Slasher Story escrita por PW, Felipe Chemim, VinnieCamargo


Capítulo 13
1x12: Terror Natalino (PART II) - Merry Xmas, Van Der Bitches!


Notas iniciais do capítulo

Escrito com sangue e víscera por Felipe Chemim.



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Neste exato momento, o vidro parecia uma pequena e frágil cortina de água em uma bela cachoeira para Skarlett. O corpo da mulher, de encontro com a janela, tinha forças suficientes para quebrá-la, e assim o fez, mesmo que ela tenha tentando impedir, com sua mão ensanguentada. Ainda com dor em sua barriga, a loira despencou da casa na árvore.

Rápido como uma pedra, o corpo de Sky caiu de costas sobre a grama verde e recém cortada. Sua visão começava a ficar escura e borrada, enquanto dava os últimos sinais de vida, com pequenos espasmos em seus braços e peito, que tentava capturar o máximo de oxigênio para os pulmões, mas falhava.

Antes de perder totalmente a consciência, colocou novamente a palma de sua mão, cheia de sangue, no ferimento em sua barriga. O líquido rubro ainda escapou por entre os dedos de Sky, antes de seu olhar fixar-se no céu.

3 horas antes…

Peter, já caído ao chão, colocou a mão sobre o ferimento, em uma região que parecia queimar como brasa. A bala da arma de fogo o atingiu em cheio e agora seu corpo expelia sangue, que escorria no piso da casa, mesmo na tentativa falha de cobrir o machucado com sua mão. Phillip ficou pálido e correu se agachando na direção do irmão, tentado ajudá-lo a conter o máximo que podia do líquido rubro.

— Peter, fica calmo! – Phillip tentou dizer, sendo um pouco hipócrita, pois estava transbordando desespero. Em um rápido movimento, pegou um pano com decoração natalina que estava por perto e pressionou no local ferido – Aguenta firme, irmão, aguenta firme… Alguém chama uma ambulância!

Mark, ainda agitado, segurava a arma de fogo, com uma expressão de ódio dominando em sua face. Como se finalmente percebesse o que tinha feito, deixou a arma cair e saiu correndo pela porta de entrada, dessa vez com uma clara expressão assustada no rosto. Vince, acompanhado de Brenda, seguiu o garoto. Não poderiam deixá-lo escapar assim.

Blaire, trêmula, estava com seu telefone em mãos, mas sua expressão parecia decepcionada. Desesperado, Phillip retirou seu celular do bolso e discou o número de emergência. Uma mulher logo atendeu.

— Emergência, como poderia ajudá-lo?

— Por favor, moça, meu irmão, ele… Ele levou um tiro... – Phillip guaguejava – Alô? Moça?

O gêmeo mais novo olhou rapidamente para a tela de seu celular e observou o sinal cortado. Então, as luzes se apagaram.

OPENING THEME

 

SLASHER STORY

 

1x12: Terror Natalino (Parte II): Merry Xmas, Van Der Bitches!

Mark pisou em algumas folhas secas e caídas enquanto fugia. Sentia seu sangue fervilhar, esquentando a musculatura de seu corpo. Seu rosto devia estar, no mínimo, corado. Mas não por vergonha, e sim, por nervosismo. Até porque não sentia culpa ou constrangimento do que fez.

Sua mão já havia se despido da arma, mas ainda assim sentia como se o objeto permanecesse na palma dela. Tinha recebido uma mistura de emoções antes do disparo. Coragem misturada com fraqueza, justiça misturada com vingança, penitência misturada com caos e desordem.

Todos esses sentimentos foram unidos em apenas um e putrificaram-se até virarem pó quando ele apertou o gatilho. O mundo pareceu perder a tonalidade em sua visão, enquanto observava Peter ser atingido pela bala. Mark nunca havia sentido tanto poder em suas próprias mãos, mesmo com uma pontada de insegurança.

Após o ato feito, um vazio preencheu o interior do garoto, que permaneceu em um estado de choque. Não acreditou que havia mesmo atirado no poderoso Peter Van Der Hills. Enquanto observava o irmão mais novo tentar socorrê-lo, Mark foi preenchido por um sentimento de fuga, e assim o fez.

Corria, sem direção e sem destino.

Logo após que saiu do cômodo e começou a dar a volta na casa, sentiu Vince e Brenda o seguindo. Ele não queria ser pego. Ele não podia ser pego. Correu o mais rápido que conseguiu, tentando despistar os irmãos Hardy. Quando conseguiu, se encontrava perto do lago.

Sua mente estava em um turbilhão de confusões e nervosismo. Não conseguia pensar em nada direito. Resolveu correr para o jardim, avistado a alguns metros. Antes de chegar até ela, parou atrás de um grande tronco de árvore. No alto, podia ser observado uma casa pendurada, totalmente rosa e mais organizada do que uma “casa na árvore comum”.

Virou seu rosto e ouviu os irmãos Hardy parando em sua procura. Olharam para os lados e resolveram correr em direção à saída, pensando que Mark estaria fugindo da casa. Mas na realidade, ele só queria ficar sozinho.

Depois que Vince e Brenda saíram de perto, Mark correu para o jardim, que estava totalmente tomado por um enorme labirinto feito por paredes de arbustos. Essas paredes estavam enfeitadas por adesivos de árvores, bolinhas e bonecos de neve. Piscas-piscas ao alto davam um charme a mais.

Ao chegar perto do início, o garoto observou o longo corredor de entrada, logo após um frágil portão metálico. Imagens de diversos papais noéis em volta do ferro anunciavam, junto com uma faixa branca, um jogo especial de natal. Mark entrou no local e foi obrigado a seguir por um corredor não muito largo, que, para variar, estava com mais enfeites natalinos. Bolinhas brilhantes batiam-se uma nas outras quando uma leve brisa seguia-o.

Inquieto, o rapaz andou até achar um corredor sem saída. Foi até o fim dele e sentou-se no chão, aconchegando-se na pouca luz dos piscas-piscas.

***

Skarlett saiu do táxi, que estava estacionado em um prédio aparentemente normal. Seu vestido azul claro se assemelhava a um pano celestial, porém sem nuvens, dando vida às curvas do seu corpo escultural. Usava um delicado colar que adentrava em seu decote sensual e brincos, que combinavam com a outra jóia. Uma bolsa estava em suas mãos, aumentando sua aparência sofisticada e cheia de classe. Os cabelos louros, curtos e repicados se movimentavam com a brisa noturna, iluminando seu rosto levemente maquiado. Ela não precisava disso.

Com o telefone colado em sua orelha, interrogava seu informante:

— Você tem certeza de que ele ainda está aqui nesse prédio?

— Absoluta. – a voz respondeu do outro lado da linha – Em breve chegarei no cemitério, entregarei o buquê ao túmulo da sua mãe.

— Obrigada. – Skarlett agradeceu – Queria que eu mesma fizesse isso, mas infelizmente não poderei. Nos falamos depois.

Ligação encerrada.

