Abigail e a Fera de Hillstone escrita por amarf


Capítulo 9
Capitulo sete




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Lucas beliscou um aperitivo da mesa, quando uma voz dominadora falou:

– Eu sou Maldiva Salazar e não aceito a presença de um mero mortal no Conselho – O cabelo ruivo da mulher flutuava gentilmente, mas seus olhos não tinham nada de gentil. Puro ódio. Seu sorriso era banhado de maldade, Lucas foi erguido no ar e arremessado para a sala onde há poucos minutos todos estavam. Naquele segundo o coração de Lucas Miller parou, não havia nada tão amedrontador quanto aquela mulher em sua frente. A ruiva estava caminhando em sua direção, ele se arrastou para trás com os olhos fixos nela, como se sua atitude lhe desse oportunidade de fugir.

– Não, pare… Deixe-o em paz – Dois homens se posicionaram no lado da garota que via toda a cena impotente, não tinha o que fazer, os dois a seguravam com força e as lagrimas escorriam de seus olhos com medo do que poderia acontecer ao seu amigo. Maldiva o ergueu mais uma vez no ar e fechou a palma da mão, o ar parou de circular nos pulmões de Lucas e sua visão ficou embaçada, os pés do rapaz que balançavam freneticamente de repente pararam.

Algo mais forte que a dor da perda começou a correr nas veias de Abigail, o corpo de Lucas tombou no chão estrondando foi como ultima gota para ela. Ninguém a observava, estavam entretidos em Maldiva e Lucas. Um calor estranho percorria o corpo dela, uma brisa balançava gentilmente o seu cabelo e seus olhos ganharam coloração lilás.

– Mandei deixá-lo em paz.

A voz não parecia pertencer a Abigail que avançou para frente, mas os dois homens a impediram novamente, só que dessa vez algo foi diferente. Ela puxou os braços para si e fez com que os dois homens caíssem no chão, caminhou ate a ruiva que estava atônita e empurrou seus ombros fazendo com que fosse jogada contra a parede a quase quatro metros de distancia.

– O que ela fez? – Lisa perguntou boquiaberta.

– Não faço idéia, mas esta ficando interessantíssimo – Shane comentou comendo mais um dos aperitivos assistindo a cena curiosamente excitante.

– Devíamos fazer alguma coisa… Ela pode se machucar – Jack comentou preocupado.

– Jack, uma vez na vida, você poderia ignorar esse sentimento e deixar a garota se virar sozinha? Veja… Ela derrubou a Maldiva.

– Não por muito tempo – Lisa disse bebendo o champagne

Maldiva se ergueu e lançou uma bola de fogo na direção de Abigail que caiu no chão sentindo seu ombro arder, ela ficou de joelho tentando ignorar o ardor que aumentava cada vez mais e mostrou a palma da mão quando viu outra bola de fogo indo em sua direção, o fogo ficou pairando no ar, Abigail se encantou com a beleza da chama e quando fechou a mão não restou nada a não ser fumaça. Maldiva ficou boquiaberta. Abigail se arrastou ate o amigo e apoiou a cabeça dele em suas pernas, acariciando seu cabelo como ele gostava.

– Lucas… Fala comigo… Estou aqui… – Sussurrou.

– Já chega. Vou acabar com vocês dois – Maldiva disse se recompondo – A festa acabou.

Antes que Jack ou Shane e ate mesmo Lisa pudesse se mover para defender Abigail, a mesma soltou um grito ensurdecedor que fez quebrar toda a vidraça do ambiente e rachar as paredes, as pessoas presentes pressionaram as orelhas sentindo a dor. O vidro quebrado voava por todo lado, mas não chegava a acertar a garota e Lucas Miller.

– Tudo bem! Talvez seja a hora de fazer alguma coisa! Ela vai acabar com meu terno novinho – Shane gritou.

– Você é tão imbecil Shane! – Lisa comentou erguendo as palmas das mãos – Tunc intermissum mihi . Quiesce obsecro¹ – Suas palavras eram sussurros ate que toda a cena se transformou.

– Você é tão velha assim? – Jack comentou observando todo o quadro parado. Os vidros estavam congelados no ar, as pessoas nas suas ultimas expressões antes de serem petrificadas, exceto três mulheres que observavam tudo friamente na ponta da mesa onde não saíram desde o começo.

– Mas não tão forte – Lisa falou rouca. Jack caminhou ate Abigail que chorava silenciosamente com Lucas aninhado em seu peito

– Faça alguma coisa. Por favor… – Disse entre soluços – Traga-o de volta.

