Nightmare Daughter escrita por LoKs22


Capítulo 2
Para Salvadora de Monstros


Notas iniciais do capítulo

E aqui estamos nos na segunda parte. Se gostar da historia faça o ritual de sempre, porém você não é obrigado.
É aqui que os avisos de mutilação vem a tona.
Agora vamos terminar o conto da Juliet Cornelia.(Se puderem me responder o que acharam do nome eu fico agradecido)



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Ah, que bom que ainda está aí. Eu trouxe chá, do seu favorito inclusive. Vamos voltar para a nossa historinha?

Depois da conversa na carruagem o motorista nos chamou.

— Ei, senhores e senhorita, acabamos de chegar. – Avisou ele.

— Ótimo, vamos Juliet, mas cuidado para não se perder, é um lugar muito grande. – Disse Padre Baldric.

Ele não estava brincando, o local era quase uma fortaleza enorme, com torres, muralha, infelizmente não havia um fosso de crocodilos e um enorme portão de madeira reforçada com aço de qualidade. Eu tinha saído da carruagem já dentro da muralha e a base em si era muito variada, por assim dizer, havia lugares de um jeito e outros com uma aparência diferente. Feitos de pedra com alguns reforços de aço em algumas partes do local. O lado de fora e dentro da fortaleza eram igualmente agitados, era gente levando arma para um lado, gente levando papel para o outro, era uma bagunça.

— Nossa esse lugar é assim 24 horas? –Perguntei um pouco confusa.

— Só durante o dia, como ainda estamos de manhã eles provavelmente estão arrumando e repondo seus equipamentos usados ontem à noite.

— Ontem à noite? Quantas vezes que vocês caçam os monstros?

— Toda noite, sem exceção. – Sir Gerald respondeu. – Nunca que um caçador terá “férias”, eles só não caçam por motivos muito importantes, como família e amigos.

— Interessante. – Sussurrei.

— Agora me siga – Pediu Baldric.

Ele me levou para dentro por outra entrada do lado direito da base, em um canto menos movimentado. Ao entrar estávamos em um tipo de armazém secundário, de acordo com Gerald, tinham várias caixas com estranhos símbolos, decidi não perguntar sobre isso. Eu estava mais focada em resolver o meu “problema”. Ao sairmos estávamos em um corredor bem perto da entrada principal. O interior estava mais bonito do que eu achava, cheio de flores bonitas, quadros com pinturas calmas e a parede estava pintada de branco claro.

— Está é a área de administração, aqui é onde nós recebemos as mensagens e contratos de todos da cidade. Incluindo a sua Juliet. – Explicou Baldric. – O andar de cima é onde fica a nossa área de problemas sobrenaturais, entre outras áreas. Tem caminhos mais rápidos, porém muito cheios, aqui é bem mais tranquilo, embora ainda de para ouvir o barulho de fora. Entendeu?

— Sim.

No caminho encontramos com uma moça de pele branca com óculos, cabelo castanho escuro, com uma roupa de secretaria verde. Não pera. Como eu posso definir melhor? Já sei, usava uma camisa de botões, deixando um decote enorme, com manga longa e um casaco verde por cima, também fechado até deixar um decote, junto a uma saia longa azul e salto alto.

— Olá Padre Baldric e Sir Gerald. – Acenou ela.

— Olá Annabeth. –Baldric respondeu.

— Oi Anna. – Respondeu Gerald com um desgosto, eu não sabia se era porque estava comigo ou porque ele não gostava dela mesmo.

— Então essa é a garotinha com sonhos estranhos? – Perguntou ela.

— Errr... Sim, meu nome é....

— Juliet. – Disse ela, me interrompendo. – Correto? Seu nome estava na carta.

— Foi você quem leu? – Perguntei um pouco envergonhada.

— Sim. Também fui eu quem mandou esses dois para te buscar.

— Ehhh... Obrigada por isso. – Agradeci com um pouco de dúvida se foi uma boa escolha.

— Nós estávamos indo até o andar de cima na área onde resolvemos nossos problemas sobrenaturais. – Disse Baldric, mas a maneira que ele falou parecia sarcástica.

— Ah sim, podem ir.

Ela saiu do caminho e seguiu o resto do corredor. Viramos à esquerda e subimos uma pequena escadaria reta.

Quando chegamos ao andar de cima o lugar mudou um pouco. Não havia mais flores e nem paredes pintadas ou quadros bonitos, só velas apagadas, janelas fechadas, onde a luz do sol iluminava o local e paredes cinzentas. Era estranho em certo ponto, parecia um lugar mais assustador. Esse lugar ficou assim até eu chegar a um quarto com uma placa dizendo “Área de pesquisas sobrenaturais”.

— É aqui que vamos procurar um jeito de te curar. Tem uma equipe lá com a injeção e uma cama para você deitar. – Disse Baldric. – Só quero que faça uma coisa, não resista de forma alguma à injeção. Entendido?

—Entendi. Padre Baldric.

— Perfeito, agora entre você primeiro. – Ele disse, enquanto abria a porta, junto a um sorriso de aparência pura e confiável. Gerald estava encostado na parede sem nem me olhar.

Quando entrei, o quarto parecia bem agradável. Possuía só uma janela, um armário de madeira do lado de uma cama simples com cobertor azul e um travesseiro normal, nada de detalhes na cabeceira ou algo do tipo, também havia uma pequena estante de madeira comum do lado da porta, a parede era pintada de branco e azul separado em listras.

Dentro da sala havia três pessoas, além de Gerald e Baldric, dois eram homens um deles mais alto que o outro e uma mulher de tamanho médio. Os três usavam um casaco, calças e botas brancas, o homem mais alto estava com uma seringa enorme, eu até engoli seco quando vi aquilo.

Por mais que eu me tente, não consigo lembrar os rostos desses médicos. Só me lembro deles me pedirem para deitar e de me injetar a algo para me fazer dormir na hora. Obviamente eu fiquei um pouco aflita em levar a injeção, porém Baldric me convenceu a deixar eles me injetarem aquilo.

Quando dormi eu entrei no sonho que iria mudar a minha vida. Até aquele momento estava escuro e nada estava se formando. A primeira coisa que eu notei foi que eu me movia no sonho, era incrível eu podia acompanhar e ir para qualquer lugar.