Skarlett ajustou seu vestido, arrumando seu decote. Com um andar matador, passou pela porta giratória do gigantesco prédio de advocacia, construído com mármore bruto. O piso, no interior, era feito com granito preto, límpido como um cristal resplandecente, refletindo parte do movimento sobre ele. Em algumas paredes, quadros de paisagens amenizavam o olhar de quem passava por lá, tentando causar uma falsa leveza e paz no recinto. Em mesas e balcões espalhados, viam-se alguns arranjos de flores, acompanhados por candelabros dourados, com algumas velas, mas que não estavam acesas, sendo usadas apenas para enfeite. Do centro do teto abobadado azul-marinho da sala de recepção, uma corrente de ouro descia, prendendo um lustre de diamantes e ouro.

As pessoas que habitavam o ambiente se dividam entre clientes e funcionários. Muitos desse primeiro grupo estavam visivelmente irritados. Possivelmente tinham algum problema que precisava ser resolvido urgentemente. Já os funcionários corriam para todos os lados, com papeladas e telefones nas mãos, em busca de uma solução mais rápida possível para diversas situações. Os homens se encontravam elegantes, com ternos e blasers diversos. As mulheres, a maioria clientes, buscavam tentar humilhar as outras, com vestidos bonitos e caros. Os funcionários mantinham uma expressão cansada no rosto, mas ainda tinham disposição e energia para pensar em soluções eficientes.

Skarlett se encaminhou até o balcão de recepção. Nele, um senhor gorducho e com bigode platinado revirava seu celular, na busca implacável de alguma coisa. A loira passou rapidamente os olhos sobre a pequena plaquinha de indentificação a frente do homem.

Brunno Fernandez.

“É exatamente o latino que procuro.”

Skarlett pousou suas mãos no balcão.

— Boa noite, senhor Fernandez. – ela cumprimentou – Gostaria de conversar com o ilustríssimo doutor Larry.

— Hum… - o senhor a encarou – Seu nome, por favor?

— Skarlett. – ela disse simplesmente. Brunno ficou esperando o complemento. Skarlett revirou os olhos e soltou um suspiro – Van Der Hills. Skarlett Van Der Hills.

Brunno virou o rosto e teclou por alguns segundos em seu computador, com os olhos fixados na tela. Depois de um tempo, seus dedos pararam e ele encarou Skarlett. Pigarreou.

— Ahn, senhora Van Der Hills… - ele começou – Você está proibida de subir conversar com o doutor ou qualquer outro. Aliás, proibida de entrar nesse prédio.

— Quem proibiu?

— Ordens maiores. – Brunno respondeu secamente, entregando à mulher a resposta que ela queria.

— Não há nada que eu possa fazer? – Skarlett fez cara triste.

— Não. E se a senhora não sair imediatamente, serei obrigado a chamar os seguranças. – ele ameaçou.

— Tudo bem, você venceu. – a loira disse erguendo as mãos em sinal de redenção – Mas antes que eu vá embora, posso conversar com algum daqueles advogados ali?

Skarlett se inclinou sobre o balcão, atraindo o olhar do senhor para seu decote.

— Já que não posso falar com o doutor, é claro que eu poderia abrir um processo com algum advogado, alegando abuso ou desrespeito a mim como cliente. Aliás, já pode parar de olhar para meus peitos, aquela câmera e aquela outra lá já capturaram seu olhar desinibido e extremamente grosseiro. – Skarlett chamou sua atenção. Brunno começou a corar – Mas tenho uma denúncia bem melhor de uma plantação de drogas ílicitas e latinas de um certo senhor bigodudo no quintal dos fundos de sua casa. Imagina também se a imprensa soubesse que um funcionário que trabalha aqui nesse escritório histórico e importante é um grande traficante há anos? Iria manchar tanto a imagem dos negócios.

Skarlett encarou Brunno por alguns segundos, que estava totalmente vermelho. Logo após, ele lhe entregou um cartão magnético.

— Aqui está seu cartão para conseguir acessar o andar do doutor Larry. – ele informou – Use o elevador do meio. Sétimo andar.

— Oh, muito obrigada! – Skarlett agradeceu sorrindo, enquanto pegava o cartão.

Desfilou pelo hall de entrada até encontrar o elevador, agradecendo pelas informações certas que tinha para conseguir entrar. As portas do elevador se abriram e Skarllet adentrou. Passou rapidamente o cartão magnético e as portas se fecharam.

***

Quando Phillip acordou, parecia ter recebido uma granada diretamente em seus ouvidos. Seu equílibrio estava completamente abalado, sua audição estava fraca e a visão escura e turbulenta. Demorou alguns segundos até que ele se acostumasse com a luminosidade do local, que retornara. Apoiou no chão gelado para se levantar, quase caindo novamente. Piscou algumas vezes, até voltar ao normal.

Olhou em volta. Todos que estavam com ele, antes de apagar, estavam ali, também acordando aos poucos.

Menos Peter.

— Onde está Peter? – Phillip gritou, obtendo um pequeno eco como resposta – Cadê meu irmão?

A pergunta foi como um tapa no rosto de Blaire, acordando-a de vez. A garota se pôs de pé e olhou em volta, também a procura do gêmeo mais velho. Por fim, a única coisa que encontraram foi uma pequena tela com um ícone de vídeo no centro.

— Será que devo dar play? – Blaire perguntou, encarando Phillip.

O irmão mais novo virou o rosto, olhando para os outros dois da sala. Riley e Rowen o encaram, com expressões monótonas e ilegíveis. Phillip tornou a olhar para Blaire e fez sinal afirmativo com a cabeça.

Após a tela ser tocada, um vídeo começou a rodar. Em um fundo branco, obtendo contraste com seu manto negro, Reaperface jazia em uma pose ameaçadora. Sua máscara mantinha a mesma expressão que sempre teve, mas agora parecia sorrir diabolicamente. Mais uma vez.

— Nós teremos uma longa e divertida noite natalina. – sua voz metódica e modificada resoou – Suponho que já notaram a falta de um certo membro do grupo de vocês, certo? Embora eu mesmo esteja surpreso que vocês não perceberam um simples gás suspeito invadindo o cômodo, mais cedo. Nunca foi tão fácil fazer vocês desmaiarem. Mas não se preocupem. Peter se encontra vivo. Ainda. Só está ferido devido ao inesperado ato do amigo de vocês.

Blaire assistia atentamente ao vídeo, sem piscar. Uma gota de suor escorreu pela testa de Phillip. Suas mãos tremiam um pouco. Estava nervoso. Muito nervoso.

— Ele se encontra dentro de casa. Não está nas melhores condições para ser visto, mas ainda mantém um fino fio de vida. – Reaperface informou – O primeiro passo do novo jogo é achá-lo. Mas quando fizerem isso, vão perceber que ainda há muitas jogadas a se fazer. E lembrem-se de quem tem o controle do jogo. Boa sorte e boa morte.

A tela ficou escura. Phillip olhou para Blaire. Então para Rowen e em seguida para Riley. Todos esperavam que ele os guiasse. A resposta do que fariam era óbvia. O gêmeo mais novo deu alguns passos e pegou a arma deixada por Mark no chão. Blaire arquejou.