– Ele morreu – Shane disse sem emoção – O coração dele parou já faz tempo. Não podemos fazer nada. Somos bruxos, não…

– Cale a boca! – Abigail gritou, suas lagrimas não cessavam. Sentia-se sem forças, como se algo tivesse sido arrancado do seu coração ou como se o próprio não existisse – Não é real. Isso não esta acontecendo… – Repetiu baixinho enquanto alisava o rosto sereno de Lucas. A dor era insuportável, seu melhor amigo estava morto. Ela estava definitivamente sozinha.

– Eu posso te ajudar – Jack sussurrou enxugando o rosto de Abigail – Mas precisa se acalmar e sair daqui.

– 30 segundos – Lisa caiu de joelhos.

– Vá. Shane irá levar o Lucas… Vá para casa.

********

– Você deve estar louco! – Shane gritou – Sabe que não podemos procurá-la mais.

– Você não precisa ir, Shane.

– Ate parece – Revirou os olhos.

– Do que estão falando? – Lisa perguntou massageando a testa, desde o feitiço do tempo na noite passada sentia-se fraca demais.

– Emilly Chermont. É dela que estamos falando – Jack falou baixo observando Abigail enrolada em um cobertor na poltrona, o ar condicionado estava baixo demais graças ao corpo sem vida de Lucas. Deviam mantê-lo o máximo que podiam.

– Achei que Emilly fosse uma desertora.

– Ela é.

– E vocês vão pedir a ajuda dela?

– Não é a primeira vez, não é? – Shane falou olhando irritado para Jack – Vamos, diga a ela.

– Uma vez precisamos de um feitiço para… Para alguém especial.

– Mas não podia ser outra pessoa?

– A mais próxima, certa e possivelmente viva é a Emilly. Além do mais, na época, não podíamos nos dar o luxo de procurar por outras.

– E onde essa Emilly esta? – Abigail perguntou sonolenta.

– Deveria descansar querida – Jack sussurrou carinhoso.

– E onde essa Emilly esta? – Abigail perguntou mais firme dessa vez ignorando o “querida” de Jack que tanto lhe incomodava

– New Orleans.

– Mas isso dá…

– Horas de viagem – Shane comentou

– Lisa, você é o vigia do defunto. Jack, você vai de carro com a mocinha…

– E você?

– Você é muito curiosa – Apertou as bochechas de Abigail e disse com desdém, saiu do quarto e o silencio pesou por alguns segundos. A porta voltou a abrir – Vocês podem ir viu? Tem pressa não – Ele disse irônico e voltou a sair dessa vez definitivamente.

– É melhor comer alguma coisa. A viagem vai ser longa – Lisa disse baixinho fechando os olhos devagar – E remédio de enjôo, Jack é um péssimo motorista.

– Pegue alguma coisa de Lucas, algo como fio de cabelo, escova de dente…

– Uma cueca usada – Lisa riu baixinho.

Abigail caminhou devagar ate a casa de Lucas. Cada passo parecia lhe arrancar um pedaço, era doloroso. Aquele caminho sempre foi feito de duas formas, acompanhada do amigo ou o encontrava brigando com Alice na sala. Sabia que não aconteceria. E o pior, era tudo e unicamente culpa dela. As lagrimas caiam cada vez mais, ela não conseguia controlar.

– Abigail? – Sra. Miller abriu a porta e sua expressão ficou confusa – Lucas não esta. Disse que dormiria com você esta noite… Tinham um encontro… Ele ate usou um terno.

– Sim. É verdade – Abigail engoliu as lagrimas com dificuldade – É que… Ele esqueceu… A escova de dente! Foi isso! E você sabe como ele é – Sorriu amarelo – Pediu que eu viesse buscar.

– Entre – Sra. Miller deu espaço para que Abigail entrasse – É ótimo ver que estão ficando… – O olhar de Abigail fez a senhora reformular – Mais unidos.

– É, estamos. Ele é meu melhor amigo, senhora.

– E você a dele. Disso eu não tenho duvida… Bem, você sabe onde é o banheiro. Qualquer coisa, você me grita.

O quarto de Lucas parecia chamá-la. Ela entrou deitando-se na cama, o cheiro dele estava impregnado nos lençóis. Abraçou o travesseiro imaginando que fosse o amigo, puxou as cobertas ate cobrirem sua cabeça e apertou os olhos.

