Chuva de Lágrimas escrita por Skadi, Ana Gomez


Capítulo 5
Capítulo 5


Notas iniciais do capítulo

Boa noite para todas vocês!
Aqui é a Jaci e eu estava morrendo de saudades!
Obrigada pela enorme paciência que tiveram conosco.
A culpa pelo capítulo ter demorado tanto a sair é minha, Ana queria ter liberado mais cedo, mas eu não estava satisfeita com que estava escrevendo e minha vida pessoal não estava bem. Sem contar que ainda tive que ir em uma entrevista de emprego (fui contratada, graças a Deus!), então ficou um pouco difícil para finalizar o capítulo. Mas aqui está, ele está prontinho e beeeeem grandinho para que vocês !
Ana pede mil desculpas pela demora, não era em nenhum momento, nossa intenção atrasar assim. Mas infelizmente as coisas aconteceram do jeito que tiveram que acontecer.
Enfim, esperamos que gostem do capítulo.

P.S.: Senhorita Carol Stewart, muitíssimo obrigada pela recomendação. Eu quase chorei de emoção quando a li e Ana então?! Nem se fala. Ficamos as duas que nem loucas rindo. Obrigada mesmo, flor! Ficamos muito felizes que esteja gostando tanto assim da nossa história.

P.S.2.: Um ENORME, GIGANTE, ULTRA, MEGA, POWER, BLASTER, obrigada a todas vocês por tudo. Por estarem aqui com a gente. Nos sentimos honradas por tê-las como leitoras.

Acho que tá bom, né? Boa leitura, meus amores.
Até mais ver,
Jaci.



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Uma hora antes.

Colocar os pés dentro do banheiro trouxe de volta os mesmo sentimentos que haviam surgido quando entrou na casa. Deslumbramento, desconfiança, gratidão... O espaço era tão grande, o teto alto e as paredes de porcelanato branco brilhantes. A pia ficava de frente para a porta, uma cuba de vidro em forma de concha apoiada sobre uma bancada que parecia ser revestida com o mesmo material que as paredes, o armário também de vidro ficava logo abaixo e um espelho grande e redondo, logo acima.

Do lado esquerdo a privada, o box com o chuveiro e a mais bela das banheiras que ele já tinha visto. A cerâmica branca refletia como um halo resplandecente a luz que a luminária delicada emanava e os pés dourados, apesar de estarem meio escondidos, ainda chamavam a atenção. Apreensivo, curioso e receoso de quebrar alguma coisa, ele andou com cuidado até a banheira e girou a torneira dourada — seria ouro?

Suas roupas, nada mais que retalhos de tecido podre e velho, foram dobradas e colocadas cuidadosamente ao lado da pia enquanto . O chão estava frio contra a pele nua de seus pés, frio como as gostas de chuva haviam estado, e demorou alguns segundos até que fosse suportável.

Ele sorriu, embasbacado, vendo seu rosto se retorcer no espelho. Quanto tempo havia passado desde que via a si mesmo? Suas costelas estavam evidentes contra a pele pálida e suja, os braços pareciam longos e finos demais para o resto do corpo e seus ossos eram todos visíveis. Hematomas, roxos, verdes, amarelados espalhavam-se pela área do seu ombro e apareciam aqui e ali abaixo das costelas onde levou um chute para ser acordado dois ou três dias atrás.

Sentiu-se mal então, inferior, burro por estar em um lugar ao qual claramente não pertencia. Mas o lado sonhador trouxe a ignorância, doce como o acalentar de uma mãe, de volta para coração e ele deu um passo à frente. Abriu a torneira, que como uma serpente dourada se inclinava por sobre a pia, e sentiu a água morna tocar seus dedos dormentes.

Esfregou as mãos com força e viu o líquido transparente ficar marrom e descer em espiral pelo ralo. Será que como a sujeira escoava, sua má sorte iria junto? Queria tanto saber a resposta para essa pergunta, queria tanto não ter sofrido tanto quanto sofreu. Seus olhos se encheram de lágrimas, que escorregaram pela sua face e ficaram presas nos fios longos da barba.