— Uau, será que pela primeira vez eu estou em um sonho só meu? – Perguntei a mim mesma muito feliz. – Obvio que é, quem mais dormiria a essa hora do dia? Principalmente em um lugar movimentado como esse.

— Talvez alguém que não consiga ficar acordado. – Disse uma voz parecida com a minha.

Imediatamente eu me congelei. Olhando de maneira travada para trás eu vi um vulto camuflado na escuridão, eu não via nada dele além dos olhos vermelhos grandes e brilhantes, praticamente na minha altura.

— Eu e-entrei no-no seu sonho? – Disse gaguejando.

— Não, não, nós estamos vendo o mesmo sonho.

— Po-por que e eu consigo me mover neste sonho? De quem é este sonho? E quem é você?

— A revelação menos tocante primeiro. Você está no sonho de uma besta, ela está em algum lugar dessa base de caçadores, não tem como ser outro lugar. Você consegue se mover porque eu deixo você fazer isso, já que tal habilidade é minha e eu sou a sua versão besta.

— Vo-você sou eu?! Como assim?

— Lembra-se da conversa que você escutou escondida dos caçadores com sua mãe?

— Que meu pai era uma besta de nome estranho que invade sonhos?

— Sim e esse poder só pode ser controlado por mim, tecnicamente eu sou esse poder, só que estou usando a sua forma monstro para nos diferenciar e explicar o quão incrível você é.

— Minha forma monstro? Eu posso me transformar nisso?

— Sim, mas somente no momento certo. Agora, por que você não olha para trás?

Quando eu viro o meu olhar vejo uma criatura pequena e fraca, algemada a um tipo mesa de ferro com uma única luz vindo de lugar nenhum iluminando bem em cima dele. Quando homens cobertos de preto, carregando ferramentas de corte, como tesouras longas e facas afiadas, todas sujas com sangue. O coitadinho do monstro ficou desesperado, balançando para os lados tentando sair, eu tenho certeza que vi uma lagrima sair do olho dele. Um dos homens pegou uma agulha enorme, que parecia mais um prego para atingir o olho da criatura.

— Parem! – Gritei e quando eu fiz isso à criatura imediatamente se libertou das algemas.

Em fúria, a criatura atacou todos os homens da sala. Ele cortou a garganta de todos com suas garras afiadas e mesmo mortos o pequenino ainda atacava eles destruindo suas cabeças sem face com toda a força que tinha.

— Ei pequenino. – Chamei-o em voz alta – Você não precisa mais lutar. Venha cá.

Ele me escutou, e me viu. Era a primeira vez que isso acontecia. Ele veio lentamente, tinha o tamanho do meu joelho até o meu pé, que não era muito grande, era bem peludo, com olhos vermelhos brilhantes. Sim isso é uma característica que todos os monstros têm. Andava em quatro patas com garras afiadas em cada uma. Ele ficou acariciando as minhas pernas até eu decidir fazer carinho nele.

— Você não é malvado como todos dizem. Você é até fofinho. – Disse eu completamente feliz e inocente.

Depois de acariciar ele, uma luz cobriu o seu corpo e ele se transformou em um humano, pelo menos parecia um. Tinha cerca de seis anos, o tamanho batia na minha cintura, cabelo castanho claro totalmente bagunçado, olhos verde-escuro e usava uma camisa velha azul, uma calça bege e sapatos de couro antigo. Nos dois ficamos surpresos quando vimos isso, mas ele ficou muito feliz quando percebeu.

— Eu voltei ao normal.

— Espera, você é um humano?

Ele me ignorou, ficou olhando para si mesmo com um sorriso enorme e dançando sem parar.

— Incrível, não é? – Disse a outra eu. – Todas as bestas são seres humanos de uma época esquecida pela própria humanidade.

—Mas como eles viraram os monstros?

— Por que não pergunta para o garoto?

— Está bem. – Respondi. – Ei garoto, pode vir aqui?

— Oh, claro. Desculpe-me por te ignorar, mas eu não acredito que voltei ao normal.

— Você sabe que isso é só um sonho, não é? – Perguntei um pouco preocupada.

— Então é o melhor sonho de todos. Do que eu lembre, desde que me tornei um monstro eu só tinha pesadelos horríveis, mas graças a você tudo ficou incrível.

— Falando nisso. Como você se tornou um monstro?

— Ah isso foi meio que há milênios atrás, eu acho, mas ainda me lembro de como foi.

— Se não quiser não precisa.

— É claro que preciso isso é o máximo que eu posso fazer.

— Ok. Só que explique devagar para eu entender.

Conforme o garoto explicava o cenário em volta começou a ter forma.

— Sim. O meu povo e eu fomos a primeira grande civilização nesse lado do planeta, não sei ao certo o quanto, mas era muito grande. Nossas construções eram totalmente diferentes da de vocês, eram formadas por casas que também eram torres gigantes e mudavam de forma com a própria vontade do dono, logico, também tínhamos várias coisas malucas, como fortalezas flutuantes ou florestas embaixo de lagos. Existia também a igreja da minha época, chamada de Ilies Pers, significa Igreja da Raça Perfeita, eles acreditavam que todos os humanos eram a raça perfeita e que deveríamos viver para sempre, sendo esse o objetivo da igreja. Na época existia magia, obviamente, só que ela não era dividida entre magia branca e negra, isso nem existia até então. Porém, em um dos testes da igreja em criar a poção da vida eterna eles criaram a bebida perfeita da cura. Com o passar dos anos essa bebida era mais usada do que água normal.

O cenário em volta parecia a história de fantasia mais bonita e sem noção que eu já vi e ouvi na vida, era como uma cidade magica, exatamente como ele descreveu, enquanto contava a história ele interagia com algumas pessoas que apareceram no caminho, apenas com um apertar de mão e acenos, mas mesmo assim parecia que algumas delas tinham alguma relação com ele, como amigos ou até familiares.

