Vivendo sentimentos, sentindo emoções-Temporada 1 escrita por Rachelroth


Capítulo 29
Nevermore


Notas iniciais do capítulo

:)



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Robin: *sentado no sofá* Diz cara, o que você quer falar?

Robin, Estelar, Ciborgue e Ravena estavam sentados no sofá olhando Mutano nervoso em pé na frente deles. A expressão do metamorfo mostrava o quanto que ele estava ansioso. Ravena mascava um chiclete com cara de desaforo e descaso.

Mutano acordou com Terra enrolada no seu lençol, virada de costas para ele. Transformou-se em um pequeno pássaro para que saísse da cama sem acorda-la. Pousou no pufe verde e voltou para sua forma humana. Estava pensativo. A noite anterior havia deixado ele completamente confuso em relação à sua vida.

A proposta de Terra e o comportamento altamente sensual de Ravena não saíam de sua cabeça. Eram lembranças muito vívidas em sua mente. O sexo com Terra não havia sido nada do que ele desejava. Ele sabia que não era o corpo dela que gostaria de possuir aquela noite. Sentiu-se mal pela primeira vez por transar apenas por tesão com uma mulher.

Saiu do quarto no meio da tarde. Encontrou Ciborgue e Abelha namorando na sala. Fez um barulho para que eles o percebessem e se recompusessem.

Ciborgue: *disfarçando* Acordou verdinho?!

Abelha: *olhando para baixo* Boa tarde Mutano.

Mutano: *sem olhar para eles* Relaxem, só vim buscar um copo de água…

Ciborgue: Tranquilo.

Mutano: *passando sorrindo* E fiquem tranquilos que eu não vi nada… não percebi o movimento rápido e assustado de vocês quando eu entrei.

Ciborgue e Abelha ficam extremamente sem graça e ligam a TV, disfarçando o fato de terem sido pegos em flagrante.

Mutano pegou uma garrafinha de água gelada e saiu da torre. O tempo estava levemente frio. Admirou a paisagem, pensativo. Sentou-se no pequeno degrau que dava acesso a porta principal. Viu o carro de Aqualad parar em frente à torre.

Aqualad: *fala polida* Boa tarde Mutano.

Mutano acenou com a cabeça e deu um gole em sua água.

Aqualad: *sentou-se ao lado dele* Foi tudo bem ontem?

Mutano: *confirmou com a cabeça* Tranquilo.

Aqualad: E a Rae?

Ele odiava quando Aqualad se referia à Ravena desse jeito. Ele sentia posse por este apelido.

Mutano: *ainda fitando o horizonte* Trouxe-a para casa mais cedo… ela passou mal.

Aqualad: Como assim?

Mutano: Ela não está acostumada a beber *pausa curta* Deixei ela em casa e voltei para a festa.

Aqualad: *preocupado* Só isso?

Mutano: *olhou para os olhos de Aqualad* E o que mais seria?

Aqualad e Mutano se olharam em silêncio por alguns instantes.

Aqualad: Mais nada… não seria mais nada.

Mutano: *volta a olhar para o horizonte, sério* Como está o relacionamento de vocês?

Ele não sabia ao certo o motivo desta pergunta, mas sentia que precisava fazê-la. Era como se esta conversa estivesse engasgada na boca do estômago dele. Ele tinha que saber se Aqualad estava a fazendo feliz. Depois de um período de silêncio, Aqualad se manifestou.

Aqualad: *olhando o horizonte* Você gosta dela, não?!

Mutano: Achei que eu tivesse perguntado primeiro…

Aqualad: Para bom entendedor, vírgula é ponto final… *olha o perfil do metamorfo* não?!

Mutano: Depende do que você seja entendedor…

Aqualad: *volta a olhar o horizonte* Acho que eu gosto dela mais do que ela de mim… mas não creio que isso seja um problema tão grande… afinal um sempre gosta mais…

Mutano: *concorda com a cabeça* Verdade… *pausa longa* Sim… eu gosto…

Aqualad o olhou rapidamente e o encarou com o olhar mais mortífero que ele poderia lançar. Bufou e sentiu a garganta secar.