Os segundos passaram e logo ele entrava na banheira, fazendo uma careta ao contato da água morna contra sua pele febril. Ficaria ali por mais de trinta minutos, deleitando-se na paz segura em que se encontrava.

O que estaria a senhora fazendo? O pensamento surgiu subitamente, enquanto esfregava com força a bucha nos braços. Não era de sua conta, mas ele não conseguiu deixar de imaginar. O que faziam as pessoas ricas, afinal? Ela parecia estar cansada e ainda assim estava se dando o trabalho de fazer tudo isso por ele. Um anjo, verdadeiramente, daqueles com belas asas, da cor das nuvens mais puras, com penas delicadas e sorriso caridoso.

Seus dedos começavam a ficar enrugados, sinal claro de que estava na hora de abandonar o conforto da banheira, e a água ficava mais gelada a medida que os segundos passavam. Ele tirou a tampa do ralo e saiu. Sentia-se mais limpo, com toda certeza, mas não negava que ainda permanecia sujo. O box foi seu próximo destino, esfregou a bucha com tanta força que a pele ficou vermelha e sensível, quando finalmente julgou ser o suficiente, desligou o chuveiro. Enrolou-se em uma das felpudas toalhas azuis que encontrou no armário abaixo da pia, pegou as roupas sujas e fedidas nos braços, abriu a porta e entrou novamente no quarto.

Jake não estava deitado onde o havia deixado e o medo de que o companheiro tivesse saído dali para fazer alguma bagunça fez com que ficasse preocupado. Não teria dinheiro para pagar por nada que estava dentro daquela casa e se Jake quebrasse... Interrompeu o pensamento, sua atenção sendo desviada para a sacola em cima da cama, tão fora do seu ambiente quanto ele. Colocou o embrulho mal cheiroso que carregava no cesto que lhe foi indicado mais cedo e depois foi abrir a sacola, sua curiosidade falando mais alto.

As roupas novas tinham cheiro de tecido novo e de limpeza, seu nariz coçou e o espirro que se seguiu pareceu muito alto para seus ouvidos. O quarto não estava frio, mas os arrepios causados pela febre que ainda estava lá trouxeram arrepios e ele tratou de se vestir logo. Se ficasse mais doente do que já estava, daria muito trabalho para a senhora e essa não era sua intenção, não podia fazer isso de modo algum.

Se sentindo aquecido pela primeira vez no que pareciam ter sido anos, ele distraída e repetidamente passava as mãos pelo suéter, a lã acariciando sua pele calejada. Ele deu uma risadinha, remexendo os dedos dentro do tênis novo como uma criança.

Hesitante, abriu a porta do quarto e olhou o corredor vazio. Respirou fundo e ouviu o clique da fechadura atrás de si.

... é só descer o corredor, virar a primeira direita e depois à esquerda — a voz suave soou em sua cabeça e ele seguiu as instruções dada por ela.

Enquanto caminhava, seus olhos curiosos e ainda maravilhados absorviam todos os detalhes com tamanha avidez que ele se parado algumas vezes em frente a um quadro pendurado nas paredes brancas. Demorou alguns minutos para que encontrasse a cozinha, distraído como estava, e só achou o lugar certo porque a ouviu.

— Tem certeza que não precisa de nada? — ela parecia estar falando com alguém.

— Tenho sim, Srta. Swan. A sopa deve ficar pronta em quarenta minutos — uma outra mulher, com o timbre mais agudo que o de seu anjo falou.

Ele achou estranho, mas aquela não era sua casa e não tinha direito de achar algo estranho ali. Barulho de metal contra metal, de água fervendo e o cheiro de comida chegou até seu nariz fazendo seu estômago roncar.

