Sexta-feira, meio dia.
Japão, Inazuma.

DIMITRI

Dimitri nunca achou que ia admitir isso, mas ele entendia o Victor.

Ele estava exausto mesmo tendo acabado de dormir e irritado, mas mesmo assim fingia não está e se controlava para não agredir ninguém verbalmente ou fisicamente.

Já tinha chegado ao Deadline Circus umas oito horas da manhã. Foi dormir e agora tinha acabado de acordar assim como todos, vendo alguns recebendo curativos de Lorelai e Nagumo. Sorriu ao ver Pavel o abraçando rapidamente, e assim se sentindo um pouco orgulhoso de ter salvado o irmão. Por mais que não tenha sido realmente ele que o salvou, e sim Jake White.

White.

Esse era o nome que nunca achou que ia mais escutar. Sabia que o garoto não fez pelo os Morozov em si ou para a família ser perdoada por algo que chateou profundamente toda a família russa. Fez por simplesmente o menino que pegou no sono no meio da estrada, que estava fingindo não estar em estado de choque por ter sido sequestrado.

Ele fez isso por Pavel Morozov.

Morozov e White eram duas famílias unidas mesmo com suas diferenças. Enquanto os Morozov gostam de música, os White gostam de esporte. Os Morozov amam o frio, os White amam o calor. Russos e australianos.

Jake e Pavel cresceram juntos, por mais que Jake seja um ano mais velho e talvez a amizade começasse a crescer por volta de seus seis anos de idade. Eles eram inseparáveis assim como todo bom Morozov e todo bom White, mas infelizmente aquilo acabou há um ano, quando Pavel sofreu um acidente de carro no ano novo.

E dava para piorar? Sim. Pavel, além de ganhar cicatrizes em muitas partes do corpo, ele teve uma amnésia lacunar e esqueceu-se de tudo sobre os White, como se ele nunca tivessem o conhecido. De acordo com o médico, Pavel estava a caminho da casa dos White junto ao tio, no qual apenas teve ferimentos leves, então ele provavelmente pensava sobre eles, e assim fez com que se esquecesse dos australianos.

Foram um choque para ambas as famílias. Eles tentaram de tudo para fazer Pavel retornar as memórias, mas nada foi possível e então os White, sem esperanças, desistiram de tentar fazer Pavel se lembrar, já que aquilo estava sendo doloroso para eles e para Pavel, que sentia dores de cabeça sempre que um dos australianos fazia algo semelhante ao que aconteceu nas memórias.

As pessoas desistiram muito dos Morozov. Muitas famílias e amigos já desistiram dos Morozov por um motivo ou outro, e isso fizeram com que eles tivessem um ódio de quem desiste tanto deles quanto de qualquer coisa. Os White desistiram de tentar recuperar as memórias, e os Morozov, por sua vez, se irritaram profundamente com os australianos.

Dimitri se lembrava de cada cena perfeitamente, e ao olhar Pavel, que estava sendo abraçado pelo os irmãos, ele cruzou os braços e foi até Jake. O loiro australiano estava recebendo curativos na mão por tê-la machucado em alguma luta que teve, e assim que o viu, podia perceber a vontade do menino de se enfiar em algum buraco.

— Olá. — disse Dimitri, se sentando ao lado do garoto. Lorelai, que fazia curativos em Jake, saiu andando ao terminar e deixou ambos falando a sós. — Vejo que ao menos não desistiu de salvá-lo.

Jake ia comentar algo, mas apenas ficou calado.

— Olhe, eu sei que você fez isso pelo Pavel. — o mais velho disse, enquanto olhava Pavel de longe indo relaxar um pouco. — E eu agradeço por isso, talvez você tenha sido a única pessoa que desistiu de nós e voltou para ajudar.

— Dimitri, eu não quero que aceitem um pedido de desculpas por... — Jake foi cortado.

— Uma coisa que todo Morozov diz é que perdoar é apenas uma palavra, e não um Obliviate¹. — Dimitri disse ao menino. — Jake, nós não odiamos você e sua família, apenas estamos tentando entender o motivo de vocês terem desistido. Se fosse você esquecer-se de nós, nunca iríamos desistir de fazê-lo lembrar.

—Mas nós não somos vocês.

— Sempre soube que os loiros eram os mais inteligentes. Sim, Jake, nós não somos vocês. — o mais velho mexeu na própria cicatriz. — Nós iríamos até o fim do mundo para fazê-los lembrar de nós, ou iríamos fazer lembranças novas com vocês. Mas vocês... Apenas porque o médico disse que tinha a provável chance de Pavel nunca se lembrar, vocês deram as costas e desistiram. Não queriam ao menos criar novas memórias.

Jake olhou Dimitri, pela a primeira vez naquela conversa. O garoto de cicatriz respirou fundo, piscando os olhos mantendo a vontade de chorar apenas para si mesmo.

