A Seleção da Herdeira escrita por Cupcake de Brigadeiro


Capítulo 56
Então, eu oro | A Escolha


Notas iniciais do capítulo

Gente, eu nem tenho o que dizer, e agora é mais oficial do que qualquer outra coisa que eu já tenha dito, pedindo desculpas para vocês. De verdade. Esse capítulo está pronto desde o dia que eu disse que estava, em Dezembro, mas todas as vezes que eu pegava para poder postar, eu relia, e nunca estava do jeito que eu acho que deveria estar. Me perdoem. Agora, hoje de madrugada eu decidi que editaria tudo o que eu pudesse, e então postaria. Minhas férias estão acabando, e eu não consegui cumprir nem metade das coisas que eu disse que faria, seja para com vocês como metas para mim mesma. Felizmente, caí na realidade, embora com uma notícia horrível para mim. Queria poder ter a vida dos personagens de fanfic, gente.
Bem, esse capítulo foi bem difícil de escrever, bem difícil de montar, mas enfim. Ele seria mais pesado, eu cortei muita coisa, que achei que no final não fosse ser legal. Por causa da notícia que recebi, não quero mais notícias tristes, nem nas minhas fics. Mudei mais uma vez o destino de alguns personagens.
Espero que gostem! Não é o meu capítulo favorito, mas é um dos que mais foram esperados, espero que tenha conseguido atingir as expectativas de vocês, na medida do possível. Eu particulamente gosto mais do próximo que virá depois desse, que vai ser um bônus na visão da Katniss, e depois, o último capítulo de A Escolha na perspectiva do Peeta!

Obrigada por tudo, gente. Me perdoem.



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Sou jovem e sou tolo, tomei más decisões

Bloqueio as notícias, virei as costas para a religião

Não tenho diploma, sou um pouco ingênuo

Cheguei longe assim por conta própria

Mas, ultimamente, essa merda não está me deixando bem

Levanto a cabeça e o mundo está em chamas

Há pavor em meu coração e medo em minhas entranhas

E eu simplesmente não sei o que dizer

 

Talvez eu ore, ore

Talvez eu ore

Eu nunca acreditei em você, não

Mas eu vou orar

— Pray, Sam Smith ft Logic

 

A semana foi muito intensa, com atividades em grupo, para passarmos o tempo, Katniss se ausentando por dois dias, voltando com novos curativos, mas parecia ficar mais saudável e feliz, tranquila. Dava para ver que os curativos eram no mesmo lugar, para sarar o que quer que esteja passando por sua saúde. Sinto tão falta de poder pegar em sua mão, para ficar em silêncio, tocando meus dedos nos seus. Os beijos são os que menos fazem falta. Sinto falta do nós. Nosso nós tão singular.

Falta de poder olhar em seus olhos, e me sentir sair do mundo terrestre, para ir para uma atmosfera completamente diferente. É terrível que tenha me tomado tanto tempo para saber o que eu realmente perdi, o que ela realmente significa para mim.

Mas estar com minha família, quase todo o tempo, me fez matar toda a saudade que eu sentia, e até mesmo sentir raiva por ter sentido tanta saudade, sinceramente. Amo eles, mas eu passei tanto tempo sozinho, que ter algum deles comigo a todo o tempo me deixa nervoso. Até de Amélia eu estou cansado, porque eu não me lembrava que nós somos tão parecidos assim, fazendo as coisas, na hora de falar, isso me deixou estressado, e ela também. Quando percebemos isso, dormimos abraçados assim mesmo, como sempre, como somos gêmeos, não é como se eu pudesse fazer muitas coisas sem ela por perto. Somos dependentes. Em algum momento de vidas que possamos ter vivido, já éramos irmãos.

A vantagem é que consegui me aproximar mais de Amanda e Stacey, assim como estreitar com Stuart, com todo o tempo que tivemos junto. Também pude conversar muito com meu pai.

Suspirei aliviado ao sair do banheiro, e ter apenas meus amigos, para me arrumarem para o dia de hoje. Portam uma caixa azul escura, grande.

— O que é isso? — perguntei, curioso, ajeitando a bainha da minha calça social preta. É até estranho, outra vez, ter que usar uma roupa assim novamente. Acabei me acostumando com as calças jeans, e as bermudas durante essa semana, que mais nos fez sentir em pleno outono, e não inverno.

— Uma coroa — Stefan contou, dando um sorriso, tirando o objeto cuidadosamente. — Você e Gale irão usar hoje. E os outros, uma mais simples, já que vocês possuem cargos reais.

— Vem, vamos arrumar esse seu cabelo! — Layla exclamou, empolgada.

Me sentei, e deixei que fizessem o que sempre fazem, depois que deram play {Ho Hey, The Lumineers}.

— Seu cabelo está mais ruivo do que loiro, está melhor assim em você — Julia comentou. — Vamos, você está arrumado. Só vamos posicionar essa coroa. Aí você pode se ver no espelho.

Suspirei, cansado, ao enxergar meu reflexo. Como eu deveria me sentir? Finalmente isso termina hoje. Eu deveria estar feliz, empolgado.

Mas meu rosto todo impecável, como se ser da realeza já fosse algo meu… é tão estranho.

— Sorri, Peeta! — Layla exclamou, animada, e nem percebi que Crescida estava no quarto com uma câmera.

Saí assustado no primeiro flash, forçando um sorriso bem dado no segundo.

— A primeira ficou ótima, e a segunda também, vamos, vamos, ninguém mais vai encher a sua paciência por hoje.

— Só mais tarde — Stefan disse, piscando.

— Estão sabendo de alguma coisa que eu não sei? — perguntei, me levantando.

— Não, dessa vez não, mas depois de hoje, nós estamos de folga até o casamento, daqui duas semanas! — Julia respondeu, quase gritando de empolgada.

— Isso! — Stefan respondeu, na mesma euforia. — Férias!

— Férias! E para todos nós! — Layla compartilhou da emoção.

— Ah, mas o Peeta nem pode se animar tanto. Vai ser o escolhido pela Princesa, então, vai entrar em uma semana muito corrida, e cheia de missões! Sem contar que, de um mês que vocês terão de lua-de-mel, três semanas serão de uma turnê extensa por toda Panem e nos pontos mais importantes do mundo! Ontem foi, oficialmente, o seu último dia como uma pessoa normal — Crescida disse, mal podendo de conter com tanta empolgação. Estava a um ponto até de gritar. Saiu correndo do quarto, sem me dar tempo de reagir.

Fiquei ainda mais triste. E meus amigos perceberam.

— Peeta, não tem mais nada que a gente ou que você possa fazer. Apenas respirar fundo. O seu destino já está traçado para o dia de hoje, não tem algo que nós possamos fazer para resolver isso agora.

Suspirei, fechando meus olhos, e então, os abri outra vez, encarando a mim mesmo. Você tem que fazer isso, Peeta. Não é o fim do mundo. O que tiver que ser, um dia será. Só relaxa. Não é o fim do mundo.

Suspirei mais uma vez. E sorri. Sorri tranquilo, e calmo, aliviado. Eu não gosto muito de pensar que as coisas que tiverem que ser vão ser um dia, mas me agrada o pensamento de que o que eu pude fazer, eu fiz. Pedi perdão, pedi perdão mais uma vez, e fui completamente sincero. Não há mais o que eu possa fazer. Katniss sabe que eu a amo. Delly sabe que eu a amo também. E cada uma delas são mulheres bem resolvidas, mesmo com as poucas idades, assim como eu.

Todavia, ainda sei que existem coisas que são, realmente, complicadas de se explicar e entender. Achei por melhor respirar fundo, e continuar como se nada fosse comigo, e aproveitar a coroa incrível em minha cabeça. Pelo menos aproveitar minha roupa.

— Eu poderia usar isso o dia todo, sinceramente, não fica incrível em mim? — perguntei, para o alívio dos meus amigos.

— Bem, nós vamos torcer para que você sempre as tenha que usar. Isso significa emprego para todos nós — Layla piscou. — Agora vai lá. Precisamos nos arrumar.

E saí do quarto, sendo escoltado até o Pátio Real, onde a cerimônia tomaria lugar, pelo menos uma parte. Esse é apenas o começo, para algumas fotos.

O lugar é gigantesco, mas parece estranhamente acolhedor e íntimo com toda a decoração delicada, como se fosse o jardim de uma casa grande.

Como se soubesse a importância do dia de hoje, o sol resolveu aparecer no auge do seu esplendor. Sabia que era um dia para Katniss.