Aqualad: E então…

Mutano: Prometa-me uma coisa… *Aqualad voltou a encara-lo* Nunca fazê-la sofrer *Mutano o encara* Eu juro que te arrebento se você fizer qualquer mal a ela.

Aqualad: *ar de obviedade e segurança ao falar* Eu sei cuidar de uma mulher, fique tranquilo.

Mutano: *toma mais um gole de sua água* Eu posso me arrepender disso *se levanta e olha para o rival* mas deixarei o seu caminho livre.

Aqualad sentia ódio do que Mutano estava falando. Sentia na voz dele uma mistura de raiva e culpa, mas tentou ser maduro e se levantou também, sem tirar os olhos dele.

Mutano: A única coisa que eu quero na vida é que ela seja feliz e se ela te escolheu para fazê-la feliz… é isso… não a machuque… a respeite… acima de tudo *estende a mão direita para o peixe titã*

Aqualad: Eu vou fazer isso… *pausa curta, aponta o indicador para Mutano* mas não por você… e sim por ela *aperta a mão do metamorfo*

Mutano sem dizer mais nenhuma palavra sai para dar uma volta. Aqualad o observa se afastar. Quando não podia mais ver a pele verde do garoto, entrou. Quando entrou percebeu rápidos movimentos vindos do sofá. Ciborgue e Abelha se ajeitavam de maneira desconcertada para assistir TV.

Abelha: *sem graça, vê Aqualad* Oi peixinho… quer assistir TV com a gente?

Aqualad: Não… vim ver a Rae.

Terra: *grita da cozinha* Ela entrou no banheiro… entrou antes de mim… *diz contrariada*

Aqualad percebe que Terra estava na cozinha sentada de costas para o sofá, completamente descabelada comendo cereal.

Aqualad: Ok… então vou ficar vendo TV aqui com vocês até ela descer.

Ciborgue: Se aconchegue ai cara…

Aqualad: *sorridente* E fiquem tranquilos que eu não vi nada.

Ciborgue e Abelha voltam a ficar sem graça e tentam disfarçar.

Estelar: Amigo Mutano… você parece nervoso.

Mutano: *tentando manter a calma* É… bom… queria dizer uma coisa…

Ravena: Podia dizer logo…

Mutano: Bom… vou sair do grupo.

Robin: O QUÊ?!

Ciborgue: Cara?!

Estelar levou as mãos na boca e Ravena se arrumou no sofá, mantendo uma postura séria.

Mutano: Calma… *retoma o fôlego* Bom… vou me matricular no curso de Veterinária e depois que o Cib se casar… bom o grupo vai ter tomar rumo…

Estelar: Amigo…

Mutano: Deixa-me terminar… *fecha os olhos* Vou ir para o apartamento da Tara… vai vagar um quarto lá…

Ciborgue: *sorri* Bom… isso tecnicamente é um casamento…

Mutano: Não…

Estelar: Amigo… não sei se fico triste ou orgulhosa deste passo importante na sua vida.

Ravena: *chocada* Casamento?

Mutano: Não *coça a cabeça* não vou me casar, a gente nem namora… mas, acho que será bom para mim… estudar… levar uma vida comum… bom… assim como a Tara *pausa curta* se ela conseguiu… eu também posso conseguir.

Robin estava em silêncio. Não conseguia processar todas as informações que ouvira. O líder se levantou e parou de frente ao companheiro verde de equipe e amigo.

Robin: Bom… *sério* Não vejo porque eu não te apoiaria numa decisão dessa *manteve um sorriso terno para tentar disfarçar a voz embargada*

Mutano: Rae?

Ravena: *se levantou e diz seca* Parabéns à vocês.