— O problema veio depois. – Continuou ele se entristecendo – Ninguém sabia, mas a magia usada para criar a bebida era feita a partir da magia negra, eu não sei como isso aconteceu, já que não existia esse tipo de magia na época. A bebida começou a transformar as pessoas de diferentes áreas do mundo em criaturas, as quais você conhece hoje. Depois da nossa transformação nos hibernamos em locais escondidos por séculos, à magia negra manteve todos vivos e escondidos nesse tempo. Quando acordamos, nós estávamos enlouquecidos, sem controle de nossas ações, querendo apenas matar e devorar os novos humanos daquela era. Enfim, é isso.

— Desculpe te fazer lembrar tudo isso. – Eu disse me sentindo culpada – Agora pode aproveitar o sonho.

— Está tudo bem, eu agradeço por me fazer sonhar desse jeito.

O garoto foi em direção a algum tipo de parque estranho, com orbes flutuantes e bancos que ficavam flutuando e girando. Parecia divertido. Ele ficou brincando lá enquanto a outra eu apareceu e conversou comigo.

— Entende agora de onde vem o seu poder? – Perguntou a outra eu com um sorriso bizarro. – A nossa raça evoluiu a ponto de controlar o poder da magia negra dentro deles para se alimentar e depois usaram o mesmo poder para evoluírem entre si até uma raça quase inteligente.

— Eu tenho uma pergunta. – Eu disse, interrompendo o raciocínio dela. – Como eu posso confiar em você?

— Eu te mostrei a verdade por trás dos monstros.

— É verdade, mas talvez quisesse me mostrar isso só para me convencer a fazer burrices.

— A sua maior burrice foi ter vindo até aqui.

— Como assim?

— Enquanto conversamos com os caçadores procuram uma forma de me tirar de você, digo, tirar todo o seu poder.

— Esse era o plano desde o início.

— Mas eles querem fazer isso te matando com magia branca.

— Eu não acredito em você.

— Não precisa acreditar, só escute com muita atenção, suas orelhas ainda funcionam, mesmo dormindo por meio dessa injeção.

Eu fiquei parada, parei de falar, parei de pensar, parei de respirar e escutei vozes conhecidas, eram Baldric e Gerald. Soava que eles estavam discutindo entre si.

— Estou falando devemos matá-la antes que se torne um problema! – Gritou Gerald.

— Não antes de fazermos mais testes. Ainda não tentamos tudo. – Argumentou Baldric.

— Nós já tentamos tudo. Essa garota monstro é imune à magia branca! – Gritou Gerald ainda mais irritado.

— Ela pode ser a nossa única chance de criar aquela poção de imortalidade.

— E se não for. – Retrucou Gerald – E se ela for a possível causa entre uma guerra entre nós e os monstros.

— Não seja bobo. Isso já é uma paranoia sua.

— Por que não? Ela é como uma bruxa que não paga pelos feitiços, com ingredientes bizarros ou sacrifícios estúpidos. Ela pode controlar tanto a magia negra dentro dela quanto a que está dentro dos monstros. Isso é a verdade e você sabe disso melhor do que eu.

— Admito isso é preocupante, mas contanto que ela acredite em nos, podemos fazer qualquer tipo de experiência até acharmos uma solução. Estamos entendidos?

— Sim, sim. Estou cansado de discutir isso também, vamos beber alguma coisa.

Quando meus sentidos voltaram para dentro do sonho, eu estava completamente assustada com o que eu tinha escutado que eu era imune à magia branca, que eles só queriam usar o meu poder para poder criar a poção da imortalidade sem o efeito colateral da transformação, o que significava que eles sabiam a verdade sobre as bestas e se preocupavam mais em viverem para sempre do que ajudar eles. Eu fiquei furiosa com isso até hoje. Logico não é todos os caçadores que sabem disso, mas os melhores ou mais confiáveis daquela ordem sabem e matam mesmo assim.

— Entende agora? – Disse a outra eu que surgiu de repente – Eles ainda não sabem que a poção da imortalidade que pretendem fazer é o da cura, mas sabem que foi essa poção que criou as bestas e não fazem nada para ajudar elas. Eles fazem o contrário. Eles caçam ainda mais para continuarem a receber a confiança e poder sobre os governos dos outros países.

— Entendo. – Respondi me recuperando do susto – Mas como eu vou fazer isso?

— Simples. – Respondeu ela – Alie-se com as bestas e derrote os caçadores, assim eles não irão sofrer

Eu pensei um pouco e olhei de volta para o garoto no seu sonho, ele estava feliz, estava se divertindo graças a mim, ele esqueceu completamente dos problemas como monstro. Foi nesse momento que um pensamento me veio à cabeça. Por quê? Por que obriga-los a lutar contra os caçadores e fazendo com que sofressem ainda mais? Se eu posso fazer isso com o sonho daquele garoto, por que não com todos os monstros? Eles já viveram demais nas suas tristes realidades e realmente precisavam de pelo menos sonhar felizes por um bom tempo. Eu repeti o que eu pensei para a outra eu e ela respondeu com uma risada bem maluca.

— Você é mesmo especial, garota. Gostei desse pensamento, se conseguir pensar assim por mais tempo talvez eu te deixe controlar toda a sua magia negra, mesmo possuindo um pensamento meio humano demais para o meu gosto.

— Serio?! Obrigada, eu acho

— Mas não agora.

— Ok, mas pode me responder outras perguntas?

— Claro que sim bobinha, você não vai acordar tão cedo mesmo, porém não vou ter todas as respostas.

— Entendi. – Concordei e pensei um pouco na pergunta. – É mesmo possível que eu faça com todas as bestas o que eu fiz com essa ao mesmo tempo?

— Sim, é bem fácil inclusive. Você cria uma única esfera de magia negra, com o objetivo de transformar os pesadelos das bestas em sonhos, conecta essa esfera as bestas e *Boom* sonho coletivo. De bônus você ainda pode ficar acordada enquanto a esfera faz o trabalho.

— Serio?! – Disse eu surpresa com tanta facilidade era.

— Sim, mas tem que se lembrar de recarregar a esfera com mais magia negra.

— Como eu consigo isso mesmo?

— Pesadelos. – Disse ela com um sorriso de louca.

— Alimente o seu poder com pesadelos humanos e mais forte ele vai ficar. Com isso é só doar parte do poder para a esfera e ela vai durar mais do que imagina.