Passado duas horas, cumprimentando as pessoas mais importantes, vendo minha família se divertir com a família de Nicolau, muitas fotos, todos foram convocados para o Grande Salão, que abrigou todos de uma forma incrivelmente confortável.

O Grande Salão é como um Teatro. Há dez cabines no alto, que mal percebemos, em dias normais. É tão bonito, que a gente nem repara.

— Você, Gale e a Princesa irão para aquele ali — tia Effie indicou. Era o que estava em maior destaque. O que diferencia de uma cabine de teatro, pelo o que pude ver apenas através de fotos, é que são bem maiores. Essa, em particular, pelo menos cinco vezes maior.

A posição e a altura dessa cabine nos deixou em uma forma que poderiam ver nossos rostos, enquanto sentados, em ao redor de uma mesa toda ornamentada para a ocasião. Mas não há nada demais em cima da mesa. Apenas um arranjo com margaridas, e girassóis, algo muito diferente. Logo tive uma lembrança da vez em que eu fui visitá-la pela primeira vez na casa da árvore. Levei margaridas para ela.

Suspirei, sorrindo, cumprimentando Gale, enquanto Katniss não chegava. Eu e Gale ficamos um de frente para o outro, em cadeiras que combinavam com a mesa, e mesmo sendo tão bonitas, são confortáveis. É diferente das cadeiras da mesa de jantar, que você não consegue saber como deve sentar, por serem tão desconfortáveis.

Gale está vestido padrão, como eu. A diferença é que eu uso um medalhão dourado – que Katniss me presenteou com um novo, depois que dei o meu no Dia do Perdão –, e ele uma pulseira, discreta, mas sei que é do mesmo material que a minha.

Uma outra diferença, é a cor da gravata. A minha é em um tom azul petróleo, a cor do meu distrito, e a dele é em um vermelho bem fechado, quase vinho. Ah, e claro, nossos penteados. O de Gale está todo para trás, enquanto o meu mais para o lado direito, porque está com os cachos naturais, como uma decisão final, já que meu cabelo, por causa de todo stress que foi a última semana, ficou muito ressecado com a escova.

Tanto eu quanto ele parecemos que já fazemos parte da realeza, como se fôssemos pessoas importantes.

— Você assistiu o último episódio de Stranger Things? Eu assisti, e não achei a música que tocou na conclusão — ri, concordando. Gale de todos os dias, até em um dia como esse.

— Assisti com o Ben, ele odiou, depois que contei da história. Eu achei maneiro, e encontrei a música. É Every Breath You Take, de muitos, mas muitos anos atrás. Fiquei escutando a noite inteira. Vou te mandar o download. Peguei meu Smarter, e ele o dele, para que pudesse enviar. Apenas segurei o arquivo, direcionando ao seu, e em menos de um segundo ele já tinha o conteúdo.

— Valeu! Eu não achava por nada, a TV do quarto está ruim, não consegui acessar o arquivo. Brabo demais!

E aí desenvolvemos a conversa sobre a série, até Katniss chegar, no auge da sua perfeição.

Surpreendentemente, ela manteve curativos expostos, enrolados nos pulsos.

— Você está linda — Gale disse, assim que ela chegou, e todos nós nos colocamos de pé para recebê-la. — Como sempre é.

Contive um suspiro. Ele fez tudo certo.

— Obrigada, Gale.

Apertou a mão dele, uma vez que esse é o limite que possamos nos tocar hoje. Quando chegou meu cumprimento, eu apenas me limitei a olhar em seus olhos, em um tom de azul impressionante. Eu até acreditaria que são azuis, mas os conheço para saber que são cinza-azulados.

Você é linda, Katniss. Pensei, mantendo os nossos olhares. Seus olhos estão com um delineado que os fazem parecer ainda mais bonitos, e o batom vermelho, faz um contraste espetacular com seu vestido branco, em um modelo ideal para a ocasião de hoje: o dia de seu noivado.

Um arrepio me sobreveio, ao me atenter para o detalhe. A esta altura, simplesmente não há nada que eu possa fazer para mudar qualquer que seja a decisão dela.

Suspirei, dando o meu melhor sorriso, imaginando como se só tivesse ela no mundo.

Houve uma chuva de aplausos, mais flashes, e muitos sorrisos, de todos os convidados. Me esforçando, consigo escutar comentários de alguns Jornalistas. “Quem será que a princesa irá escolher? Será uma completa surpresa para todos nós!” “Não é possível saber o que iremos esperar de um momento como esse!”

Suspiro, sorrindo, ao ver minha família lá em baixo, acenando no meio da multidão.

Nos sentamos. Mal dando tempo de respirar, todos fomos surpreendidos pelo mais inesperado possível para mim.

Uma alta rodada de tiros foi escutada, e por impulso, me inclinei para ver tudo o que estava acontecendo lá em baixo, ao invés de apropriadamente me abaixar, por causa do susto.

— Mas o que foi isso?! — Katniss exclamou, mas tudo aconteceu mais rápido que podíamos imaginar. Muitos guardas tiraram uma bandana vermelha do bolso e amarrar cobrindo o nariz e a boca, impedindo a identificação, então vários tiros, por parte desses, começou a ser ouvida.

— Malditos sulistas! — Gale praguejou, vendo a situação. — Não acredito que vieram!

Ele se transformou do garoto que estava conversando sobre uma série para um homem em defesa do seu país mais rápido do que qualquer coisa que eu pudesse pensar em fazer.

 

— EI, EI! — Gritei, em desespero absurdo, aos plenos pulmões, começando a descer as escadas, praticamente voando de três em três, mas Gale me segurou, e nós dois vimos um desses guardas simplesmente atirar na cabeça de um jovem, que mal pode reagir, apenas empurrar três crianças para dentro de uma sala.

Eu fiquei paralisado. Gale falou um palavrão por mim. Ele também paralisou, enquanto o sangue borrava o chão branco e mogno. O sangue dele simplesmente jorrava feito um rio. Um rio morto e cheio de sangue.

Uma lágrima caiu dos meus olhos, e um nó se formou na minha garganta, mediante a cena mais assombrosa de toda a minha vida. E ainda escutava, no meio dos tiros e gritaria, o som de fotos. Completamente em choque.

Acabou. Para ele, não vai haver um amanhã. E talvez para nenhum de nós. Minha vontade é de socar eu mesmo, até ficar desacordado.

— Anda, venham, venham! — Ouvi Zac gritar, e foi o que nos fez despertar, e subirmos correndo as escadas, mas eu quase caí, assim como Gale, sem conseguir assimilar, mas desesperados, toda a gritaria, completa gritaria e escândalos no andar principal.
Mas antes de sermos levados para longe, depois que um tiro passou arranhando entre eu e Gale, que ainda puxava meu braço, eu pude ver Cato correndo com todas as forças com Ben no colo, que o segurava com todas as forças, mas ao mesmo tempo Cato segurava forte na mão de Amanda, o braço, na verdade, bem junto de seu corpo, com sua irmã bem ao lado dele, agarrada à irmã caçula de Blane, que é uma bebê, puxando Stuart e sua mãe, enquanto Amélia estava do outro lado, sendo carregada no colo por Dean, e uma mancha de sangue estava em seu estômago, e meu pai com uma mão no ouvido, sangrando.
Quase vomitei. Não vomitei porque o ritmo começou a ser ainda mais frenético, porque estávamos com Katniss, que estava absoluto estado de choque, sem conseguir reagir, mal andava.

— Onde é o esconderijo mais próximo?! — Gale perguntou.
— Aqui neste andar, não podem ficar, precisam ir para o esconderijo real, a princesa Prim já chegou lá — escutar isso fez Katniss relaxar, mas não muito.
— E meu pai? — o guarda balançou a cabeça, na mesma hora que nos pediu para abaixar, e ele efetuou três disparos, nos empurrando para um corredor estreito.
— Voltou para buscar sua mãe e sua prima. Preciso limpar o andar, sou o único aqui, como podem ver, mas procurem um esconderijo — Zac disse tão rapidamente, que eu ainda precisei raciocinar.
— Eu vou atrás do meu pai. Se vocês quiserem, fiquem aqui — Katniss disse, em meio os altos sons de bombas e tiros, rodadas e mais rodadas, em meio a gritaria, ela se colocou de pé, mas é claro que eu e Gale também.
— Ótimo, então... — ele sacou uma arma da calça, recarregando agilmente. — Eu cubro da direita, Peeta, na esquerda — jogou uma arma pra mim, e eu quase deixei cair.
— Mas o quê...? — murmurei. A expressão de Katniss foi a mais engraçada, sem acreditar no que aconteceu há dois instantes.
— Tem uma coisa que eu não te contei, eu sou da Guarda Escarlate, trabalho junto com o Max e a Lucia, e meu objetivo é proteger você, desde o começo — ele disse, simplesmente, porém li em seus olhos que não era como ele gostaria de contar ela sobre a notícia, que realmente é impactante, embora eu tenha descoberto uns poucos dias atrás. — Podemos conversar mais tarde sobre isso.
— Tudo bem... — ela respondeu, atordoada. Acho que eu estou um pouco assim também. — Apenas me ajudem a tirar isso.

