Contraposição escrita por Blue Butterfly


Capítulo 6
Capítulo VI




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/644989/chapter/6

'O que você tá fazendo?' Jane parou sobre os pés e virou para observar Maura em seu caminho de volta para a casa.

'Apanhando algumas flores para a mesa.' Ela disse calmamente, concentrada na tarefa de quebrar o caule da planta. Havia uma grande variedade de espécies e cores, e nesse momento a médica estava recolhendo um cacho com pequenas flores azuis.

Jane se rendeu ao trabalho de apanhar flores e se juntou à ela na tarefa. O trabalho em equipe resultou num buquê maior do que elas imaginaram. Quando a médica adicionou a última, ela sorriu satisfeita ao estudar o quão bonito tinha ficado.

'Isso vai alegrar o ambiente.' Ela disse em voz baixa, ainda olhando para elas. Ela se colocou a andar, seguindo a detetive, mas parou no momento em que seus olhos caíram sobre o pescoço da morena. 'Oh, Jane!' A voz lamentou-se, mas logo em seguida Maura riu.

'O que foi?' A morena se virou espantada para ela, olhos arregalados.

'Seu pescoço está todo sujo de terra!' Ela exclamou e levou os dedos até a pele da mulher, tentando limpá-la.

'Droga.' A detetive resmungou e com a própria mão tentou limpar-se, às cegas.

'Bem, sua camiseta não está nas melhores condições também, se você quer saber.' Maura acrescentou com um sorriso contido, rindo da outra.

'Oh, é mesmo? Vamos ver o que a sua roupa tem a dizer.' Jane segurou o braço da médica e a girou com gentileza, franzindo o cenho ao notar que o pijama de ceda parecia intacto, excluindo algumas folhas de grama grudadas nele - as quais ela retirou.

'Bem... Parece que você teve mais sorte do que eu.' Ela suspirou em derrota.

Maura deu de ombros. 'Nada que um banho não resolva.' Ela disse e as duas começaram a andar num silêncio confortável, mais uma vez.

Assim que chegaram na casa Maura procurou por um vaso para poder colocar as flores na água, e teve que se certificar de que Jane iria tomar banho imediatamente para que não sujasse nenhuma parte da casa - o que se resumia ao sofá que ela parecia ansiar tanto. Depois de minutos de birra, acordos não feitos e um bico acompanhando sua derrota, a morena se dirigiu a passos duros para o banheiro, disparando em mau-humor antes de fechar a porta, 'Você vai querer checar?'

'Não me obrigue!' Maura devolveu e riu consigo mesma, balançando a cabeça da infantilidade da outra enquanto colocava uma a uma as flores dentro do vaso. Ela escutou o som do chuveiro sendo ligado e minutos depois, quando sua tarefa estava completa, ela se apressou para o quarto para trocar a própria roupa. Ela abriu sua mala e se deparou com a organização que Angela tinha tido o cuidado de fazer. As roupas leves para o calor estavam em um lado; camisetas, calça de yoga, shorts; as para os dias mais frios (ou noites) estavam de outro lado, e se resumiam em moletons e até mesmo sua pantufa preferida. Ela sorriu com a gentileza a atenção da mulher, e separou um shorts e camiseta para vestir. Apesar das noites serem frias, o dia estava começando a ficar quente. Convencida de que se começasse a tirar a roupa de dentro da mala para colocar no guarda roupa, não terminaria a tarefa tão logo, ela voltou a fechar a mala e se trocou. Pensando em Jane, ela abriu a mala da morena e tirou uma troca de roupa para ela - uma camiseta roxa e um shorts jeans. Quando ela pousou a vestimenta na cama, o celular da detetive começou a vibrar e Maura o localizou em cima da mesa de cabeceira.

'Jane? Seu celular está tocando.' Ela disse não muito alto, sabendo que a morena a ouviria naquele tom porque o banheiro em que estava era o da suíte.

'Você pode atender? Se for importante diga que eu retorno.' Ela devolveu, não muito preocupada.

'Claro.' Maura disse e se apressou ao pegar o aparelho, não se importando em checar o identificador. 'Isles.' Ela atendeu, deu meia volta para retornar à cozinha, e ouviu a linha muda por um instante.

'Maura?' A voz de Angela veio com um tom de confusão, felicidade e alívio.

'Angela.' A médica sussurrou, de repente sentindo uma falta imensa da mulher.

'Oh, Maura! Como você está, querida? Você está bem? E Jane? Vocês estão a salvo?' A mulher disparou um milhão de perguntas, sem nem parecer estranhar o fato de que a médica quem tinha atendido o celular de sua filha.