FLASHBACK ON

Havia desfeito as malas e estava aproveitando o por do sol na janela do seu quarto. O bosque naquele horário era amedrontador, mesmo assim, resolveu dar uma volta pela cidade. Ouvia os insetos e o balançar das folhas, aquilo era bem diferente da sua antiga vida em Atlanta.

– Ei! – Alguém gritou depois que Abigail foi derrubada com força

– Isso foi uma tentativa de assassinato?

– Ele se soltou da coleira – O rapaz lhe ofereceu a mão para ajudar a levantar – Tenho que pega-lo – Mal terminou as palavras e saiu correndo em direção ao peludo.

Abigail girou os calcanhares e decidiu que voltaria para casa, estava escurecendo rápido demais e estava ficando com fome. Duas casas depois da sua, viu o rapaz que havia visto a poucos minutos e caminhou em sua direção.

– Ei! – Ele se virou para ela sorrindo amigavelmente – Conseguiu pegar o meu quase assassino?

– Com certeza, senhorita. E ele já foi devidamente punido, não se preocupe.

– Obrigada – Ela riu baixo.

– De férias em Hillstone?

– Não… Acabei de me mudar. Moro na terceira casa – Ela apontou.

– É neta da… – Ele tossiu um pouco – Diana?

– Não gosta da minha avó?

– Ela é um pouco… – Ele franziu a testa tentando achar uma palavra que não fosse tão ruim – Esquisita.

Abigail ficou em silencio.

– Você é diferente do que imaginei… Ate agora você tem me parecido bem normal.

– O que? Achou que eu fosse ter três braços ou…?

– Você é linda – Ele sorriu galanteador.

– E a carne nova do pedaço. Já vi que você é garanhão da cidade.

– Esperta – Lucas apertou o nariz da garota – Gostei de você.

FLASHBACK OFF

Abigail se sentou enxugando as lagrimas, se Lucas a visse daquele jeito no mínimo bateria nela. Foi ate o banheiro, pegou a escova e desceu correndo gritando um ate logo a Sra. Miller, chegando em casa, viu Jack de braços cruzados na calçada com uma mochila rosa nas costas.

– Combinou com você – Ela disse.

– Você demorou.

– Eu trouxe a escova – Abigail o entregou.

– Lisa colocou algumas coisas que você talvez precise – Jogou a escova dentro da mochila rosa e entregou a garota que não se moveu enquanto ele caminhava ate o outro lado da rua onde um Mustang preto antigo estava estacionado

– Nos vamos nisso?

– Nisso? – Ele falou como se tivesse sido ofendido – A Lorraine se magoa fácil.

– Lorraine? Você deu nome a um carro?

– A gente pode discutir isso aqui enquanto seu amigo apodrece ou você pode entrar para seguirmos viagem.

Foi o suficiente para que dessem inicio a viagem mais cansativa e enjoada de Abigail que se arrependeu amargamente de não ter pegado remédio como Lisa aconselhou. Algumas horas depois ela conseguiu dormir.

**

– Chegamos… Querida… Acorde – Jack a balançou gentilmente, mas não houve resposta. Depois de se hospedar no hotel, a pegou no colo com cuidado e caminhou ate o quarto. Era simples, sem muito luxo e pequeno. A cama afundou com o peso de Abigail que se acomodou logo, Jack sentou-se do outro lado e ficou observando. Tudo era tão novo e ao mesmo tempo igual que o machucava.

Resolveu beber para espairecer e matar o tempo, mesmo que estivesse cansado, não iria conseguir dormir naquela hora. Tirou a blusa deixando sob a cama e sentou-se na poltrona bebericando o uísque ruim, fechou os olhos e respirou fundo.

Na cama, Abigail despertou, mas não se moveu. Ao abrir os olhos, deu de cara com um corpo alto e forte. A expressão do rosto de Jack mesclava cansaço e alivio. Reparou pela primeira vez como ele era realmente lindo, os olhos pareciam ter a cor do gelo mesclando com azul escuro, o maxilar, o lábio, o cabelo negro como a noite, o pescoço, o abdômen forte, os braços grandes e firmes. Algo em Jack encantava, a deixava anestesiada, quase hipnotizada. Poderia passar horas observando-o. Respirou fundo tentando ignorar o calor estranhamente gostoso percorrer seu corpo. Quando seus olhares se encontraram foi como ter sido arrancada do próprio corpo, era como se estivesse flutuando. Um sorriso de canto brilhou na face de Jack.