Indicou uma fenda na saia grande do vestido amarelo, e eu troquei um olhar com meu amigo. Suspiramos juntos, descendo o zíper interno, revelando a verdadeira continuação de seu vestido, mas bem mais simples e mais fácil de correr, realmente.
— Agora dá — ela murmurou, e simplesmente saiu. Nós fomos atrás.
— Precisamos ir para o andar debaixo, mas primeiramente, temos que buscar meu arco e flechas.
Assentimos, mas minha alma berrava desesperada dentro de mim, enquanto corríamos pelo palácio, entre pilares, sendo escoltados algumas vezes por outros guardas, que estavam ao nosso lado. Um tiro acertou meu braço de raspão, mas eu só fui me dar conta quando entramos em uma sala imensa, e que eu não tinha vindo aqui antes, com certeza. Essa é menor, mas parece boa para fugir quando o mundo está aos pedaços, como agora.
— Ah, meu Deus — balbuciei, me apoiando na parede, sem nem ousar ver como está meu braço, que arde como um inferno,enquanto Katniss vasculhava um armário grande atrás. — O que é que está acontecendo, Senhor?

Senti o gosto de sangue no interior da boca, percebendo que eu mordia a língua.
— Gale, me ajuda, por favor — ele assentiu, mirando em alguma coisa, tirando um arco e uma aljava com pelo menos cinquenta flechas.
— Só mais uma coisa.
Ela falou, se afastando com uma tesoura, então só vi uma parte de seu vestido caindo, e ela voltou, com ele cortado acima dos joelhos, sem o colar de pérolas, nem os brincos. Tive que piscar duas vezes, por toda sua beleza, mesmo sem querer.
Sai do estado de estupor para perguntar se tem alguma coisa para colocarmos nas armas, já que eu não tenho mais munição. Gale mexeu onde se lá que Katniss colocou esse arco e flechas, me passando uma nova arma, e novos cartuchos, que eu poderia deixar nos bolsos. Agradeci, depois de verificar como se usa.
Na Seleção, somos ensinados a usar toda e qualquer arma, para nossa defesa, e para momentos assim. Reis também precisam estar em campo de batalha.
— Temos que ir encontrar meu pai — falou, decidida. Eu estou com medo, porém a coragem de ir fazer uma coisa útil foi muito maior. — E pelo caminho, ajudar os guardas e quem mais estiver precisando.
— Tudo bem, — dissemos juntos. — mas por onde vamos começar?
Completei.
Ela abriu o Smarter, e mostrou exatamente onde o rei está, e o ponto dele se mexia lentamente.
— Ele está machucado — Gale disse, verificando em um aparelho um pouco diferente. — A Guarda está protegendo-o, mas está difícil, porque estão procurando você, e seu pai ferido é um jeito de fazê-la se aproximar.
Katniss ponderou, mas logo tirou uma flecha, endireitando a postura, como uma rainha faz. Não abaixou a cabeça, embora estivesse tão mal quanto nós, não recuou, mesmo que tenha visto sua própria prima falecer sem que desse tempo de fazer alguma coisa.
— Quem disse que eu preciso estar perto para fazer alguma coisa. Apenas preciso cuidar do meu pai.
Ah, meu Deus. Minha respiração até falhou, por causa de tudo. Que mulher de coragem ela é.
— Bem, então vamos — falei, sem parecer um covarde, abri a porta, dando passagem para os dois.
Definitivamente, os minutos seguintes foram os mais agitados de toda minha vida, e minha respiração jamais vai ficar tão afetada como hoje.
Quando precisei dar meu primeiro disparo para matar mesmo, e não para ver se tinha alguém por onde passaríamos, enquanto Katniss e Gale cuidavam de outras pessoas do Sul, eu quis desistir, por ter sido certeiro na cabeça de um homem que estava arrastando como refém duas criadas. Porém não desisti, embora tenha sido o desejo do meu cora, sei que não posso desistir.
Katniss tem em si todas as razões para parar, tal como eu tenho, Gale também, mas existem pessoas que precisam de nós. Continuei, avançando, e aproveitávamos quando guardas nos davam proteção, e até mesmo pessoas comuns, que trabalham aqui, mas que são da Guarda Escarlate, tal como Gale.
Precisei correr, e ir protegendo Katniss na frente, para não pensar muito sobre isso. Mas precisei fazer outros disparos, e acertar outras pessoas. De forma fatal.
Nós corríamos, disparávamos, nos abaixávamos, e eu sequer sabia mais qual era meu objetivo, a não ser quem estivesse usando a bandana.
— O rei está no terceiro andar! — Gale gritou para mim. — Katniss, precisamos de um caminho para chegarmos até lá. Pelas escadas e elevador é impossível!
— Vamos pelo armário de uma das salas! — ela gritou de volta, enquanto disparava uma flecha perfeita no peito de uma mulher que segurava uma criança, que logo caiu quando fora atingida. Mas então vimos que não era qualquer criança, mas uma das trigêmeas, uma das irmãs de Calvin. Se ela está aqui, onde estaria Calvin? Um calafrio novo se apossou do meu corpo. — Ah, não.
— Deixe que eu vou lá, apenas me deem cobertura — falei, verificando os dois lados. Sai, correndo, e a vantagem de ter feito isso foi que muitos apareceram para mirar em mim, porém tudo o que vi foram flechas de Katniss voando pelo corredor, certeiras, tais como as balas de Gale, que realmente sempre foi o melhor nisso, depois de Cato, que sempre praticou artilharia.
Peguei Marylin, se não estou enganado, e ela gritou, então tive que me apresentar outra vez, para fazê-la se acalmar, porém não deu muito certo. Abri a primeira porta, e Katniss atrás de mim com Gale, não sendo surpreso por estar com dez sulistas recarregando suas armas. Batemos a porta, feito três adolescentes e saímos correndo na direção oposta, até que Katniss foi na frente, e como estava sem usar o arco, por conta de estar na frente e sem ter como mirar melhor, eu atirava com uma mão, mas não tão certeiro, por causa da menina de quatro anos no meu braço, chorando, e sangrando. Eu não estava entendendo onde vinha seu sangramento.
Deve ser de algum ferimento na barriga ou na perna.
— Aqui! — a morena exclamou, e nós entramos no que parecia um quarto para alguma adolescente. — Você se incomoda se ficar sozinha?
— E-e-e-e-eles tocaram em mim, tia — a menininha disse, tremendo muito, depois que eu coloquei ela na cama, enquanto Gale estava na porta, depois de trancar, e falava coisas das quais eu não conseguia entender pelo telefone.
