cigarros atrás das orelhas e enrolavam as mangas de suas camisetas, exibindo músculos deprimentes do tamanho de bolas de golfe. As garotas, agindo como as personagens de seus filmes favoritos, tentavam parecer confiantes e decididas, adultas e independentes. Sorrindo para aqueles mesmos garotos cinzentos, que não queriam nada além de sexo. Que não queriam nada além do que se divertir. Que queriam apenas usá-las para contar detalhes aos amigos depois, durante dias e noites de bebedeira.

Ele desviou os olhos para Cassie novamente, que sob a luz do começo de tarde parecia cintilar. Sua pele emitia sutilmente um brilho pálido e esquálido, e era como se uma aura triste a circundasse naquele momento em que parecia tão vulnerável. Por baixo da sombra azul ele enxergou seus olhos, e por um momento a viu apenas como uma menina. Sem toda a maquiagem, a roupa curta e a autoconfiança recém-adquirida, ela nada mais lembraria que uma simples menina. No fundo, Carter não sabia exatamente o porquê de tê-la convidado para compartilhar seu último baseado. Talvez, ele pensou, não fosse assim tão diferente dos outros garotos. Talvez estivesse apenas com outras intenções, intenções que ainda não havia descoberto quais eram. Mas que, de algum modo, ele acreditava que estavam lá.

— Nós podemos ir pro Lollipop, né? — Cassie indagou, virando-se abruptamente e o pegando a observando no flagra.

— É. — ele resmungou, desconcertado. — Ninguém vai lá mesmo.

— Ótimo. — ela abriu o lado do carona e se lançou no banco.

Com um último olhar para o prédio largo de tijolos vermelhos que era a escola, e um suspiro pesaroso, Carter também entrou no carro.

***

Quando criança, Carter adorava ir ao Lollipop. Ele ainda se lembrava de como ficava feliz quando seu pai chegava do trabalho e o mandava se arrumar para que pudessem ir juntos ao seu tão amado parque.

Agora, encarando o portão de grade enferrujado, toda aquela estrutura que havia sido o palco de momentos felizes era como um cemitério de brinquedos. Abrigando estruturas gastas e deprimentes, com cores vivas transformadas em tons esmorecidos de melancolia e montes e montes de ferros retorcidos. Aquele havia se tornado um lugar onde os jovens costumavam ir usar drogas, transar e fazer qualquer outro tipo de coisa que ele não conseguia imaginar. As crianças da região eram estritamente proibidas por seus pais de se aproximarem dali, afinal, nunca se sabia o que poderia ser encontrado ao atravessar aquela entrada grotesca.

— Vamos. — Cassie tomou à dianteira.

O portão rangeu quando ela o empurrou, como uma lamúria agonizante. A trilha de pedras que se estendia serpenteante e depois se subdividia em várias estava coberta de cascalho e lixo. Carter observou as barracas e os primeiros brinquedos, e em sua mente conseguiu vislumbrar claramente todas aquelas luzinhas coloridas acesas, piscando, convidando, atraindo e cativando as crianças do bairro.

Eles avançaram ainda mais dentro do parque, contornaram uma fonte de pedra em ruínas e dobraram à direita. Seguiram a diante por mais alguns metros e depois de entrarem em um consenso, decidiram ficar no carrossel.

A estrutura circular e decrépita estava consistente o suficiente para permitir que eles se sentassem em seu interior, atrás de pôneis gastos e de aparência macabra. Carter não perdeu tempo e puxou o isqueiro do bolso, junto com seu cigarro já enrolado.

— Eu adorava esse lugar — Cassie comentou, sua voz soando mais alta no silêncio a volta deles. — Meus pais me traziam aqui todos os finais de semana, e este carrossel era o meu brinquedo favorito.

Carter puxou a fumaça, segurou-a por alguns segundos dentro da boca e depois a deixou se perder no tempo. Em seguida, passou o baseado para as mãos de Cassie.

— Eu sempre vinha com o meu pai — falou. — Minha mãe nunca teve paciência pra esse tipo de coisa.

A princípio Cassie engasgou, mas já na segunda tragada conseguiu se manter estável. Por algum tempo, eles apenas ficaram nesse jogo de passar o baseado um para o outro, mergulhados em suas próprias recordações. Carter reviveu mentalmente cada passeio, cada risada e até mesmo cada algodão doce comido. Ele sentia e muito a falta de toda aquela inocência, de quando conseguia olhar para o mais sem graça dos objetos e encontrar a beleza dele.

Sua atenção, no entanto, foi retomada quando Cassie retirou um saquinho de dentro do sutiã. Assim, sem mais nem menos.

— O que você tá fazendo? — indagou, olhando confuso para seu rosto e depois para o saquinho.

— Eu gosto de estrelas — ela respondeu, enfiou o dedo no saquinho e três pequeninas estrelinhas de plástico vieram grudadas em seu indicador. — Gosto de galáxias e... Bem, eu não posso chegar até lá, certo? Então, eu simplesmente as trago até mim.