— Phillip, você não deveria tocar na arma. – ela opinou – As digitais de Mark ainda estão aí e isso prova que ele atirou em Peter.

— Não se preocupe. A justiça que cairá sobre aquele verme não vai ser algo moralmente legal. – Phillip respondeu com um semblante sério em seu rosto – Agora, vamos achar meu irmão.

Phillip liderou a caminhada, abrindo uma porta e começando a guiar o pequeno grupo pela casa. Blaire o seguia. Ela mantinha as mãos perto do corpo e distribuía passos pesados. Estava tensa. Rowen e Riley caminhavam logo atrás. Essa última olhava para todos os lados, tentando visualizar qualquer coisa que ajudasse. Talvez o assassino estivesse a espreita, esperando o melhor momento para um golpe certeiro em uma vítima desprotegida. Ou talvez Peter estivesse mais perto do que imaginavam, esperando uma ajuda essencial antes que o anjo da morte o sucumbisse.

Alguns cômodos permaneciam mergulhados em uma penumbra leve que se instalara como um parasita naquela casa. Reaperface devia estar controlando os geradores de energia, assim explicando o fato da luz fraca pelos corredores e locais. Ninguém podia garantir que o maníaco estava escondido entre os tons escuros da casa, em suas sombras. Nos medos de suas vítimas.

Após alguns minutos andando com cautela e nervosismo pela casa, Phillip avistou seu irmão. Ele estava amarrado em uma cadeira, com os braços para trás e a cabeça caída. Parecia estar inconsciente. Tomando cuidado com a arma em suas mãos, o gêmeo mais novo se agachou, colocando a mão no rosto do outro.

— Peter, ei… - Phillip chamou calmamente – Ei, cara, sou eu, seu irmão. Você está me ouvindo?

Os olhos de Peter estavam semi-abertos e ele tinha pequenos espasmos na pálpebra. Parecia estar delirando. Phillip deu a volta na cadeira e observou correntes e fios em volta dos pulsos de seu irmão. Entre as mãos, um pequeno círculo mantinha uma contagem regressiva, junto com um pequeno bilhete.

— O que diz aí? – Blaire perguntou.

— “O cadeado que prende Peter só pode ser aberto por uma única e exclusiva chave, que está em algum lugar na residência.” – Phillip leu – “Se divirtam procurando. Sem polícia ou outras pessoas, ou a casa voa pelos ares.”

— Ai meu Deus! – Blaire exclamou.

— Você tem certeza? – Rowen perguntou – Pode ser uma outra armadilha. Colocamos essa tal chave e tudo explode do mesmo jeito.

— É nossa única alternativa. – Riley respondeu – Nossos celulares estão sem sinal.

— E ele ainda está ferido. – continuou Blaire, agachando-se na frente de Peter e analisando o ferimento causado pela bala – O assassino fez um curativo mal feito intencionalmente. Ele quer que Peter fique vivo, mas tempo o suficiente para realizar o jogo dele. Muito sangue foi perdido, suponho que se continuar nesse ritmo, morrerá em…

—…3 horas. – Phillip completou – É a contagem regressiva no relógio. A chave está em algum lugar da propriedade, precisamos achá-la.

— Mas esse lugar é enorme. Tem o lago, pode estar lá no fundo dele. Ou enterrado profundamente no jardim. – Riley supôs.

— Riler, você não está ajudando. – Rowen alertou

— Sabem o que isso significa, certo? Para uma busca mais eficiente, teremos que nos separar. – Phillip concluiu.

Rowen começou a argumentar. Riley cuspia contra-argumentos. Blaire andava nervosa, olhando com desespero para Peter, sussurrando coisas. Todos falavam ao mesmo tempo e parecia um zumbido de abelhas.

— Gente! – Phillip gritou exigindo silêncio – Vocês podem ficar se quiserem, mas eu quero tirar meu irmão disso.

— Nós também ajudaremos. – Riley disse. Certo medo se mexia dentro dela, mas isso não a impediria de nada. Nada.

— Certo. A propriedade é enorme. – Phillip lembrou – Eu vou pelos fundos e revisto o jardim. Riley e Rowen, verifiquem os portões e parte frontal.

— E eu? – Blaire perguntou.

A contagem no relógio começou a contar, fazendo um pequeno “bip!”. Phillip olhou para o relógio.

3:00:00.

2:59:59

2:59:58

2:59:57

Phillip fitou o rosto de Blaire por alguns segundos, talvez ainda tomando coragem para dizer o que queria. Segurou na ponta da arma e esticou seu braço, oferecendo o objeto à garota.

— Pegue. Fique aqui. Como filha de um xerife, suponho que saiba manusear uma arma. Cuide de Peter. – Phillip começou – Ele está indefeso e precisa de alguém. Você parece nutrir algum sentimento por ele. Pois agora alimente a proteção. Fique aqui. Vigie as portas, as janelas. Converse com Peter. Ele pode não estar acordado, mas poderá te ouvir.

Depois de alguns segundos observando a arma na mão de Phillip, Blaire tomou-a de suas mãos, junto com as instruções. Olhou para Peter, prometendo cuidar do garoto, não importa o que acontecesse. O irmão mais novo se encaminhou para o corredor dos fundos, então virou seu rosto e disse:

— Fiquem espertos e não se distraiam. Andem com seus celulares em mãos. A qualquer mínimo sinal que consigam, liguem para uma ambulância, polícia ou qualquer ajuda. Vamos precisar depois que acharmos a chave.

Seus olhos pousaram mais uma vez sobre Peter e ele fez uma promessa silenciosa: “eu voltarei, irmão.”

***

As pernas de Skarlett se cruzavam enquanto ela andava. O corredor era mal iluminado pelos abajures em cima de pequenos balcões de madeiras espalhados perto das paredes. Possuía certo charme, talvez até algo meio britânico. O tapete sobre seus pés possuía tonalidade vermelho-vinho, uma cor que agradava os olhos da mulher. Andou até o fim do corredor, adentrando na única porta visível.

— Por um acaso, algum daqueles advogados pode te processar por os fazer trabalhar em uma noite como essa? – Skarlett disse fechando a porta.

— Na verdade, não. – um homem sentado de costas em sua cadeira giratória falou, então virou-se, encarando a loira – Estava no contrato deles. E um bom advogado sempre lê o que assina.

Skarlett sentiu o veneno de Larry exalando.

— Mas pelo menos poderia colocar alguma decoração de natal? – Skarlett sugeriu olhando ao redor da sala – Cadê sua touquinha de papai noel?

Larry soltou um riso irônico. Seus olhos claros combinavam com alguns cabelos grisalhos que apareciam em sua cabeça. A barba recém-aparada em seu rosto lhe dava um ar mais jovial, como um adolescente vestido de terno. Para completar a imagem, usava uma gravata azul, combinando com suas íris.