Tentando ser o mais silencioso possível, ele se aproximou da porta da cozinha, permanecendo perto do batente. Não queria interromper a aparente paz de pensamentos que seu anjo de cabelos escuros se encontrava, ela parecia tão concentrada. Mas sua vontade não foi cumprida, o ombro machucado latejou e o que era para ser um gemido de dor, devido a sua garganta inflamada, saiu como um pigarro. Como desejou que tivesse sido silencioso o suficiente para que ela não o escutasse. Não teve tanta sorte, não esperava que fosse ter de qualquer forma.

— Sente-se, por favor — ela disse se levantando e passando por ele, fora da cozinha, fora de seu olhar.

Sem reclamar, porém ainda confuso, ele caminhou até onde lhe foi indicado. Confuso, ele encarou a superfície polida à sua frente e depois arriscou uma olhadela para a mulher que continuava ao pé do fogão. Ela também o olhava e constrangidos, ambos viraram o rosto rapidamente.

Srta. Swan, como havia sido chamada pela ruiva, retornou segundos depois com uma caixa de metal em mãos, colocando-a em cima da bancada, o som do metal contra o mármore foi quase inaudível.

— Seu braço está machucado, não está? — sua voz estava cheia de seriedade e isso o surpreendeu. Como ela sabia? — Deixe-me ver, por favor?

— Não é necessário, a senhora não pode fazer nada, só um médico — ele disse a olhando.

— Então atenda ao meu pedido, sou uma das melhores médicas dessa cidade, agora me permite ver o que há de errado?

Sua vergonha superava qualquer outro sentimento que pudesse tentar surgir naquele momento. Não se sentia confortável tendo que tirar a roupa ali, na verdade ele tinha quase certeza que conseguia ouvir o sangue correndo por suas veias para deixar suas bochechas vermelhas. Mas ele lutou contra isso, lutou contra a reação instintiva e fez o que lhe foi mandado.

Mas ele lutou contra isso, lutou contra a reação instintiva e fez o que lhe foi mandado.

As mãos dela estavam quentes enquanto, com precisão, ela examinava e vez ou outra ele gemia com dor. Em um momento foi pedido que levantasse o braço e o mesmo parecia estar queimando de tanto que ardia quando o ergueu.

— Não parece estar quebrado, o que é bom, mas para ter certeza só fazendo um raio x — Isabella tinha falado, começando a se afastar e o indicando que podia se vestir novamente. — Vai ser difícil mexer por algum tempo, talvez umas duas semanas, três no máximo.

Seu cabelo ficou ainda mais bagunçado quando terminou de passar o suéter pela cabeça, mas ele não se importou. O ombro doeu durante todo o processo, latejando e dando fisgadas que faziam sua mão tremer.

— Obrigado, senho-doutora.

— Pode me agradecer depois que seu braço estiver curado. Afinal de contas, como se machucou em primeiro lugar?

E ele contou, tentando esquecer o desconforto no braço esquerdo e a atenção, que sem dúvida alguma, a mulher ruiva dava à sua curta narrativa. Um copo de água apareceu na sua frente e só então percebeu o quanto estava com sede, logo metade do líquido já havia sido sorvido e a outra metade, após uma breve recomendação da doutora, também.

Ficaram em silêncio, apenas os sons da comida cozinhando rompendo a calmaria ocasionalmente.

O cheiro do tempero fez sua boca salivar. Ele realmente estava com fome, muita fome, mas já havia aprendido a conviver com o sentimento angustiante. A água tinha ajudado um pouco, o suficiente para que pudesse continuar no silêncio sem ter sua condição denunciada pelos roncos que sentia no estômago.

— Venha comigo, vamos enfaixar seu braço, vai diminuir um pouco da dor se ele estiver imobilizado.

A voz calma o fez levantar o olhar da bancada com pressa. A doutora já se levantava e ia em direção à porta da cozinha. Ainda um pouco atordoado ele a seguiu, tentando novamente não esbarrar em nada no caminho, que era completamente diferente daquele que fez quando ela foi mostrar o quarto. Ou será que estava seguindo o mesmo trajeto? Teve certeza de que era outro quando não passaram pela sala com o piano.