— Incrível. – Eu parei para pensar um pouco e lembrei de algo. – Isso vai ter alguma consequência não vai?

— Sim, logico que vai. – Disse ela sem nem hesitar – A consequência vai ser, nunca mais poder aparecer ou conviver socialmente com alguém. Ou porque eles irão te evitar ou porque eles podem ficar em perigo acompanhando você enquanto salva as bestas.

— Quer dizer, nada de vida social? – Perguntei um pouco preocupada.

— Exatamente, além do mais você vai estar sendo caçada por muita gente. Talvez, depois de uns anos, se eles não virem muito o seu rosto, você pode se preocupar menos em aparecer, mesmo assim não poderá ter uma vida que vocês, humanos, consideram normal.

— E quanto a minha mãe? – Perguntei chateada e já sabendo da resposta.

— Eu não recomendaria leva-la com você, mas também não deixaria na cidade.

— Como assim?

— Os caçadores com certeza a usariam como isca para te atrair.

— Eles fariam isso com ela?! – Perguntei um pouco assustada.

— Um dia, se eles ficarem desesperados para te encontrar, com certeza.

Eu fiquei triste por um momento, abandonar tudo que eu conhecia e amava pelo bem deles, será que era certo? Será que eu havia maturidade para fazer tal decisão? Eu tinha apenas 8 anos e era estupidamente ingênua. Todavia se eu deixasse isso de lado não conseguiria viver sabendo do sofrimento deles.

— Lembrando que essa escolha não precisa ser feita agora, mas você vai fazer ela em algum momento.

— O que quer dizer? – Perguntei, confusa com o que ela falou.

— Quero dizer que você vai fazer uma escolha, querendo ou não e as duas terão consequências. A pergunta é qual das escolhas merece mais a sua atenção. Pense nisso. Aliás o sonho que você entrou veio de dentro da base, não acha?

— Eu entendi. Os caçadores usam eles em experimentos estranhos.

— Não acha que devia pelo menos liberta-los?

— Isso não é muito arriscado?

— Não se você fizer isso durante a noite, quando todos forem caçar. Esse lugar fica quase vazio.

— Mas aonde eu deixaria eles?

— Isso vai depender da mesma escolha de antes.

— Eu realmente tenho que decidir? Eu tenho apenas 8 anos.

— Infelizmente essa decisão é sua, porem pessoas podem te influenciar a fazer a que menos te agrada. De qualquer maneira não existe escolha errada, nem boa ou ruim. Existe apenas a sua escolha.

— Entendi. Acho que preciso de mais tempo para pensar.

— Ótimo. Porque já está na hora de acordar.

— Eu vou me despedir do garoto.

— Lembre-se, é sua vida ou a deles. Qual merece mais sua atenção?

— Hei, pode vir aqui? – Eu perguntei para o garoto brincando.

— Claro, salvadora.

— Não me chame assim. – Pedi a ele com um pouco de vergonha. – Meu nome é Juliet.

— O meu é Teor.

— Ótimo nome. Olha, já está na hora para eu acordar. Acho que você também.

— Eu não consigo, a fumaça branca me deixa fraco e sonolento e eu durmo de novo.

— Fumaça branca?

— Sim, os caçadores usam muito aquilo quando nos capturam. Não tem como a gente revidar.

— É uma pena.

— Não se preocupe, mas espero que você volte e transforme tudo em um sonho lindo como esse de novo. Por favor.

— Se eu conseguir, com certeza você vai ser o primeiro a ter o pesadelo transformado em sonho.

— Oba! – Gritou ele, animado – Foi um prazer conhecer você.

— Também. Até mais.

— Tchau salva- digo, Juliet.

Quando eu me virei eu vi a outra eu, que disse uma última coisa.

— Não perca o controle, senão quiser ser a controlada.

Eu não havia entendido, mas isso ia me afetar de alguma forma. Quando eu fechei os meus olhos eu acordei no mesmo quarto onde estava antes de dormir.

— Ah, olha quem acordou. – Disse Baldric entrando no quarto pouco depois de eu acordar.

— Oi Baldric. – Respondi ainda um pouco cansada. – Que horas são?

— Quase 6 da tarde. Por quê?

— Nada. Só estava querendo saber que horas são.

— Você entrou no sonho de alguém?

— Não, por que deveria?

— Os caçadores dormem durante a tarde, pensei que havia entrado em um sonho no meio da pesquisa.

— Não entrei no sonho de ninguém. Pela primeira vez eu tive um sonho só meu.

— E como foi?

— Eu não lembro dos detalhes. Por isso eu digo que foi um sonho meu.

— Entendo.

— Eu vou trazer algo para você comer, você dormiu por muito tempo deve estar com fome. Você vai querer o que?

— Pode escolher. Eu não sou seletiva com comida, qualquer coisa basta.

— Claro, já volto.

Depois que eu comi, comecei a pensar na minha escolha, como fazer ela e quando eu vou ter que faze-la. Ao mesmo tempo pensei, será que eu devia confiar na outra eu do sonho, talvez tudo fosse uma ilusão dela, eu precisava de uma confirmação. Eu pensei em seguir a ideia dela e sair durante a noite a procura da cela onde teriam as bestas, porém não tinha ideia de onde procurar. Baldric interrompeu meu pensamento entrando no meu quarto.

— Onde está Gerald? Foi caçar?

— Não. – Respondeu ele, firmemente. – Ele foi conversar com o chefe dos caçadores dessa base, reportar os resultados da pesquisa que fizemos com você.

— Isso soou como se eu fosse só um objeto de testes.

— Não. Eu não quis dizer dessa maneira. Sinto muito por isso.

— Tudo bem, sei que não fez por mal.

Será que não era? Eu sempre achava um pouco estranho o sorriso confiável e exagerado de Baldric, como se ele quisesse que eu confiasse nele sem nenhum problema, embora eu desconfiasse dele por causa disso, acho que todos os padres têm essa habilidade de serem confiáveis com facilidade.

— Acho que está na hora de eu dormir.

— Claro, volto aqui amanhã. Se quiser alguma coisa é só me chamar com aquele sininho perto da sua cama.