A empata se retira da sala e sente sua vista embaçar por conta das lágrimas. Entrou correndo em seu quarto e tão logo começou a hiperventilar.  Sentiu as paredes do quarto se fecharem em cima dela, fazendo-a cair no chão. Espremeu-se em posição fetal, apertando seu crânio com a maior quantidade de força possível. Sentiu uma tontura violenta invadir seu corpo. Percebia os sons do mundo cada vez mais abafados e longínquos. A hiperventilação fez com que sua pressão caísse o suficiente para se sentir fora de controle. Chorava na mesma velocidade em que respirava. Sentiu que iria morrer.

Sentiu medo de morrer.

Pontadas muito fortes se espalhavam por sua cabeça, anunciando o que seria o início de uma enxaqueca insuportável. Sentiu as mãos esfriarem e a nuca encharcar com seu suor nervoso. O que estaria acontecendo, afinal? Não conseguia se concentrar para usar seu poder de cura… se é que ela poderia ser curada daquilo. Não conseguia se mover.

Ali ficou.

Indefesa.

Sozinha.

Desesperada.

Ravena: *entrando na sala* Já está aqui?

Aqualad: *sorriso terno* Boa tarde… se divertiu?

Terra: *gritou da cozinha* O pouco que ela ficou… acho que sim, né… até precisou voltar para casa…

Ravena: *séria, para Terra* É… seu amorzinho me trouxe e me colocou para dormir…

Terra a encarou com olhos de desprezo.

Aqualad: *bateu no sofá, indicando que ela se sentasse ao lado dele* Encontrei com Mutano e ele disse que você passou mal…

Ravena: *se sentou ao lado e coçou a cabeça com preguiça* Não estou acostumada a beber…

Terra: *parou atrás do sofá* Já contou para seu amorzinho que você dançou em cima do balcão?

Ravena: *cerra os olhos e a encara* Estava começando, mas já que você adiantou, vou pular para a parte em que o seu amorzinho te deixou sozinha para me trazer pra casa…

Aqualad fingiu não se incomodar com aquela conversa entre as duas, mas na verdade estava irritado com as duas discutindo essencialmente sobre para quem Mutano deu mais atenção. Tinha vontade de manda-las calarem a boca, mas não o fez. Apenas manteve o controle, como um lorde faria.

Abelha: *adorando* É loirinha mais anônima do universo… parece que você não foi a mais popular ontem, né querida…

Terra: *ignorou* Bom… já que M-E-U amorzinho saiu… vou voltar para a cama, sabe?! Esquentar o colchão para ele…

Ravena a seguiu com o olhar. Ela, definitivamente, não gostava dela.

Aqualad: Não sei por que você se irrita tanto com ela…

Abelha: Ah querido… *se intrometendo, bate uma palma desaforada* Pode deixar que eu respondo isso… *Ravena sorri satisfeita* Aquele projeto exibido de jornalista não vale o chão em que ela pisa…

Ciborgue riu da raiva com que Abelha falava de Terra.

Abelha: Essa garota é sem noção… como ela tem a cara de pau de dizer que não é popular? Ela foi líder de torcida… ela é uma exibida, metida e que paga de boa moça…

Aqualad: *rindo* Não precisa se exaltar Honey.

Abelha: E as roupas que ela usa? Na cabeça dela só existe verão? Quero ver o que ela vai vestir no inverno… *completamente irritada* Ah… isso eu vou querer ver.

Ciborgue tenta massagear os ombros da noiva, mas, desprecavido, leva um tapa.

Abelha: Não tente me acalmar… eu já estou por aqui *aponta a testa* com ela passeando pela torre…

Ciborgue: Ela é companheira do Mutano… não tem como proibir…

Abelha: Ah… mas ela dorme aqui dia-sim-dia-sempre… praticamente mora no quarto dele.