— Você quase morreu para salvar Pavel, e ele morreria para salvá-lo com ou sem memória, já que ele o vê como um amigo mesmo você tendo ficado três ou quatro meses perto dele depois de perder as memórias. Foi um ato que nos fará repensar, mas eu não quero que vocês achem que ficamos tristes somente por vocês terem desistido, e sim por vocês desistirem de algo que iríamos até um fim e arranjar um jeito. Se ele não se lembrasse, vocês poderiam criar novas memórias com ele! Os White nunca pensaram nessa possibilidade?— Dimitri perguntou.

Jake ficou calado escutando aquilo. Ao ver a mãe o chamando pela a mão para conversar provavelmente sobre Enzo, Dimitri respirou fundo e deu leve tapa nas costas do loiro.

—O que mais se apega sofre mais. Os Morozov fizeram um teste de confiança em vocês, mas parece que vocês nos deixaram cair. — Dimitri sussurrou.

E assim o loiro levantou, indo até a mãe. Jake ia embora, mas Pavel foi correndo até ele e se sentou ao seu lado, começando a conversar despreocupadamente com o mesmo. O australiano apenas sorriu, vendo o menino o entregar um prato de comida e quase o forçar a comer.

— Come primeiro, então. — Jake disse. Pavel fez careta e cortou um pedaço do frango e levou a boca. O loiro sorriu, começado a comer.

***

Sexta-feira, uma hora e meia.
Japão, Inazuma.

SAVANNAH

Savannah estava surpresa com o que ouvia de Seirin sobre os Salazar.

Não que elas fossem de fazer fofoca, mas Seirin estava comentando devido a elas não saberem quase nada sobre os dois irmãos. Lorelai sempre desviava do assunto quando perguntava para ela algo, e Victor dizia sempre “Acho melhor vocês não saberem” ou “Não é da sua conta”.

Sentadas à mesa aproveitando o almoço sem os Salazar, que estavam ocupados em outras coisas, para conversar a respeito deles a Price tinha sido a primeira acabar a comida junto a Yasmin.

— Eu odeio falar dos outros, mas... A Lorelai estava sinistra quando ela olhou para Enzo. — Seirin confessou.

Samantha olhou Yasmin, Yuume e Carolina. Por mais que a Testarossa já sabia do fato de Victor ser sociopata, ela não sabia de tanta coisa como Seirin, que descobriu através de Enzo.

— Podemos perguntar mais algumas coisas aos irmãos deles. Michael é amigo da Irene, podemos ver com ela se tem como ele comentar.

Logo uma albina se sentou na mesa, mexendo no celular. Era Irene.

— Precisam de mim? — ela falou, agitando as pernas no ar. Yuume ia abrir a boca quando Irene a fez sinal para se calar. — Eu sei o que vocês querem, mas não querendo ser advogada do diabo, acho que eles têm todo o direito de não comentar a vida para vocês.

— Mas você deve saber sobre eles, nós não sabemos nem se eles são alérgicos a poeira ou não. — disse Carolina.

— Nem nós. — disse uma voz masculina, se sentando ao lado de Savannah. Era Hiroto, que piscou levemente a ela. Savannah ia fazer piada, mas decidiu deixar quieto. Ela se virou e viu os meninos se sentarem-se à mesa. Ela procurou Nagumo, mas ele não estava ali.

— Nós não temos um Salazar no grupo, mas somos amigos do Victor e... — Fubuki foi cortado.

— Vocês são amigos, eu estou aqui por curiosidade. — disse Goenji, fazendo Irene dar um riso abafado. — Victor é um chato.

— Você não é diferente, Goenji. — Irene falou a ele. Seirin achou que o garoto ia bater na mais nova, então já estava preparada para segurá-lo.

— De qualquer modo, se você ajudar a descobrir apenas mais um pouco sobre eles, será a nossa Morozov favorita. — Irene revirou os olhos com o suborno do Fubuki.

— Eu não ligo em ser a Morozov favorita. — Irene comentou.

Ela logo mexeu no celular e os olhou.

— Bem, mas vocês podem fazer uma coisa por mim, se querem tanto a minha ajuda... — ela sorriu, captando a atenção de todos. — Um de vocês terá que me dar uma aula. Não que eu queira isso muito, mas é que a minha mãe quer colocar o pai dos Salazar como o meu professor durante uma semana porque ela irá voltar para a Rússia porque é semana de aniversário dos pais dela. E eu realmente não vou com a cara daquele professor desde que o mesmo descobriu que o Michael gosta de mim.

Savannah ficou mais calma.

— Aula de que?

— De caçador. É claro. — Irene sorriu. — Sei que as meninas são novatas, mas vocês salvaram o Pavel, mesmo que o Jake tenha feito um papel importante. Afinal, salvar o Pavel das encrencas dele não é para qualquer um. — ela olhou os meninos. — Os meninos não vão querer me ensinar. Certo?

— Nunca. Nem aguentamos o Dimitri direito, imagine você. — disse Hiroto e Irene concordou.

— Nem eu aguento a mim mesma. — Irene brincou.