– Chegamos em New Orleans? – Abigail se sentou e falou mais baixo do que pretendia

– Sim. Deveria voltar a dormir, amanha levantamos cedo para procurar Emilly.

– Achei que soubesse onde ela estava.

– Emilly é nômade, apesar de ser fixa na cidade, nunca é da mesma… Loja.

– Quando foi a ultima vez que precisou dela?

– Faz muito tempo – Ele enfatizou o “muito”

– Por que precisou da Emilly?

– Eu também havia perdido alguém importante.

– Onde esta?

– O que?

– Esse alguém?

– Você é muito curiosa – Ele sorriu de novo abaixando o olhar para o copo de uísque – Teve que ir embora por motivos de… Força maior.

– E…

– Boa noite, Srt. Lincoln – Ele se levantou indo para cama, o coração de Abigail bateu mais forte vendo-o se aproximar tanto. Só naquele segundo percebeu que dormiriam na mesma cama, ela olhou para o espaço vazio e depois para ele – Não vai dizer que esta com medo de mim?

– Nã-não – Gaguejou

– Não seja patética.

– Você que é patético

– O que pensa que vou fazer? Que irei te estrangular no meio da noite?

– Claro que não! Já disse que não estou com medo – Ela disse tentando esconder o tom histérico de sua voz, deitou-se e cruzou os braços olhando o teto. Jack começou a rir

– Não vou te desvirtuar, Abigail… A não ser, que peça. É claro.

– Eu não irei pedir isso – Sua voz saiu rude – Nunca.

– Eu posso esperar esse “nunca” acabar – Tocou devagar a mão de Abigail que sentiu o choque elétrico percorrer seu braço, seus olhares voltaram a se encontrar e um calor que começava na ponta do pé percorria todo seu corpo indo se encontrar em apenas um lugar. Ela se sentia como no jantar do conselho, o tempo havia parado mais uma vez e o único som era seu coração explodindo no peito – Boa noite – Jack sussurrou sorrindo carinhosamente, mas nenhum dos dois fechou os olhos. Era como se tal ato fosse impossível de fazer, Abigail observou bem os detalhes do rosto de Jack, no canto superior da sobrancelha esquerda havia um cicatriz pequena quase imperceptível, descendo mais um pouco podia perceber o maxilar que ia afinando consideravelmente ate o queixo, a barba rala que crescia, a ponte de nariz reto e a boca. A boca era o que mais atraia seu olhar, com certeza, Jack não podia calcular o estrago que fazia no corpo da garota quando sorria daquela forma. Os olhos de cor gelada olhavam curiosos para Abigail que aos poucos fechava o olho relutante.

– Ah, minha querida… Não sabe como me mata ao me olhar desse jeito – Sussurrou quando percebeu que a garota havia caído no sono. Acariciou o cabelo castanho e logo em seguida sua face, a pele macia era um convite irresistível para Jack.

**

Jack foi o primeiro a se levantar, depois de fazer sua higiene matinal, escancarou as cortinas do quarto deixando a luz entrar e acordar Abigail que coçou o olho e examinou o quarto confusa, sem assimilar o que estava acontecendo e onde estava.

– Você tem 10 minutos para se arrumar. O dia vai ser longo – Foi a primeira coisa que Jack disse antes de sair do quarto batendo a porta.

– Bom dia para você também – Abigail murmurou indo para o banheiro. Alguns minutos depois estavam estacionando o carro no bairro French Quarter. Os olhos da garota não paravam um minuto. A Saint Louis Cathedral, a catedral mais antiga do país, se exibia tomando toda a atenção do lugar. Só depois conseguiu notar a presença da estatua do General Andrew Jackson em frente – Nossa…

– O que?

– Não parece que estamos nos E.U.A

– É a parte mais legal de New Orleans. Aqui é o coração da vida musical, intelectual e noturna na cidade – Abriu os braços apontando para todos os lados.

– Onde vamos procurar primeiro? É tudo tão… – Ela não conseguiu terminar.

– O coração do bairro: a pracinha Jackson Square.

Não foi muito difícil encontrar músicos, estátuas humanas, cartomantes, mímicos, agenciadores de passeios turísticos pela cidade, e principalmente muitos turistas com suas máquinas digitais, mas Emilly Chermont estava virando uma missão impossível. Era uma confusão, nada parava. Tudo se movia ao mesmo tempo e deixava Abigail confusa e encantada, mas algo em seu peito lhe deixava desconfortável. Temia que não encontrasse a tal bruxa a tempo.

