Mascarade escrita por Last Mafagafo


Capítulo 7
Capítulo 7 - O Persa


Notas iniciais do capítulo

Desculpe a demora...
Boa leitura!



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Mme Giry reclinara-se sobre a cama de Blanche. Com um copo d'água na mão, ela lançou seu conteúdo sobre o rosto da moça, que acordou com o susto. Mme Giry não estava de bom-humor. Na noite anterior Blanche havia perdido a apresentação e naquela manhã não acordara quando fora chamada. A senhora puxou o cobertor que abrigava a moça e a deixou sentir o frio que entrava da janela, aberta havia poucos minutos pela própria madame. Blanche não se mexeu.

A verdade é que não estava se sentindo bem. Seu corpo parecia ter grudado na cama e seus olhos não abriam de maneira alguma. Blanche sentia os machucados do dia anterior, a maioria já ganhando tons de roxo, a sensação de ter rolado escada abaixo até o último subsolo da ópera. Mas Mme. Giry estava alheia àquilo tudo e a fez levantar da cama a qualquer custo. Ela ralhava sobre sua falta de responsabilidade e preguiça, reforçando que qualquer bailarina da França gostaria de estar no seu lugar.

Blanche enfim levantou, colocou roupas de “mulher decente” e rumou para a ópera, que ficava ao lado da pensão das bailarinas. Lá ela colocou o corsellet e o tutu, calçou as sapatilhas e se juntou às outras para os ensaios. Enquanto se trocava, pensava que nenhuma bailarina da França gostaria de ter passado pelo que ela passara e, se Mme. Giry soubesse, não teria a tratado daquela maneira. Ela pensou em dizer tudo, mas o medo do fantasma falou mais alto.

Entre um pliê e um relevê, ela não parava de pensar nos seus encontros com o Fantasma. Só de pensar na sua quase morte no dia anterior tinha calafrios. Ainda podia sentir seus dedos agarrando seu pescoço, apertando até que o ar desaparecesse. Ou ver seu rosto deformado e ouvir seu grito desesperado de tristeza. Podia sentir suas mãos frias agarrando seus pulsos e a jogando naquele barquinho para levar Christine de volta à superfície. Aliás, onde estaria Christine? Teria se recuperado?

— Blanche, aconteceu alguma coisa ontem? - sussurrou Meg para a amiga.

Ela se surpreendeu. Será que Meg havia percebido sua ausência? Será que ela suspeitava daquela história maluca do fantasma? Impossível…

— Não. O que quer dizer com isso? - perguntou.

— Jared não para de te olhar. Parece estar querendo chamar sua atenção. E ontem… Bem, eu e mamãe vimos vocês sozinhos - Meg corava.

Blanche olhou para Jared e percebeu que ele a observava, como Meg havia descrito. Ele sorriu de forma sedutora e parecia estar dedicando seu ensaio a tentar lhe encantar. Seus passos à perfeição e o galanterismo em sua apresentação eram de tirar o fôlego. Jared era um homem bonito, o que a deixava com o ego inflado por receber sua atenção. Porém ela sabia que, no fundo, seria apenas mais uma de suas aventuras. Depois de quase morrer duas vezes na mesma noite e pelo mesmo carrasco, Blanche não se sentia nem um pouco seduzida a passar uma noite com aquele bailarino arrogante. Se a vida era tão frágil, não gostaria de desperdiçar um minuto sequer se apaixonando por alguém que não estava disposto a se apaixonar por ela.

— Não se preocupe, Meg. Eu não tenho intenção nenhuma em ser seduzida por Jared.

— Espero que não, Blanche. Você pode se machucar.

Mme. Giry olhou de modo repreensivo para as duas, que se calaram de imediato. Praticamente no mesmo instante os novos diretores da ópera entraram com Carlotta entre eles. Todos exibiam grandes sorrisos e gestos expressivos. Carlota mantinha sua cabeça altiva, os cachos grossos e ruivos alinhados pomposamente sob um chapéu roxo com penas e todo este conjunto balançava de um lado a outro conforme sua cabeça altiva se movia. Os vestidos de babados arrastavam no chão. Os diretores pediram a atenção de todos, que se silenciaram e olharam para eles.

— Gostaríamos de anunciar o retorno da maravilhosa Carlotta, nossa eterna prima-donna, ao espetáculo desta noite.

Ninguém pronunciou uma palavra. Apenas Mme Giry deu um passo a frente.

— Senhores, e quanto aos pedidos do Fantasma? - ela perguntou, de modo altivo e autoritário. O trio pareceu incomodado.

— Este senhor não deve e nem irá se intrometer nos assuntos desta ópera. O reinado deste Fantasma já durou tempo demais. Carlotta voltará esta noite.

Um burburinho começou a crescer nos bastidores, a maioria contra a decisão dos diretores. Todos sabiam do que o Fantasma era capaz. Blanche mais que todos eles. Os diretores acabavam de declarar guerra. Algo de ruim estava destinado a acontecer a partir de então. Carlotta, que desejava ser ovacionada pelo elenco em seu retorno se sentiu completamente ofendida, e ameaçou desistir de se apresentar.