'Nós estamos... lindando com isso.' Ela disse com honestidade. 'Mas estamos a salvo, Angela. E quanto a você?' Ela parou perto da mesa e apoiou a mão nela.

'Bem, Maura. Jane pode dizer que não é seguro nos falarmos por telefone, mas eu precisava checar vocês.' A voz da mulher pareceu carinhosa, no estilo maternal que Maura conhecia.

A demonstração fez com que a garganta da médica fechasse. Ela se sentia terrível por estarem todas passando por aquilo, mas principalmente por ser o foco da atenção por ter sido sequestrada. Quem quer que tenha feito aquilo, tinha colocado em pânico todos eles, a ponto de planejarem uma fuga, de se esconderem em um canto vazio do mundo.

'Você tem se alimentado, Maura?' A voz de Angela veio de novo, já que um momento de silêncio tinha corrido entre elas. Os Rizzolis, definitivamente, não conseguiam lidar com a quietitude. 'Você sabe como Jane é, ela come apenas azeitonas e ketchup se deixar! Espero que ela esteja cuidando bem de você.'

'Ela está.' Maura assegurou, sentindo que era hora de responder algo ou a mulher acharia que a ligação tinha sido encerrada. 'Não se preocupe, Angela. Eu tomo conta dela.' E sua voz saiu tremida porque, primeiro, com sua confiança abalada ela se sentiu ridícula, considerando que ela mal pudera cuidar de si antes e se deixara ser sequestrada, e segundo que diante de toda aquela situação, novamente, ela se sentia tão frágil e vulnerável.

'Eu sei que vai, querida. Eu espero ver vocês duas logo. Apenas se mantenham firmes, ok?'

'Ok.' Maura murmurou, não sabendo ao certo até quando controlaria sua emoção.

'Eu amo você, Maura. Por favor, diga a Jane que a amo também.' Angela murmurou, a própria voz tremida.

E foi o que bastou. 'Eu digo.' Ela disse e sentiu duas lágrimas rolarem rosto a baixo. 'Eu amo você, e tenho certeza de que Jane também.'

'Eu sei.' Ela murmurou. 'Se cuidem, querida. Até logo.'

'Até logo.' Maura murmurou de volta, desejando com todas as forças que o logo se precipitasse a acontecer. A ligação foi encerrada e ela depositou o celular em cima da mesa, limpando o rosto em seguida. Ela estava tão concentrada em seus pensamentos e desejos que nem notou Jane se aproximar.

'Maura, quem era?' Ela perguntou distraída, inconsciente do estado da mulher.

Assustada, a loira quase pulou e se virou rapidamente para ela. 'Oh!' Ela exclamou e levou a mão no peito. 'Era sua mãe.' Ela disse rapidamente, esperando que Jane não notasse que estava abalada, mas como sempre...

'Você estava chorando?' Ela andou até a médica, uma mão esticada para tocar-lhe o braço.

Maura desviou o olhar e tentou elaborar uma resposta. Quando uma não veio, foi Jane quem falou por ela.

'Maur, tudo bem. É uma situação difícil, eu sei.' Ela disse em voz baixa, confortando a outra.

'É.' A médica disse ainda de olhos baixos, fungando.

'Ela não disse nada para te chatear, certo?' Jane franziu o cenho, desconfiada, e embora Maura não pudesse ver seu rosto brincalhão ela riu apenas com o tom da voz.

'Não, ela foi bem... carinhosa.' Maura finalmente levantou os olhos para Jane e sorriu. Se Jane e Angela tinham algo em comum, eram o carinho e conforto - emocional - que ambas sabiam oferecer muito bem. 'E ela disse que é para eu me certificar de que você não coma apenas azeitonas e ketchup.'

'Ah há! Viu só? Eu como algo verde. E agora é você quem tá dizendo que não devo!' Jane disse em brincadeira e quando a médica riu, ela abriu o típico sorriso bobo.

'Ela também disse para eu te dizer que ama você. E ela está bem, caso você esteja perguntando.' Maura ofereceu e fungou uma última vez, a sensação incômoda de antes perdida.

Jane revirou os olhos numa falsa irritação e apertou as mãos nos braços da médica. 'Eu a amo também, mas você precisa concordar comigo que um tempo sem ela por perto vai cair bem.'

Maura encolheu os ombros. 'Eu sinto a falta dela.' Ela confessou.

Jane apertou os olhos e encostou o dorso da mão no rosto da loira. 'Você deve estar com uma febre muita alta.'

Maura riu de novo e reprovou a atitude da morena com um balançar de cabeça. 'A única coisa que tenho é fome!'