Olhando para a mulher andando na sua frente, ele se perguntou se ela sabia como tocar, os dedos dela eram longos, mas as pessoas podiam ter dedos daquele jeito e ainda assim não saberem como lidar com as teclas de marfim.

Isabella abriu outro par de portas e ele imaginou estar dentro do hospital.

A luz branca e forte machucou seus olhos, fazendo-o piscar várias vezes tentando se adaptar. As paredes eram tão alvas quanto a luz, os armários e os outros móveis eram feitos de aço escovado com vidro. Nada estava fora do lugar e o cheiro de álcool era forte.

— Pode se sentar na maca — ela disse enquanto abria armários perfeitamente organizados e retirava o que esteve procurando.

Como antes, ele fez o que foi pedido. Sentou-se na beirada da maca, suas mãos apoiadas nas laterais e apertando o fino colchão com força. Por mais que tentasse, não conseguiu evitar sentir aquela pontada de desconfiança e medo surgirem em seu peito. Essas sensações começavam a incomodar. Era errado. Ela estava apenas o ajudando e ele pensando besteiras com sua cabeça idiota.

— Desculpe, mas poderia tirar o suéter e a camisa, por favor? — Isabella se aproximou com uma pequena bandeja retangular de metal em mãos.

Alguns minutos dolorosos — para ele — depois e ela calmamente contornava braço dele com gaze de forma que não fosse ficar muito frouxo, mas também não muito apertado. Apenas o suficiente para que ficasse imobilizado.

— A senhora é realmente uma médica? — havia falado sem nem ao menos notar. Era estúpido perguntar tal coisa, ela estava ali tratando dele e tinha lhe dito na cozinha... Besteira, devia aprender a controlar sua língua!

— Sim — Isabella respondeu sorrindo pequeno, dando outra volta no braço fino, que não deveria ser tão magro a ponto de mostrar os ossos. — Mas não se preocupe, não o trouxe até aqui para arrancar seus órgãos e vender no mercado negro.

Sabia, tinha certeza na verdade, de que não passava de uma brincadeira. Lógico que ele sabia. Mas a tensão veio do mesmo jeito e fez sua respiração ficar presa. Os olhos dela, que antes estavam voltados para o trabalho de suas mãos, encontraram os dele.

— Você teria que estar saudável para isso e não tenho os equipamentos necessários para verificar isso.

Ele decidiu, então, que ela tinha um senso de humor.

Engolindo seco, virou o rosto para frente, vendo seu reflexo no vidro bem limpo.

Um silêncio confortável caiu sobre eles, enquanto Isabella finalizava as últimas voltas e depois prendia a bandagem com firmeza para que não soltasse. Ela guardou as coisas que não usou de volta em seus devidos lugares e as que não seriam mais usadas, foram descartadas no lixo.

O caminho de volta foi feito sem nenhuma palavra também, apenas os sons de seus passos ecoavam pelo corredor vazio. A mulher ruiva que estava cozinhando não se encontrava mais por ali e, para alívio dele, Jake estava deitado ao lado da porta. A língua para fora e rabo no alto balançando feliz.

— Jake! — sua voz tinha saído carregada de emoção, os olhos imediatamente marejados e antes que notasse já estava agachado ao lado do cachorro o abraçando.

Isabella ficou observando os dois por mais alguns segundos, com os braços cruzados. Seu estômago roncou baixinho e ela pigarreou. O mendigo nem mesmo notou quando ela passou por ele e entrou na cozinha e honestamente não podia dizer que estava incomodada com essa falta de atenção sobre si.

No seu mundo, na realidade em que vivia, aonde quer que fosse alguém sempre olhava, sempre tinham consciência de sua presença e pareciam saber quem exatamente ela era. Depois de algum tempo, aquilo, o modo que agiam ao seu redor, se tornou invasivo, cansativo e foi decidido inconscientemente que não suportava mais a situação.