Em seguida foram para uma das ruas mais famosas de New Orleans, Bourbon Street. Cheiros se misturavam, vozes, sotaques, flashes… Ela observou ruazinhas com prédios antigos, balcões de ferro trabalhado, sobrados históricos, bares, restaurantes, casas de jogo, música em cada esquina e muita animação.

– Estou ficando com fome Jack – Ela reclamou, o rapaz franziu a testa e disse perto de sua orelha causando um arrepio involuntário

– Vamos para o French Market, é um tradicional mercado urbano onde estão cafés, restaurantes e diversas lojinhas. Comemos e aproveitamos para procurar Emilly – Foram vitimas de mais um fracasso, apesar da comida deliciosa de um dos restaurantes, o desconforto ainda estava com Abigail que já estava se dando por derrotada.

– Parece que Emilly morreu.

– Pessimista – Jack revirou os olhos – Eu saberia se isso tivesse acontecido. Vamos ao pitoresco Voodoo Museum.

– Um museu?

– Dedicado ao Vudú, é na Dumaine Street 724. Logo ali – Apontou para encruzilhada logo na frente e seguiram – Se seguirmos mais a frente voltamos a French Quarter.

– Andamos em circulo então?

– Não seja pessimista – Revirou os olhos novamente. Não chegaram a entrar no museu, visitaram mais outras lojinhas ate que entraram em uma de antiguidades. Tudo estava empoeirado e parecia abandonado.

– Sinistro – Murmurou observando bonecos de palha no teto.

– Posso ajudá-los? – Uma mulher negra, de cabelo cacheado longo e olhos grandes, brilhantes e de cores diferentes apareceu no balcão da frente. Um caramelo muito claro e outro negro como a noite, Jack apareceu no campo de visão da mulher que esbanjou um lindo sorriso – Jackson! Quanto tempo… – Passou por uma portinha e abraçou calorosamente o rapaz

– Essa é minha amiga, Abigail – Jack a apresentou – É a Emilly que procurávamos.

Abigail se sentiu renovada. Sua esperança triplicou e sua alegria ficou nítida.

– Isso é… – Ela suspirou como se tirasse um grande peso – Você deu trabalho.

– Me procuram por que?

– Precisamos de sua ajuda.

– Ajuda pra quê? – Emilly olhou diretamente para Jack dessa vez

– Um feitiço especial. Mors et uita²

– A ultima vez que me pediu uma coisa dessa foi para uma pessoa importante… – Ela olhou de soslaio para Abigail

– A pessoa é importante para ela – Jack apontou para Abigail que não havia entendido aqueles segundos de conversa

– Trouxeram algum objeto do tal? – Abigail entregou a escova de dente – Hum… E onde ele esta?

– Em Hillstone.

– Longe não é?

– Você vai fazer? – Abigail indagou

– Claro. Vai demorar em torno de… Três horas – Falou enquanto voltava para trás do balcão – Algo mais?

– Não – Jack falou frio – Em três horas voltamos – Saíram da loja e respiraram o ar puro com calma, a bagunça pela primeira vez pareceu convidativa aos dois – Esta escurecendo… Vamos voltar ao hotel, tomar banho, jantar e ai pegamos o feitiço e voltamos para casa.

– Parece um plano ótimo. Gostei.

********

A janta foi servida no próprio hotel. Enquanto terminava a sua, Abigail bisbilhotava a rua que parecia mais encantadora do que de dia. A varanda do quarto dos dois era pequena, mesmo assim charmosa, e tinha leve cheiro de rosas que se misturava com a da janta e os aromas da rua.

– Planeta terra chamando Abigail – Jack murmurou

– Desculpe, falou comigo? – Ela se virou para o rapaz que sorriu

– Parece que esta muito entretida. Posso saber o que é?

– Sou apaixonada por arquitetura antiga… E não sei se você reparou, mas New Orleans é…

– Eu sei – Ele comentou bebendo um pouco do vinho servido no jantar – Parece que atravessamos o tempo. Ainda mais nessa parte da cidade.

– Com certeza eu voltarei aqui um dia, mas para aproveitar sabe? Cada pedacinho – Ela disse entusiasmada com a idéia

– Posso te passar uma lista de lugares que vai adorar.

– Você é bem viajado como o Shane?

– Sim, viajamos para os mesmo lugares, só que de modos diferentes.