Quando ela disse isso, espontaneamente eu levantei seu vestidinho rosa, como o de suas irmãs, e vi o que eu mais temia, ela sem calcinha, e sangrando. Ah, meu Deus. Então é de onde veio todo o sangue.
— Ela foi estuprada, Katniss — falei baixo, e eu pensei que Katniss ia estourar de tanto que ficou vermelha, e seus olhos cheios de lágrimas. — Não podemos deixar ela aqui sozinha. Ela precisa, inclusive, de um banho. Urgente.
Não tem apenas sangue.
Definitivamente, eu não posso lidar com isso, Katniss então a pegou, e levou para o banheiro, me olhando, me fazendo ficar com o nó engasgado na garganta, impedindo o choro. É como se ela tivesse passado pela mesma situação.
Menos de cinco minutos depois, Marylin voltou, sonolenta no colo de Katniss, com uma toalha envolvendo o corpo pequeno. Gale não disse nada, apenas mexeu em seu relógio, embora tenha ouvido tudo, sua expressão silenciosa e devastada, foi o bastante para demonstrar que Katniss poderia ficar uma hora dentro do banheiro que não teria importância.
Daí ele saiu da cama, onde estava sentado, e eu não chão, correndo para a porta, com uma arma nas mãos.
— Entra — a voz de Gale, então vimos Calvin entrar totalmente suado no quarto, com suas outras duas irmãs, muito parecidas com Marylin. Calvin, se tivesse que ser descrito quanto cor, seria vermelho, e não branco.
— Ah, meu Deus, eu pensei que tinham matado vocês! É só sobre isso o que eles falam! — ele deixou as menininhas no chão, e foi correndo pegar Marylin, começando a chorar. — Onde você pensa que estava?! Você estava do meu lado, sua doida!
— Eu fui atrás da mamãe! — a garotinha respondeu, soluçando de chorar, com a toalha quase caindo de seu corpo.
Troquei olhares com Katniss, e precisei engolir em seco. Gale colocou uma mão na testa, depois no bolso.
— Calvin... — chamei ele, depois que as três deitaram na cama, juntas, todas abraçadas uma na outra. Me aproximei da porta, já que vamos deixar os quatro aqui, e eu contei o que tinha acontecido com sua irmã.
Nunca imaginei que um dia eu fosse estar em uma situação como essa. Katniss ficou totalmente compadecida, abraçando-o bem apertado, enquanto Gale estava com uma expressão de que também verdadeiramente sentia muito pelo o que tinha acontecido.
— Mas bem, eu não posso ficar aqui com elas, eu vi que estavam atrás de mim, não continuaram porque Cato salvou minha vida, eu nem sei como ele está agora, apenas sei que se não fosse ele, eu não ia ter conseguido fugir. — Calvin disse, depois de se desmanchar no que havia acontecido com sua irmã de menos de seis anos.
— O que aconteceu? — perguntei, rapidamente, e ele disse que estão mesmo gritando para todos e a ordem é matar a mim, minha família, Katniss e todos de sua linhagem.
— Cato foi atingido muito gravemente, bem quando eu peguei Amber e Clare no colo, e ai gritaram o nome dele, algo como ele é seu amigo, eu ia ajudar, mesmo com minhas irmãs, eu ia dar um jeito, mas tudo aconteceu muito rápido, e eu só consegui correr, até receber a mensagem de Gale. Depois chegaram guardas nossos, e muito mais tiros, eu não sei mesmo como meu amigo está. Apenas sei que vocês precisam fugir, e se esconder. Eles não estão aqui procurando alguma coisa a não ser a cabeça de vocês.
Nesse instante os tiros e gritaria foi se aproximando, me fazendo querer chorar, já que meu coração parecia que estava na boca.
— Vou mandar vocês quatro para a cozinha. Depois, apenas puxe essa alavanca — Katniss deu as direções. — Com certeza eles não foram para lá. Quando chegar, puxe isso, para que a gente possa ir para o terceiro andar, entendeu?
Ele imediatamente assentiu.
— Quando chegar na cozinha, procure o quadro de uma mulher caminhando, e toque no pé esquerdo, vai abrir uma passagem secreta, e vocês irão para um esconderijo bem seguro — ela ia falando tudo muito rapidamente, enquanto eu e Gale estávamos a postos na porta, depois de verificar as munições. Ele está mais preparado para isso do que eu, pressuponho, e pelo visto, ele e mais guardas que estão com a guarda escarlate se prepararam para isso, mas o medo em seus olhos cinzas azulados é tão claro e limpo quanto o céu hoje quando nós acordamos.
Gale está tão mal quanto eu e Katniss, suas mãos trêmulas dizem muita coisa, tal como o fato de mexer no cabelo toda hora.
Mas eis a questão, como se soubesse o que ia acontecer, está chovendo como nunca eu tinha visto nesses seis meses.
Medo. Desespero.
Katniss bateu a porta do armário, e parecia loucura, mas sei que é como Finnick e eu nos encontramos algumas semanas atrás.
— Pegaram meu pai — Katniss murmurou. — Ele está muito machucado.
— Então, eu sinto muito por isso, mas quem vai pior aqui somos nós! — Gale exclamou, mas em um sussurro, quando vozes com um inglês mais agudo estavam bem do outro lado da porta. Olhei para Katniss, que se assustou com isso também.
— Venham, venham! — ela exclamou, mas não baixo o bastante para que os outros do outro lado da porta não escutassem. Uma gritaria.
É A PRINCESA! ARROMBEM ISSO! AGORA! — Não era algo bom.
Corremos nós três para o espaçoso armário, então, mas a porta não queria fechar de jeito nenhum. Invadiram.
— Achem eles! Agora! Eu só saio daqui com a cabeça deles!
O armário!
— Oh, meu Deus — Katniss sussurrou, começando a chorar. O corte em sua testa sangrava bastante. — Por que isso não quer funcionar?
Quando eu me dei conta de algo que eu não queria ter dado, e é o que estava, possivelmente, pesando. Um guarda morto, dos nossos, e morto recentemente, onde seu colete estava impedindo a porta de fechar. Eu acho que era dos nossos. Não tem cabeça.
Katniss deu um berro, logo em seguida, mas eu consegui rapidamente puxar o colete, a porta fechou, e a sensação foi de estarmos despencando, embora estivéssemos subindo, mas eu pensei que ia dar errado, por eles terem começado a atirar contra.
— AH! — ela berrou quando o corpo se mexeu com o balanço, sujando seus pés, com o sangue ainda quente, ela se jogou para cima de Gale, que estava mais perto, enquanto eu nem sabia o que dizer ou fazer, mediante aquele corpo ali. No Sete, ver um morto é, infelizmente, normal, porém, nunca vi alguém assim, dessa forma. É assustador. Eu não consigo falar. É a pior coisa que já vi em toda minha curta existência.

