Insidious escrita por Bah


Capítulo 4
O mistério entre as paredes


Notas iniciais do capítulo

Olá, leitor! :)
acho que é aqui que a história realmente começa a se desenvolver. Espero que continuem acompanhando.

Ps: As músicas citadas realmente existem e são muito boas. Achei que não poderiam ter mais a ver com Alicia e Oliver.Se tiverem um tempinho, ouçam! Acho que, de alguma forma, dá mais vida à estória

Boa leitura! ♥



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. Esqueci as cortinas abertas na noite anterior e, ainda que com os olhos doídos pela claridade repentina, me senti bem com os raios de sol tocando minhas pernas. As camadas de gelo sobre as árvores quase se dissipavam e o inverno estava no fim. Os botões do pequeno jardim que mamãe tanto cuidava já desabrochavam. Respirei fundo e apoiei meu corpo dolorido nos cotovelos. Era sábado e um sentimento de alívio se apossou de meu corpo por não ter que pisar naquela mansão, mas, logo em seguida, um vazio chegou e eu podia sentir o vácuo dentro do meu peito. Não veria Oliver naquele dia.

Vesti um moletom velho e gostei de não ter que me preocupar com o emaranhado de fios cor de laranja que alcançavam meu glúteo. Papai me chamava de Leãozinho quando tinha a idade de Lilith.

_Bom dia, querida! Parece que não te vejo há décadas! Aquele trabalho não está te exigindo muito, Alicia?

_Bom dia, mamãe. Na verdade está sim, mas nada que eu não suporte.

Forcei um sorriso.

_Ah, eu e seu pai sentimos tanto...

_Está tudo bem, vamos ficar todos bem.

_Parece que o sol resolveu realmente sair, não é mesmo?_começou papai_O tempo está lindo para algumas fotos.

Fotos? Sol? Porra! Como não pensei nisso antes? Se Oliver era fotofóbico, como tinha fotos na praia, na cachoeira, nas baladas mais piscantes de todo o Maine? Algo muito estranho acontecia dentro daquela casa e eu descobriria o quê.

_Está tudo bem, docinho? Ficou tão pálida de repente.

_Tudo sim, pai, só tenho algumas coisas para resolver.

Engoli o café, que desceu absurdamente quente, e vesti a primeira coisa que vi pela frente. Conforme me aproximava da mansão um calafrio percorria minha espinha. Por que eu estava indo para lá, afinal?

Margareth abriu a porta e me encarou com expressão confusa.

_O que faz aqui, menina? Ainda não trabalha em tempo integral_disse fechando a porta atrás de si.

_Será que eu posso ver o Oliver? Eu só tive um pressentimento ruim.

_Ah, então você costuma visitar os outros sem avisar por conta de avisos do além?

_Escute, Margareth_respirei fundo_eu não sei quando foi que te deixei tão irritada ou o por quê dessa sua antipatia gratuita, mas no momento queria que deixasse isso de lado e me deixasse só dar um "olá" para ele.

Ela fechou a porta sem hesitar. Juntei todas as forças que dispunha e dei diversos socos e chutes na porta, só parando quando a senhora Hill me atendeu. Quase dei, acidentalmente, um chute em sua canela.

_Eu terei que chamar a polícia?_disse em tom calmo, um sorriso forçado no rosto.

_Eu sei que você não quer chamar a polícia_arrisquei_tem algo acontecendo aí dentro e você não quer que ninguém saiba.

Ela deu uma risada longe de ser cordial e passou a mão pelo curto cabelo negro. Me preparava para argumentar mais uma vez quando finalmente colou o corpo à porta aberta e fez um sinal teatral para que eu passasse.

Subi o mais rápido que pude, sem me importar com a expressão reprovadora de Margareth. Encontrei Oliver aparentemente adormecido com os cabelos encharcados no travesseiro. Me aproximei e toquei a pele de seu braço. Ele abriu os olhos inexpressivos por conta do sedativo.

_Você está aqui...

