Mascarade escrita por Last Mafagafo


Capítulo 19
Capítulo 19 - A Máscara da Morte Escarlate




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— Banche, você ainda não se arrumou? - era Meg que entrara no camarim das bailarinas, que havia esvaziado com o início da festa. Blanche estava escondida entre as araras de roupas. A loirinha estava vestida de capitã da marinha, de calças, colete e chapéu. Blanche sorriu, apesar de não se sentir alegre. Não era um traje feminino, e por isso extremamente interessante como fantasia.

— Não quero mais ir.

— Deixe de besteira, Blanche! Você já está até de fantasia! Bata colocar maquiagem e arrumar o cabelo. Venha!

Ela se levantou e deixou Meg a conduzir até o espelho, sentando-a em uma cadeira. Sem muita vontade, a moça se maquiou e prendeu o cabelo em um coque alto. Estava terminando de se arrumar quando Christine entrou no camarim. Ela usava um vestido belíssimo em degradê do roxo para o rosa-claro. Ele era repleto de estrelas e havia uma tiara de lua em sua cabeça. Parecia a princesa da noite. Blanche ficou surpresa por encontrar Christine tão bonita, com as bochechas rosadas e um sorriso apaixonado no rosto que a fez mais encantadora do que quando desapareceu da ópera. No fundo a invejou e um ódio indesejado incomodou seu coração. Christine era mesmo belíssima, como era possível competir? Meg a fez contar todas as novidades dos últimos tempos e Christine compartilhava seus momentos de felicidade com todo o prazer.

— Vejam – Christine tirou do peito um lindo anel, com um diamante, que pendurava a um cordão amarrado ao pescoço.

— Oh, Christine, ele é lindo! – Disse Meg.

— Vão mesmo se casar? – Sussurrou Blanche, escondendo uma tímida alegria. Pensou em como seria bom se ela sumisse da ópera para sempre.

— Não tenho dúvidas disso, mas ainda é segredo.

— Não consigo entender porque esconder algo tão lindo quanto o amor – disse Meg.

Christine abraçou a loirinha novamente e mudou de assunto, perguntando de Mme Giry.

— Oh, Christine, você precisa ver minha mãe. Ela esteve preocupada com você.

Meg saiu correndo em busca de Mme Giry, deixando as outras duas sozinhas.

— Então está mesmo tudo acertado?

— Sim. Eu o amo, Blanche. Mais do que qualquer outra coisa.

— Mas e quanto ao Fantasma? - perguntou, baixinho.

— Como você sabe sobre ele? - ela parecia surpresa.

— Eu ouvi você conversar com Raoul no terraço aquele dia. Lamento, não queria espioná-los - Blanche disse uma "meia-verdade".

Christine parecia contrariada, mas respondeu mesmo assim.

— Não queria que esta história se espalhasse, Blanche. Ele foi apenas um pesadelo. Eu e Raoul estamos decididos a nos casar e sair daqui. Esta é a última vez que visito a ópera - ela sussurrou.

Blanche não teve tempo para respondê-la ou demonstrar surpresa, pois Madame Giry entrou no camarim, abraçando Christine. Se demorou perguntando sobre as aventuras da moça longe dos palcos, ao que ela respondeu muito animada. Christine parecia outra, mais leve, mais natural. Depois que saíram do camarim, Christine foi se juntar ao noivo.

O salão principal do teatro estava enfeitado e iluminado. Havia todo tipo de fantasia, das clássicas, como princesa e pirata, até peixe dourado. A noite estava realmente divertida, mas Blanche não se sentia alegre o bastante para festejar com as outras pessoas. Monsier Moncharmin e Monsier Richard riam como tolos pelo triunfo da noite e Carlotta, um pavão, se exibia, sendo seguida de Piangi, o tenor, por todo lado. Aparentemente Carlotta já estava se sentindo melhor e estava determinada a mostrar a todos que aquilo fora só um contratempo. Christine e Raoul exalavam alegria e amor, e só um tolo não perceberia o quanto estavam apaixonados. O Persa também estava lá, com roupas coloridas e festivas de seu país de origem. Ele cumprimentou Blanche com um sorriso.

Com o tempo a bailarina começou a se animar com a festa. Estava determinada a esquecer Érik naquela noite e foi o que fez. Estava conversando com Renée depois de ter dançado com Monsier Levigne. O barulho de risadas e conversa se misturava com a música, num clima de carnaval veneziano. Mas tudo se silenciou de uma hora para outra e os olhares se voltaram para o centro do salão, de onde surgiu uma figura distinta que ninguém havia visto antes. Suas vestes eram vermelhas, um grande chapéu e uma capa de mesma cor, como um toureiro nascido do sangue. Porém a figura exibia uma máscara sinistra demais para comparar à exuberância alegre das outras fantasias. Uma caveira.

Era impossível olhá-lo sem que um arrepio de medo se propagasse entre os convidados que insistiam em permanecer na sala. Era a morte-rubra que chegava à meia-noite para vingar-se da soberba do rei (ou dos reis, no caso), que festejavam por pensarem estar livres dela. Era o Fantasma da Ópera, que trazia insultos e sarcasmo aos protagonistas da Ópera Populaire, que mostrava seu poder ao exibir uma nova ópera, o motivo de passar tanto tempo compondo. Don Juan Triunfant, a peça em que ele trabalhara por todos aqueles dias.