— Obrigada.

Eu havia trocado de roupa, depois que ele saiu. Eu usei um pijama branco com corações vermelhos junto a um simples chinelo vermelho escuro.

Eu esperei um pouco antes de dormir. Olhei para janela esperando todos saírem para caçar até que o lugar ficasse vazio, eu observei várias pessoas com roupas diferentes, porém com a cor preta, saírem armadas e preparadas para a caça. Bem antes saíram os empregados normais, tipo secretarias como a Annabeth, vulgo secretaria peituda, embora eu não tenha visto ela sair. Quando todos saíram eu dei uma última olhada no quarto e na escrivaninha havia uma vela acessa sustentada por um suporte de prata, decidi pega-la e sair do meu quarto.

Quando aproximo a minha mão da maçaneta, ela se destranca imediatamente, eu me assusto achando que era alguém entrando, mas depois que se destrancou não aconteceu nada. Eu abri a porta e os corredores estavam vazios, iluminados por velas dentro de vidros e sustentadas na parede por suportes de ferro normais.

Andei lentamente pelo corredor, indo em direção a secretaria. Pensei que se existisse um mapa daqui em algum lugar, tem que ser no lugar que cuida da papelada dos caçadores.

Eu segui exatamente o mesmo caminho de quando eu cheguei lá, bem cautelosamente para não fazer barulho, tudo que dava para eu ouvir era minha respiração e meus pensamentos sobre o que eu estava fazendo. Respirei fundo para me acalmar e continuar sem medo até a ala de administração. Ao chegar lá eu não tinha ideia de onde começar a procurar, pensei em olhar pelas janelinhas que cada porta tinha, para ver se encontrava a sala certa. A sala não parecia mais assustadora mesmo escura, as velas iluminavam bem o corredor e as paredes não davam um clima estranho como era no segundo andar. No caminho de olhar cada porta comecei a escutar o barulho estranho, como se fossem gemidos, eu assustei de começo, porém quando o som ficou mais alto enquanto andava comecei a estranha-lo e vi que o barulho era do escritório da Annabeth. Sabia disso porque havia uma plaquinha escrita isso.

Quando me aproximei do escritório me perguntei se era certo, mas estava curiosa demais para me importar, e me deparei com essa cena: Ela estava lendo em voz alta um tipo de conto erótico, na hora eu não tinha ideia do que ela estava falando, porém, quando achei esse conto alguns anos depois, achei interessante e comecei a ler mais. Por algum motivo, ela estava fazendo caretas estranhas enquanto lia aquele livro, usando apenas uma mão para lê-lo, a outra mão estava de baixo da mesa e eu só podia ver o que elas estava fazendo do peito pra cima.

Depois de ver aquele momento da secretaria peituda, continuei andando no corredor e eu encontrei uma sala chamada “Arquivos”, lá estava cheio disso, com aquelas gavetas de ferro e uma mesa no centro e com certeza teria um tipo de mapa do local. Aproximei a minha mão da maçaneta e a porta se destrancou na hora. Abri lentamente para não fazer barulho e entrei.

A sala tinha várias gavetas de arquivos dando a volta pelas paredes, eram bem grandes e parecia ser dividido por ordem alfabética do nome do assunto. Obviamente procurei no “M” de mapa. Fiquei com uma mão com a vela e a outra olhando os arquivos, a luz me ajudou a ver qual era a gaveta certa. Entretanto, depois de procurar, eu não encontrei apenas uma cópia do mapa como também encontrei informações dos monstros. Infelizmente o que a outra eu do sonho me mostrou era verdade, os experimentos, a origem das bestas e o objetivo dos caçadores em tudo aquilo. No meio de tudo havia uma lista daqueles que cooperaram com os experimentos e dois nomes lá me chamaram a atenção. Gerald e Baldric. Aqueles dois sabiam de tudo e realmente só queriam me usar para conseguir a vida eterna.

Eles acreditavam que se eu posso controlar a magia negra sem consequências, eles poderiam pegar essa habilidade e criar a bebida da imortalidade sem nenhum problema. Eu nunca me senti tão furiosa em toda a minha vida. Procurei no mapa o local onde mantinham as bestas e fui rápida, porem cautelosa, até lá.

A porta ficava do outro lado da fortaleza, em um corredor escuro e abandonado, de paredes cinzentas e no final com uma única porta de aço com diversas trancas diferentes nela. Como estava nervosa demais, abri todas as fechaduras com um estalar de dedos e com um toque a porta se abriu. Eu entrei nela e só pude ver uma descida grande e escura para o desconhecido.

Sem medo eu desci, estalei os dedos de novo, a porta se fechou e trancou de volta. Descendo as escadas eu comecei a ver uma fumaça branca cobrindo o cominho, por sorte eu já estava chegando ao final da escadaria.

A fumaça atrapalhou um pouco a minha visão de início, porém ao chegar na sala ela ficou um pouco menos densa e me permitiu ver o que eu já esperava lá dentro. Gaiolas e mais gaiolas. Todas cheias de monstros, alguns deles estavam mortos outros só sonolentos. Essas gaiolas tinham vários números que a identificavam. Eu andei para ver mais o que tinha. Aparentemente a fumaça branca vinha de um incenso encantado por clérigos que deixam as criaturas daquele jeito, mas elas demoram a funcionar, ao mesmo tempo em que demoram a acabar.

Quanto mais eu andava mais bestas mortas encontrava. Eles nem se deram ao trabalho de joga-las fora, acham que podem usar o corpo para outros tipos de testes bem mais nojentos. Isso me deixava com nojo, eu não sei se eram os corpos ou o cheiro do incenso, mas eu estava passando mal.

— Isso é horrível! – Exclamei em voz alta a mim mesma. – Era isso que eles planejavam para mim? Deixarem-me em uma dessas gaiolas e me fazer testes nojentos até morrer? Esses caçadores enganaram a mim e a minha mãe, além de maltratar esses coitados com testes sofredores, mesmo sabendo que eles são humanos por dentro. Isso é horrível, muito horrível.

Lagrimas começaram a correr pelo meu rosto, minha decisão era definitiva eu ia ajudar as bestas custe o que custar.