_Sim, estou. Aconteceu alguma coisa?

Ele deu um meio sorriso e umedeceu os lábios incolores.

_O que faz aqui hoje?

Bom, e o que eu fazia? Disse a primeira coisa idiota que me veio em mente.

_Se importa se eu colocar o CD que me deu para tocar nesse rádio? Ainda não tive tempo de ouvir.

Ele fez que não em um movimento imperceptível de cabeça. Coloquei-o para tocar e uma música lenta de bela letra se iniciou.

_Turning Page _ ele disse em um sussurro.

Concentrei-me no que a canção tinha a dizer.

" Eu esperei por cem anos,

Mas esperaria mais um milhão por você.

Nada me preparou

para o privilégio de ser seu.

Se eu tivesse apenas sentido

O calor de seu toque

Se eu tivesse apenas visto

Como sorri enquanto enrubesce.

Ou como aperta os lábios

Ao se concentrar

Eu teria sabido

Pelo que vivi

Pelo que tenho vivido."

Eu teria ficado de joelhos involuntariamente se já não estivesse nessa posição. Deitei o tronco na beirada de sua cama e minha cabeça tocou seu quadril.

_Daria tudo para entender, Oliver, eu juro...tudo!

Antes que notasse comecei um choro incontrolável, mal podia respirar. Ele pousou calmamente a mão com um novo machucado no topo de minha cabeça.

_Você quer sair daqui?_Perguntei.

Ele sorriu e me olhou como se eu fosse uma criança tola propondo uma cavalgada em unicórnios coloridos, como se não houvesse a mais remota possibilidade dele deixar aquele inferno.

A próxima música começou, se chamava "If I Told You", nunca tinha ouvido falar, mas era muito boa, assim como a primeira.

"E se eu te dissesse

quem eu realmente era?

E se eu te deixar entrar em minha charada

E se eu te dissesse o que realmente aconteceu?

Sem mais máscaras e joguinhos?

Tem tanto que quero contar

Mas tenho tanto medo de deixar sair

Cada segredo que escondi no passado.

Você me veria diferente?

Seria assim tão ruim?

Eu me pergunto como seria

Se eu te dissesse.

E se eu dissesse que

Isso tudo é só um modo

De esconder minhas inseguranças?

E se eu te dissesse

Que não sou tão forte

Como quanto gosto de fazer acreditar que sou?"

Estava claro que as músicas eram um pedido de socorro, letras mais do que objetivas, mas como eu poderia ajudá-lo? Como afastaria seus demônios se nem ao menos os conhecia?

Eu olhava seu rosto suado quando algo me chamou a atenção: um pedaço da raiz de seus cabelos negros exibia um loiro quase branco.

_Vire a cabeça, por favor.

Ele virou bruscamente para o lado oposto ao que eu havia pedido.

_Acho que você devia ir.

_Oliver, por que pinta o cabelo?

Não vi quando Margareth entrou no quarto, mas a agulhada que deu em uma das pernas de Oliver me pegou de surpresa. Ele mantinha os olhos fixados em mim, na mesma posição. Seu peito se contraiu e um grunhido baixo saiu de sua garganta até suas órbitas se revirassem e então apagasse de vez.

_Onde está a senhora Hill?_perguntei com o sangue fervendo.

_Na sala de estar_respondeu com o mesmo tom agressivo.

Desci os lances de escada e encontrei a mulher concentrada em alguns papéis.

_Senhora Hill, já decidi. Quero o trabalho em tempo integral e começo hoje.

Ela me olhou por detrás dos óculos cor de mel que deviam custar o preço da minha casa com tudo dentro. Comigo e minha família, inclusive.

_Isso é ótimo! Parece já ter provado ser mais do que qualificada para o emprego, mas nós temos regras e, uma vez quebradas, você jamais verá Oliver novamente.

Engoli em seco.

_Diga o que tenho que fazer.

