Abigail e a Fera de Hillstone escrita por amarf


Capítulo 6
Capitulo quatro




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No vilarejo onde eu morava as casas não eram grandes, feitas de pedra consequentemente não tinham cor, o vilarejo cinzento que hoje não existe mais estava sempre em movimento. Eu e meus amigos costumávamos correr por todos os becos, ruas, ladeiras e poças de lama para atrapalhar o pouco comercio que a cidade tinha ou para importunar velhas ranzinzas que se vingavam beliscando nossas bochechas quase todos os domingos quando resolviam nos visitar.

Mas tudo isso mudou no dia em que fui visitar meu avô. Era um dia ensolarado, eu estava olhando o vilarejo pela janela do meu quarto esperando o sinal de um dos meus amigos para poder correr ate uma das barracas de fruta quando minha mãe me gritou:

– Jackson – Eu não respondi, bati o dedo no vidro como se aquilo fizesse meu amigo aparecer – Jackson, venha cá agora! – Eu suspirei irritado, me arrastei ate a cozinha onde sempre tinha um cheiro forte de chás e especiarias que só minha mãe entendia, seu cabelo castanho estava nos costumeiros cachos desordenados, usava um vestido longo de linho vermelho, ela ficava radiante com aquela cor. Eu me aproximei dela que sorriu amável, se abaixou para que nossos olhares se encontrassem, passou a mão em meu cabelo e disse: – Hoje é um dia especial. Você já é um homenzinho, esta na hora de lutar pela família.

– Do que esta falando mamãe?

– Nos vamos visitar seu avô.

Ela preparou uma cesta com um pouco de comida, me vestiu em um dos meus casacos mais grossos e vestiu-se com uma capa grossa também, enquanto caminhávamos pelo vilarejo todos pareciam sérios demais, na época, eu não dei tanta importância. Quando chegamos ao limite entre as casas e a grande floresta, eu parei institivamente. Ela apertou minha mão, aquilo significava que deveríamos continuar. Mamãe caminhava com serenidade na mata, alguns arbustos espinhosos perfuraram minha pele, mas continuei firme. Ate aquele dia eu não fazia ideia que tinha um avô, ainda mais que ele morava na grande floresta.

Os minutos se passavam e a mata ficava cada vez mais densa, eu estava com calor mesmo que a luz do sol fosse pouca naquele ambiente úmido. Meus cabelos já estavam molhados de suor, meu coração palpitava ansioso, o ar estava pesado. Eu já estava para pedir a mamãe que parasse quando ela sussurrou:

– Chegamos querido.

Eu forcei a visão para procurar alguma casa, algum sinal de humano, talvez um caminho claro de pedras, mas na minha frente estava a mesma floresta que me cercava.

– Não vejo nada.

Murmurei temendo ouvir que estávamos perdidos, porem mamãe abriu um sorriso enorme que fazia tempo que eu não via, ela estava feliz. Radiante. Soltou minha mão e deu mais um passo para frente. Eu a segui, aos poucos uma casa pequena com apenas uma porta de madeira podre surgiu entre as folhagens da mata, a casa que um dia teve cor estava coberta de musgo e plantas. Logo na frente um homem de cabelos brancos e barba da mesma cor que cobria seu peito estava acocada cavando alguma coisa.

– Papai? – Mamãe disse alegre, o velho homem ergueu o olhar. Seus olhos eram de uma cor inconfundível e única, lilás com pontos de roxo. Tinha um brilho juvenil.

– Ah, minha pequena menina! – Ele se levantou para receber o abraço que minha mãe estava guardando. Ele era tão alto que podia ter quase dois metros de altura – E você, Jack, vem cá.

Eu caminhei tímido em sua direção, ele se abaixou para que pudesse ficar cara a cara comigo.

– Como sabe o meu nome?

– Eu sei tudo que tenho que saber – Bateu de leve em minha cabeça e depois voltou a cavar.

– Eu… – Fiquei confuso com sua resposta, não fazia nenhum sentindo para mim. Eu apenas fechei a boca e concordei, ele tirou uma pequena raiz e enfiou na boca sem cerimonia. Entramos na minúscula casa. Não tinha sala, era apenas uma cozinha, um quarto e outra porta que eu fiquei atiçado a descobrir para onde ia. Os moveis eram de madeira branca e os assentos das cadeiras cobertos com pele de urso.

