Além do Caos escrita por Um Alguém


Capítulo 6
Capítulo 6




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Ficamos deitados sem dizer nada por um longo tempo, só encarando o teto manchado e cheio de rachaduras. Minha perna estava doendo bastante, mas eu tentava não pensar nisso. Em determinado momento senti Dexter segurar minha mão, entrelaçando nossos dedos.

– O que está fazendo? - perguntei virando só o rosto para ele.

– Pensando. - respondeu ele distraidamente.

– Me refiro a isso. - levantei nossas mãos juntas.

– Ah, sim. Estou segurando a sua mão.

– Isso eu já notei, Dexter. Quero saber o por quê.- disse perdendo a paciência.

– Porque quando anoitecer eu vou sair para ir encontrar o Luke e o resto do pessoal. E você provavelmente não vai querer ir comigo. Então estou aproveitando nosso tempo juntos.

– Você fala como se fôssemos um casal apaixonado prestes a se separar para sempre. - soltei minha mão da dele.

– E não somos? - perguntou ele virando de lado para olhar.

– Claro que não.

– Qual a probabilidade de nos encontrarmos por acaso de novo?

– Certo, talvez nós não nos vejamos mais. Mas não somos um casal, muito menos apaixonados.

– Certeza? - insistiu ele.

– Você só pode estar brincando. - desdenhei virando-me para ele.

– Sabe, olhar seus olhos assim de perto é como observar um céu noturno ou um belo amanheceri¹.

– Isso não é uma música? - perguntei desconfiada.

– Talvez. Mas é verdade. - ele aproximou o rosto do meu e assim que seus lábios tocaram os meus dei-lhe um tapa, me afastando rapidamente.

– Você ficou louco?! - questionei chocada já de pé ao lado da cama. Ele sentou-se com a mão na bochecha.

– Você podia só ter dito que não queria. - comentou ele tranquilamente, levantando e parando a minha frente. - A menos que você quisesse. - ele fez menção de chegar mais perto e eu recuei.

– Para! - ordenei impetuosa. - Chega desse joguinho. Eu cansei. Nunca mais encoste em mim.

Manquei até o banheiro, trancando-me no minúsculo cômodo. Meu coração martelava no peito. Tudo que eu conseguia pensar era em como ele tinha se atrevido. Parei de frente para o espelho sobre a pia. Ele estava todo rachado, e por um momento vi alguma semelhança entre nós dois. Havíamos sobrevivido, ainda estávamos ali, mas tínhamos tantas cicatrizes que era difícil nos reconhecer.

Fiquei observando meu reflexo distorcido no espelho quebrado até não aguentar mais a dor na perna. Saí do banheiro caminhando lentamente. Dexter estava sentado no chão, ao lado da cama, brincando com meu canivete. Sem dizer uma palavra ou lançar-lhe sequer um olhar, fui para a cama e deitei-me de lado, ficando de costas para ele.

– Rach, eu…me desculpa. - disse ele com a voz lânguida. - Prometo que não vou mais tentar te beijar nem nada do tipo.

Não respondi. Poderia dizer algo que não devia ou do qual me arrependeria depois. Ele também não disse mais nada. O único som no pequeno flat era o do canivete raspando no chão. Minha perna estava latejando. Estava difícil manter os olhos abertos e eu não sabia dizer se era por causa do cansaço ou da dor. Por fim, deixei-me levar e apaguei.




Assim que acordei me deparei com Dexter deitado na cama a poucos centímetros de mim, com a mão na minha cintura. Pensei em empurrá-lo da cama ou dar-lhe outro tapa, mas achei melhor usar uma abordagem menos agressiva um pouco.

– Dexter. - chamei-o cutucando seu peito. - Dexter.

– Hum…

– Acorda, Dexter. - cutuquei-o com mais força e ele abriu o s olhos. - Pode explicar? - gesticulei para sua mão na minha cintura.

– Claro, claro. - ele parecia meio constrangido, mesmo assim não se afastou nem moveu um músculo. - Você estava tendo pesadelo, se debatendo e tudo mais, então deitei aqui para te acalmar.

– É mesmo, é? - perguntei descrente. - E o que você fez, alguma mágica?

– Não, eu só fiquei aqui e disse que estava tudo bem, que não ia deixar nada de ruim te acontecer.

