Eu de Letras, ela de Irônicas escrita por Sr Devaneio


Capítulo 16
Capítulo 16 - Rashley


Notas iniciais do capítulo

É bom estar de volta! :')
(Meu notebook estragou novamente, pra variar. Perdi umas cenas MUITO bacanas e isso me desanimou pra caramba.
Tive que recomeçar esse capítulo aproveitando as poucas memórias que eu tinha do trecho que perdi, espero que tenha ficado bom ou melhor que antes)
Desculpem pela demora, boa leitura!
(Saudações formais aos novos acompanhantes da história! Sejam todos muito bem-vindos :) )
Este capítulo do retorno é dedicado à minha queridísima J Stanesco. Amiga, escritora, leitora e beta nas horas vagas, é o maior amorzinho da vida. J, espero que goste do seu capítulo, pois foi feito com carinho e possui aquela essência legal de "voltei!" hsuahasushau (?).
Boa leitura ;)



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            Então, era hoje. Às 18h30, no Bouley Vegan’s – o restaurante com um dos melhores cardápios veganos e não-veganos do país. Meu “encontro” com Rashley.

            Sinceramente? Pensei em desmarcar. Mais de uma vez. Mas já estava super em cima.

Por mais que meu cérebro usasse todos os ótimos argumentos que ele tinha para conduzir meus dedos ao contato da loira no meu celular e envia-la uma mensagem que me libertasse. Mas... eu tinha dado minha palavra. Eu não tinha coragem de desmarcar o compromisso, a poucas horas de acontecer, sem um bom motivo. Fora de cogitação...

            Após ficar enrolando ao máximo (até pensei em adiar as aulas de dança com Anna), finalmente chegou o horário de eu ir me arrumar. Não me levem a mal, mas é que eu ainda estava com os dois pés atrás com esse convite da Rashley. Já são mais de um ano tendo que conviver com os apertos repentinos dela e algumas vergonhas passadas no meu local de trabalho.

            Às seis e vinte e três eu estava em frente ao Bouley’s. É incrível como, para as coisas que mais nos atraem, conseguimos nos atrasar, mas, para aquelas que tentamos evitar ao máximo... Como eu tinha sido tão rápido?

Lá estava ela. Sentada à mesa reservada para dois, uma expressão ligeiramente... apreensiva? Talvez tivesse um pouco de receio misturado também. Ela ainda não conseguia me enxergar através de uma das imensas janelas de vidro do local, o que era bom de alguma forma.

Suspirei. O.k., vamos logo com isso.

Pessoalmente, ver a expressão de Rashley aliviar perceptivelmente me deixou um tanto quanto desconfortável. Me senti meio mal por ter cogitado dar um bolo na moça.

— Boa noite! - cumprimentei com um sorriso que eu sinceramente esperava não ter sido falso.

— Andrew! Olá - ela se levantou.

Tentei argumentar dizendo que não havia necessidade, mas mesmo assim ela o fez. Retribuí seu abraço caloroso.

Rashley estava realmente feliz em ver que eu tinha cumprido com o combinado... Caramba.

— Boa noite! - ela continuou – Fico muitíssimo feliz que tenha vindo. Como você está?

— Bem, obrigado. E você?

Ela fez um gesto indicando a cadeira ainda vazia à sua frente. Sentei-me.

— Estou feliz – ela riu brevemente – Uau, você está muito bonito esta noite. Quero dizer, você sempre está... você é bonito, isso, mas está mais hoje... Ahn...

Acabei rindo de seu embaraço. Aquilo me relaxou um pouco.

— Eu entendi, Rashley. Obrigado! Você também está encantadora. - respondi e surpreendi-me com a veracidade contida na frase.

Ela usava um vestido com um tom de rosa suave, que ia até o joelho, elegante e com um cinto fino dourado amarrado à cintura – e que combinava com sua sandália discreta de marca. Usava um perfume suave desta vez, maquiagem leve e havia deixado os cabelos soltos, caindo por sobre os ombros formando cachos dourados nas pontas. Ela estava, realmente, encantadora.

Mais surpreendente ainda era o fato dela não ter me elogiado com alguma provável segunda intenção. Não, Rashley tinha sido genuinamente sincera, mas sem nenhuma malícia no que disse e isso me relaxou ainda mais – apesar de ser curioso.