'Oh, é mesmo?' Jane arqueou as sobrancelhas, divertida. 'Vamos fazer nosso café da manhã, então, e colocar alguma comida nessa sua barriga.' Ela deu leves palmadinhas na barriga da médica. 'Nada de verde, certo?' Ela provocou e Maura revirou os olhos.

'Você é impossível, Jane. É uma luta te manter saudável.' Maura resmungou.

'Se te faz feliz, eu posso comer algo saudável, mas depois quero ser recompensada com sorvete!' Ela disse alegremente.

Maura riu e num movimento impensado segurou o rosto da morena e beijou sua bochecha, agradecida por tê-la ali em sua vida, em seu coração. Jane sorriu-lhe de volta e a abraçou durante longos segundos, acariciando suas costas. Enquanto a morena acariciava suas costas, ela sentia toda a energia que precisava de volta, fortalecendo cada parte de si, fundindo de novo os pedaços uns nos outros que tinham se quebrado.

'Jane, obrigada por cuidar de mim.' Ela murmurou contra o peito da outra. 'É tão bom... só saber que tenho você comigo.'

'Ei...' A voz rouca de Jane lhe alcançou os ouvidos, e seus braços apertaram o corpo da loira. 'Você faz o mesmo por mim, não precisa agradecer, Maur.'

'Eu só quero que você saiba que eu reconheço isso. Cada coisa mínima que você faz por mim, eu reconheço.' Ela levantou a cabeça para olhar para Jane, seus olhos brilhando na mais pura honestidade.

'Eu sei, querida. Eu sei.' Jane sorriu-lhe docemente, beijou sua testa, e a colocou em um novo abraço. Nenhuma das duas pareciam dispostas a se soltarem, talvez porque se sentissem mais fortes ali, juntas, ou poderia ser apenas a sensação de conforto tornando-as escravas de suas vontades.

O estômago de Maura fez um barulho e ela riu. 'Eu realmente estou com fome.'

'Deus, você tem um monstro dentro de si?' Jane soltou-a finalmente e Maura lhe fez uma careta em suspense, como se dissesse você nunca descobrirá.

E o resto do dia tinha se estendido em uma contínua tranquilidade. A parte da manhã tinha sido passada no sofá, assistindo programas variados, enquanto Maura insistia em folhear umas revistas velhas. Em certo ponto, ainda se sentindo esgotada emocionalmente, ela tinha se encolhido contra o braço do sofá e Jane ria divertida ao vê-la tentando resistir ao sono, fechando os olhos lentamente e virando uma página numa tentativa mal sucedida de permanecer acordada por conta da curiosidade. Depois de muita resistência, os olhos finalmente se fecharam e ela dormiu segurando a revista na mão em punho, e quando Jane tentou acomodá-la melhor lá, Maura arquejou em protesto e a morena sabia melhor do que insistir. Ela simplesmente a deixou ali, encolhida em concha, cabeça pressionada contra o braço do sofá e uma revista pressionada contra seu rosto. A situação engraçada, Jane não conseguiu se conter e tirar uma foto com seu celular, apenas para atormentá-la quando o momento fosse conveniente.

Enquanto a médica dormia, Jane se adiantou e preparou o almoço. Cozinhar não era exatamente seu tipo de atividade preferida, mas quando se tratava apenas dela e de Maura, ela usava de suas habilidades que por outras vezes preferia manter escondidas. Nesse dia, em especial, ela acabou por descobrir que a atividade manteria sua cabeça longe dos acontecimentos do dia anterior. A hora parecia ter passado rapidamente misturada com uma leve sensação de leveza e normalidade. Quando terminou a refeição, ela procurou por esticar a sensação e decidiu colocar a mesa - uma tarefa rápida, considerando que eram apenas dois lugares.

Com o último talher colocado no lugar, ela respirou fundo e foi para acordar Maura - exceto que ela não precisou. Com seus joelhos já no chão, e na frente da médica, Jane notou que ela estava acordada. A loira estava na mesma posição em que dormira, mas os olhos sonolentos estavam agora grudados na TV.

'Ei'. Jane disse sorrindo diante da fofura da cena. 'Não sabia que você tinha acordado.'

Maura se remexeu e levantou os olhos para ela. 'Fiquei com frio.' Ela balbuciou.

'Oh, querida... Sinto muito, nem pensei em te cobrir.' Jane se desculpou, acariciando seu braço.

A médica balançou a cabeça e se sentou no sofá. 'Não é sua responsabilidade.' Ela disse agradecida.

'Não me custaria nada.' Jane devolveu e se levantou, esticando as mãos para a loira. 'O almoço está pronto, espero que você não se importe com o cardápio.'

Maura segurou as mãos dela e se levantou. 'Batata frita e refrigerante?' Ela provocou.