Saí na frente, enquanto Gale segurava Katniss.
— Esse é o quarto do Blane — murmurei, com a dor na garganta, sem saber se ele está bem, uma vez que não o vi, apenas sua família correr junto com Cato. Mas o Sulista revirando as coisas do meu amigo feito um cachorro não permitiu. Gale foi mais rápido do que eu, matando-o, ainda abraçado firmemente à Katniss, que soluçava.
Sentamos Katniss na cama, depois de trancarmos a porta, que já este estava sozinho, e ninguém escoltava a porta. Mas não temos muito tempo.
— Katniss, Katniss, precisamos ir para um esconderijo, apenas isso — Gale disse. — A Guarda acabou de resgatar seu pai, estão evacuando ele.
Então pegou, e mostrou a mensagem, onde diziam que dois estavam com o rei, que está seriamente ferido.
— Você precisa se esconder.
— Não, não, tudo bem estarem com ele, mas eu preciso ir e ajudar essas pessoas! — exclamou, trêmula. — Como será que Calvin está? E as irmãs?
Não havia resposta. Com muita, muita graça, Clare saiu viva, por estar abraçada a cintura dele. Marilyn estava em seu colo, enquanto Amber estava segurando na barra de sua blusa. Não podemos ter a menor noção de como ele está.
— Temos que sair logo daqui — foi o que eu disse, quase sem voz, sem saber de onde encontrei forças para me colocar de pé. — Temos que sair daqui.
E saímos, em uma correria frenética, depois de apenas eu fazer um pequeno curativo na testa de Katniss, já que isso estava atrapalhando sua visão.
De vez em quando, entrávamos nós três em um corredor, para puxar fôlego, até que nos viram, e não perderam a oportunidade para atingir Gale e a prima de Katniss, que surgiu do nada, chamando pelo meu nome, e eu me perdi, quando tudo aconteceu muito rápido, em meio aos diversos disparos, espalhados pelo palácio, berros, choros, gemidos de dor.
— NÃO! NÃO! JUNE! NÃO! JUNE! — Katniss berrou, com todo seu fôlego, fazendo minhas cordas vocais se “arrepiarem”, tamanho foi seu grito, e foi correndo, caindo, inclusive, comigo atrás, assustado, até o corpo da que eu reconheci como uma filha de uma criada, já vi Katniss conversar com essa criança. Enquanto fiz três disparos contra o peito do homem que tinha acertado-a, depois comecei a disparar contra os que estavam vindo em nossa direção, assim como Gale, que cambaleou, e eu o ajudei a vir para o corredor, indo puxar uma Katniss histérica, desacreditada, mas ao mesmo tempo sabendo que não tinha mais solução, mais do que quando viu o corpo do guarda decapitado.
O tiro em sua amiga jovem foi silencioso, na testa. Não precisava de muito para sabermos o que tinha acontecido. Ela morreu sem chances. O sangue logo começou a borrar, além da parede que foi atingida por respingos, o chão.
Não tenho como descrever a alegoria carnavalesca que está meu coração. Eu precisei segurar o vômito e meus próprios gritos, por estar tentando conter uma Katniss descontrolada, mas compreensivamente.
— Meu Deus, meu Deus, eu não... meu Deus — balbuciou, então, depois dos berros, quando caiu em si do lugar onde estamos, tomado por inimigos, pouco menos de um minuto depois, ficou olhando fixamente para o corpo da criança de no máximo sete anos. A cena é a pior que se possa imaginar. O vestido azul cristal dela está banhado, tão rapidamente, com o próprio sangue dela. — Mal pude vê-la se aproximar, e-e-eu... Gale, como você — ela então olhou para meu amigo, que estava piscando várias e várias vezes, pressionando uma mancha gigantesca de sangue puro, na altura do quadril. — Gale...?
Ela engatinhou até ele, ainda cambaleante.
Fiquei tonto. Apenas tinha ajudado ele a ficar no fundo do corredor, depois de estourar as lâmpadas daqui. Ele foi para o lado, de um grande sofá, impossibilitando a visão de algum sulista, que com certeza passaria apressado por aqui.
— Eu vou ficar bem, foi apenas de raspão — disse ele, com muita dificuldade. — Vocês precisam continuar.
Balancei a cabeça em negativa, rasgando a manga da minha camisa, que que meu terno já se foi há muito tempo, sem nem dizer nada, puxando sua mão, e pude ver melhor. Isso não foi um arranhão. Ah, mas não foi mesmo.
— Você consegue sentir suas pernas? — Katniss perguntou, em um murmúrio, ficando de joelhos ao meu lado, pegando nas mãos dele. — Gale, obrigada.
Ele assentiu, acho que para as duas coisas, já que balançou seu pé.
— Vou ficar bem.
— A bala está alojada, isso vai infeccionar e você ainda corre o risco de ficar aleijado — falei, com uma voz que eu não sei de onde veio, de tão “normal”. — Onde poderíamos encontrar algo para tirar essa bala daí?
Perguntei para Katniss, embora não a encarasse. Não tenho psicológico para olhar em seus olhos a esta altura do campeonato. Estamos no terceiro andar, por ser onde seu pai está. Não estamos muito longe agora.
— Esconderijo — disse ela, se apoiando de mim para ficar de pé. — Aqui tem um esconderijo.
Começou, trêmula, a procurar onde está o lugar que possa abrir um esconderijo, e estava bem no começo do corredor, onde jazia o corpo da criança June.
Ajudei Gale a se colocar de pé, e ele se segurou para não gritar, a um ponto que seu rosto que já estava vermelha por conta de toda a correria, até o pescoço ficou.
Katniss abriu, depois que verificou se não tinha mais alguém ali, para então me ajudar a alocar Gale na cama, fechando a porta de ferro que não tinha menos de trinta centímetros de blindagem.
— Tenho como abrir — disse, como se soubesse no que eu pensava.
Me ajudou a resolver um pouco a situação de Gale, que é bem mais séria do que nós podíamos imaginar, mas conseguimos tirar a bala, depois de mãos trêmulas.
— Precisam sair daqui — ele mandou, quase desmaiando, depois de perder tanto sangue. — Precisam sair. Estão chegando até aqui, e eles estão com as chaves de boa parte dos esconderijos. Não vai ter problemas se eu estiver aqui sozinho.
— Você está ficando louco?! — gritei, pela primeira vez. — Você pode morrer ainda, por causa de toda essa perda de sangue! Já perdemos Blane, talvez Calvin e Cato! Não vou deixar mais um amigo meu!
— E isso é muito sério! — Katniss completou. Ele se manteve impulsivo.
— E que diferença vai fazer vocês dois ficarem aqui?! Nenhuma! Se eu tiver que morrer, eu vou morrer! Por que acham que eu escolhi vir para cá arriscando tudo? Porque eu ia morrer se continuasse em Miami, assim como se eu continuar aqui! Morrer eu sei que vou, e vocês também, a questão é como vou morrer! Eu escolhi dar minha vida para salvar a de vocês! — retrucou, irritado. — Escolhi por livre e espontânea vontade! Vocês podem decidir se ficam aqui, correndo o risco de morrerem comigo, ou vão juntos para procurarem o rei, mas sabendo do risco que estão assumindo. Existem pessoas que matam por vocês espalhadas pelo palácio, mas há outras que podem matar vocês.
Eu me apoiei em uma das paredes do lugar minúsculo. Deus, salve Calvin, Cato, Blane e todas as crianças espalhadas por esse palácio.
Meu corpo late por descanso. Meus braços estão arranhados, sangrando, em alguns pontos, por conta das centenas de estilhaços, um tiro de raspão. Minhas pernas estão melhores, mas não muito. Há um rasgo na minha calça, e quando me abaixei, no meio dessa correria, arrastei sem querer meu joelho no chão, causando todos os arranhões.
— Peeta, você vem comigo? — Katniss perguntou, fungando, por causa do choro. Está toda suja, assim como eu, mas eu estou pior, por ter estado com Marylin no colo, e depois tirado a bala de Gale, estou completamente sujo, como se uma bola de sangue tivesse estourado em mim. Minha calça azul nem está mais azul. Agora ta mais pra um roxo.
— Pra onde mais eu iria? — perguntei de volta, dando de ombros. O tiro de raspão está doendo mais, por esse tempo parado. Meu corpo clama por parar. Mas é exatamente o que Gale disse.
Ela assentiu.
— Gale, estou ativando um alarme. O sistema está reconhecendo que você está gravemente ferido — ela afagou carinhosamente o cabelo dele, suado. Eu com certeza já estaria morto se não fosse por ele. — Quando tudo acabar, virão até você com uma equipe médica totalmente preparada para cuidar exatamente do que aconteceu com você.
— Tudo bem — respondeu, bem fraco. Me aproximei, e senti que não seria a última vez que iríamos nos ver.
— Fica forte — pedi. Segurei meu choro, desde que vi Blane ser assassinado, e estou segurando até agora. — Nosso squad não vai ser um squad sem você.
Ele riu, fechando os olhos, balançando a cabeça em negativa.
— Apenas fiquem vivos. Vou ficar bem.
Não houve nada depois disso. Katniss apenas cobriu ele, como se já estivesse morto, para caso algum sulista chegasse. Depois de um beijo demorado na bochecha, saímos. Ela colocou uma senha especial.
— Apenas Troy e Zac poderão abrir, se Prim ou papai ou eu não autorizar ou apenas depois de dois dias — me disse, enquanto estamos abaixados. O corpo de sua amiga não está mais aqui. Ela está em estado estupor, no caso, Katniss. O barulho é insuportável. Estão avançando.
— Acho uma boa ideia. — respondi.
Não há Katniss princesa ao meu lado, e nem um Peeta Selecionado. Há apenas dois adolescentes estraçalhados por um governo horrível.
Precisamos ir... — eu falei, avisado por minha própria intuição. — Se ficarmos aqui vão nos matar.
— Vamos.
Nos colocamos de pé, e trocamos um olhar. Não sei bem dizer que tipo de olhar foi esse. E o que eu senti...
— Temos que encontrar meu pai. Ou algum lugar que nos leve ao esconderijo real.
Assenti, nos quebrando, então, depois de verificar, pudemos sair, e correr, ajudando algumas pessoas, colocando-as em esconderijos.
Ministros, conselheiros, todos, pareciam totalmente desnorteados, mas não explicamos nada, apenas os jogava-os em um esconderijo, e saímos correndo para ajudar mais pessoas.
Quando senti que estávamos sendo seguidos.
Aproveitei que estávamos em uma parte de muitas esculturas, para nos infiltramos entre as armaduras e obras de gesso.