— Eu estava pensando aqui... prefere comer ou conversar primeiro? - perguntou ela.

— Você se refere àquele assunto?

— Isso. O que nos trouxe aqui, por assim dizer...

Parei para pensar. Há pouquíssimo tempo eu até queria que a experiência passasse rápido, mas depois desse começo... Como claramente nesta situação eu devia dar uma resposta objetiva, respondi que a conversa poderia esperar um pouco. Podíamos ir fazendo os pedidos e conversando sobre outras coisas enquanto isso.

— Certo, então. Estou com você. - brincou, antes de pegar o cardápio.

Fiz o mesmo e não muito tempo depois, um garçom apareceu. Ela pediu uma salada brasileira e eu optei por algo que tivesse um pouco de carne. Quando ele perguntou a respeito da bebida, Rashley olhou para mim e eu devolvi o olhar. Nenhum de nós tinha pensado naquela parte, então optamos rapidamente por sucos.

— Bem, como foi seu dia? - tomei a iniciativa de puxar assunto quando o garçom saiu.

— Foi... tranquilo. Fui resolver umas coisas e depois fiquei em casa, esperando o momento de começar a me arrumar – ela riu com nervosismo. Espera, quer dizer que ela estava ansiosa por isso? - E o seu?

— Foi bem... monótono. Tranquilo, mas monótono.

— Entendi... – ela respondeu.  E então, me encarou por alguns segundos.

— Há algo errado? - imediatamente levei a mão direita até meu olho, conferindo se meus cílios por acaso não estariam desalinhados nem coisa e tal.

— Ah, não, não. Está tudo certo com você e, bem, seu olho – ela brincou ao ver minha reação incomum.

Opa!

Tentei disfarçar com um sorriso.

— Foi instintivo, desculpe. - ri.

Ela riu junto comigo.

— Não, tudo bem. Todos temos alguma mania...

— O quê, não. - eu ainda ria – Essa mania não é minha. Acabei me acostumando, ao que parece.

Ela fez uma expressão de quem não entendeu muito bem, mas assentiu.

Anna! Céus, isso foi ligeiramente embaraçoso...

— Claro, claro. Entendi – respondeu ela, divertindo-se – Eu achei peculiar, mas de um jeito legal... A pessoa de quem você "puxou" isso ou é espontânea demais ou muito detalhista.

Realmente. Pode acreditar que ela consegue ser as duas coisas.

— Ei Andrew, eu... posso perguntar uma coisa? - perguntou ela

— Pode... claro.

Eu já havia acabado quebrando o gelo, de qualquer forma...

— É uma dúvida boba, mas por curiosidade: há quanto tempo você faz exercícios físicos?

— Bem... - contei mentalmente – contanto com este, já fazem três anos.

— Nossa, é bastante tempo! Já deu para se acostumar bastante, então...

— Sim. Para mim, já se tornou rotina ir treinar e tudo o mais... Mas e você, também é adepta do culto ao corpo? - brinquei.

— Bem, eu faço exercícios diários desde o começo do ano. Comecei ioga há pouco tempo e fiz boxe até o meio do ano – ela riu.

Por isso ela era inegavelmente em forma!

— Boxe? Uau! Eu não... imaginava. Tenho vontade de começar também.

Ela se animou:

— Começa sim, é muito bom! Só estou dando um tempo pra poder focar em outras atividades, mas pretendo voltar depois. Eu adoro!

— Imagino... deve ser bem maneiro aprender a dar uns bons socos. Autodefesa nunca é demais.

— Realmente... Mas mudando de assunto, como vai a universidade?

— Está bem tranquila, por hora. Obrigado! E... como vai a vida?

— Está indo. Sempre alguma coisinha para resolver, mas nada muito berrante.

Nesse momento, nossos pedidos chegaram. Naturalmente, o assunto deu uma diminuída enquanto comíamos - o que não necessariamente implicava em silêncio absoluto. Passamos a conversar com mais reserva entre uma garfada e outra, mas ainda assim foi agradável.

Quando terminamos, uma dúvida que eu tinha me veio à cabeça. Será que eu tinha espaço suficiente para perguntar? Bem, não custa tentar.

— Rashley? - chamei-a enquanto ela terminava de limpar os lábios.

— Hum? - ela respondeu prontamente.

— Eu... posso te perguntar uma coisa? Pode ser algo um tanto quanto pessoal.