Ravena: *seca* Isso é verdade…

Abelha: Sabe o que é isso? Culpa de vocês… não sabem por limites aqui, ai vira essa zona… ah… meu caro… mas fique sabendo que na nossa casa não vai ser essa bagunça não…

Ciborgue: *rindo* Calma linda…

Abelha: Linda é o cacete… pode parar… você acha que eu não percebo vocês dois *aponta para Ciborgue e Aqualad* torcendo o pescoço para olhar as coxas, a bunda, os peitos dela?

Ravena dá uma olhada torta para Aqualad, que fica sem graça.

Abelha: É… essa miniatura de repórter na minha casa não pisa…

Ciborgue: Tá… tá… melhor mudar de assunto…

Abelha: Mudar por quê? Tá sendo ruim ouvir verdades da musa loira?

Ciborgue: Não…

Aqualad: Honey… você fica irritada demais quando fala dela.

Abelha: Ah *indignada* Agora o problema sou eu? O problema não é da falta de receptores de frio dela? Ou seria pura coincidência o fato dela só se dar bem com homens?

Ciborgue: A Estelar gosta dela…

Abelha: A Estelar… tadinha… ela gosta de tudo… até do Robin…

Ciborgue riu e abraçou Abelha que irritada lhe deferiu alguns tapas, fazendo-o rir ainda mais. Ravena e Aqualad se divertiam com a cena de ciúmes de Abelha. E com a irritação dela também.

O desespero de Ravena só a fazia pensar que deveria ir para Nevermore. Mesmo sabendo que a situação por lá estava caótica. A garota encolhida no chão se segurava para não urrar de dor. Com esforço, tento levantar. Sem sucesso. Tão logo rastejou até o móvel onde guardava seu espelho de meditação.

Cada segundo que passava sentia mais angústia e dor. Sentia como se facas furassem todo o seu corpo. Sentiu-se despedaçada por dentro e por fora. Conseguia ver o cabo de seu espelho, mas jogada no chão não conseguia alcança-lo.

Chorou em um desespero quase silencioso. Agora ela queria morrer. Talvez assim aquela sensação passasse, mesmo que lhe custasse à vida. Não havia sanidade. Nem poderes. Nem força naquele momento. Podia jurar ter ouvido uma batida em sua porta e uma voz masculina, mas o som era tão abafado que não soube distinguir se seria real ou seria mais uma alucinação.

Alucinação!

A empata acordou de ressaca. Moral e etílica. Ao abrir os olhos pôde sentir que não estava sozinha. Mas ao procurar ao redor de si, não encontrou nada. Não sentiu a presença emocional de ninguém. Tinha dores de cabeça e seu corpo estava cansado.

Levantou e se sentou com preguiça na cama. Se quer tinha tirado a roupa em que fora para a Candy. Aos poucos as memórias de suas ações foram envergonhando-a. Brevemente ouviu um sussurro. E novamente ao procurar… nada encontrou.

Na verdade essas sensações estranhas já estavam participando aos poucos da vida da empata. Para ela havia duas possibilidades: ou ela estaria enlouquecendo ou havia algo realmente mau que não poderia ser encontrado nem com seus poderes de empatia.

Para ela a primeira opção parecia absurda e a segunda… bom… também.

Por vezes via algo rapidamente e quando retornava o olhar para ver melhor, este algo não estava ali.

Alucinação!

Sim. Agora a possibilidade de ela estar enlouquecendo se fazia mais forte e presente. Se não fosse loucura só poderia ser um prenúncio de morte. Não conseguia pensar em qual das possibilidades seria a menos pior.

Tentou controlar a respiração. Tentou concentrar-se em seu chakra. Precisava reunir forças para levantar a mão e agarrar seu espelho de meditação. Por pior que pudesse ser, em Nevermore poderia pelo menos tentar encontrar uma resposta. Quem sabe as coisas por lá já não estariam melhores?

Com a gota de força que ainda restava em seu corpo, conseguiu se esticar e puxar o espelho para perto de si.