Do lado esquerdo, a sala possuía uma estante com diversas prateleiras, todas preenchidas com diversos livros grossos e visivelmente recém limpos. A maioria falava sobre leis e códigos jurídicos. Skarlett sabia disso. E também sabia o que cada livro dizia. Teve que ler todos eles para entrar na faculdade. Sempre teve boa memória e analisava bem os outros. Guardava qualquer mísero detalhe. Qualquer coisa que pudesse ser usada contra ou a favor de alguém em uma situação. Gostava de conhecer as pessoas com que convivia e com que lidava.

A mesa no centro da sala estava preenchida com diversas pilhas de papéis. Poltronas para visitantes se mostravam convidativas. No lado direito, a única visão obtida era um quadro. Nele, um céu pintado apenas com uma tinta azul-celestial se misturava com o azul-marinho que percorria dando forma ao mar. Era uma bela obra aquarela pintada à mão.

— Bom, Skarlett, - Larry começou a dizer, unindo suas mãos – faz bastante tempo que não nos vemos…

— Três anos e cinco meses.

—…e eu queria ter perguntar o que te trouxe até meu simples escritório. Até porquê você foi proibida de subir até aqui.

— Engraçado você relembrar disso. – Sky ironizou sentando-se em uma das poltronas – Depois de tudo que você me fez, ainda me proíbe de usar um simples elevador?

— Sei que tipo de mulher você é. Não precisa me enrolar. – Larry disse, gesticulando com as mãos – Vamos direto ao ponto. O quê você quer?

— Bem… Antes de você ir embora e me deixar sozinha, você disse que seu pai, o juiz Weil, possuía certos arquivos sobre Tommy Warland e alguns detalhes sobre o assassinato de vinte anos atrás. – Skarlett falou seriamente – Eu os quero.

Larry forçou uma risada seca.

— Para quê? Você soube das últimas notícias, não soube? Tommy Warland está morto.

— Eu sei. E eu ainda quero os arquivos. – Skarlett repetiu.

— Eu adoraria entregá-los para você, mas não estão comigo e…

— Eu sei que esta porra está com você, Larry. Ah, desculpe, esqueci que você é uma machista de merda e espera que eu me comporte como mocinha. – a loira disse – Você pode enganar qualquer mísero advogado que está se enforcando aos poucos com uma gravata lá em baixo, mas eu não sou igual a nenhum deles e sabe disso.

Ela pousou as mãos sobre a mesa.

— Eu sei que os arquivos devem estar em algum livro falso naquela instante, dobrados duas ou três vezes, onde ninguém poderia imaginar. – Skarlett falou – Você me deve isso. Me fez assinar um acordo sem ler, o qual me fudeu por um bom tempo, Larry. Eu tive que me esforçar para retomar as rédeas da minha vida. Se não fosse a promotora Keating… Não sei onde estaria.

Larry abriu a boca e Skarlett sabia que ele negaria novamente.

— Certo. – ela o interrompeu – Eu não queria ter que usar algum truque sujo ou segredos da sua família contra você, mas não tenho escolha.

Ela retirou algumas pastas e jogou sobre a mesa de Larry.

— O que é isso? – ele perguntou confuso pegando uma das pastas. Skarlett se levantou e começou a andar pela sala.

— São diversos ofícios, protocolos, denúncias, fotos e prints de vídeos que incriminam seu pai. Um juiz tão dedicado a família, com uma imagem tão bonita e inspiradora, mas que possue um passado tão podre quanto a carcaça do velho Tommy Warland.

— Os processos que a promotoria tem não são esses. São coisas pequenas que arrebatamos com um sopro. – Larry parecia incrédulo.

— Por enquanto. Mas você, apesar de ser uma péssima pessoa, entende das leis. Sabe que isso tudo aí poderia colocar seu pai atrás das grades em duas horas. – Skarlett blefou – O caso em que ele aceitou um cheque com vários zeros para silenciar tudo sobre aquele acidente envolvendo filho de um milionário e deixá-lo impune. Ou o estupro contra uma estagiária de dezessete anos que foi enterrado. E ainda tem aquele…

— Cala a boca, sua vadiazinha medíocre! – Larry gritou furioso jogando as pastas no chão e fechando a mão sobre uma tesoura.

— Oh, não fique tão bravo. – Skarlett fez biquinho, ironicamente – E está pensando o quê? Em me matar com uma tesoura? Faça-me o favor. Se ainda me desse cinco minutos para colocar uma roupa apropriada, poderíamos ter uma luta justa. Na verdade, iria me favorecer um pouco…

Ela aproximou da mesa e colocou o dedo indicador em baixo do queixo de Larry.

— Os arquivos. – ela repetiu.

Larry bufava.

— Ou vou ferrar seu pai, de um jeito pior que você me ferrou. Seu pai. O homem que te colocou onde você está hoje em dia. O homem que sua mãe não sabe que a traiu com sua própria sobrinha. O homem que esconde tantos esqueletos em seu armário quanto um cemitério em seus túmulos.

Larry fechou os olhos por alguns minutos. Então se encaminhou para a estante e pegou um dos livros falsos que possuía o interior oco. Dentro dele, pegou uma papelada e entregou para Skarlett. A loira ficou satisfeita e guardou tudo em sua bolsa.

— Você se acha invencível, não é mesmo, Skarlett?

Ela sorriu e se encaminhou para a porta de saída.

— Invencível não. – ela negou – Apenas melhor.

A porta se fechou atrás dela.

A bolsa pendia em seu braço, enquanto andava com uma postura ereta e que demostrava em seus passos a mulher forte que ela se orgulhava em ser. Enquanto andava até o elevador, discou alguns números em seu celular e o colocou na orelha.

— Alô? É do jornal diário? – ela perguntou – Tenho algumas informações que dariam uma ótima primeira página. Sobre o juiz Weil. Algo totalmente sigiloso, de graça e anônimo.

Sky havia prometido para Larry. Mas não havia gravação disso e dessa vez ela não assinou nada. Sorriu, ao terminar seu pensamento. A ligação com o jornal foi encerrada e as portas do elevador se fecharam.

***

Phillip dava a volta na propriedade. O local estava escuro e ele não via um palmo na frente de seu rosto. Era a hora perfeita para ser vítima da lâmina de Reaperface. Andou cautelosamente, de costas para a parede, tateando por onde passava.

Alguns piscas-piscas ainda mantinham-se acesos ao longe, perto do jardim, entre poucas árvores, em um caminho pouco convidativo. Phillip já achava díficil ter que achar uma chave. No escuro, isso tudo se multiplicava por cem.

Começou a andar pelas árvores, sempre olhando em volta. Mesmo com o pouco de luz que emanava pelos piscas-piscas, eram apenas pequenos pontos de luminosos cobertos por uma escuridão devastadora.

O escuro.

O escuro sempre foi uma fonte de fobia entre diversas pessoas. Phillip nunca teve medo da penumbra. Desde quando era bebê, sempre dormia com as luzes apagadas. Podia-se criar até um pequeno e particular mundo. Cada homem tinha sua escuridão dentro de si. E apesar de o gêmeo mais novo não ter medo, ele entendia quem tinha.