Ela considerou o pedido por alguns instantes.

— Pode sim. Sem problemas. - sorriu.

— Isso não é da minha conta, e eu peço desculpas antecipadamente, mas é algo que me chama a atenção...

— Uhum.

— Você é uma moça que chama a atenção, é bem resolvida, independente e tudo o mais, então porque ninguém te acompanha? Digo, amigas e tal? Você me passa a impressão de ser bastante popular entre seus conhecidos, mas eu nunca vi ninguém acompanhá-la em suas idas à livraria, muito menos esperar do lado de fora, se fosse o caso... - eu tentei escolher as palavras ao máximo para não parecer muito invasivo ou curioso ou até mesmo ofendê-la de alguma forma.

Ela me observou por um instante. Em seguida, passou o dedo no lóbulo da orelha esquerda com um olhar pensativo. Deveria estar pensando em como me responder e me senti um intrometido na hora.

— Certo, vou te contar. Isso tem a ver com o que viemos conversar aqui, então provavelmente já vamos engatar os assuntos.

Ela estava com um olhar meio triste ou era impressão minha?

— Na verdade, Andrew, eu devo começar te pedindo desculpas. Por pular em cima de você, assusta-lo, surpreendê-lo, deixá-lo sem-graça, dar em cima de você e, bem, tudo o mais que eu já tenha feito contigo que invadiu o seu espaço. Me desculpe, sinceramente.

Espera... isso foi repentino!

— Eu tenho estado bastante pensativa já a algumas semanas... Minha psicóloga concordou que seria bom se eu abrisse o jogo com você com relação a isso, já que você é uma das vítimas.

Isso estava começando a me assustar, ligeiramente.

— Nunca fui muito de fazer amizades, sabe? Desde o Ensino Fundamental, nunca consegui fazer uma melhor amiga que fosse. As pessoas sempre acabavam se afastando de mim, depois de aproveitar o máximo que podiam – ela devia estar se referindo ao fato de o pai ser dono de uma rede de livrarias famosas em todo o país -. Só piorou no Ensino Médio. Como meus pais sempre trabalharam muito e eu nunca tive irmãos ou irmãs, acabei tendo que me conformar com a minha própria companhia e a dos livros.

E então, eu havia entendido tudo. Se o que Rashley estava me explicando era verdade, então na verdade...

— Mas apesar de eu adorar os livros e as histórias neles contidos, nenhum, deles era para sempre e eu novamente ficava sozinha. Por mais que eu lesse, sempre que acabava isso me acontecia: eu terminava uma leitura a companhia que os personagens me faziam desaparecia. A falta que eu sentia de alguém estava sempre presente. Mesmo quando se ausentava (nesse espaço de tempo entre a primeira e a última página), ela sempre estava lá. Nem mesmo as crianças conseguiam preencher completamente esse vazio. - ela parou para prestar atenção à minha reação por um momento. Falava devagar e pausadamente, para que eu compreendesse de primeira. - Isso acabou me gerando uma carência um tanto quanto excessiva, e aí eu te achei. Um cara inteligente, gentil, legal, respeitoso e bonito... Lembra do dia em que você me ajudou a achar um título e ainda me sugeriu alguns livros?

— Eu tinha acabado de começar a trabalhar... Lembro sim. - Não pude evitar a sensação de nostalgia que me acometeu.

— Pois bem...  Eu me deixei levar pela falta que sentia e acabei misturando um monte de coisas. E aí... - ela suspirou – sei que passei uma impressão totalmente errada sobre mim. Mas o pior de tudo era que eu queria forçar algo que simplesmente nunca nem teve chances de acontecer e estraguei mais uma oportunidade de ter um amigo – ela deu um sorriso breve e triste antes de olhar bem nos meus olhos e dizer – Me desculpe de verdade.

Então, durante todo esse tempo, eu realmente tive uma impressão errada sobre Rashley. Ela poderia ser um pouquinho mimada, talvez, mas era completamente vazia de sorrisos e momentos compartilhados com alguém de quem se gosta. Rashley era sozinha.

Era... compreensível, até.

Ela olhava para baixo, ainda com aquela tristeza no olhar. Fiquei com dó, mas não foi por esse motivo que eu disse:

— Desculpo. Claro. Desculpo, sim...

Ela levantou o olhar e uma lágrima singela escorreu. Rapidamente ela a secou assim como seus olhos.

