Já era madrugada quando atravessei as portas da sala de Nick Fury. Meu cabelo selvagem estava molhado assim como as roupas que eu havia vestido durante à tarde do dia anterior. Minha sandália chiava a cada passo pesado. Maria Hill entrou na sala logo depois de mim e Nick nem mesmo tirou os olhos do tablet que estava na mão. Bati os braços em sua mesa, tentando atrair atenção.

– Você mentiu para mim! - Falei, com tanta fúria na voz quanto nos olhos - Me manipulou! - Berrei

– Eu falei que ele era um possível responsável. - Falou, com tanta calma quanto era possível

– Ele nem mesmo sabia que a SHIELD existia! Eu mesma o interroguei sob a água, quase o afoguei!

– Sinto muito que a missão não tenha sido como imaginava, embora tenha sido realizada com sucesso.

Me preparei para berrar outra vez e jogar tudo o queria sobre o seu Império e seu tapa-olho. Guardei cada uma daquelas palavras xulas que eu pretendia berrar e recompus a postura. Dei meia volta e saí da sala pesadamente, ouvindo o chiado da sandália.

Fora da sala, havia uma agente de negros olhos gentis a minha espera. Ela me guiou para um quarto semelhante ao que eu havia vislumbrado na sala de câmeras, quando descobri sobre Steve Rogers.

A caixa de curativos sobre a cama me fez tomar consciência do quanto estava exausta. Graças à Crusher Crock e sua parceira, eu estava com a maçã do rosto inchada e vermelha, combinando com um corte no lábio e outro na testa. Além dos inúmeros hematomas roxos pelo corpo, havia um corte que começava no ombro e terminava no meio das costas. Quando ela saiu, eu estava com roupas secas, curativos e analgésicos.

Clint entrou no quarto segundo depois.

– Garota, você deu uma surra nele! - Ele encostou a porta e fechou a mão na forma de um soco

– Ele me deu uma surra - Dei um soco em sua mão, como cumprimento. - Obrigada por ter mandado o resgate rápido.

– Assim que vi seu sinal, corri para cá.

– Valeu. Eu entendi o recado sobre Nick também.

– Era o máximo que eu podia fazer. Ele te mandou para essa missão de propósito, queria que você usasse sua raiva para exterminar o cara.

– Saquei o jogo dele. Sabe, Clint, eu preciso muito ir para casa e dormir.

– Acho que você devia dormir aqui. Esse quarto é seu enquanto precisar e não sei como você vai explicar isso para a sua família.

Pensei por um segundo.

– Vou ficar.

Com o efeito dos analgésicos, acordei após o horário de almoço. Meu rosto não estava mais inchado e nem mesmo tão vermelho. Os hematomas eu podia esconder com a minha própria roupa. Saí da SHIELD como um fantasma, com a maior descrição que eu podia. Voltei apenas no dia seguinte, para entregar relatórios sobre a missão e saber sobre o interrogatório.

– Crusher Crock estava negociando com Amanda Waller sobre sua pena na cadeia por tráfico de armas pesadas - pensei no machado - e assassinato culposo. Você foi ao trem no lugar dela, então ele e a parceira, que ele chamou de "Lince", desconfiaram de você. Aliás, ela desapareceu.- Coulson me explicava enquanto lia os relatórios do interrogatório

Nada mais eu tinha para fazer ali. Passei bem longe das salas de detenção provisória enquanto saía, não tinha a menor vontade de olhar para Crusher outra vez. Fui direto para o shopping, como tinha combinado com Suzi.

– Você sumiu de repente! - Ela falou, talvez pela terceira vez, enquanto cortava sua torta com o garfo.

– Eu não sumi. Avisei você, sua tonta. - Revirei os olhos depois de mais um gole do milkshake de limão com chocolate

– Eu sei, eu sei... Mas não avisou Dick. Ele me procurou.

– Só fiquei fora por dois dias!

– Certo, mas ele te ligou e você não atendeu. Ele só queria saber se estava viva.

– Eu já liguei para ele, ok? Vamos falar de você. Ainda está saindo com aquele cara?

– Que cara? - E enfiou o garfo cheio de chocolate na boca

– Aquele que conheceu no meio do curso, na Europa, mas o reencontrou aqui em Gotham. Tem mais de um?