Todas morderam o lábio, e olharam entre si. Depois de um tempo, Savannah viu que todas olhavam para ela e Yasmin como se fossem as únicas que provavelmente teria paciência com ela.

— Vamos juntas. — Yasmin disse a Savannah, mesmo que estivesse com certo medo da situação. Savannah sorriu e afirmou com a cabeça hesitando a cada momento.

Irene sorriu vitoriosa e se levantou, mandando eles a seguirem assim que todos terminarem de almoçar. Savannah começou a ter medo daquele sorriso na garota, olhou Hiroto que mexia os lábios em “Boa sorte” para ela.

Ok, ela tinha que se acalmar. Elas não vão dar aula para uma amostra grátis feminina do diabo, certo?

***

Sexta-feira, cinco minutos para as duas.
Japão, Inazuma.

YUUME

O caminho para a casa dos Salazar foi longo, talvez por ter ido de carro tenha a feito achar que era perto do Circus. Yuume passou o caminho inteiro olhando a Morozov explicar que ela “pegou emprestada” a chave da casa dos Salazar com o Michael e se alguém descobrisse, eles seriam caçadores mortos. Depois que ela parou, a albina começou a cantarolar Dollhouse, de Melanie Martinez.

— É de Morozov ficar cantando? — disse Yasmin, se lembrando do Dimitri cantarolar algo enquanto dirigia.

— Deve ser. Tem vezes que nós se pegamos cantando porque lembramos de certa música para certo momento. — disse a albina.

— E porque Dollhouse? — perguntou Yuume.

—Não sei.

Irene foi até a porta e a abriu, assim entregando a chave na mão de Yuume e fazendo sinal para eles entrarem.

— Estarei esperando na frente da casa. Vocês têm duas horas.

Ela fechou a porta ao vê que todos tinham entrado. Yuume olhou para a chave em mãos e a colocou no bolso, respirando pesadamente e olhando a casa vazia e com apenas a luz do sol entrando pela as janelas iluminava.

— Vamos. — disse Suzuno.

Eles começaram a procurar alguma coisa no qual não sabiam. Queriam respostas para tantas perguntas, queriam saber mais sobre eles.

Yuume subiu as escadas junto a Yasmin, o corredor dos quartos estava o mesmo. Yuume correu até o quadro que achou do Victor e mostrou a Yasmin, fazendo-a rir vendo Victor, na infância, fantasiado. Ele não parecia ser daquele tipo de pessoa. Mas logo Yuume retirou o retrato da mão de Yasmin.

No fundo da foto, tinha um garoto brincando com dominós junto a uma garota, que provavelmente era Lorelai. Enquanto Lorelai estava concentrada em jogar dominó, o garoto olhava Victor sério e parecia irritado, como se estivesse brigado com o irmão ou ele ter feito algo. Elas olharam mais perto e viram que não parecia ser Michael ou Souji.

Era alguém parecido com Victor. Então Yuume se lembrou da história do irmão gêmeo de Victor, Benjamin, e olhou Yasmin.

— Então aparentemente esse Benjamin existiu. — Yuume disse a Yasmin.

— Mas, se ele existiu, porque as pessoas nunca falaram dele e poucas sabem sobre ele? Os Salazar não são do tipo de esconderem quantos irmãos tem. — Yasmin disse. — Eu acho, porque Lorelai vivia contando histórias sobre os irmãos e coisas assim.

Quando a rosada ia dizer algo, eles escutaram um barulho vindo do fundo do corredor.

— O que foi isso?

Yasmin mordeu o lábio.

— Não sei. Vamos.

Yuume hesitou, mas era melhor elas conferirem. Foram andando em passos lentos e suaves para não fazer barulho no chão de madeira da casa. Ao chegar no fundo do corredor, elas olharam que tinha um caminho para ir a esquerda.

— Esquerda não... — Yuume sussurrou baixinho.

Elas continuaram a andar, até que sentiu uma pessoa bater duas vezes o pé no piso de madeira e fazer um barulho um pouco alto. Ambas pararam, e Yuume sentiu a mão da pessoa tocar seu ombro, e parecia que Yasmin tinha a outra mão da pessoa no ombro dela.

A pessoa as virou, e elas arregalaram os olhos.

— O que diabos vocês fazem aqui? — perguntou o homem, as prensando contra a parede com as mãos em seus pescoços.

O homem era idêntico ao Victor, a diferença é que seus cabelos eram longos e amarrados em um rabo de cavalo. Ele parecia ser um pouco mais alto.

— Benjamin? — disse Yuume meio fraco, deixando o quadro com a foto de Victor cair no chão enquanto tentava se soltar das mãos do garoto. Sem sucesso.

O mesmo deu um sorriso e olhou Yasmin, que parecia assustada tentando tirar a mão do garoto de seu pescoço. Yuume também estava, mas fingia não estar. Ele riu das tentativas das duas.

— Bonequinhas, vocês não vão conseguir. E sim, eu sou Benjamin. —o homem falou. —Benjamin Hugo Salazar.