Mas na realidade, as pessoas não têm medo do escuro, e sim do que há nele.

Regulou o flash de seu celular e começou a guiar-se pela trilha. Se não conseguia ligar para ninguém, pelo menos iria dar outra utilidade para o aparelho.

Pensou ter ouvido passos a direita. Virou rapidamente o corpo. Respiração pesada. Coração acelerado. Não viu nada. Continuou a andar. Olhava para todos os lugares que conseguia ao mesmo tempo, tentando ver qualquer coisa que se parecesse com uma chave.

Andou por alguns minutos, até conseguir ter uma visão ampla do labirinto no jardim. Era o local mais bem iluminado que podia se ver. O estalo na mente de Phillip foi rápido.

Com passos apressados, ele entrou no labirinto.

***

A água balançava suavemente como uma brisa solta pelo céu. Lucky sentia a cabeça ter leves espasmos e doer, levando sua mão à ela, antes mesmo de abrir os olhos. Ao abrí-los, percebeu que o céu noturno estava sobre sua cabeça, quase inteiramente negro como o manto de Reaperface, com apenas um ponto de iluminação: a lua.

Após a dor em sua cabeça começar a diminuir, o atleta percebeu que ele estava balançando, como se estivesse em uma rede entre duas paredes. Olhou ao seu lado e observou a madeira do pequeno bote, em que ele se encontrava dentro. Agarrou as bordas para ganhar impulso e sentou-se. Girou sua cabeça para a direita e depois para a esquerda, visando tentar ter o maior conhecimento possível da área em que estava.

Estava no meio do lago. Ao longe, a casa de Hannah mantinha algumas luzes apagadas e outras acesas. O silêncio predominava, sendo quebrado pelas pequenas ondas batendo no casco do bote ou por barulhos da natureza. Atrás da casa, no jardim, pequenos feixes de luz se misturavam na visão de Lucky. Eram algumas árvores enfeitadas.

— Olá? – ele falou baixo, mas obtendo um eco mesmo assim – Tem alguém aí?

Silêncio.

Bateu os braços na água, tentando dar movimento para a pequena embarcação, mas falhou. O bote parecia estar preso por alguma coisa. Sentou-se novamente e bufou, tentando pensar em qualquer mínimo plano para sair dali. Passou as mãos no rosto. Suava. Com a mão em formato de concha, mergulhou-a na água e depois lavou o rosto. Precisava despertar também. Olhando para água, que na quase escuridão total, estava negra, teve uma ideia.

Então, Lucky mergulhou no lago.

***

— Rowen? – Riley chamava caminhando pela calçada que levava até o portão de entrada – Rowen, cadê você?

A garota perdeu o amigo enquanto passavam por entre algumas árvores no jardim. Em um momento, ele estava atrás dela. Três segundos depois, havia sumido. Metade de Riley estava irritada com o amigo, pensando ser uma espécie de brincadeirinha de mal gosto fora de hora. A outra metade fervilhava em preocupação. E se ele foi pego pelo assassino?

Riley chegou até o portão. O metal estava retorcido e diversos cadeados impediam sua abertura. Ela agarrou em duas barras e chacoalhou, sem saber ao certo qual era o objetivo. Olhou em volta. Estava tudo vazio, como um deserto.

Não sentia-se segura ali. E realmente, não estava. Todos estavam vulneráveis. Ainda mais sozinhos. Solitários. Sozinha. Solitária. Vulnerável. Com medo. Sozinha.

Riley recomeçou sua caminhada, pela calçada de onde veio. Iria voltar para a casa grande, faria companhia para Blaire. Cruzou os braços como sinal de auto-proteção e mentalizou a imagem de Rowen em sua mente. Precisava achar o amigo. Olhou rapidamente para a tela de seu celular. Ainda estava sem sinal.

Ouviu um barulho por perto. Olhou em volta. Seria Rowen? Reaperface?

Virou o rosto para a esquerda e avistou uma pequena construção de madeira. Estava mofado, quase caindo. Provavelmente fora construído há muitos anos atrás. Parecia ser um pequeno cômodo onde se guardavam coisas velhas. Uma pequena ideia começou a brotar na cabeça de Riley. E se a chave estivesse ali? A garota mal havia visto a primeira vez que passou por ali e só veio a notar agora por pura sorte. Um lugar velho, camuflado na fraca iluminação e um tanto macabro. Perfeito.

Riley caminhou em passos lentos até a pequena construção. Deveria ter no máximo três metros quadrados. Ela segurou na maçaneta enferrujada da porta e a abriu com um rangido. Lá dentro, a escuridão predominava na maior parte. Entrou.

Andava calmamente entre alguns objetos velhos. Uma máquina de cortar grama, uma tesoura de jardinagem, mangueiras, brinquedos quebrados, guarda-roupas velhos. No telhado, um buraco dava visão da lua. Riley olhava atentamente, tentando acostumar seus olhos na penumbra. A porta atrás dela fechou-se.

“Chave, chave… Ache a chave, Riley!”

Passou por um espelho sujo, quando uma teia de aranha grudou em seu corpo e a jovem se balançou e agitou os braços freneticamente, tentando escapar do material grudento. Quando finalmente conseguiu, acabou esbarrando em uma pilha de objetos, que foram ao chão. Ferramentas, pedaços de madeira e um galão com soda cáustica caíram.

Além de pneus desgastados e várias ferramentas, uma lanterna também deslizou pelo chão, em um semi-círculo, parando aos pés de Riley. Não havia achado a chave, mas pelo menos conseguiu algo útil. Inclinou o corpo e esticou o braço, pegando o objeto.

Com o polegar direito, acionou o botão da lanterna, que lançou um feixe de luz. Apontou para o espelho, obtendo uma visão do reflexo de todo o cômodo. Seus olhos se arregalaram e o coração disparou ao ver a imagem refletida.

Riley gritou.

***

Skarlett estava com as pernas cruzadas no banco traseiro do táxi. A taxista dirigia calada, provavelmente cansada do longo dia de trabalho. A loira permanecia com a cabeça baixa, folheando os arquivos que Larry lhe deu. Muitos relatavam as vítimas do massacre há vinte anos. Um homem que morreu por levar várias pancadas com uma barra de ferro. Uma senhora degolada. Um garoto foi carbonizado e sua irmã, enterrada viva.

Chegou até a página que não queria. O nome, escrito com caneta vermelha, já impunha certo poder. Úrsula Van Der Hills.

Fotos do corpo estavam anexadas. Palavras corriam pelas linhas, descrevendo os golpes. Nas costas. Nos braços. Na barriga. Perna, nuca e pescoço. Skarlett aprendeu a desenvolver um estômago forte com cenas fúnebres. Logo após se formar em direito e de se tornar advogada, um dos primeiros casos que pegou foi um assassinato de uma garotinha de sete anos.

Mas ela nunca aprendeu a desenvolver uma proteção sentimental envolvendo sua mãe. Logo após a morte de Úrsula, Skarlett foi adotada por um casal de amigos de sua mãe. Foi bem criada, tinha tudo o que sempre quis, pois a condição financeira de seus pais adotivos era quase a mesma, talvez até superior, do que a família Van Der Hills.