_Margareth decidiu continuar por conta dos remédios, portanto, essa não é mais parte de sua função. Durante os finais de semana deve manter-se em seus aposentos até a hora do almoço e, só então, pode levar a refeição de Oliver e começar a executar sua tarefa.

_E qual exatamente seria minha tarefa?

_Controlar os impulsos de Oliver. Vou deixar uma parte dos sedativos com você, em caso de emergência.

_Não será necessário. _ estremeci.

_Regras. _ Ela me fuzilou com o olhar. _ Você deve estar ciente de que só pode ir para casa a cada quinze dias.

Aquilo me doeu, mas fechei o acordo e assinei o contrato.

_Senhora Hil... _ Ela me olhou impaciente. _ como Oliver pode ser fotofóbico com todas aquelas fotos sorrindo na praia?

_A condição dele é psicológica. Ele se convenceu de que tem problemas com o sol, e então começou a realmente se sentir mal quando exposto à claridade muito intensa.

Aquela resposta não me convenceu por completo, mas fez algum sentido.

_Nós vamos até a praia essa noite. _ Disse por fim.

_Ele concordou? _ Pareceu surpresa.

_Sim. _ Menti.

Já passava das dez quando Oliver terminou seu jantar e logo depois devolveu para o vaso de sua suíte. Nada parava em seu estômago por conta dos remédios e, para resolver, mais medicação.

_Eu falei com sua mãe..._ comecei enquanto andava de um lado para o outro, temendo sua reação_ pedi para que nós fôssemos até a praia essa noite

_Pra quê? _ perguntou aéreo.

_Vai te fazer bem.

_Tudo bem, senhorita "sabe tudo"! Vamos para o caralho da praia, se vai me fazer tão bem assim_seu tom era agressivo, há tempos não falava assim comigo. _ Aproveita e me espeta de uma vez com a agulha escondida no seu casaco. Vai realmente ser mais fácil aguentar sua ladainha estando desacordado.

Ah, a agulha...eu sabia que ele notaria.

_Escute, Oliver, eu cumpro regras. Não se esqueça de que eu trabalho para a sua mãe! Se quero ficar aqui tenho que andar na linha.

_Ah, sim, me desculpe _ começou debochado_ às vezes esqueço que só atura minha presença porque é paga pela ilustre Senhora Hill. Foda-se você.

Ele puxou o cobertor até a cabeça e virou-se para o lado da parede, deixando os tornozelos de fora. Estava ainda mais magro, ainda mais branco, se é que isso era possível. Eu não sabia como agir, fiz a primeira coisa que me veio à mente: cantarolei ridiculamente desafinada a primeira música do CD que me deu. Ele permaneceu na mesma posição pelos primeiros dois minutos, mas logo notei seus músculos, antes contraídos, cedendo aos poucos. Finalmente virou e me encarou.

_Alicia...

_Sim?

_Se eu for na droga da praia você pode, pelo amor de Deus, parar de cantar?

Lutei para segurar o riso e fracassei. Ele revirou os olhos e voltou para debaixo dos cobertores.

Era quase meia noite quando resolvi que era hora de sairmos. Oliver ficou relutante por um bom tempo, mas não demorou até que cedesse diante do meu talento ensurdecedor para a música.

Ele vestiu um casaco preto pesado, as calças rasgadas e se recusou a calçar qualquer coisa. Deduzi que tinha machucados novos. Margareth, um homem gordo e outro com a aparência de um rato nos “escoltaram” até o lado de fora. Seus pés trêmulos tocaram a areia e me senti complemente leve quando ele olhou para o céu e encheu os pulmões de ar.

_Como se sente?_ Perguntei.

Mas ele parecia fascinado demais para me responder. Foi em passos contidos e os pulsos cerrados em direção ao mar e se sentou na linha em que o oceano umedece o solo. Me sentei ao seu lado.

_Libertador, não?

Ele movia o lábio e piscava cada vez com mais frequência, conforme seu tique nervoso se acentuava. Mais um ataque, pensei.