— Ele tomou banho — o homem disse, entrando na cozinha e trazendo o vira lata em seus calcanhares.

— Sim — Isabella respondeu, andando até a bancada de madeira, retirando a tampa de vidro de cima da panela que estava ali. O cheiro gostoso da sopa subiu e se os ouvidos deles fossem tão apurados quanto os de Jake, teriam escutado o estômago um do outro roncar. — Coma devagar.

Aconselhou, pegando a concha e servindo os pratos com um pouco do líquido espesso e fumegante. Ao ouvir o latido animado do cachorro atrás do homem, ela sorriu e foi até um dos armários pegar uma tigela funda. Serviu a tigela com uma boa porção da ração que Sam tinha trago e a colocou no chão, com cuidado, ao lado dos bancos altos.

Todos se sentaram, Jake, Isabella e o mendigo.

O tilintar das colheres contra a porcelana da louça compunha a trilha sonora do pequeno jantar, os pães que haviam sido deixados dentro de uma cestinha já estavam acabando e a sopa dentro da panela também.

— Como foi parar nas ruas? — ela perguntou, limpando os cantos da boca com um guardanapo de papel. Ele a olhava agora, a mão direita parada no ar por alguns segundos, enquanto decidia se contava ou não.

— Quando não se tem nome e documentos, nem mesmo um lugar para dormir durante a noite, é fácil ir parar nas ruas, doutora — ele manteve a cabeça baixa, remexendo a sopa em seu prato como uma criança brinca com os vegetais que não quer comer.

— Eu não perguntei se é fácil — Isabella abaixou a colher e se levantou. Colocou o prato sujo dentro da pia e foi até a geladeira pegar o suco de laranja. — Quero saber sua história, como foi que perdeu tudo e passou a viver ao relento.

O homem ficou calado, pensativo, ainda brincando com a comida. Não queria que a doutora sentisse pena dele, não se sentia alguém digno de pena. Mas devia ao menos esse mínimo de consideração a mulher. Um suspiro abandonou seus lábios e as palavras começaram a fluir.

— Acordei em pânico na emergência de um hospital — começou, soltando a colher e se levantando para levar a louca suja para a pia. — Não fazia ideia de como tinha ido parar ali, mas não demorou muito para uma enfermeira aparecer e eu perguntei a ela o que tinha acontecido.

"Alguém havia me encontrado na estrada, machucado, sangrando, e resolveu que apenas me deixar caído no chão na frente do hospital seria o melhor a fazer. Não tinha documentos ou carteira comigo, a pessoa que me deixou lá não tinha nem esperado os enfermeiros chegarem até mim antes de sair arrancando com o carro. Perguntaram qual era o meu nome, não consegui responder, não lembrava meu próprio nome, não lembrava nada da vida que levei até acordar ali."

"Foi assustador não saber quem eu fui, se tinha família, amigos ou qualquer pessoa que se importava comigo. Recebi alta três semanas depois de ter acordado, de acordo com a enfermeira responsável estive em coma induzido durante duas semanas até aquele dia, e não foi uma sensação boa deixar o hospital. Procurei um lugar nos abrigos, mas estavam lotados e em um deles fui empurrado para fora sem ao menos poder ficar com a mochila com que havia entrado. As pessoas não souberam ser gentis, não tiveram compaixão e estavam sempre tão repugnadas e com medo de que fosse apenas um vagabundo querendo roubá-las que nem mesmo se dispunham a me ouvir pedindo ajuda. Os dias passavam, plantas cresciam e morriam, minha mente e meu corpo se acostumavam com a tormenta que enfrentavam e eu continuei. Até hoje."