Desde pequena, mantinha sua personalidade forte e certa astúcia. Sempre reparou que não havia fotos dela bebê pela casa, com seus pais ou qualquer registro típico, como por exemplo, um álbum de fotografias. Até sua adolescência, sua real história e passado foram negados por sua família.

Quando atingiu certa idade, seus pais adotivos sentiram que já era hora dela saber toda a verdade, até porque, uma hora ou outra Skarlett descobriria. E poderia ser da pior maneira. Ela absorveu tudo que ouvia como um tiro em seu corpo. Demorou para se acostumar com a ideia.

Virou mais algumas páginas dos arquivos. Achou páginas mais atuais, percebendo isso através da amarelagem das folhas – que era quase nenhuma. Algumas páginas mostravam o rosto da família dos gêmeos Van der Hills.

— Meus primos. – ela falou consigo mesma, passando o dedo por cima dos rostos quase idênticos na foto.

Ao lado dos pais, alguns post-its estavam anexados. Skarlett cerrou os olhos e aproximou o rosto para ler melhor a letra minúscula. Por fim, eram apenas referências aos ofícios de vinte anos atrás. A loira os procurou e começou a ler. Era uma narrativa sobre a prisão de Tommy Warland.

Na noite em que foi preso, planejava sair da cidade. Começar uma nova vida com a criança que estava criando. Iria fugir de toda aquela sujeira que cheirava a sangue e morte, literalmente. Mas algo o impediu. Um trio.

Victor e Pamela Van Der Hills, junto com Edward Hardy, se juntaram em vários depoimentos, o que foi crucial para a prisão de Tommy Warland. Os três acabaram sendo os únicos sobreviventes do massacre causado pelo maníaco. E manteram suas vidas a salvo graças a isso. Bom, pelo menos até os dias atuais.

Tommy Warland já estava morto. Em algumas páginas seguintes, Skarlett observava fotos recentes, ainda desse ano. Os gêmeos entre seus amigos. Sky conhecia bem cada um deles. Antes de voltar a Reaperswood, solicitou para seu informante uma breve análise daqueles jovens. Irmãos mauricinhos - que no caso eram seus primos; uma dupla de góticos; a rainha popular do colégio que no futuro viria a ser uma viciada em drogas com cinco filhos; o cara durão que usava jaqueta de couro e parecia mais velho por causa da barba; uma francesa que não tinha muitos dados disponíveis; um rapaz isolado; um atleta sem muita inteligência; uma loira patricinha e vários outros que ela até cansou de lembrar.

Folheou mais algumas páginas. Traçou sua unha através de uma foto em tons pretos e brancos de uma garota. Na legenda, dizia ser a filha de Tommy Warland. Parecia ser um hospício. Uma pequena festa, confraternização ou algo do tipo, feita há anos. Tinha balões pendurados, comida em mesas e várias pessoas em volta, entre eles, outros pacientes, funcionários e visitantes. Skarlett encarou a foto por alguns segundos, olhando as faces. Até parar em um rosto que parecia ser conhecido. Observou. Observou. E observou. Lembrou.

Exaltada com a ideia que começava a se juntar em sua cabeça, Skarlett voltou as fotos. Analisou as duas fotografias. Uma delas foi tirada há anos atrás, e uma atual. É claro que os detetives não vão se ligar nesses meros detalhes. Ela gostaria que fosse mesmo um equívoco ou engano seu. Mas tudo se confirmou quando achou a outra foto que queria. Era o mesmo rosto. A mesma pessoa.

O assassino.

***

A água nunca esteve tão fria.

Lucky formava círculos no ar com seu braços girando, mantendo seu corpo em movimento. A roupa estava colada ao corpo e ele tentava manter-se concentrado. Algo parecia acompanhar o atleta. Ao seu lado. Em baixo da água, nas profundezas do lago. Dentro de si mesmo. Era o medo.

Se assustou quando algo tocou em seu pé. Se atrapalhou nos movimentos e então paralisou. Talvez tenha sido alguma planta aquática. Ou um peixe. Mas tinha algum peixe naquele lago?

Voltou a nadar. Chegava perto da margem. Faltavam apenas alguns metros. Iria sair dali, procurar ajuda, qualquer pessoa. Seus músculos doíam e sua cabeça ainda tinha alguns espasmos da dor. Estava meio tonto, mas permanecia determinado. Durante toda sua carreira no time do colégio, aprendeu a manter o foco, não importa qual fosse a situação e o grau da dificuldade.

Três metros até a margem. Depois dois. Então, parou.

Algo boiava na água, bem ao lado da margem. Parecia ser um jacaré. Teria Reaperface feito uma armadilha e jogado um réptil como aquele no rio? Não, não parecia ter vida. Poderia ser um simples tronco. Mas também não parecia um tronco.

Lucky lentamente se deslocou pela água, até perto da margem. Uma coloração rubra começava a se misturar com a água do lago, como uma sujeira de óleo. Seu coração saiu de seu corpo e afundou até o fim do lago quando ele percebeu do que se tratava.

— Hannah… - ele falou baixinho.

O corpo da loira boiava ao lado da margem, sem um mísero e insignificante fio de vida. A água ao redor se misturava com o resto do sangue rubro e denso que escorria do cadáver. Lucky se aproximou, pálido, com os olhos marejados. O rosto de Hannah estava irreconhecível e destruído, com um pouco de massa capilar restando. Seu corpo estava inteiramente nú, cheio de ferimentos. Mesmo com o rosto deformado, o atleta sabia que era a garota.

Lucky tirou um de seus braços que estava mergulhado e avançou para tocar o corpo da loira, mas hesitou. Ele não suportava mais essa dor do luto. Perder pessoas próximas e que gostava. Primeiro, grande parte de seu coração foi brutalmente triturado quando Miles foi morta. Agora, o resto seguiu o mesmo caminho.

O jovem ficou por mais alguns segundos ao lado do corpo, até não conseguir mais aguentar. Contornou o cadáver, apoiou-se na margem e saiu do lago. Deitou por alguns segundos, olhando para o céu. Duas estrelas brilhavam mais do que as outras, ao lado da lua.

***

Blaire havia trancado as portas do cômodo do jeito que conseguiu. Ao lado, jazia uma escada que levava até um corredor do segundo andar. Três janelas na parede e uma porta no fim do corredor. Agora, a garota estava sentada no último degrau, no pé da escada, roendo uma de suas unhas. Na outra mão, segurava a arma com confiança. Mas, um pingo de nervosismo crescia dentro dela.

Peter soltava algumas palavras aleatórias, em uma premissa de que acordaria a qualquer momento, mas isso não aconteceu em nenhum minuto. Blaire conversava com ele, às vezes cantarolava alguma canção. Porém, no fundo sabia que estava tentando acalmar mais a si mesma do que ao rapaz. Apesar da situação e do contexto em que se encontrava - e com uma bala alojada no corpo-, ele mantinha uma expressão calma.