Erik então, de modo grosseiro, criticou a atuação de Carlotta, o físico de Piangi e o conhecimento de Moncharmin e Richard sobre arte e cultura. Não só isso, ele revelou ao mundo ser tutor de Christine e a acusou da maluca traição que ele inventara. Erik iludira a si próprio imaginando que Christine poderia amá-lo como homem. Como ele não conseguia enxergar que ela estava apaixonada por outro alguém? Blanche, apesar de não ganhar destaque no discurso do Fantasma, sentia-se a mais humilhada entre todos eles, observando da multidão a obsessão de Erik por Christine. A bailarina se sentiu ofuscada pela deusa da noite, a Lua que era Christine. Não havia espaço para outra.

Enquanto o Fantasma falava de Christine, ele se aproximava dela, com os olhos colados nos seus, a encantando, paralisando. Eles foram se aproximando até ficarem a centímetros um do outro. Era perceptível que havia certa atração entre os dois grandes astros da noite. Raoul, tentava puxar Christine, mas ela não o atendia e Blanche soube que não era a única que sentiu ciúmes ao ver os dois tão próximos. Ciúmes? Será que era isso o que sentia?

Ela não conseguiu mais assistir à cena. Aproveitou a distração de todos e fugiu para o camarim das dançarinas, passando entre os casais que se agarravam nos corredores, alheios ao espetáculo que ainda acontecia. Tudo o que queria era se livrar daquela fantasia e fugir. Esquecer que tudo aquilo realmente acontecera. Retirou a roupa que usava e colocou seu vestido usual. Estava farta! Pegou uma garrafa de conhaque que sabia que Camille escondia no estofado de um divã e deu um belo gole, tossindo bastante em seguida. Soliére, fugindo da festa com o Conde de Chagny, apareceu no camarim a surpreendendo. Pareciam estar alheios ao espetáculo e se assustaram com a presença da moça.

— O que você está fazendo? – perguntou Soliére.

— Estou curtindo a noite – disse, já um pouco bêbada.

— Blanche? O que está fazendo? – ela tentou pegar a garrafa da sua mão, mas Blanche puxou.

— Por acaso não viram o espetáculo? A máscara da morte escarlate decretando nosso azar?

— Do que está falando? - o conde perguntou.

— Vá ao salão principal e descobrirá. Este lugar vai virar um inferno! - a moça passou por eles com a garrafa na mão. Naquele estado, rumou para a saída do teatro, pronta para acabar com a garrafa na Maison. Já não estava tão consciente de seus atos e percebeu que não controlava bem seus movimentos. Sentiu raiva de si mesma por estar naquele estado, da mesma forma que o pai, nas tantas vezes em que chegara em casa bêbado.

— O que está fazendo? – era Erik, escondido em um canto nas coxias, próximo à saída dos fundos.

— Máscara da morte escarlate? - ela disse, escorando-se em uma viga para não cair.

— Apropriado, não acha? – ele sorriu.

— Acho que as fantasias do baile estavam muito apropriadas hoje…. - ela se levantou e se aproximou dele.

— Por que a ironia? — ele segurou seu braço.

— Com licença –  Blanche puxou o braço com agressividade, mas ele não a soltou.

— Você está bêbada? - ele perguntou.

— Não te interessa! - ela gritou, o empurrando - Estou cansada... desse lugar, dessas pessoas, cansada do Fantasma da Ópera.

— Você se cansou de mim? – havia um tom de mágoa em sua pergunta, que ela preferiu ignorar.

— Esse espetáculo de hoje à noite, as ameaças... Dom Juan Triunfant...

— É isso que tanto te incomodou? Não disse que eu era um gênio, que eu era brilhante e deveria me expor? Foi o que fiz.

— Ah foi? Você quer Christine, nada mais que isso! Você queria vê-la seduzida novamente, embebida por suas palavras, atraída por você.

— E eu consegui! Ela queria me beijar, queria cair em meus braços e ser minha novamente. Você viu aquele soldadinho ridículo e o seu ciúme?

— O que eu vi foi o Fantasma da Ópera lançando sua maldição - gritou a moça.

— Você está bêbada como o seu pai - ele disse, com nojo.

— Não me ouse a comparar a ele! Você é um idiota. Por isso Christine não te ama. O que ela sente, você pode chamar de qualquer coisa, medo, curiosidade, pena, mas não chame de amor! Você não sabe o que é o amor. Não saberia que alguém te ama nem que te cuspissem isso na cara! – gritou, sem perceber o quanto estava exaltada.

— Sua menininha fútil e estúpida. Eu deveria matá-la! – Erik levantou a mão, prestes a dar-lhe um tapa no rosto. Blanche encolheu-se, tremendo. Lembrou-se do pai nas tantas vezes em que lhe bateu e em Jared quando tentou violentá-la. Ela estava aterrorizada. Erik percebeu isso pouco antes de desferir-lhe o tapa, mas conseguiu se conter, se arrependendo no mesmo momento.

Ele segurou seu braço com delicadeza e pousou uma das mãos carinhosamente no rosto da moça, o lugar exato em que ele iria acertá-la. No entanto, o mal já estava feito e Blanche só sentia dor. Ela puxou o braço do aperto do Fantasma e afastou a mão dele de seu rosto.

— Não toque em mim - ela disse. Ela não estava mais bêbada e ambos sabiam disso.

Ele se calou, mantendo-se estático enquanto ela caminhava até a porta.

— Eu já me sinto morta - disse, deixando-o sozinho.

Ela saiu do teatro, com medo que ele tentasse alcançá-la e correu para a pensão das bailarinas. Por causa da festa, a casa estava vazia. Blanche não se preocupou em acender as velas, apenas entrou em seu pequeno quarto e trancou a porta. Escorando-se na cômoda ao lado da porta e na penteadeira, chegou até a cama e agarrou seu travesseiro, deixando as lágrimas correrem em seu rosto. 


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