Mutano voltou e viu Ravena encaixada nos braços de Aqualad, completamente aconchegada, assistindo à televisão. Ele abaixou a cabeça, chateado e pensativo. Subiu direto ao seu quarto e encontrou Terra jogando vídeo game. A loira olhou para ele e sorriu. Ele apenas sorriu de volta.

Ele já havia escolhido o que era melhor para ele. Para ela.

Sentou-se ao lado de Terra e a beijou. Novamente. E novamente. Ajeitou-se ao lado dela no pufe e conectou outro controle. Ela lhe fez carinho no cabelo desgrenhado. Ele retribui “roubando” o nariz dela com os dedos. Brincaram. Beijaram-se. Transaram.

Mutano olhou fixamente nos olhos azuis de Terra. Com um sorriso terno e sentindo-se leve lhe disse que aceitava a proposta dela. A garota retribuiu com um grande sorriso e um abraço apertado.

Na sala, Aqualad acariciava a cabeça de Ravena. Ela estava concentrada no filme de ficção científica. Estava realmente interessada. Vez ou outra ele beijava a testa da garota, fazendo-a sorrir timidamente.

Ravena disse seu mantra entre dores insuportáveis, num sussurro quase inaudível. De repente percebeu-se sem dor. Apática. Quando abriu os olhos percebeu que a gosma negra e pegajosa lhe cobria até os ombros.

Nevermore quase não existia mais.

Sem cor.

Sem odor.

Sem nada.

Um silêncio triste, bizarro e assustador.

A gosma a paralisava quase que por completo. Ravena quis chorar.

Mas não havia tristeza suficiente em si para que chorasse.

Só havia desespero e uma sensação estranha de arrependimento.

Nada mais.

Mas ela não podia se entregar. Não agora. Não ali. Com muita, mas muita dificuldade tentou caminhar. Um fio de esperança aqueceu seu coração quando viu a luz esverdeada de sua emoção esperançosa ao fundo. A luz estava mais enfraquecida, mas resistia como se tentasse mostrar à empata que ela ainda poderia se salvar.

Tudo que via ao redor era o caos, a destruição e a desagregação. Ela não sabia como, nem quando ela ficou destruída por dentro.

Sentia como se tentasse nadar contra a correnteza. A força que precisava fazer para caminhar com os membros superiores e inferiores era praticamente a mesma. Agradeceu mentalmente pela insistência de Robin que eles treinassem nado contra a correnteza.

Aos poucos viu a sombra de algo que parecia ser uma de suas emoções. Ou do que deveria ter sido uma… Esforçou-se para chegar perto e quando chegou percebeu que era Afeto. Ela estava com o corpo submerso. Só era possível ver a face da emoção, que não trazia nenhum semblante afetuoso. Apenas o olhar desesperado de quem sabia que estava prestes a morrer.

O que estava acontecendo?

Mais ao fundo viu aquilo que deveria ser fusão de Raiva e Felicidade. Por mais que sentisse aversão daquilo, precisava encontrar alguém… alguma coisa. Sempre com a dificuldade homérica de se locomover. Sentia-se cada vez com menos energia.

Foi se aproximando e pôde ver uma terceira cabeça fundida. Assustada, tentou recuar. Precisava sair dali. Não poderia suportar a bizarrice de três emoções fundidas. Seria o seu fim?

Em sua jornada solitária e desesperada foi reparando em como as coisas estavam destruídas. As árvores, outrora coloridas e fortes, agora estavam despedaçadas, sem vida.  Havia estranheza no ar.

Nevermore estava estranha. Acima de tudo estranha.

Quando olhava para o que deveria seu o céu, por vezes podia ver fragmentos de memórias distorcidas. Mas Nevermore era sua mente. Começou a duvidar das próprias lembranças. Estava confusa. Olhou para baixo e só enxergou o piche grudento.

Terra: *olhando fixamente nos olhos de Mutano* Você tem certeza?

Mutano: *fecha os olhos* Do que?