Shhhhhh — murmurei para Katniss, apertando firme o seu braço. Ela assentiu, mas trêmula. Estamos em um segundo andar se uma sala só para isso, no terceiro andar. Confuso, mas o palácio é gigantesco mesmo. São quatro andares principais, porém dentro desses, há até dez.
— Ela já está quase morta, Barner — uma voz masculina disse, com graça, entrando na sala. — Quantos pegaram ela mesmo?
Outro homem gargalhou.
— Eu nem sei. Se com a princesinha foram vinte, com ela acho que foram uns quarenta, ou cinquenta — respondeu. — Quebraram as pernas e os braços dela, acredita? Não sabia que ela era tão frágil assim... mas que bom que é!
O homem gargalhou, como se fosse uma piada bem cômica.
— Você não se aproveitou? Pode aproveitar agora, já que é a rainha — uma voz feminina fez piada, então de camarote pudemos ver totalmente a mãe de Katniss com o vestido aos frangalhos, sangrando pelo nariz, pelos ouvidos, com os olhos roxos de tanto apanhar, as mangas do belo vestido azul que usava, rasgadas, revelando seus braços cheios de hematomas. Eu perdi o ar, mas Katniss pareceu ter perdido as forças. Sua pele da cor do chocolate ficou branca.
Segurei-a com força. Oh, céus.
— O que fizeram com ela? — murmurou, mais frágil que jamais esteve.
— Eu não quero isso daí, Janine! Faça-me o favor! Quero algo direito, pelo menos uma mulher de bom coração! — Agora podíamos ver o rosto de todos eles, e não eram velho, mas jovens, por volta da nossa idade. Haviam pelo menos quinze, e o mais velho do grupo, talvez o líder, tinha uns trinta anos. As roupas estavam sujas, mas ele comia biscoitos despreocupadamente, como se nada estivesse acontecendo.
— Ah, mas Bob quer é a — censurei em minha mente. — da Katniss! — um gritou, e todos riram. — Até mesmo tinha se inscrito na Seleção!
— Cuide de sua vida! — o tal Bob exclamou, dando um chute na rainha, que se mexeu, mas bem pouco. — Quando vão levá-la para queimar? Eu quero ver esses olhos que mataram meus pais queimarem bem vivos. Maldita, espero que tenham te tratado como você tratou os sulistas durante todo esse tempo.
Cuspiu no rosto dela, desferindo outro chute.
Katniss já chorava, cobrindo a boca com as mãos. A morena ao meu lado não tinha mais equilíbrio, de longe poderia notar-se isto. Mas permanecia de pé, escondida, assistindo sua mãe. Há tanta dor em seu olhar, misturado com mágoas, que é difícil manter os olhos nela. É como se fosse ela a mulher totalmente humilhada e amarrada lá embaixo.
Não soube o que fazer, tendo conhecimento de todos seus sentimentos quanto a mim e Delly, eu ainda sim entrelacei meus dedos com uma de suas mãos, que pendeu ao lado do corpo, sem forças sequer para cobrir a boca.
Encarei Katniss, que me encarou por um breve segundo. “Eu estou aqui com você”, falei. Ela se concentrou novamente na mãe. Posso sentir meu coração pulsar em meu pescoço, como se estivesse indo para a boca, e toda a cena me faz querer vomitar tudo o que eu comi um dia.
Sinto estar em um tobogã de sentimentos e pressentimentos ruins, que fazem que eu mesmo queira morrer por ter presenciado tudo o que presenciei no dia de hoje. Não faço a menor ideia como todos nós pudemos acordar com calma, ansiosos para um dia especial, e estarmos agora, exatamente uma hora depois que o ataque foi declarado, nos escondendo, orando por nossas vidas, encarando o corpo da Rainha de Panem.
— Depois que encontrarmos a princesa e o Peeta, fica calmo, essa porcaria vai pagar por ser uma desgraçada — Janine respondeu, tirando um pacote de biscoitos de dentro da jaqueta. — Não acho que vá demorar, já que conseguimos matar um dos Selecionados, e o rei está praticamente morto, embora tenham resgatado ele, eu até deixei. Tenho certeza que meu tiro pegou no pulmão dele. Já deve estar até morto neste altura. Eu dei três tiros certos, para fazer ele sentir, e pagar pela maldita que escolheu para se casar.
— Mas quem aqui que acertou a irmã do loiro lá, aquela morena? — O mais velho perguntou, enquanto Janine brincava de cortar os cabelos longos (agora não mais) da rainha, que estava com os olhos azuis fechados, mas suas lágrimas limpavam seu rosto sujo com poeira e sangue. Clara não carrega nem a glória dos seus sapatos de diamantes, como eu ouvi uma criada comentar mais cedo.
— Sei lá, acho que fui eu — um moreno disse, dando de ombros, se jogando em cima do sofá. — Bem lindinha ela. Uma pena que eu tinha que apenas dar um susto. Quase senti pena, mas quase. Pegou a barriga, não sei se vai matar, nem tive esse objetivo mesmo. Vi ela ser carregada por um garoto, não sei se ela morreu, mas tanto faz, já que sinto que vamos encontrar a Katniss, e eu vou me encarregar de fazer ela gritar até ficar sem voz.
Senti o ódio ficar no meio da minha garganta, e lágrimas de fúria, mas Katniss quem me segurou dessa vez, enquanto eles riam, e a Janine, que realmente parecia não ter mais de vinte e três anos, se divertia torturando a rainha, deslizando a faca pelos cabelos dela.
— Aqui, quando eu vou poder tacar fogo nela? — perguntou, friamente, enquanto as mãos de Clara estavam presas de uma forma tão brusca, que seus pulsos já estão em carne viva. — Não quero que ela morra agora, assim. Precisa pagar por todos os males que fez.
— Calma, JJ, ela não vai morrer agora, eu apliquei adrenalina antes do James se enfiar nela. Calma, que ela sentiu cada um fazer com ela o que fizeram com a Primrose, e com as garotinhas da nossa vila quando tirou todo o suporte de ajuda de lá sem avisar o parlamento... aqui se faz, e aqui se paga — uma garota disse, de uma forma totalmente reconfortante para a tal Janine. Tem a pele escura, e o cabelo está raspado em um lado, com o resto em um black. Senti medo dela, e do kit de facas em sua cintura. Em uma outra ocasião, eu poderia jurar que ela é uma Dois, uma modelo muito requisitada. Tem uma aparência ímpar. Mas seus olhos, o que eles carregam, anulam tudo. O rapaz mais velho não deve ser o líder com ela no bando. Katniss teve uma crise de arrepios, tal como eu. — Alguém mais vai querer brincar com ela? Aproveitem... melhor agora do que depois.
Perguntou, com um sorriso.
— Porque eu quero, mas de um jeito diferente...
Puxou uma navalha do bolso da calça jeans apertada, depois de se abaixar.
— Aqui têm uma saída? — Katniss perguntou em um sussurro.
— Vou procurar.
Engatinhando, muito apreensivo, por causa dos meus machucados nos joelhos, encontrei uma saída, e silenciosamente abri, vendo dar em um corredor vazio. No caso, aqui, um acesso ao que parecia ser o quarto de hóspedes real. Fiz um positivo para Katniss, que assentiu.
Voltei para o lado dela.
— Vou acertar minha mãe — ela disse, em um tom quase inaudível. Eu fiquei desacreditado. — Não podemos acertar essas vinte pessoas, é suicídio, e nenhum deles parecem estar brincando em serviço. Vão queimá-la viva.
— Katniss, é a sua mãe, e — assentiu.
— Ela está me pedindo.
Não entendi, então olhei para baixo, vendo que os olhos da rainha estão fixos em Katniss, cheios de lágrimas. Ela olhou bem para mim. Piscou, e lágrimas novas caíram. Por favor, ela disse, apenas movendo os lábios.
— Com quem essa maldita está falando? — A morena perguntou, dando um chute que pudemos escutar, já que demos um pulo silencioso para atrás da pilastra. Não nos viram. Katniss puxou lentamente uma flecha de sua grande aljava.
— Calma, Enobaria — Janine brincou, tragando em um cigarro. — Ela deve estar cega de tanto que tomou soco do Brutus. Deixa ela malucar sozinha.
— POR FAVOR! — A rainha berrou, com um fio de voz.
— COM QUEM VOCÊ ESTÁ FALANDO?! — perguntou com um berro, e um gemido alto de pura dor foi ouvido. Eu estremeci.
— Ninguém — respondeu a rainha, sem glória, dignidade, humanidade, respeito. Eu nunca poderia ter imaginado ela em uma situação como esta, mesmo mediante todos os dramas dos quais colocou sua filha mais velha. É assustador ver a decadência de uma pessoa. No fundo, quis que ela pagasse por tudo o que causou em Katniss, porém, nunca dessa forma. Depois de tudo o que presenciei hoje, essa é a última coisa que eu quero que alguém passe, nem as pessoas ruins.
— Tirem a roupa dela — a voz da morena ordenou, e uns assobios debochados foram escutados. Katniss soluçou alto, mesmo com as mãos agora cobrindo a boca, o que me assustou muito, mas não escutaram pelas vozes altas.
Depois de quinze minutos, quando pararam de gritar feito animais, xingando a rainha, e até uns sons desagradáveis, pois aparentemente outras três pessoas foram “tocar” nela, Katniss apertou minha mão.
Eu sei o que ela vai fazer. Ah, eu bem sei.
— Anda, estão pedindo para levarmos ela para queimar logo, para atrair a princesa. Antes, Trevor, dá nessa mulher outra dose de adrenalina. Ela tem que sentir o fogo lamber esse corpinho dela. Lembra que ela mandou seu irmão à fogueira por estar na rua depois das cinco da tarde. Seu irmão de quatro anos. Faz ela pagar.
Eu abri a porta que dava no quarto vazio, depois de ter ido verificar se estava tudo bem para nós seguirmos e entrarmos no primeiro esconderijo que víssemos na nossa frente.
Katniss se alinhou, como uma perfeita arqueira, que com certeza ela é.
— Eu não sei se atiro no coração ou na cabeça — murmurou, abalada. Parou de mirar, olhando para mim. Seus olhos estão azuis, por conta das lágrimas que está derramando, porém, ao redor, estão todos vermelhos. Carrega em si o meu desespero e o da mulher que a gerou. — Não quero fazer isso.
Abaixou a flecha, suada, como eu, angustiada até seus ossos.
— Katniss, você não precisa fazer isso — falei, sincero, muito abalado também, até pela própria rainha. Não tenho nem como explicar o que é ver o que estamos vendo. Sua mãe foi amarrada toda aberta, totalmente nua, no meio da sala, sustentada por estátuas. A cena é uma das coisas mais humilhantes da vida de um ser humano, e nem alguém que já fez tanta maldade como ela merece o que está vivendo.