– Tem algo a perguntar Jack? Parece-me um pouco curioso.

– Por que mora aqui sozinho?

– Quem disse que estou sozinho?

– Bem, eu…

– A floresta nunca esta vazia – Ele cochichou.

– O que quer dizer com isso?

– Quer ouvir uma historia Jack, meu filho? – Eu concordei em silencio.

“Em um tempo antigo onde o mundo vivia em equilíbrio, um homem chamado Silênio desenvolveu a habilidade de dominar ambas as forças: o bem e o mal. Mas ele não tinha conhecimento que a sua ação acabaria levando ao fim o equilíbrio e a harmonia do mundo, sua bondade e seu discernimento para o certo e errado foram sucumbidos pelas forças, com o passar dos anos Silênio se transformou em um ser irracional regido pelas próprias forças.”

– O que aconteceu? – Interrompi curioso demais. O homem barbudo cujo ainda não conseguia chamar de avô riu divertindo-se.

– Foi criado então Admonitu Quattuor.

– O que é isso?

– Foi criado um conselho formado por quatro mulheres que foram submetidas a desenvolverem a habilidade de dominar as forças, essas mulheres adquiriram tanto poder que podiam ver o passado, o presente e o futuro. Tinham a força de interferir na vida de quem fosse para que não houvesse mais ninguém como Silênio, uma ameaça para o equilíbrio do mundo.

– A cada 100 anos, essas mulheres deixam seus corpos para que possam habitar em outro corpo que seja favorável a elas – Ele pegou um copo de agua e transportou a agua para outro copo – E assim tem sido por anos. Família de bruxos seguem a risca as leis e profecias das quatro mulheres…

– Bruxos?

– Aqui querido, coma um pouco – Minha mãe colocou um prato de purê de arroz e batatas quentes para mim e o homem na minha frente. Antes que desse sua primeira colherada na comida, levantou-se ate o pequeno armário próximo a porta pegando velas usadas e colocou na mesa para iluminar.

O dia passara muito rápido, já estava anoitecendo. Confesso que fiquei um pouco amedrontado em voltar para casa na escuridão. Mamãe sentou-se do meu lado e também começou a comer, apesar de querer voltar para casa e quebrar algumas janelas de algumas senhoras, eu estava curioso para saber mais da historia de bruxos.

Quando todos nos terminamos a janta, o homem se recostou na cadeira penteando a barba longa com os dedos, pegou um cachimbo no armário e ascendeu um fumo que tinha leve cheiro adocicado.

– Vamos sentar lá fora. A noite esta linda.

Ele mentiu. A noite estava escura. Eu não enxergava um palmo diante do meu nariz, na parede havia um banco de dois lugares encostado, sentamos ali. Em nossa frente eu conseguia ver o brilho de algo, então sabia que ali próximo tinha agua. Ele soprou mais uma vez a fumaça antes de voltar a falar:

– Como você acha que surge os bruxos, Jack?

– Eles são filhos de outros bruxos?

– Certamente. Há família de bruxos por todo o globo, de vários tamanhos, forças… – Enquanto sua voz divertida e calma contava a historia a fumaça que saia de seu cachimbo dançou em meus olhos transformando primeiro em um homem, depois ganhou curvas de uma mulher com uma criança ao seu lado – Nos somos uma família de bruxos muito poderosos.

– Nos? – Eu sussurrei

– Sim, Jack – Ele soprou a fumaça que se transformou mais uma vez em curvas de uma linda mulher, o brilho que eu dizia ser agua, também ganhou curvas, mas era o corpo de um homem. Agua e fumaça dançavam uma valsa em minha frente – Mas nem todos carregam a marca de um bruxo, eu, por exemplo, sou apenas um Pro Talibus.

– E o que é isso?

– É um portal para que as quatro mulheres enviem suas mensagens.

– Como um… Mensageiro.

– Isso meu filho – Quando ele apagou seu cachimbo e o colocou de lado, as figuras que dançavam explodiram em uma luz fraca, foi como se nunca tivessem existido, levantou-se dando alguns passos para frente, se abaixou tocando a terra, eu achei que ele estivesse procurando mais alguma raiz para comer, mas sua voz sussurrou e aos poucos ele foi falando cada vez mais alto:

“Symbolum eam, sanguis” – Repetia isso muitas vezes ate que seus olhos se encontraram com o meu, em seu rosto continuava o sorriso divertido, mas tinha algo diferente. Ele parecia perverso. Sem saber o por quê comecei a me sentir fraco vendo-o me olhar daquela forma. As sombras da floresta ganharam corpo físico, elas caminhavam, se arrastavam e algumas ate dançavam ao redor do velho. Eu não conseguia me mover, tentei correr quando senti algo gelado e visguento tocar minha perna, meus olhos viram uma sombra, mas eu não conseguia reagir.