Terra: *se aconchega no peito nu dele* De que quer ir morar lá em casa?

Mutano: *pausa curta* Vai ser bom para mim… bom… viver um pouco sem poderes não é?!

Terra: *preocupada* Só por isso aceitou?

Mutano: *hesitante* Não… você sabe…

Terra: *sorri* Então…

Mutano: *beija o topo da cabeça da garota* Então você vai ter que me aturar o dia todo…

Terra: *divertida* Não não… vou me livrar de você no período do trabalho…

Mutano: *ri* E você acha que eu vou trabalhar onde?

Terra: *volta a falar sério* E quando você pensa em ir? Digo minha colega sai após os feriados do fim de ano…

Mutano: Bom… não posso sair antes do Ciborgue e da Abelha voltarem da lua de mel…

Terra: E quando eles se casam?

Mutano: Nada marcado oficialmente, mas acredito que na primavera.

Terra: *faz voz de criança* Ah… Mas ai fica longe *aperta o tronco dele*

Mutano: Bom… mas depois que sua colega sair do apartamento, eu poderei dormir lá de vez em quando…

Terra: *satisfeita* E quando você vai contar para os outros?

Mutano: *sério* Ainda não sei…

Trouxe suas mãos para superfície e as achou estranhas. Era como se ela não tivesse certeza se aquelas mãos fossem dela própria. Não tinha certeza de nada mais. Em lapsos conscientes, sentia medo. Em lapsos de despersonalização, sentia estranha de si mesma.

Ao ver uma moeda gigante flutuando em cima da cabeça, se perdeu. Não sabia onde ou porque estava. Voltou a olhar as mãos. Seriam dela? Olhava para os lados e não reconhecia nada. Imagens passavam soltas por sua pele.

A cada nova dissociação, menor tempo durava sua consciência. Ela não conseguia chegar… aonde quer que ela estivesse indo. Mas as mãos… de quem seria? E porque raios estavam presas nela?

Caminhando lentamente, sem rumo e sem desgrudar os olhos daquelas estranhas mãos, acabou sentindo algo bater em seu joelho. Afastou as mãos da frente de sua face e pode ver uma terceira mão saindo da superfície da gosma. Era uma mão petrificada.

Ravena: *sussurra para si mesma* Conhecimento.

Retomou brevemente a consciência de si e a memória de onde estava. Precisava encontrar alguém. Ou pelo menos, precisava encontrar a saída. Tentou olhar ao redor e foi quando viu que a aberração de três cabeças de aproximava. Paralisou.

Raiva/Felicidade/Rude: Olá querida Ravena.

Ravena arregalou os olhos ao ver a cabeça morta da Felicidade espremida entre Raiva e Rude. A pele delas, na região do busto e pescoço, estava carcomida e queimada, faltando partes. Era possível ver que elas tinham dois pescoços e três ombros. A cabeça morta da Felicidade parecia anexada aos dois pescoços, e por mais que seu semblante trouxesse ausência de cor, sua boca se movimentava quando as outras duas falavam.

Ravena: *assustada* O que é você?

Raiva/Felicidade/Rude: Querida… somos você…

Ravena soltou um grito quando Felicidade reviveu assombrosamente, rindo descontroladamente. Ela não parava de falar. Era impossível entender um assunto se quer. E de repente, morreu de novo.

Ravena: O que vocês fizeram?

Raiva/Felicidade/Rude: Você fez…

Ravena: Eu? Não…

Raiva/Felicidade/Rude: Ah querida… obrigada…

Mutano deixou Terra descansando e saiu vagarosamente. Precisava de um banho. No corredor viu Ravena vindo em direção aos quartos.

Mutano: *de cabeça baixa* Boa noite…

Ravena lhe defere um golpe no peito.

Ravena: *irritada* Não quero mais a Tara por aqui…

Mutano: *com a mão no peito, agachado no chão* Vocês está louca?!