_Olha para mim. _ Ajoelhei-me em sua frente _ Resista a isso. Enfrente, você é mais forte. Resista, por favor, não vá embora.

Ele esfregou o pulso na têmpora em um movimento repetitivo, os olhos vidrados no oceano, o pescoço se contraindo, um tremor vindo de dentro do crânio. Tomei seu rosto em minhas mãos e segurei em suas orelhas. Ele parecia alheio a tudo, mas enfim começou a falar.

_Eu nunca tenho muito tempo. Não vão te deixar ficar aqui. Eu juro que não quis fazer aquilo...eu não quis fazer aquilo! Não quis fazer aquilo!

_O que você fez, Oliver?

Ele começava a responder quando fui surpreendida por uma pancada e caí em um baque surdo.

...

Senti gosto de areia em minha boca, acordei atordoada, a cabeça e os ouvidos latejando. Passei a mão em minha têmpora pulsante e vi o sangue quente em meus dedos. O que diabos havia acontecido comigo?

_Oliver!_chamei.

_Fique quieta, menina! Já estou preparando os curativos_Disse Margareth com um rolo de gaze e esparadrapos nas mãos.

Tentei me sentar, mas minha cabeça parecia pesar o dobro do meu corpo.

_O que aconteceu?_balbuciei_Onde está o Oliver?

_O Oliver te atacou na praia. Eu avisei que a ideia era péssima, mas sua teimosia é coisa de outros planetas. Eu e outro empregado a trouxemos para o seu quarto. Não se mexa, não foi tão grave, mas preciso terminar de estancar o sangue.

Ela passava uma toalha morna em meu ferimento.

_O que? O que você está dizendo? O Oliver não me atacou! Nem poderia, eu estava olhando para ele quando algo me atingiu. Ele não tinha nada nas mãos.


_Ora, o que está sugerindo? Eu e Aaron estávamos de olho em vocês, só não pudemos chegar a tempo! Ele pegou uma pedra e te golpeou. Você está confusa por conta da pancada, é isso.

Ela evitava olhar em meus olhos enquanto falava. Enquanto mentia. Colocava a gaze quando dei um tapa em sua mão e segurei seu pulso.

Me sentei, ignorando a dor.

_Escute, Margareth...você pode não ir com a minha cara, pode me odiar, mas não vai meter Oliver nisso. Eu sei que ele já me atacou antes e não duvidava que aconteceria mais uma vez, mas tenho completa consciência de que o que aconteceu dessa vez não foi culpa dele. Vocês podem achar que eu sou burra, ou desatenta, mas eu não sou. Pode apostar que vou descobrir o que está acontecendo aqui. Acredite, não vão se livrar de mim tão cedo.

Ela estava pálida. Girou o pulso e se livrou das minhas mãos nervosas.

_Não preciso dos seus cuidados_cuspi.

Ela deixou a gaze e saiu do quarto, batendo a porta atrás de si. Me perguntei se não havia sido muito dura com ela e um filete de culpa ameaçou a aparecer, mas se foi assim que lembrei de sua selvageria ao tratar Oliver.

Dormi algum tempo depois, lutando contra a minha vontade de ir até o quarto de Oliver. Mergulhava na inconsciência quando o som de um choro sentido me despertou. Prendi meu cabelo melado pelo sangue em um coque, calcei um par de chinelos e olhei pela porta entreaberta. A mansão estava engolida pela penumbra. Cada gota que escorria das torneiras, cada vez que eu inspirava, todos os pequenos ruídos ampliados naquela imensidão silenciosa.

Fui quase automaticamente até o quarto de Oliver e o encontrei dormindo profundamente. O barulho vinha de umas três portas à frente. Era o quarto de Margareth. Colei o ouvido na porta trancada e ouvi a mulher lamentar, sem entender as palavras que, pelo que consegui compreender, eram direcionadas a Deus. Afastei-me de seu quarto e me senti mal por ter sido tão rude. E se ela, assim como eu, só obedecesse ordens?


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