— É a sua mãe. Você sabe que não precisa fazer isso. Você não tem que fazer isso — insisti. Porém logo calei a minha boca. O que eu faria no lugar dela? Não faço a menor ideia. Posso estar aqui, bem ao lado dela, e não fazer a menor ideia do que ela realmente está sentindo, e qual reação ela tem que tomar mediante a situação. Suspirei, e simplesmente abracei Katniss pelos ombros. Ainda estou ao seu lado. E vou continuar estando.

— Não vou aguentar sabendo que ela sofreu ainda mais, essa é a questão, Peeta — Katniss falou, chorando, outra vez. Não passamos de sussurros. — Eu preciso salvar ela, mas não vai adiantar, não tem como matar toda essa gente.
Por entender exatamente o que ela quis dizer, toquei na sua mão que segurava a flecha.
— KATNISS, POR FAVOR! ATIRA! — Clara berrou, em plenos pulmões, e imediatamente começaram a se agitar, procurando por nós.
Maldita — Katniss murmurou, correndo comigo na frente, para o outro lado. — Maldita! Não acredito que ela fez isso!
Exclamou, soluçando, abaixando-se, já que uma chuva de tiros nos cobriu. Agora nós fomos tomados por outro sentimento, que já estava pulsando em nosso sangue, que é o desespero. Na verdade já estávamos, mas agora ficou ainda mais sério.
A rainha continuou gritando, chamando ela, e eu também.
— ATIRA EM MIM! ATIRA EM MIM! ATIRA EM MIM! PEETA! ME MATEM! ME MATEM POR FAVOR! ATIRA, SUA IDIOTA! — ela berrava, em plenos pulmões. Seus ossos estavam expostos, na fratura que fizeram em sua perna. Meu Deus.
Com um fôlego, depois de dar um murro no chão, aproveitando o intervalo dos gritos da majestade, estavam subindo correndo, nos localizando, atirando, mas estávamos entre duas pilastras.
— Eu vou mesmo.
Nunca vi Katniss daquela forma. Furiosamente, pegou a flecha, armando, enquanto eu a dava proteção, mas não tínhamos mais que três segundos. Tudo aconteceu muito rápido, mal dava para respirar. A cada momento que se passava, cada segundo que continuávamos vivos, internamente eu agradecia por ainda não ter vomitado.
Todos gritaram juntos quando a flecha atravessou a cabeça da rainha não-misericordiosa, que deu um sorriso maldoso, que ecoou em um silêncio cortante, como a flecha que pôs fim seu sofrimento, para toda uma eternidade.
Bem, mas agora ela ia para uma outra vida, que não sabemos se será tão misericordiosa como a flecha de Katniss.
Eu fiquei escandalizado. Mas um tiro passou assobiando tão perto do meu ouvido, tirando uma lasca do mármore, que o que eu pude fazer foi jogar Katniss no chão com força, primeiramente cobrindo seu corpo com o meu e pegando-a em meus braços, fazendo ela largar outra flecha.
Tranquei a porta, depois que entramos no quarto, mas nem tinha tempo para pensar, logo invadiram, mas já estávamos correndo por nossas vidas, e de mais nada ou ninguém. Ela caiu, mas outra vez consegui segura-la.
— Para onde estamos indo?! — perguntou, chorando, de mão dada a minha, enquanto descemos.
— Para um esconderijo. Agora! — a empurrei contra a parede, com uma chuva de balas.
— VOCÊS NÃO VÃO CONSEGUIR ESCAPAR! — A Janine gritou, pude identificar sua voz.
Corre! Corre! — gritei, praticamente deslizando pelo chão, já que estou descalço, como ela, há tempos. — Vamos!
— Ajuda! Eu preciso de ajuda! — ouvimos, com as luzes piscando sobre nós, e eu senti um arrepio gelado na base da minha coluna. O dia já se foi há tempos, já que a cerimônia seria feita durante o pôr-do-sol, agora está bem escuro. E mal completou-se uma hora, embora pareça que estejamos aqui há uma eternidade.
— É a Julia! — exclamei. Corri para ajudá-la, que pareceu se desesperar quando me viu, então eu congelei. Só ouvi o estalo da arma ser colocada pronta para disparar. Engoli em seco ao sentir bem no meu ouvido. Meu coração bateu mais forte do que em qualquer momento da minha vida. Vou vomitar. Vou vomitar. Vou vomitar. E aqui vai cair meu coração bem no chão.
— Eu disse que você não ia fugir — Janine disse. Ergui as mãos, em rendição. Fechei os olhos. Uma gota fria de suor escorreu solitária no meio de todo o suor ardente. É agora. O vômito veio outra vez, mas não consegui pôr para fora. O que senti foi como um beliscão na ponta da minha coluna. Minha cabeça girou. Caí no chão. Caí mesmo, porque não aconteceu.
O tiro dela não veio, um som pior se escutou, uma flecha atravessando sua cabeça, e ela caiu morta bem ao meu lado, aos pés de uma Julia bagunçada, com um bebê no colo.
Não perdi tempo, puxando Katniss, apenas agradecendo com o olhar, para irmos até minha amiga, que não parava de chorar.
— Aqui tem um esconderijo, mas está lotado, e eu não consegui andar — disse, então vi que sua perna estava em um jeito que, eu não acredito que possa ser reversível. Mas depois de tudo o que vi hoje, não foi nada demais. Ao menos ela ainda tem a perna, e está respirando.
— Vamos ajudá-la, espere — eu falei, saindo de onde ela estava, e vi uma pessoa, um homem, sem bandana, que quando me viu, eu pude logo identificar que é Zac.
— Precisei tirar a farda, para poder ajudar mais pessoas — se justificou, mas então ele ficou muito bravo, irado, na verdade. — O que demônios estão fazendo vocês três aqui, senão em um esconderijo?! O rei está com quase todos os médicos no esconderijo real, eu pensei que vocês, irresponsáveis, estivessem lá também!
As luzes piscaram outra vez, dessa vez em um intervalo de mais de cinco segundos, e foi assustador.
— Estamos procurando um esconderijo agora! — Katniss gritou de volta. — Ela precisa de ajuda!
Zac nos ajudou a colocar ela de pé, então a pegou nos braços.
— Não podemos acompanhar vocês dois — falei. — Somos os procurados agora, precisam ir. Vamos procurar um esconderijo.
Nem deu tempo para mais, pois logo mais sulistas (isso tudo pelas roupas completamente diferentes das nossas, e com bandanas) entraram na curva.
— Vá! — Katniss ordenou, pegando outra flecha, atingindo o peito de um, ganhando tempo para nós. — E FIQUE COM ELA!
Zac teve que ir, mas seu olhar de arrasado por não poder fazer algo mais foi triste para todos nós.
Peguei na mão de Katniss, e passei para ela uma arma de um outro guarda, com munição, e só pensávamos em viver, não tinha mais como ter outro objetivo. Eu não sei mais o que estou fazendo, para onde eu devo ir, o que eu vou fazer. Simplesmente estamos correndo. Correndo. E correndo.
Aí quando estávamos no quarto andar, o pior aconteceu, e eu para mim, no meu coração, foi o fim.
Estavam justamente nos esperando. Ficamos encurralados.
— Olha, se não é o nosso ex-futuro casal real, de acordo com as revistinhas — A morena das facas falou, com um sorriso. Como ela pode manter tanta paz?
Seu andar foi bem suave, mesmo com uma das coroas de Katniss na cabeça, reconheci por ser justamente a que ela usava mais cedo.