Ravena: Não gosto dela. *volta a caminhar, voz suave* Boa noite

Afastou-se lentamente daquela aberração, enquanto aquilo ria. Precisava de um norte. Precisava de algo que pudesse usar como referência. Sim! A luz verde de Esperança. Ela iria até ela.

Usou o piche estranho para escrever em sua mão esquerda “Siga a luz verde”, pois temeu que perdesse a memória novamente. Manteve as mãos acima do nível do grude. Começou a ouvir a voz de Ciborgue falando que iria morar com Estelar. Estranhou essa memória. Parecia que alguma coisa estava errada, mas por mais que ela pensasse, não conseguia identificar o que.

Dissociou.

Viu duas mãos à sua frente. Mãos? De quem seriam aquelas mãos? Eram bonitas. Ela desejou muito ter mãos como aquelas. Viu uma luz negra cortar sua visão debaixo para cima e então desejou fortemente em ter mãos bonitas como aquelas.

Mas não deu certo… talvez aquela luz não pertencesse ao pato cadente… Mas pelos menos aquelas mãos haviam gostado do corpo gelatinoso dela, já que a seguiam.

Ravena achou curiosa a forma como uma delas tentou se comunicar. Leu na palma daquela bela mão esquerda com diversos dedos “Siga a luz verde”. Procurou em volta. Sim! Tinha uma luz verde.

Ravena: Linda… será lá que eu poderei pedir belas mãos como vocês?

Medo: *em forma de fumaça, surgiu em sua frente* Não faça isso…

Ravena: Olha! Estrelas voadoras…

Medo: Elas estão atrás de você!

Ravena: Fofa estrela marinha do céu animado… do que estarás tu dizendo-me?

E puff… sumiu.

Mas aquelas mãos horríveis continuavam a segui-la. Por quê? Só pode ler na palma da mais horrorosa “Siga a luz verde”. Talvez fosse melhor obedecer aquela mão maldosa. Não havia como saber o que ela poderia fazer de horrível aos olhos da empata. E ela gostava de olhos. Principalmente dos seus.

Ravena estava desconfiada. Com certeza. Estavam tramando contra ela. Talvez fosse obra da fumaça saltitante. Com aquelas purpurinas… só podia ser malvada. Iria sujar todo chão da sala e Cathal brigaria…

Ravena: *puxa o ar com força* Cathal!

Retomou a consciência. Suas memórias estavam confusas, embaçadas e sem nenhum nexo lógico-temporal. Ela estava mais perto de Esperança. Sim ela estava. E conforme se aproximava sentia-se mais aquecida.

Tentava fechar os olhos ao caminhar. Era horrível olhar os destroços de sua consciência – ou do que restou dela –, no caminho à Esperança encontrou uma a perna de Coragem. Não sabia se ela estava afogada ou se o resto do corpo havia se separado daquela perna.

Encontrou restos de capas. Encontrou restos de vida.

Após três dias Mutano havia se animado com a ideia de sair do grupo. Pensou em iniciar uma faculdade. Seria bom…

Mutano: *olhando a internet* Biologia… gosto de biologia…

Terra: *sentada ao lado dele* Mas veterinária é bacana e é sua cara…

Mutano: *levou a mão ao queixo, pensativo* Veterinária? Hum… *jogou veterinária no site de buscas* Vamos ver…

Terra: *animadora* Você se transforma em todos esses animais… vai saber cuidar deles…

Mutano: É que biologia tem plantas…

Terra: É…

Mutano: Mas olhando aqui a grade… *rolando com o mouse* veterinária parece mais minha cara…

Terra: Eu também acho…

Mutano: É isso… *olha para ela* É isso… escolhi… *fala firme* eu escolhi…

Terra: Adoro quando você fala assim… sério… tão másculo…

Mutano amolece e beija a garota. Transam.