Para maior desespero dos diretores ouviram-se palmas e assobios dos empregados e o restante do elenco, o que humilhou ainda mais Carlotta, que percebeu não ser desejada. Os diretores tentaram bajulá-la novamente, mandando que todos se calassem. Quando Carlotta decidiu voltar atras, por fim, os diretores incentivaram a saudá-la com palmas e vivas.  Ninguém realmente se esforçou, mas Carlotta deu-se por satisfeita e se retirou, demandando mil e um pedidos absurdos.

Carlotta se sentia ameaçada por Christine e, mesmo que não houvessem batido uma palma sequer, ela voltaria à ópera. Seu medo era o mesmo de todos os artistas: ser esquecida pelo público. Sim, porque a sociedade que um dia a adorou e ovacionou, aplaudindo de pé suas performances e a chamando diva, um dia, sem mais nem menos voltava aquele mesmo amor para uma moça mais jovem e de olhar angelical.

O amor do público era frívolo e transitório. Carlotta sabia disso e havia sentido a dor do esquecimento logo após de perceber que sua substituta não só tinha sido à altura de seu talento, como também a ultrapassava em encanto e naturalidade. Parecia um anjo celestial. Carlota, ferida e assustada, apressou-se em voltar para a ópera e encontrou nos diretores dois parvos que ainda não sabiam gerenciar o mundo artístico, de modo que conseguiu triunfar ao final deste pequeno dissabor.

Retomaram aos ensaios e, pouco tempo depois, Christine aparecia para se juntar aos demais. Ela voltou ao seu posto inicial no espetáculo e voltou a representar uma escava, se tornando mais uma bailarina, como era antes. Pobre Christine, depois de um breve sopro de sucesso, era obrigada a voltar do ponto inicial sem nem mesmo ter feito algo que justificasse sua decaída. Ela parecia triste e mantinha-se calada.

— Christine, não fique triste. Ao menos você foi descoberta. Poderão aparecer outras oportunidades - disse Meg, com doçura.

— Não estou triste, Meg. Talvez seja melhor assim . É, com certeza é melhor assim - disse Christine, se mantendo misteriosa.

Blanche não quis falar nada sobre o Fantasma. Pensou que, se apenas ela se lembrasse do que acontecera, Christine estaria fora de perigo. Quanto a ela, talvez um dia se esquecesse que aquilo realmente ocorrera. Talvez um dia até pensasse que havia sonhado, como mocinha impressionada que era. Continuou calada, perdida em pensamentos, até o final do ensaio. Pensava se não deveria fugir, para bem longe da ópera, se não deveria procurar outro lugar para viver. O Fantasma ainda poderia mudar de ideia e, um dia, a encontrariam pendurada por uma corda em algum lugar dos subterrâneos, assim como acontecera co o Sr. Buquet, o maquinista-chefe.

Mme Giry as liberou do ensaio e o grupo se dispersou. Blanche decidiu voltar ao Maison de las Ballerines e descansar um pouco mais. Seu corpo ainda estava dolorido, apesar da adrenalina da dança ter suavizado a sensação. Ainda assim ela sabia que quando se acalmasse a dor voltaria com todas as forças. Porém, no seu caminho, uma figura curiosa se aproximou. Era o Persa.

O Persa era um homem misterioso que vivia visitando a ópera e andando pelos corredores e subterrâneos. De pele morena e olhos verdes, estava sempre usando um chapéu de astracã. Ninguém o interrompia ou perguntava o que fazia lá, apenas o deixavam passar. Alguns diziam que era um investidor, outros que era jornalista. Especulavam até que seria um policial disfarçado. O fato é que deixavam o Persa andar livremente pela ópera de Paris. Ele segurou o braço de Blanche com delicadeza e a puxou para um canto.

— Tenha cuidado com o Fantasma, moça. Não volte mais para os subterrâneos e nem se meta nos assuntos dele. Você correu grande perigo ontem - ele sussurrou.

— Como sabe? - disse, assustada. Seu coração disparava.

— Eu vi - ele respondeu, com um sorriso amigável no lábios - Não se preocupe com a Srta Daáe, ele não a machucará. Prometo que cuidarei dela, mas tenha cuidado com sua vida.

— Ele vai me matar? 

— Se ele quisesse, você já estaria morta.

— Devo fugir? - perguntou Blanche. Ela não sabia bem porque, mas estava confiando cegamente naquele homem. Talvez estivesse tão assustada, com tanta ansiedade para falar do ocorrido, que se agarrava a sua primeira e única oportunidade.

— Não precisa. Se ele quisesse te matar, te encontraria, mesmo fora daqui. Tranquilize-se, mas não cruze mais o caminho do Fantasma.

Ela assentiu e ele saiu, desaparecendo sem que eu se desse conta do que havia ocorrido. Nunca havia falado com o Persa, mas na primeira vez em que conversavam era justo sobre o Fantasma da Ópera. Será que o Persa sabia de algo? Era melhor nem perguntar. Melhor mesmo era seguir seu conselho e esquecer do Fantasma.


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Notas finais do capítulo

O Persa não é um OC (personagem original). Ele veio direto do livro de Gaston Leroux e é meu personagem favorito. É uma pena que ele não tenha entrado no musical ou no filme, mas pelo menos eu posso colocá-lo na minha fic :)



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