– Não. Estou saindo com ele desde que o conheci. Ele veio de Metropolis, trabalhava na Oscorp de lá e foi promovido, mas tem que ficar aqui agora.

– Imagino que você esteja detestando isso!

– Oh, claro! - Ela falou e caímos na gargalhada

Me assustei com a campanhia tocando 15min mais cedo do que o combinado, Dick devia chegar às 20h. Mesmo assim, ajeitei o vestido em frente ao espelho e abri a porta com um sorriso no rosto. O entregador de comida chinesa sorriu de volta.

– Obrigada. - Peguei as caixinhas e entreguei o dinheiro

– De nada! - Ele respondeu com aquele "quê" a mais, típico de um verdadeiro e gentil babaca.

Fechei a porta com os pés e me virei para a cozinha. Clint acabava de colocar um dos pés no chão da minha sala, enquanto passava o resto do corpo pela janela.

– Ei! Parado! Pode voltar! - Mandei, apontando as caixas de comida.

– Vai me bater com rolinho primavera?

– Dick está chegando, Clint.

– É importante, Anji - Ele falou sério e eu hesitei - Eu devia ter falado antes da sua missão, mas Nick descobriu e a mandou antes.

– Certo... - Ouvi a campanhia novamente - Entra pela porta - Sussurrei

Clint revirou os olhos e começou a passar o corpo para fora outra vez. Deixei as caixas na cozinha e voltei para a porta. Olhei pelo olho mágico antes de abrir, dessa vez.

– Oi, Dick. - Abri um sorriso

Ele estava com uma camisa social salmão, dobrada até os cotovelos e o cabelo bagunçado. Combinava perfeitamente com o meu vestido escuro, curto e com alcinhas nos ombros. Deixei que ele entrasse e o levei para a cozinha, Dick parou na entrada.

– Quando você disse "jantar", imaginei que você fosse cozinhar! - Ele reclamou, olhando para as caixinhas de comida chinesa ao mesmo tempo que ria.

– Eu nunca disse que sabia cozinhar! - Bati o pé e ele riu mais

Revirei os olhos e caminhei até a mesa da cozinha, comecei a mexer na comida comprada e senti Dick me abraçando por trás. Ele deu um beijo na lateral do meu pescoço, e depois outro, e mais um. Seus beijos desciam na direção do meu ombro. Ele puxou a alcinha do vestido para baixo e deixou meu ombro nu, e depois o cobriu com beijos suaves. A essa altura, minhas mãos estavam paradas sobre a mesa.

A campanhia me despertou e me virei para Dick, que me olhava com intriga. Ele recolocou a alcinha do vestido no lugar e eu caminhei para a porta, tentando me concentrar em qualquer coisa que não fosse ele.

Clint me cumprimentou como se não tivesse me visto há 5min atrás e entrou. Dick estava sentado e organizava a mesa, ele e Clint se encararam.

– Dick, esse é o Clint Barton, ele trabalha comigo e é um bom amigo. - Eles trocaram um aperto de mão -Clint, esse é Dick Grayson, ele... - As palavras fugiram

Em uma noite, Dick era apenas um amigo. Na outra, um amigo colorido, com quem eu estava saindo. E essa noite, secretamente, eu esperava que ele ficasse até o amanhecer ou mais.

– Eu sei, Dick Grayson é seu namorado. - Clint completou minha frase - Ela já me falou de você. - Clint sussurrou para ele

– Bom, você disse que era importante. Então sente-se. - Mandei

Sentei-me ao lado de Dick, e Clint ficou na nossa frente. Sua expressão havia mudado outra vez e, agora, eu estava encarando um Clint Barton tenso e sério.

– Hm... Como você sabe, faz parte do meu trabalho... no RH, pesquisar sobre você. - Contraí todos os músculos do meu corpo para não dar risada da desculpa esfarrapada de Clint ou da cara de intriga de Dick - E eu fiz minhas pesquisas sobre você e o sobrenome Amell. Quando seus pais morreram, você não era a única filha. Você tem um irmão, Anj... Alicia.

Dessa vez, não tive vontade de rir. As palavras dele simplesmente se recusavam a fazer sentido na minha cabeça.

– Oi?