Mas aquelas mãos… só poderiam estar zoando da cara da empata. Diziam-lhe coisas terríveis… acusavam-lhe. Com os 200 dedos apontados para sua fuça. Ordenando-a. “Vamos… vá… vá… caminhe até a luz verde”.

Mas chegou. E viu uma senhorita brilhante. Parecia uma luzinha de Natal. E também parecia consigo mesma. Seria armação das mãos, só podia. Como alguém que não é ela poderia ser tão magicamente sua irmã gêmea?

Esperança agarrou com força na mão direita de Ravena fazendo retornar a si novamente. O ato fez com que a emoção gemesse, como se aquilo doesse.

Ravena: *confusa* Esperança?

Esperança: *voz fraca* Por favor…

Olhou para sua própria mão direita, indicando que a mesma segurava outra emoção. Ravena tentou se soltar, mas Esperança não permitiu. A empata percebeu que a luz dela estava ainda mais fraca. Olhou de quem seria a outra mão segurada por Esperança.

Sabedoria.

Ravena: *alto* Sabedoria…

A emoção mais sábia mantinha as duas mãos levantadas. Assim como Afeto, apenas sua face não estava submersa. A mão esquerda estava fortemente agarrada com Esperança e a direita estava fechada com tanta força que parecia que os dedos logo afundariam e rasgariam a palma.

Sabedoria: *voz fraca e baixa* Ravena… estamos morrendo…

Ravena: *ofegante* Como assim?

Tentou se soltar novamente, mas Esperança não deixou.

Sabedoria: *cansada* Não se solte. Esperança é a única imune à imundice da loucura, ela mantém são quem a toca…

Ravena: Loucura?

Sabedoria: Querida… estamos morrendo…

Ravena: *fala ansiosa, rápida* O que eu faço? Como mudar isso? O que? Como?

Sabedoria: *falta de ar* Você… sabe…

Ravena: *desesperada* Não… eu não sei…

Sabedoria: *se esforça para levar a mão direita até a empata* Sim… você sabe… escute… *abre a mão e deposita um papel na mão da empata* Esperança vai me soltar para que ela consiga te levar de volta até o ponto de retorno do espelho. Com isso, eu não aguentarei… mas haverá um tempo… não há muito tempo…

Ravena: *mais desesperada* Mas eu não sei…

Sabedoria: Sou sua sabedoria… você sabe sim Ravena… só espero que consiga a tempo.

A emoção se solta de Esperança. Isso faz com que a emoção brilhe em uma intensidade maior e relaxe visivelmente.

Esperança: *recuperando o fôlego* A Sabedoria consome muita energia.

Ravena: Porque você não se afeta?

Esperança: *sorriu* Já ouvi que a Esperança é a última que morre?

Ravena pode caminhar com suavidade. O fato de estar de mãos dadas com Esperança fazia com que o grude não fosse tão grudento.

Ravena: Se era fácil caminhar com você, porque não saiu andando com Sabedoria?

Esperança: A Sabedoria só pode caminhar junto ao Conhecimento. Sozinha não vale de nada. Elas se separaram e bem… ainda bem que eu estava por perto… *chegando ao ponto do espelho* Agora vá. Quando eu me soltar de você ganharei um pouco mais de força… mas quando só sobrar eu, logo enfraquecerei e tudo se perderá… vá… você sabe o que fazer…

Ravena voltou de Nevermore confusa e cansada. Estava tonta, mas cheia de vitalidade. Viu o papel de Sabedoria na sua mão e o abriu com cuidado.

Era um pedaço de seu livro.

Era a última página do seu livro refeito.

Era a última página do livro infantil que continha seus sonhos, suas metas.

Em letras garrafais, estava lá.

“RESPEITAREI MINHAS EMOÇÕES E AS VIVEREI EM COMPLETUDE”

 

Fechou a mão em punho.

Sim.

Ravena: *falou para si mesma* Eu sei o que fazer!!!

CONTINUA…


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Notas finais do capítulo

Curiosidade? Loucura total? Socorro?

Fala aê...



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