— Não se preocupe querida. – Disse uma voz estranha na minha frente, por um momento achei que fosse a outra eu, porém a voz dela era parecida com a minha, essa era mais grave e assustadora.

— Eles logo irão conseguir sua vingança. – Continuou ele.

Eu enxuguei as lagrimas nos meus braços e olhei para frente. Assustada eu vi uma figura alta, com pelos se movimentando por todo o corpo, olhos brilhantes e vermelhos como os de qualquer besta, garras afiadas, pernas bem largas e braços também, seus dentes, afiados como uma lamina, se erguiam até a bochecha, formando um sorriso de louco e finalmente ele tinha uma nevoa negra em volta, que o protegia contra os efeitos do incenso.

— Que-Que-Quem é você? – Perguntei um pouco com medo e surpresa.

— Não me diga que esqueceu quem é seu pai? – Perguntou ele, sem mover a boca, era como se as palavras saíssem dele por mágica.

Automaticamente eu congelei, eu sabia que meu pai era um tipo de besta só não lembrava como a besta se parecia. Aquela coisa grande medonha era o meu pai, ele fez o que fez com a minha mãe e me criou.

— Você é ele?! – Disse completamente surpresa – Mas como e por que você está aqui?

— Meu poder me permite ir para onde eu quiser. Infelizmente eu só posso fazer isso à noite, você é outro caso. Você pode ir até onde você quiser a qualquer hora, enquanto tiver magia negra suficiente dentro de você. Enquanto ao porquê, eu quero te guiar ao seu verdadeiro futuro, como rainha de todas as bestas, que é o que você está destinada a ser.

— Jura? – Disse encantada com as palavras dele. – Mas eu não sei se estou pronta, eu não acho que consigo machucar alguém, mesmo se elas estiverem machucando as bestas.

— Tem certeza? – Perguntou ele de uma forma mais cruel. – Nem mesmo os caçadores? Eles iam te manter pressa aqui para sempre, junto aos outros monstros e mesmo se não fizessem isso, eles iam continuar os testes nessas criaturas querendo ou não. Até cumprirem o seu objetivo de recriar a poção que transformou todos nós em bestas.

— Tem razão. Mesmo assim eu não sei se...

Um barulho me interrompeu e parecia com os das trancas da porta de cima se abrindo. Quando escutei passos de pessoas descendo, também escutei as vozes de Gerald e Baldric. Eu me escondi em meio a algumas caixas perto de mim enquanto a conversa deles ecoava pela escada.

— Mas por que precisam fazer experimentos hoje? – Perguntou a Gerald enquanto descia a escada. – Não precisamos dessas criaturas idiotas, já temos a garota, não é?

— É mas de acordo com os testes, o da gaiola vinte e dois parece estar dando resultados positivos na criação de uma poção de coragem permanente.

— Você quis dizer em uma poção de frieza permanente ou de loucura permanente.

— Sim, mas eles conseguiram reduzir os efeitos da frieza e loucura bestial usando um pedaço dessa mesma criatura durante uma cirurgia ontem. Agora precisam de uma outra parte dele.

— Espera, gaiola vinte dois? – Perguntou Gerald como se estivesse lembrando algo. – Está falando daquela bola de pelos ambulante? Aquela que eu capturei mês passado?

— Sim, essa mesmo.

— Hmpf, quem diria que uma besta tão fraca seria tão útil. – Após ele falar isso os dois chegam à sala das gaiolas e procuram pela gaiola vinte dois.

Em meio às caixas eu conseguia ver a gaiola vinte dois. Dentro dela estava a mesma criaturinha que eu visitei nos sonhos, o Teor. Era tão pequeno que me passou despercebido quando cheguei à área. Meu pai também se escondeu, em um canto perto de uma das celas.

— É esse. – Disse Baldric em frente à gaiola da criaturinha.

Gerald se aproximava para pega-lo. Eu não podia deixa-lo fazer isso, eu lembrava o pesadelo de Teor, era horrível e o pesadelo ia virar realidade de novo. Essa foi a minha decisão final, eu ia salva-lo.

— Ei vocês dois! – Gritei antes de pegarem na gaiola. – Que tipo de loucura vocês estão fazendo?

Os dois tomam um susto, eu os encarei com ódio nos meus olhos azuis disposta a confronta-los.

— Garota! – Gritou Gerald no susto

— Juliet! – Gritou Baldric igualmente. – O que faz aqui?

— Nada demais, só descobrindo a verdade por trás dos caçadores.

— Não importa o que diga ninguém vai acreditar ou se importar com o que você fale.

— Quem disse que eu quero que saibam a verdade. – Respondi com fúria. – Eu vou libertar esses coitados e deixá-los em paz, longe de vocês ou de qualquer um que pode machuca-los.

— Coitados! – Exclamou Gerald – Como pode dizer que desses monstros devoradores de gente?

— Eles não fazem isso por querer e vocês sabem disso. Sabem até que eles já foram humanos assim como vocês.

— Como sabe de uma coisa dessas? – Perguntou Baldric assustado.

— Com isso aqui. – Respondi com os arquivos dos monstros nas mãos e joguei bem na frente deles. – Eu sei até sobre quem realmente sou, seus mentirosos.

— Onde conseguiu isso, sua peste?

— Preciso responder?

— Ora sua! – Gerald fica irritado, tira um revolver de dentro do seu sobretudo e mira em mim.

— Gerald, não! – Gritou Baldric – Nunca estivemos tão perto de recriar a poção.

— Desculpe, mas ela sabe demais.

— Juliet, por favor, se renda. – Pediu Baldric. – Nós só fizemos isso para proteger você e todos da cidade.

Eu abaixei minha cabeça, dei uma risadinha e em seguida fiz um sorriso maléfico.

— Me proteger? Não me faça rir. Vocês mentiram porque temiam o que eu posso ser e pretendiam arranjar formas de me deixar mais fraca e de me usarem da forma que quiserem. Eu sei a verdade e jamais deixarei vocês conseguirem fazer isso.

— Escuta aqui, seu monstro. Se der mais um passo eu atiro em um dos seus amiguinhos bem aqui do meu lado.

Gerald virou a mira para Teor. Ameaçando atirar nele.