Blaire se levantou e começou a andar em círculos pelo cômodo. Queria poder ajudar mais, sair ao redor, procurando a maldita chave. Por outro lado, não poderia deixar Peter sozinho e indefeso. O garoto sempre tentou proteger tudo e todos, e agora, era o que mais precisava de ajuda.

A garota olhou para o segundo andar e franziu a testa.

— Eu não fechei aquela janela? – se perguntou.

A cortina balançava calmamente com a brisa que adentrava no local pela janela aberta. Andou até os pés da escada. Subiu os três primeiros degraus e parou, tentando se concentrar em algum movimento. Tendo o silêncio como resposta, continuou a subir. Segurava a arma com as duas mãos, pronta para atacar.

Chegou ao último degrau e antes de ficar de frente com o corredor, parou. Encostou-se na parede, respirando fundo. Olhou para a arma em suas mãos e depois para Peter. Respirou mais uma vez e jogou seu corpo para o corredor, que mantinha as luzes apagadas. Com os braços esticados, mirava o escuro.

Não tinha ninguém ali. Tentou focar melhor sua visão na escuridão, mas nada aconteceu. Relaxou os músculos do seu corpo. Devia ter esquecido de fechá-la na hora do nervosismo. Curvou-se, agarrando a janela com uma de suas mãos e fechando-a. Conferiu se fez tudo certo para certificar-se que dessa vez realmente havia feito.

Em um rangido que ecoou pelo cômodo, a porta no fim do corredor se abriu. Um pouco de luz surgia do outro lado. Uma figura escura e mascarada estava parada ali. Blaire virou seu rosto e encarou o maníaco com rosto esquelético.

— Sai daqui! – ela gritou, inutilmente.

Sacou novamente a arma e segurou-a com as duas mãos. O assassino dava passos lentos e pequenos, se divertindo com a situação. Em sua mão esquerda, um facão refletia o pouco de luz no ambiente. Blaire mirou em Reaperface e respirou fundo novamente, tentando impedir que seu nervosismo tomasse conta dela. Ajustou a mira uma última vez, exatamente na cabeça do maníaco. E apertou o gatilho.

***

Mark estava sentado no canto do corredor no labirinto. Abraçava seus próprios joelhos, com a cabeça cabisbaixa. Lembranças rodeavam sua mente. Quando era criança, deveria ter uns três ou quatro anos, prepara-se para dormir. As luzes do seu quarto estavam apagadas e os olhos pesavam. Porém, antes de pegar no sono, olhou para a cabeceira da cama e a sombra de uma mão parecia fechar-se sobre ele.

O pequeno garoto gritou desesperado, pedindo socorro para sua mãe. Quando a mulher entrou no quarto, o garoto estava de baixo das cobertas e o colchão estava encharcado com urina. Na janela, um galho de árvore batia no vidro. Era o motivo daquela sombra.

Mark tinha diversas fobias e barreiras em seu psicológico. Não mantinha muitos amigos e os que tinha, morreram. Letrisha, a única namorada que teve em seus dezessete anos, também se foi. Sentia-se sozinho e isolado, como se fosse um simples anexo da sociedade, alguém que não importava se respirava ou não.

Passos pelo labirinto. Mark levantou a cabeça, em alerta. Quem seria o infeliz que estaria ali no labirinto com ele? Será que…? Só de pensar na lâmina do Reaperface, o corpo de Mark recebeu arrepios. Então, ele observou um jovem passar. Parecia ser Phillip. Mas o que ele estaria fazendo ali?

Mark levantou-se e caminhou até a saída do corredor. Olhou para a esquerda, na direção em que Phillip foi. O gêmeo tinha acabado de virar para um corredor da direita, saindo da vista do primeiro garoto. O rapaz sentiu-se aliviado, estava sozinho novamente. Pelo menos, era o que pensava.

Um barulho de passos pisados atrás dele chamou sua atenção. Mark virou e avistou um Papai Noel, que parecia rir cruelmente.

— Ho ho ho… - ele riu – Você está perdido, jovem rapaz?

Mark abriu a boca para responder, mas ficou paralisado. O Noel deixou o saco vermelho que trazia nas costas cair ao chão. Enfiou sua mão pela abertura.

— Não se preocupe, tudo ficará bem. – o bom velhinho prometeu – Tenho até um presente para você.

 A mão dele saiu do saco, trazendo consigo um bastão de madeira. Não, não era um simples bastão. Na ponta, duas lâminas refletiam a iluminação vinda dos piscas-piscas. O Papai Noel riu de um jeito macabro e posicionou o machado de lâmina dupla em suas duas mãos.

Mark, tropeçando em seus próprios pés, começou a correr.

***

— Puta merda! – Blaire xingou em voz alta.

A garota apertou o gatilho mais algumas vezes, mas sem resultado. O Reaperface pareceu rir atrás da máscara de caveira, se aproximando em passos lentos. Blaire verificou a munição da arma e sentiu vergonha de si mesma: estava sem balas.

Era óbvio que durante o desmaio coletivo, o assassino retirou todas as balas da arma. Como pude ser tão idiota?

Sem muitas alternativas, Blaire lançou a arma contra o Reaperface, que a rebateu com seu facão, em um simples movimento de seu braço. Ela estava perdida. Virou seu rosto, olhando para Peter lá embaixo, começando a acordar. Seu corpo estava travado. Ela precisava proteger o garoto.

Em um momento de desespero, Blaire lançou-se contra Reaperface, em um combate corpo a corpo. O assassino paralisou-se por um momento, parecendo surpreso com a decisão da garota. Mas ela não era do tipo que fugia.

Conseguiu desviar dos primeiros golpes desferidos com o facão. Um deles quase atingiu seu braço. Com a mão estendida, Blaire atingiu um tapa no rosto de Reaperface. A máscara cadavérica voou pelo ar, atingindo o chão com um barulho oco. O assassino virou rapidamente de costas, para esconder seu rosto.

Blaire ficou pasma com o que tinha acabado de fazer. Virou-se, em direção a escada, pronta para fugir. Porém, uma mão segurou firmemente seus cabelos. Não conseguia virar para avistar o rosto do assassino e tentava se soltar dele. Como se atendesse seu pedido, Reaperface a empurrou para frente, fazendo-a rolar escada abaixo.

O corpo da garota foi batendo degrau por degrau, até chegar no hall. Seus ossos estalavam na queda e talvez tenha quebrado algo. Sua visão ficou borrada e ela sentia que ia desmaiar. Mesmo sem foco, conseguiu avistar Reaperface parado no topo da escada, ainda sem sua máscara, mas não conseguiu focalizar seu rosto.

Em poucos segundos, tudo escureceu.

***

Riley virou-se, depositando alguns tapas nos ombros de Rowen. O rapaz havia surgido rapidamente no reflexo, atrás dela, assustando-a.

— Você tem merda na cabeça, Rowen? – Riley disse brava, mas pelo menos ainda sorria – Tem um assassino a solta, não pode ficar me assustando desse jeito!