– Como assim? – Ela apoiou o cotovelo na mesa e o rosto na palma da mão concentrada agora em Jack

– Gostamos de coisas diferentes. Enquanto ele procura uma boa festa, eu procuro talvez, um bom restaurante. Não que eu não goste de festas, mas…

– Eu entendo. Deve haver tempo para tudo, é o que acho. Uma coisa de cada vez. Qual o primeiro lugar que você me indica? No quesito culinário… – Ela disse rindo, Jack ficou um milésimo de segundo sem pensar numa resposta. O riso dela parecia iluminar todo o lugar.

– Sem duvida o Café Du Monde, ele foi inaugurado em 1862 e boatos de que continua esplendido ate os dias de hoje.

– Se você não fosse tão idiota às vezes poderia ser meu guia turístico.

– O pagamento teria que ser diferente comigo – Ele piscou.

– Viu? Patético.

– Temos que buscar o feitiço.

A noite o lugar parecia mais macabro do que ao dia. O cheiro de mofo estava mais forte e algo mais que Abigail não conseguia notar, Jack levantou a parte do balcão que dava acesso para mais da loja e entrou em um quartinho pequeno que tinha velas por todo o canto, colares de pedra e coisas que pareciam terços, mas a garota sabia que não era. Emilly estava sentada com o rosto abaixado, na mesa a sua frente tinha um desenho de um circulo feito com giz branco, dentro havia a escova de Lucas, um pequeno frasco vazio e uma pedra cinzenta.

– Dê-me a mão – Emilly levantou o olhar para Abigail que se assustou com a voz fria da mulher, Jack a incentivou e ela o fez – Para completar, precisamos de um laço de sangue – Emilly disse abrindo a palma da mão de Abigail e fazendo um corte pequeno deixando o sangue escorrer para o frasco que ate então estava vazio. Tudo aconteceu muito rápido. As palavras que não faziam sentido para Abigail ficavam cada vez mais altas em sua cabeça e a pedra ia diminuindo consideravelmente a cada minuto.

**

Abigail acordou dentro do carro de Jack, a estrada e tudo a sua volta parecia um borrão, ela tentou se mover, mas a dor em sua cabeça se fez presente e o estomago embrulhou.

– Para o carro.

– Bom dia flor do dia.

– Para. O. Carro.

Ela colocou a mão na boca evitando um falso vomito. Ele obedeceu e Abigail desceu do carro, mas sentia-se tão fraca que mal se mantinha em pé, no mesmo segundo, Jack ficou do seu lado segurando sua cintura para apoiá-la.

– Você esta bem? – Ele segurou seu rosto para olhá-la nos olhos

– É como se eu tivesse acabado de ser atropelada por um caminhão desgovernado.

– Eu sei… Eu sinto muito querida, mas foi preciso. Só assim o feitiço seria concluído.

– E foi feito?

– Sim.

Ela tentou sorrir.

– Estamos na metade do caminho, logo chegaremos a Hillstone.

– Você é um péssimo motorista – Ela disse sentando-se no chão, Jack riu alto

– Posso melhorar. Me dá uma segunda chance?

– Você tem remédio de enjôo caso não funcione?

– Podemos procurar na próxima parada.

No som do carro tocava “My girl – The Temptations” e Jack cantava animadamente fazendo uma dancinha coreografada com os braços vez ou outra soltando o volante de vez fazendo o coração de Abigail parar na garganta.

– Você é louco – Ela riu

– Essa viagem serviu para salvar o seu amiguinho ou me agredir verbalmente? – Ele falou sem emoção nenhuma – Essa parte – Gritou e começou a cantarolar o refrão de outra musica que Abigail não conhecia. Ela voltou a rir mais alto e por mais tempo dessa vez.

Quando a garota acordou pela quinta vez estava em frente a sua casa. Ela desceu do carro rápido e antes que entrasse em casa, Jack a segurou pelo braço.

– Esse tipo de feitiço é algo grande. E toda escolha tem uma conseqüência.

– Do que esta falando?

– Tem certeza que quer entregar isso a ele?

– Não tenho duvidas – Ela franziu a testa e depois disse suavemente – Ele é…

– Vá. Entregue. Depois de algumas horas ele estará de volta – Tirou do bolso da calça um anel de prata com um pequeno rubi.

– Tudo vai dar certo não é?

– Eu farei que sim – Jack sorriu enquanto Abigail corria para o quarto.

¹: Tempo, me de um tempo. Pare, eu peço

²: Morte e vida


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