— Não ouse fazer isso, caçador idiota. – Eu me senti mudando, eu estava furiosa, o sangue em minhas veias se movia mais rápido, minhas mãos sentiram a necessidade de cortar Gerald em dois e senti um extremo prazer vindo desses pensamentos de morte e sangue.

Baldric, assustado, se afastou de Gerald e lentamente seguia para a saída.

— Chega de brincadeiras. – Gerald fez um sorriso ameaçador com o dedo prestes a puxar o gatilho. Eu me aproximei e ele atirou.

— Há, eu disse que ia mata-lo se... – Gerald se virou e surpreso sua bala nem tocou no Teor. – O que? Mas como?

— Procurando por isso? – Disse isso mostrando a bala nos meus dedos, entre o indicador e polegar.

— Ora sua. – Reclamou ele, atirando outra bala bem no meu olho esquerdo. – Morra!

Quando eu levei o tiro aquilo foi à gota d'água. Eu abaixei novamente a minha cabeça e comecei a rir loucamente. Quando levanto a cabeça de volta o meu olho direito estava completamente vermelho, mostrando que estava na hora de liberar o meu lado monstro.

Em um piscar de olhos eu apaguei todos os incensos e velas do local, trocando a fumaça branca pela nevoa negra parecida com a do meu pai. Estava impossível para eles me virem, porem comigo era o contrário, eu via tudo muito bem.

Quando percebi, eu havia me transformado. Meu cabelo negro cresceu e começou a flutuar, como se não existisse gravidade em volta de mim, minha pele se escureceu completamente, garras se formaram em minhas mãos, meu olho, que recebeu o tiro, foi curado automaticamente e também estava vermelho. Ok, essa parte do olho que levou o tiro estar vermelho eu não sei se era verdade, mas depois você vai entender a minha dúvida quanto a isso. Meus dentes ficaram mais afiados e se ergueram até a bochecha. Para finalizar, meu pijama de corações até então estava só um pouco sujo com cera de vela e parte do meu sangue que caiu depois de levar o tiro.

— Hora de conhecerem o seu pior pesadelo, caçadores. – Falei isso seguido de uma risadinha insana.

Gerald não estava com medo, prestava atenção nos sons em sua volta, ele escutou um som a sua direita e atirou sem pensar duas vezes. Quando percebeu havia atirado na parede e eu estava atrás dele.

— Você errou. – Disse com o sorriso de louca e meus olhos brilhando de uma forma aterrorizante. – Você é o pior caçador de todos.

Ele ficou congelado. Virou seu olhar lentamente para mim e disse.

— Você é a pior besta que eu já lutei.

— Guarde os seus elogios para o inferno, bom caçador. – Isso foi a última coisa que ele escutou antes de eu perfurar sua garganta com minhas garras e puxei-as para cima arrancando o resto da cabeça dele fora, que voou longe.

O sangue do corpo sem cabeça se soltou em todo o meu pijama deixando ele completamente vermelho. Foi lindo demais... Ah, foi mal a exaltação. Tenho que contar essa história mais vezes. Eu estou me sentindo muito bem.

Baldric estava com medo e se movia lentamente procurando Gerald na escuridão, até escutar um barulho de tiro e ir em direção a ele. No caminho algo voa em sua direção e se mostra ser a cabeça de Gerald. Ele grita e começa a correr, onde ele achava ser a saída. Até que uma corrente forte e repentina de vento o empurra e ele cai no chão.

— Juliet, por favor, eu sou seu amigo, não precisa me matar. – Ele implorava isso chorando e ajoelhado. Eu surgi em meio a nevoa, andando bem na frente dele. – Por favor, eu sou o seu amigo.

Ele começou a fingir um sorriso e eu já estava farta de ser enganada por aquele sorriso maldito.

— Eu vou arrancar esse seu sorriso da boca para fora, literalmente. – Comentei antes de pular na cara de Baldric e arrancar sua boca com várias mordidas. Antes de ele morrer definitivamente eu furei os seus olhos com as minhas garras, o que o fez sofrer mais.

Eu nunca me senti tão bem, o sangue, a morte e a dor que eu causei foram incríveis. Eu me levantei de cima do corpo de Baldric e me perguntei.

— Po-po-por quê? – Me perguntei, com as mãos tremulas de sangue e o meu sorriso monstruoso. – Eu não sinto que fiz algo errado. Eu sinto que precisava fazer isso para sobreviver. Por que me sinto assim? Por que eu não estou com medo ou nervosa? Será que é assim que as bestas se sentem quando matam alguém?

— Isso se chama de instinto de sobrevivência. – Respondeu meu pai ressurgindo das sombras. – Uma besta tem isso para jamais ter pena daqueles que o caçam ou que eles caçam, cada besta usa o instinto de sobrevivência de uma forma diferente. Você o usa com uma forma cômica, sempre sorrindo e achando graça no que mata. É inevitável, embora não precise se sentir assim o tempo todo.

— Entendo. – Concordei ainda na minha forma besta. – E agora?

— Agora iremos vingar as bestas de seu terrível destino, matando todos os humanos, com você seremos invencíveis.

Eu estava pensando em aceitar, porém eu olhei em volta primeiro. Eu vi os monstros, eles estavam cansados e fracos, claro que eles acumularam uma grande quantidade de ódio dentro de si. Pensando por outro lado esse era o lado besta deles querendo se vingar. O lado humano deles já estava cansado de matar e sofrer. O sonho de Teor não havia nada sobre vingança, só quando ele ainda era uma criatura.

Foi aí que lembrei que esse era o meu objetivo desde que tive aquele sonho na mente de Teor com a outra eu, porém, algo me tirou do caminhou, algo que tentou me controlar enquanto estava fora de controle. Imediatamente eu me lembrei do que a outra eu disse “Não perca o controle, senão quiser ser a controlada.” Era isso que ela quis dizer, ela sabia que meu pai ia aparecer para me convencer a lutar contra os humanos e dominar o mundo controlando as bestas. Depois ele, provavelmente, ia me matar e ficar no meu lugar.