Acordei no dia seguinte de cama, mas não era a minha. Uma pele de urso cobria meu corpo e velas tremulavam no chão, eu sabia que ainda estava na casa do velho. Levantei meio tonto, a casa estava iluminada pelas velas dando um aspecto sombrio, no meio da cozinha onde deveria estar a mesa, o velho estava de joelhos com os olhos fechados. Relutante, me aproximei da figura paralisada que estava de arrepiar, estava a centímetros do seu corpo quando ele segurou em minha mão e eu fui sugado me sentindo cada vez mais vazio.

Quando acordei pela segunda vez, estava em minha casa. Algo tinha sido roubado dentro de mim. Eu não sentia mais medo, dor ou frio. Eu estava faminto… Mas não era de fome.

************

– Lisa, volta já aqui! – Shane gritou irritado, a garota corria pela casa com o celular balançando nos dedos, no visor uma foto do rapaz no banheiro – Volant – Jogou uma bola de fogo em direção a Lisa que segurou de volta e fez sumir em vapor.

– Sério? Sabe que comigo esses joguinhos não funcionam…

A brincadeira encerrou quando ouviram alguém bater na porta.

– Esta esperando alguém? – Jack disse mordendo a boca para segurar o riso da briguinha dos dois

– Algo errado… Algo bem errado… – Lisa franziu a testa, ela apertou o peito desconfortável com a situação – Vejam quem é a na porta. Preciso me concentrar – Sussurrou subindo as escadas.

Shane caminhou ate a porta, Abigail estava de braços cruzados, a testa franzida a deixava com uma expressão mais apreensiva, estava acompanhada de Lucas que parecia entediado. Quando os olhares dos dois se encontraram, foi um misto de confusão e alegria.

– Oi Shane… Atrapalho?

– Não… – Ele sorriu – Algum problema?

– Não vai nos convidar para entrar? – Lucas disse olhando por cima do ombro de Shane, Abigail deu uma cotovelada nas costelas do amigo

– Desculpe Shane… Eu… – Ela coçou a cabeça um pouco nervosa – Não lembro bem da noite passada, achei que podia me ajudar a…

– Você não a drogou, drogou? – Lucas voltou a dizer

– Sutileza não é o seu ponto forte mesmo! – Abigail massageou a testa

– Não, eu não droguei ninguém. E não posso ajudar.

– Não pode?

– Eu mal consigo me lembrar… Acho que bebemos cerveja demais… – Sorriu galanteador

– Não vem com essa para cima de mim não rapaz! – Lucas se pôs na frente de Shane – Você já é bem grandinho para “beber cervejas demais” – Imitou com fracasso a voz de Shane

– Qual o seu problema? – Abigail gritou

– Esse cara nem nos convidou para entrar. Tem algo errado aqui. Eu sinto cheiro de encrenca a km de distancia – Lucas semicerrou os olhos encarando o rapaz que ainda estava na porta sem dizer nada

– Foi bom vê-la novamente, Abigail. Na próxima vez que nos encontrarmos, espero que esteja sozinha! – Fechou a porta deixando a garota sem respostas

– Para poder droga-la de novo não é?! – Lucas gritou – Eu não vou deixar!

Abigail saiu de perto do amigo dando passos fundos, estava visivelmente irritada.

– Volta aqui, Abigail!

– Mil vezes ter vindo sozinha! – Ela praguejou no ar – O que deu em você?

– Eu estava atrás das suas respostas! – Disse irritado com a amiga, colocou as mãos no bolso e saiu andando deixando-a para trás. Ela ficou parada no mesmo lugar olhando o amigo caminhar sozinho em sua frente, atrás a mansão Hill que de dia parecia bem mais imponente brilhava no sol forte daquela manha.

Detestava ficar sem respostas. Girou os calcanhares e caminhou atrás do amigo, não tinha mais nada para fazer ali.


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