Isabella escutou a história dele com a mesma atenção que tinha dedicado a sua mãe quando ela lhe contava histórias antes de ir dormir. Tinha feito a coisa certa ao acolher ele é estava aliviada. Um pequeno sorriso fez caminho para seu rosto enquanto ela o via lavar o prato dele e o dela, para depois secá-los com um pano branco. Ia dizer que não havia necessidade alguma de fazer aquilo, amanhã os empregados estariam de volta e que ele não precisava se preocupar, mas se deteve no último segundo. Tinha que lhe dar espaço, não devia ter sido fácil falar sobre sua vida.

— Vou assistir um pouco de TV antes de ir para a cama, gostaria de me acompanhar? — ela convidou educadamente, colocando a panela com o que tinha sobrado da sopa dentro da geladeira para que não estragasse.

Ele não respondeu de imediato, se manteve virado para a pia. Talvez estivesse pensando se deveria ou não aceitar o convite. Seria indelicado com ela se o fizesse e isso era algo que ele não tinha intenção alguma de fazer, nunca.

Por fim assentiu lentamente e a seguiu para a sala de estar.

Assim como os outros cômodos da casa, esse tinha uma decoração simples, porém luxuosa, com os tons de branco fazendo tudo assumir um tom fantasioso. As dezenas de almofadas bordadas com fios dourados e vermelhos em padrões intricados se espalhavam pelo enorme e confortável sofá — também branco —, tornando-o convidativo.

De frente para o sofá a televisão, um quadrado grande e negro, ficava emoldurada por caixas de som tão finas e bonitas que pareciam esculturas. Ele ficou parado, na soleira da porta, olhando a dona da casa andar até o sofá e apertar um botão qualquer em um retângulo preto. O controle, ele descobriu, quando imagens apareceram na tela e vozes surgiram na sala.

Envergonhado e ainda um tanto hesitante, ele fez o mesmo caminho que ela tinha acabado de fazer e sentou no outro extremo do sofá.

— Obrigado — não tinha certeza se ela escutaria em meio ao volume do som da televisão. Esperava que sim e não ao mesmo tempo. O não se sobressaia acima de tudo.

Da forma mais discreta que podia virou seu rosto na direção dela, tentando ver se ela realmente não o havia escutado. Mas a doutora tinha uma expressão concentrada, seus lábios levemente apertados em uma linha fina, os olhos vidrados no que quer que estivesse passando na tela e o cabelo preso em um coque que não havia notado antes.

A curiosidade o tomou e ele olhou para a televisão.

— O que é? — perguntou.

Havia uma mulher asiática com roupa de nadadora fazendo caretas enquanto se movimentava na piscina recolhendo latas e embalagens que deviam estar no lixo e não na água. A cena mudou e agora três rapazes apareceram na tela, um deles ria vendo a mulher fazer aquele esforço recolhendo as coisas através de uma televisão.

— É um drama coreano. Esse se chama Boys Before Flowers, é engraçado, romântico e uma ótima forma de se passar o tempo — Isabella murmurou sem tirar os olhos da história que se desenrolava. — O meu predileto. Sempre que tenho tempo o assisto.

O silêncio entre os dois esticou seus dedos imaginários e acariciou seus lábios, deixando as vozes dos atores como único som. Isabella, apesar de estar prestando atenção em seu programa, estava consciente do homem sentado no sofá ao seu lado, curiosamente assistindo a série que ela tanto amava.

Sorriu. Estava sendo uma boa noite. Pela primeira vez desde que tudo havia acontecido, ela se sentia confortável ao lado de alguém que não fosse apenas seu reflexo no espelho.

Os minutos foram passando, em seguida as horas e enquanto os personagens na televisão interagiam uns com os outros, Isabella e o mendigo continuavam sentados no sofá. A mulher com a cabeça encostada no ombro dele, roncando suavemente e ele a olhando dormir.


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Notas finais do capítulo

E aí? O que acharam? Deixem um comentário, ficaremos super felizes em saber o que vocês pensam. Um beijinho =)
Com amor,
Jaci ♥