A outra eu gostou da ideia de um sonho para as bestas, por isso disse que se eu mantivesse o meu sonho ainda ia me deixar controlar a magia negra. O objetivo principal era me convencer a ficar do lado do meu pai. Até hoje eu não entendo por que ela concordou em me dar a magia mesmo com um pensamento tão diferente.

Enfim, eu ia comentar isso com meu pai, mas quando eu me virei para o lado dele ele me estranhou, como se algo em mim tivesse assustado ele por um segundo.

— Qual o problema? – Perguntei na minha forma besta despreocupadamente.

— Seu olho esquerdo. – Respondeu. – Ele está normal, ele está humano. O que isso quer dizer?

Eu fiquei surpresa em ouvir aquilo, fiquei tocando em volta do olho

— Talvez seja porque eu não queira uma guerra contra os humanos e monstros. Prefiro ficar só cuidando dos monstros, eles merecem um bom sonho depois de todo o sofrimento ele passaram.

— Você diz para deixá-los viver em uma ilusão o resto de suas vidas?

— Por que não? Eles já viveram tempo demais na realidade.

— Entendo. – Disse ele, decepcionado. – Infelizmente você não serve mais para mim.

Ele desapareceu na minha frente, entretanto ele ainda estava lá, eu senti a presença dele vir em minha direção.

— Imaginei que diria isso. – Comentei isso sorrindo para valer.

Quando ele tentou me atacar desprevenida eu reagi com uma onda de poder que o empurrou longe. Enquanto ele estava no chão eu absorvi o máximo que pude da magia negra que ele possuía dentro de si. Ele revidou com outra onda de poder, mas em vez de lutar, ele fugiu em um piscar de olhos. Eu só escutei um sussurro em meus ouvidos antes dele ir.

— Você não merece controlar esse poder.

Depois que ele se foi, decidi desfazer a nevoa negra e fazer a conexão entre as mentes de todas as bestas das gaiolas. Usando a dica da outra eu ficou mais fácil de fazer. Eu entrei no sonho junto, porém não sabia ao certo quanto tempo eu tinha antes de alguém chegar, então tinha que ser rápida.

No começo, todos estranharam a volta de serem humanos, ao mesmo tempo que ficaram felizes. Eu criei um cenário agradável, que parecia um parque com um palco com cortinas vermelhas no centro. Eu estava dentro dele

— Atenção aqui, por favor! – Gritei chamando a atenção de todos. – Primeiro quero deixar claro que tudo isso é um sonho.

Quando eu disse isso eles ficaram estranhados e logo depois decepcionados

— Esperem. – Avisei a eles antes da total decepção – E se eu disser a vocês que podem sonhar assim por um bom tempo.

Eles pararam e conversaram entre si questionando o que estava acontecendo.

— Quem é você? – Um deles perguntou.

— Sou uma de vocês. – Respondi – Uma que pode ajuda-los a viverem em um sonho perfeito.

— Por quanto tempo? – Outro perguntou.

— Se concordarem, talvez séculos, quem sabe para sempre.

Todos ficaram surpresos e alguns emocionados quando eu disse isso, uma vida sem medo de morrer ou de matar. Era algo absurdo.

— Não perguntem como ainda. É meio complicado de explicar. No momento os seus corpos ainda estão na base dos caçadores, onde foram capturados.

Todos se lembraram dos caçadores e a sombra do medo começou a chegar perto deles, as memorias terríveis sobre o que fizeram com eles voltaram com força total.

— Pessoal se concentrem! – Gritei. – Eu posso fazer com que nunca mais precisem de se preocupar com eles de novo. Só preciso de um lugar, um do qual ninguém, nenhum humano ou caçador tenha encontrado ainda.

Eles se acalmaram e discutiram entre si. Eu dei um sorriso esperando que alguém me respondesse.

— Oh, Oh, eu conheço, eu conheço. – Disse alguém com voz de um garotinho.

Eu o chamei até o palco e ele veio correndo, muito animado.

— Teor! – Exclamei, animada por ver ele de novo.

— Oi salvadora, sabia que ia voltar.

— Eu prometi, não foi? – Comentei dando uma risada. – Agora me conte onde fica esse lugar.

— Claro. –Disse ele antes de cochichar o lugar.

— Obrigada. – Agradeci, ele em seguida fica no meio do palco e grita.

— Amigos, eu sei que estão em dúvida, mas podem confiar nela! Eu confiei e não me arrependo. Vamos dar uma chance a ela, o que vocês têm a perder?

— É verdade. – Disse em voz alta. – Vocês não acham que viveram demais na realidade escura e cruel de vocês? Qual o problema de viverem em uma ilusão por um tempo próximo ou até maior do que estiveram na realidade?

Eles concordaram e se animaram, perguntando o meu nome, em seguida.

— O nome dela é Juliet! – Gritou Teor- A Salvadora dos Monstros!

Eles começaram a gritar o meu nome, me saudando.

— Agora fechem os olhos e quando abrirem estarão no sonho mais longo e perfeito da vida de você. Muito obrigada por confiarem em mim.

E foi o que eu fiz. Em segundos depois de acordar eu prendi o sonho deles, para que não sonhassem com nada mais até que estivesse tudo pronto, e levei os corpos deles para o local que Teor me contou. Usando a minha habilidade de teletransporte, que foi melhorada com a magia absorvida na luta com meu pai e com essa magia reserva eu consegui recuperar aquelas ruínas de um pequeno reino até sua antiga gloria, pelo menos o castelo principal onde vivemos. Que bom que você já sabe onde é, além do mais nós estamos nele. Depois eu deixei os corpos das bestas em descanso em um local grande e agradável o suficiente para caber milhares de outras criaturas.

E todos vivem felizes até hoje. Fim. Alguma pergunta?

O que aconteceu com a minha mãe? É bem... Opa já está anoitecendo. Foi divertido, mas eu tenho que ir. Devia contar minhas histórias mais vezes. Quem sabe na próxima você me conte a sua história, hmmm? Enfim, hora de caçar pesadelos! Bye bye.


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Notas finais do capítulo

E aqui estamos nós no final da segunda parte dessa historia maravilhosa. Obrigado por lerem tudo isso. Vou para de pedir para comentar ou favoritar, só o fato de terem lido já me faz bem feliz, mas agradeço se o fizer.