– Achei que fosse parar com esse joguinho de te tentar me conquistar.

– E vou. Quer dizer, já parei. Não acredita em mim? - perguntou ele com olhar inocente.

– É meio difícil acreditar com você com a mão na minha cintura e esse papinho.

– Caramba, você é durona, hein? Não alivia nem quando eu sou inocente.

– De inocente você não tem nada. - pontifiquei.

– Você realmente acha que eu sou um cafajeste safado, não é? - perguntou ele chegando ainda mais perto. Não respondi e ele tomou isso como um sim. - O que eu fiz para você pensar isso de mim?

– Quer que eu faça uma lista? - perguntei com um sorriso involuntário.

– Ah, você está brincando. Eu não fiz nada. - contrapôs ele indignado.

– Só tentou me beijar. - lembrei-o.

– Só. - concordou.

– Só?

– É.

– E os flertes todos?

– Flertes? Essa palavra ainda é usada? - perguntou ele se divertindo.

– Está fugindo do assunto.

– Certo. Talvez eu flerte um pouco com você as vezes. - assumiu. - Mas só porque é muito legal.

– O que tem de tão legal nisso? - quis saber curiosa.

– Não sei, acho que eu gosto das garotas difíceis. - ele piscou para mim e abriu um pequeno sorriso. - E você joga bem esse jogo, é inteligente.

– Eu não jogo nada, você que joga. - disse-lhe. - E o que te faz pensar eu sou inteligente?

– Você não me deixou te beijar.

– Então se eu tivesse deixado seria burra?

– Está vendo só? - ele ria abertamente. - Está jogando comigo. Se continuar fazendo isso vou acabar me apaixonando. - ele chegou mais perto. Agora a proximidade era tão grande que nossas respirações se misturavam.

– Não começa com isso, Dexter. Chega para lá. - disse empurrando seu peito. - Você prometeu que ia parar com essas coisas.

– Eu não estou fazendo nada, Rach.

– Eu estou falando sério, se você não parar eu vou te dar outro tapa. - alertei-o quando sua mão deslizou da minha cintura para as minhas costas.

– Eu estava pensando que você devia ir comigo para o casarão encontrar o pessoal. - disse ele tranquilamente, ignorando-me. - Você precisa de cuidados médicos.

– Dexter.

– Eu sei, eu sei, você não pode ficar com a gente senão todos morreremos. Tudo bem. Eu não estou falando isso. Estou só dizendo que você poderia ir comigo, aí a Kristin e a Sally dariam uma olhada na sua perna e depois você iria embora ou faria sei lá o que.

– Com certeza não há nenhum tipo de segunda intenção nessa sua proposta maravilhosa, não é? - perguntei debochada tentando não pensar na pressão que a mão dele fazia nas minhas costas ou na intensidade do seu olhar.

– Você tem uma imagem deturpada de mim. Mas eu não me importo.

– Claro que não.

– E então, vai comigo ou não?

– Se eu disser que não você não vai me deixar em paz, não é?

– Exato.

– Então eu posso pensar um pouco antes de responder?

– Claro, minha faísca. - ele abriu um largo sorriso.

– Faísca? - questionei confusa.

– Faíscas são imprevisíveis, bonitas e potencialmente perigosas, como você. - explicou ele abaixando o tom de voz. - E quando está escuro lá fora e ninguém está por perto, você continua brilhandoii.

– Isso é outra música, Dexter. - acusei-o tentando fugir do olhar dele.

– Mas não deixa de ser verdade. - ele se inclinou e me deu um beijo de leve na bochecha depois se afastou com um sorriso brincalhão. - Durma um pouco, vamos precisar estar descansados para ir para o casarão.

– Eu não disse que vou. - lembrei-o.

– É, mas eu sou um cara esperançoso. - e então virou para o outro lado da cama me deixando sozinha com minhas inquietações.






i I Won't Give Up - Jason Mraz - trecho da música citado -> "When I look into your eyes It's like watching the night sky Or a beautiful sunrise"

ii Last Hope - Paramore - trecho da música citado -> "And when it's dark out No one's around, it keeps glowing"


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Notas finais do capítulo

Críticas, sugestões e elogios são sempre bem vindos. Vejo vocês por ai, Sobreviventes :)



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