Carter franziu o cenho, sem saber se seus sentidos estavam sendo afetados por aquela garota ou pelo baseado já na metade.

— Você é doida ou algo do tipo?

Cassie sorriu de maneira gentil, prendendo estrelinhas nos braços, nas bochechas, nas coxas e na testa.

— Eu já disse, o mundo é doido, Sr. Young. — ela tomou a mão dele entre as suas, e Carter lutou contra o impulso de se retrair. Contudo, se ela notou, continuou o que estava fazendo e colou nas costas de sua mão uma única estrela. — Sei que você deve achar isso estupidez, meus pais dizem isso o tempo inteiro.

Quando ela soltou sua mão, Carter baixou os olhos para a solitária estrela azul cintilando contra sua pele.

— Por que tá fazendo isso? — perguntou, erguendo os olhos para encarar seu rosto.

— Gosto de estrelas e...

— Não. — ele cortou. — Não tô falando das estrelas. Tô falando de tudo. Por que tá fazendo isso? Quer jogar sua vida no lixo?

Cassie o encarou com uma combinação esquisita de culpa e mágoa refletida nos olhos. Ambos estavam inebriados pelos efeitos do baseado que haviam compartilhado, mas Carter ainda estava são o suficiente para conseguir captar os detalhes a sua volta. Os olhos dela ficaram marejados de repente, as estrelinhas em seu corpo possuíam agora um aspecto triste e lamentável.

— Tudo? — contrapôs ela, balançando a cabeça em negação. — O que é tudo pra você, Carter? Toda a minha vida eu vivi sendo alguém que não queria ser, cresci ouvindo das pessoas o que eu deveria fazer e segui a tudo cegamente. Eles me disseram pra ser a melhor e eu fui. Disseram que só havia um único caminho, e eu acreditei. Só que todo mundo tem um limite, e eu acredito que já extrapolei o meu. Eu cansei. Cansei. Se tem algo em que eu acredito agora é que o mundo não vale à pena.

Cassie fechou os olhos e uma lágrima riscou sua bochecha, levando consigo uma estrelinha roxa. Carter a observou em silêncio, sentindo-se zonzo por conta de suas palavras. Ele pensou que, se houvesse uma maneira de chover nas galáxias, tal fenômeno seria intenso e profundo como as lágrimas dela. Ele sabia também que, se quisesse, poderia tocar as estrelas. Bastava esticar a mão e tocar seu rosto ou seu braço ou suas pernas.

Mas ele não conseguia se mover, não conseguia parar de encará-la e muito menos parar de pensar que o mundo era realmente doido. Cassidy Underwood era do tipo que os fracassados olhavam e almejavam, ela era a personificação do bom exemplo. Ela apenas era, só isso. E durante muito tempo Carter acreditou nessa figura que havia sido pintada sobre a garota prodígio, sem sequer imaginar que isso era tudo o que ela era. Apenas uma figura. Apenas uma imagem criada em prol do benefício alheio. Apenas alguém reluzente por fora e oca por dentro, assim como ele mesmo.

— Eu sei que não somos amigos e que não faz sentido nenhum eu tá contando essas coisas pra você — ela prosseguiu, passando bruscamente as mãos pelo rosto, removendo aquela mistura de lágrimas, estrelas e maquiagem. — Mas eu sempre reparei em você, Carter. E não com maus olhos... Só vi em você alguém que vivia exatamente aquilo que eu queria pra mim.

Carter balançou a cabeça, incrédulo.

— Você não sabe o que tá falando — disse com firmeza. — Viver como eu? Isso é destrutivo, vai acabando com você aos poucos. Você pode... Você pode, não sei, terminar o ensino médio e ir para a melhor faculdade do país! Você pode ser o que quiser, mas não precisa se destruir pra conseguir isso.

Cassie sorriu tristemente para ele, em seguida, apoiou-se nos joelhos e se inclinou em sua direção.

— Não há nada aqui pra ser destruído — sussurrou, olhando-o nos olhos. — Quem eu era deixou de existir a muito, muito tempo. Eu só quero que alguém me ajude a me sentir única, como eu jamais me senti antes.

Olhos nos olhos, estrelas na pele e vazios por dentro. Carter sentiu-se momentaneamente acalorado pela proximidade dela, como costumava se sentir quando ainda era só um menino e seu pai lhe chamava para que pudessem jogar basquete juntos. Ele também podia beijar as estrelas, bastava impulsionar seu próprio corpo e se aproximar dela. Poderia saber que gosto seus lábios tinham e como deveria ser envolver seu corpo franzino.

— Eu vou ajudar você — sussurrou de volta, surpreso consigo mesmo e com seu súbito e vigoroso interesse por ela.

Naquela época, é claro, Carter era só mais um jovem dentre tantos outros. Ele era apenas mais um com apenas alguns trocados no bolso e uma mochila cheia de sonhos. Ele era apenas mais um que acreditava possuir conhecimento o suficiente a respeito da vida num sentido geral.

Carter Young era inocente demais e só viria a descobrir isso mais tarde. Quando se desse conta que, na verdade, metades de vazios não se completam.


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