'Oh, Doutora Isles! Você duvida de minhas capacidades!' Jane disse teatralmente e apontou com uma mão a mesa posta, uma salada colorida em cima da mesa, e um cozido de carne em outro recipiente.

'Como...?' A loira começou e não terminou, perplexa pela capacidade de Jane ter preparado aquilo sem seu conhecimento.

'Não pergunte. Apenas coma. E não venha dizer que não está bom - eu provei, até mesmo a salada.' Ela disse e piscou um olho, provocando de volta.

'Eu poderia me acostumar com isso.' Maura disse enquanto se sentava na mesa.

'Desde que você lave a louça sempre depois.' Jane disse brincando e a acompanhou.

Meia hora depois e o almoço consumido, as duas decidiram que uma caminhada longa na beira do lago seria o melhor programa para tarde. Alguns quilômetros de caminha, elas descobriram um cais de madeira velha, coberta por musgo verde nas beiradas.

'É seguro?' Maura perguntou desconfiada ao passo de que Jane não hesitara nenhum pouco ao cruzá-lo.

'Bem, a madeira não tá rangendo nem nada. É um bom sinal, não é?' Ela perguntou meio incerta, mas a idéia de despencar na água não a assustava nenhum pouco.

Maura deu de ombros e a seguiu. O único perigo evidente era que as tiras de madeira eram um tanto quanto escorregadias, mas com o devido cuidado nenhuma delas cairiam. Na última faixa, Jane se sentou e Maura se sentou ao seu lado. Os pés foram parar dentro da água enquanto os calçados foram postos ao lado de seus corpos. O dia estava quente, mas não sufocante. Á água estava fria, e um arrepio correu o corpo de Maura ao senti-la.

Depois de apenas balançarem os pés e observarem o movimento da água ondulante em baixo delas, as duas se engajaram numa conversa sobre o sequestro de Maura. Depois de um pouco de encorajamento, a médica lhe contava como tinha recebido uma ligação em seu celular e sido convocada para o então local do crime, como tinha encontrado uma viatura vazia e ninguém por perto, e de como estava prestes a atender o telefonema de Jane quando alguém a agarrou por trás, pressionando um pano em seu rosto e fazendo-a apagar. O resto da história - que ela tinha contado de certa forma para Jane - ela se recusou a contar por uma terceira vez, por assim dizer. Ela se esgotara ao contar para Korsak, e nesse momento Jane não estava por perto porque o homem exigira que ela se retirasse do quarto por não estar mais na investigação. Os olhos verdes de Maura, implorando para que fosse permitido que a morena ficasse não adiantaram em nada. Sozinha, ela lutou para contar-lhe tudo, e quando terminou parecia tão transtornada quando chegara ao hospital e acordara pela primeira vez. As lembranças ainda eram fortes e assustadoras, mas por Maura tê-las vivido enquanto sob a influência da toxina, elas pareciam distorcidas e perturbadoras. Quando ela começou a hesitar depois da narrativa da primeira vez que acordara lá, Jane pediu para que ela não se sentisse pressionada a continuar, se não quisesse.

Conversa encerrada, um silêncio que revelava o quanto aquilo era doloroso - para as duas - pairava sobre elas. Num gesto de suporte, Jane segurou sua mão e a colocou em seu colo, e por longos minutos ela ficou lá, mesmo depois que outra conversa tinha se iniciado. O gesto que era sutil ,mas que dizia tanta coisa, tinha tocado Maura. Nele jazia as intenções da morena: Ela estava ao lado de Maura, ela cuidaria dela, lhe daria conforto, lhe ampararia. Ela seguraria sua mão quando ela estivesse assustada, e mesmo depois disso, porque Jane não era o tipo de pessoa que a deixaria, tão pouco permitiria que ela tivesse a sensação de estar só.

Cedendo ao toque da outra, Maura inclinou sua cabeça e a descansou no ombro forte de Jane. O assunto havia feito uma curva enorme, e agora Jane contava para ela sobre uma vez em que Angela insistira para que fossem fazer um piquenique no parque da cidade e como Tommy tinha comido metade da comida antes de sair de casa, mas a mãe apenas notara quando chegaram lá. Maura ria delicadamente com a narrativa, e com as águas do lago se ondulando com o movimento de seus pés, e com o braço de Jane - que estava em sua cintura agora - ela descobrira outra forma de alcançar aquela calmaria específica que procurava em suas meditações na yoga. E quando Jane finalmente beijou sua cabeça com uma risada brotando de seus lábios, Maura finalmente entendeu sobre as águas que limpavam seus pés, carregando toda a negatividade e concebendo-lhe serenidade, e sobre o abraço de Jane em sua cintura, lhe oferecendo todo o equilíbrio que precisava para se manter centrada.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!