— Engraçado é não estarem com medo de mim — ela disse, rindo. Não tem mais de vinte e cinco anos. De onde vêm tanto ódio, que escorre de seus olhos? — Katniss, olhe como a coroa é bonita em minha cabeça.

Brincou, rindo. A morena que segurava minha mão apertou sua palma contra a minha ainda mais forte, e eu a dela. Não ceder.

Mas não, Katniss não prendi os olhos no alto, mas em alguém com os olhos esverdeados que nunca nos trairia. Troy. Piscou para mim. Como ele chegou até ali, é um verdadeiro mistério, que eu sinceramente não quero saber como foi que isso se sucedeu.

— Essa coroa fica bem em você, mas tem alguém aqui que fica melhor — Katniss respondeu, então olhou para mim, muito rapidamente, abaixa, e a morena nem percebeu.

— É mesmo? Em quem? — perguntou, com uma faca afiadíssima entre seus dedos. Vi uma fumaça começar a se formar lá atrás.

— Na dona, que por acaso sou eu.

E aí eu apenas me abaixei, com Katniss, quando Troy jogou lá detrás uma bomba de fumaça, e vários disparos foram ouvidos, berros.

— Katniss! — ouvi ela gemer de dor, mas não me soltei dela, agarrando em sua cintura, voltando a correr desesperadamente as escadas, como alvo o quarto do príncipe, por saber que tem algo que eu possa colocá-la para irmos para o esconderijo real.

— Troy! — chamei, mas não pude vê-lo. Katniss foi atingida por uma bala maior bem no ombro. Ela gritava de dor, e não é para menos. Precisou segurar também o vestido, que logo tomou cor vermelha com o próprio sangue.

— Vocês não vão fugir! — Um homem gritou. — Não vão sair vivos daqui.

Vi que ele pegou uma granada. Ou os degraus, ou o quarto do outro lado. Estamos encurralados.

O homem está todo debilitado, e eu poderia facilmente acertá-lo se ainda tivesse minha arma.

Quando eu tive a ideia mais louca da minha vida.

— Fica comigo e cala a boca — falei para Katniss, quando ele desviou o olhar, com todas as forças que tive, agarrei ela, descendo pelo canto, enquanto eles continuavam a disparar para qualquer lado, e a fumaça foi ficando mais e mais pesada. Fogo.

Outra bomba foi estourada, e nós tivemos nossos corpos separados bruscamente, sendo atingidos no rosto e nos braços por estilhaços de vidro e madeira. Gritei de dor, enquanto rolava pelos degraus. Me desesperei quando não a vi. Subi mais dez degraus, socando o homem que tentava enforcá-la, tudo isso em segundos, não víamos nada, apenas sangue.

Depois dessa bomba, as coisas ficaram em câmera lenta, os gritos e berros distantes, mas ao mesmo tempo bem ao nosso lado. Comecei a não conseguir respirar por toda a fumaça densa. Não consigo enxergar mais de 10 centímetros na minha frente.

Joguei ela com força pelos degraus, mesmo vendo seu rosto machucado, para tirá-la dos olhos da mulher das facas, que vinha com tudo.

— Mas você não vai escapar! — ela gritou, mas consegui bater o corpo dela contra a imensa janela de vidro, bati uma, duas, três, quatro vezes, até de seu nariz sair sangue, para então arremessar seu corpo magro sobre os homens que estavam tendo a total noção do que tinha acontecido. Eu não faço ideia de onde consegui algum tipo de força para conseguir fazer isso. Minhas mãos não param de tremer.

Praticamente voei até Katniss, ainda caída, pisoteada por outros que viam ela, mas aparentemente desistiram de estar ali ou algo do tipo. Peguei ela pela mão, desesperadamente.
Ela foi me acompanhando, mas cambaleava, por causa de toda a fumaça. Saia sangue feito uma cachoeira de seu ombro.
Depois de escaparmos da fumaça, não nos escapamos de tiros, por ter sido ativado o alarme de incêndio, mas consegui empurrar-nos para debaixo de uma mesa.

— No a gente vai até o outro lado, tem um armário direto para o esconderijo real.
Indicou, tonta. Eu pensei estar perdendo ela. Me desesperei, sem tentar sucumbir o medo de perder sua vida.

Não esperei pelo já.

Nos empurrei, deslizando meu corpo, com o dela sobre o meu, alcançando uma arma, quando vi vários guardas e pacificadores serem liderados por Troy, já fuzilando contra a escada que estávamos.

Três vieram ao nosso encontro.

— Corram com ela daqui! — gritei, passando Katniss para o colo de um deles, Sebastian, se não me engano. — Sumam com ela! Levem ela para o hospital agora! Pelo amor de Deus, ela foi atingida por várias coisas!

— O quê?! Peeta! Não! Você tem que vir comigo! — ela berrou, chorando, mas eu sei que não posso acompanha-los. Eles tiveram pena. — PEETA!

— Não a escutem, apenas sumam daqui, saiam correndo para o primeiro lugar que der no esconderijo real, ela não pode ficar aqui, querem matá-la a todo custo!

Logo, antes que eu mal terminasse, saíram correndo, protegendo-a, e eu fiquei ali, embaixo na mesa, abraçado a mim mesmo, escutando ela berrar, seja de dor como por eu ter ficado aqui.

Eu vi que só tinha como um de nós passar a tempo de ter proteção. Que fosse ela.
Engatinhando, para debaixo de mais uma mesa, vi a porta que dava para mais um esconderijo, como ela tinha dito.

Corri, a tempo, fechando, dando graças por estar sozinho, mas um estilhaço bateu bem no meu relógio, que abriu a porta, mas fechou, e eu não vou ter como abrir sozinho.
Cambaleei, desnorteado, caindo sem rumo, e batendo minha cabeça na parede, caí definitivamente inconsciente no chão, gelado, sem ouvir mais nada. A única coisa que eu sabia é que, como se a própria Natureza soubesse de todo o caos que aconteceria hoje, a última coisa que escutei foi a chuva lá fora.

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Pessoal, é isso, infelizmente, nesse não veio nada sobre finais felizes ou coisas do tipo, mas virá no próximo, que está com meio caminho andado, e como eu estou muito triste, é capaz de não levar muito tempo para postar. Infelizmente, não posso deixar uma data, porque eu não confio muito em mim para nada não. Vou deixar com vocês um trecho.

Música: Breathing, Ariana Grande
Trecho: "— O povo quer um líder, mas não uma soberana absoluta.
— E como esperam que eu faça isso? Como eu vou fazer isso sozinha? Meu pai está no Canadá com Prim, sem a menor possibilidade de transferência para cá.
— Bem, não queremos, e nem estamos na posição de pedir alguma coisa, e nem há o que cobrar de você nesse momento, mas fazer uma escolha para seu casamento, com algum dos dois Selecionados que indicou para a Final.
Suspirei, concordando. Encarei todos aqueles gráficos, e papéis que já tinha para que eu lesse e posteriormente venha assinar até o pôr-do-sol.
— Quanto tempo eu tenho até poder fazer um pronunciamento para todo o País?
— Quando achar que estiver ok o suficiente para trazermos algumas pessoas para te entrevistarem. Amanhã pela tarde, seu quarto será liberado, há uma equipe generosa trabalhando para mudar o ambiente, assim como o de sua mãe, que ocupava a suíte da Rainha. Pode escolher para onde irá ficar a partir de agora, amanhã, e então, se sentir confortável, fazer o pronunciamento."

Esse foi bem pesado, com algumas cenas difícies de escrever, mas eu graranto que no próximo não vamos ter todo esse clima, e nem milhares de milhões de questionamentos por parte da Katniss, que estará com a mente bem no lugar, mesmo depois de tudo isso o que está acontecendo, ok? Eu vou estar respondendo todos os comentários lindos que vocês me deixaram no capítulo anterior ainda nesta madrugada, e mais uma vez, gente, eu peço perdão. Apenas não é exatamente toda a alegria dos meus status dos Instagram ou memes do WhatsApp. Queria que minha vida fosse uma fanfic, e eu pudesse resolver as coisas da forma que eu gosto, do jeito que eu quero. Infelizmente eu não posso. Mas garanto que essa fic aqui terá um final bom, de paz, e é exatamente o que eu desejo para você que está lendo isso aí do outro lado da tela. Obrigada por tudo. E me perdoem.

(Obs para quem acompanhava A Proposta, eu repostei no mês passado, ela já está toda disponível!)



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