— Eu sou alguém com questões internas complicadas, mas... por favor não sinta pena de mim.

E ela não foi grosseira ou rude em seu pedido. Estava mais para suplicante.

— Não sinto. Quero dizer, não desta forma... Está tudo bem, o.k.? Agora eu compreendo.

Enfim, ela assentiu. Mantinha um sorriso fraco nos lábios.

— Obrigada por entender. Sério.

— Que isso!

E então ficamos em silêncio. Eu não sabia mais o que dizer. Após um tempinho, ela falou:

— Agora que terminamos, acho que seria bom se desocupássemos as mesas...

Eu entendi o que ela queria dizer.

— Tudo bem, vou pedir a conta.

— Não precisa, eu pago. - dito isto, ela chamou o garçom que havia nos atendido. Ele estava próximo.

— Espera. Rashley, tudo bem. Eu pago desta vez, o.k.?

Ela me lançou um olhar direto:

— Não, Andrew. Fui eu quem o convidou; eu pago. Pode deixar.

Não estava tão confortável quanto antes.

— Rashley, por favor – insisti –. Não precisa se preocupar comigo, o.k.?

— Andrew...

— O.k., então.  E se cada um pagar o seu? - cortei-a, ainda na esperança de fazê-la repensar sua decisão.

— [...] eu insisto. Sério. - disse ela.

Caramba, e agora? Eu estava sem jeito, sem graça e não sabia mais o que dizer ou como insistir.

O garçom chegou.

— Tudo bem. Relaxe, rapaz! - disse ela para me tranquilizar enquanto entregava o cartão de crédito ao jovem que estava nos atendendo.

— Rashley... - suspirei. Já estava feito -. Obrigado.

— Não tem problema. E ei, calma. Você não estará em débito comigo nem nada do tipo – ela acrescentou e riu. Um sorriso genuíno.

Eu sempre achei Rashley linda. O que estragava realmente era a fixação súbita dela por mim. 

Mas agora que ela tinha me contado o que acontecera e, de certa forma, me abriu uma oportunidade de conhecer a "verdadeira Rashley" (como ela mesma tinha dito no convite que me fez) quem sabe não nos tornássemos amigos? Ela realmente estava me surpreendendo, tanto no papo quanto no comportamento.

Quando saímos do restaurante, ela se virou para mim e falou:

— Obrigada, mesmo, por aceitar o convite.

— Imagina, Rashley, eu que agradeço!

Ela riu.

— O que foi? - perguntei, começando a rir também.

— Posso estar sendo presunçosa demais, mas... se quiser me chamar apenas de "Rash", tudo bem pra mim.

Desta vez, eu sorri.

— Certo, Rash. Obrigado pela oportunidade, por se desculpar e explicar tudo. Desculpe se em algum momento eu fui invasivo demais ou qualquer coisa assim.

— Não foi, não. Fica tranquilo... Nossa, sinto que tirei um peso das costas! - ela brincou, apesar de eu saber que havia seriedade naquela frase.

Então me lembrei de algo que ela disse durante a conversa.

— Ei, Rashl... Rash, quando estávamos conversando, você disse a palavra "crianças". Você disse "nem mesmo as crianças conseguiam preencher completamente esse vazio"... Posso perguntar que crianças seriam?

— Bem, que horas são?

— Sete e cinquenta e dois...

— Tem algum compromisso marcado para esta noite? Tudo bem em demorarmos só mais um pouquinho? - ela perguntou.

— Hum... Não tenho nada marcado, não. Claro, por mim tudo bem.

— Beleza, então. Quer conhecê-las? Digo, as crianças...

— Sim. - quaisquer que fossem as crianças, eu sentia que algo bom estava para acontecer.

— Certo. Vem comigo, vou te apresentar a elas. - ela falou, começando a andar em direção ao seu carro, não sem antes fazer um sinal para eu segui-la.


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Notas finais do capítulo

O que acharam do nosso capítulo de retorno?
Comentem. Serinho, eu sinto falta de vocês.
Se você é nov@ aqui, quero te conhecer!
Portanto, comentem. Mesmo que seja "amei, continua" (sério). ^^
(Ah! Segunda-feira levo o notebook estragado para o técnico. Vamos torcer para que ele consiga recuperar os arquivos de lá, assim a próxima atualização chega mais rápido visto que o capítulo já está adiantado :)



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