— Não foi minha intenção! – Rowen se defendeu, apontando sua câmera portátil para o rosto da amiga. O rapaz usava o flash do aparelho, iluminando o máximo que conseguia – E nós não seremos assassinados esta noite. O maníaco parece estar querendo brincar com os irmãos Van der Hills.

— E quem disse que não pode nos usar para brincar com eles? – Riley indagou, chutando um pedaço de madeira que estava na sua frente – Aliás, onde você se meteu? Estava atrás de mim e de repente sumiu.

— Eu achei ter visto algo parecido com uma chave perto de algumas árvores. Fui desesperado tentar achar e não era nada. – Rowen explicou, suspirando – Quando me virei, você já tinha sumido de vista.

Riley absorveu a resposta por alguns segundos, enquanto se encaminhava para a saída dali.

— Vamos sair daqui. – a garota disse – Vamos dar a volta, vemos como Blaire está e podemos procurar em outro lugar.

Rowen assentiu em silêncio e ambos saíram do cômodo. Começaram a andar entre as árvores do jardim da frente. Acharam melhor não seguir pela calçada que levava até o casarão, pois poderiam ser alvos fáceis. Caminharam em silêncio, ouvindo apenas os próprios passos sob a vegetação, quebrando algumas folhas secas.

O rapaz iluminava o caminho com sua câmera, enquanto Riley seguia na frente, com seus passos cuidadosos. Então, a garota parou e fez sinal para que seu amigo fizesse a mesma coisa.

— Desliga essa luz. – Riley sussurrou.

— Por quê?

— Desliga. Essa. Luz. – Riley rangeu os dentes. Dessa vez, seu amigo atendeu o pedido – Acho que ouvi alguns passos.

Rowen ia responder alguma coisa, quando os passos se tornaram mais audíveis. Como se fosse ensaiado, a dupla de amigos se jogou no chão, tentando se esconder entre as árvores. Os passos que ouviam pareciam ser de mais de uma pessoa. Deitados na grama, observaram Vince e Brenda passarem por eles.

— Ah, são só os irmãos Hardy. – Riley disse, se preparando para levantar, mas Rowen faz sinal para que ela esperasse um pouco mais.

Ambos continuaram observando os irmãos Hardy, que pareciam preocupados. Olhava para todos os lados. Rowen sabia que eles estavam atrás de Mark, mas pareciam procurar algo a mais. Ou alguém. Seguiram seu caminho, enquanto Riley encarou seu amigo.

— Vamos, temos que voltar para a mansão. – Riley disse, levantando-se.

Os dois se levantaram e começaram a caminhar em direção à casa. Não era seguro ficar ali fora. Não era seguro estar em Reaperswood. Riley gostaria de ir embora. Poderiam ter material suficiente para o documentário, e ela não gostaria de ser a próxima a ter seu sangue derramado pela faca dentada de um psicopata.

Se sobrevivessem àquela noite maldita, Riley conversaria com todos e iria propôr sair da cidade. O jogo de gato e rato pareciam consumí-los cada vez mais e ela gostaria de terminar viva nessa história.

Com a luz da câmera apagada, ambos caminharam em silêncio e no escuro.

***

Mark entrou em um beco sem saída três vezes, ou mais. Xingava a si mesmo por ter largado a arma no casarão. Poderia ter mais chances de se defender naquele momento. Mas estava indefeso, com um Papai Noel assassino o perseguindo em um labirinto no jardim.

Também poderia clamar por misericórdia e gritar por ajuda de Phillip, pois viu o rapaz seguindo quase o mesmo caminho, mas duvidava muito que fosse ajudá-lo após o que Mark fez com o irmão dele.

O garoto parou. Havia chegado em um corredor que se dividia em dois. Precisava tomar uma decisão rápida. Talvez um deles levasse a mais um corredor sem saída, e este seria seu fim, por isso, precisava ser inteligente. Tentou ver se algum deles dava alguma pista sobre seus respectivos destinos, mas pareciam iguais.

No corredor anterior a que Mark veio, um “ho ho ho” ecoou, indicando que o assassino estava perto. Um barulho de metal sendo arrastado arranhou os ouvidos do garoto, e ele pode imaginar o maníaco vestido de Noel arrastando o machado de lâmina dupla pelo chão, pronto para atingir sua vítima.

Mark fechou os olhos e respirou fundo. Rapidamente, seguiu pelo corredor da esquerda.

***

Phillip havia escolhido o corredor da direita há alguns minutos. Seguia por um caminho que ficava alternando entre chão de grama e azulejos. Provavelmente a família de Hannah estava aquela parte do jardim. Ouvia alguns sons esquisitos que ele não conseguia identificar, advindos dos corredores que deixou para trás.

O gêmeo mais novo não tinha nenhuma arma para se defender e a cada passo, caminhava para o desconhecido. Verificava seu celular a todo momento, tentando ver algum mísero sinal telefônico. Virou mais algumas direitas e mais algumas esquerdas, até encontrar uma saída que o levou à uma abertura de uma grande sala.

O piso era dividido em azulejos pretos e brancos, como um tabuleiro de xadrez. A decoração seguia uma linha mais rústica, com uma cor avermelhada e paredes feitas de tijolos. Tudo estava escuro ali, exceto por um círculo de luz que iluminava um pequeno banco de madeira. Em cima dele, uma chave prateada reluzia, convidativa.

Phillip deu um passo a frente mas hesitou. Não poderia entrar ali por instinto. Precisava analisar a situação, pois tudo ali indicava ser uma armadilha. Tentou ver mais além, porém a penumbra no ambiente era total. Esticou sua cabeça para dentro do salão de festa e olhou para os lados, tentando ver algum interruptor, mas não achou.

Sem muitas escolhas, resolveu arriscar, afinal, a vida de seu irmão parecia depender daquela chave. Entrou lentamente no salão, sempre olhando ao redor e para o chão, tentando evitar cair em uma armadilha. Conseguiu chegar inteiro perto do banco, e parou na frente dele.

Respirou fundo e esticou seu braço para pegar a chave, quando as luzes se acenderam e ele viu um corpo pendurado no teto.

***

Mark tropeçava nos próprios pés enquanto corria sem saber ao certo para onde ir. Ainda sentia o Noel Assassino o perseguindo, não importasse o quanto ele corresse. Quando mais rápido ia, mais perdido se sentia.

Seguiu pelo corredor, até que o espaço estreito se abrisse em um espaço amplo a céu aberto. O espaço se tratava de um círculo feito de tijolos. Na extremidade oposta a entrada, uma churrasqueira automática e uma mesa de madeira se encontravam. Haviam duas janelas, uma oposta a outra, porém fechadas com uma espécie de cerca.

Se encontravam espalhados pelo chão, várias caixas de presentes, de tamanho suficiente para esconder um boi. Uma placa feita em alguma gráfica anunciava um jogo de achar algum tesouro. Mark revirou os olhos ao imaginar Hannah elaborando a dinâmica.

Mais um “ho ho ho!” foi ouvido, e parecia estar cada vez mais perto. Mark tentou arrancar alguma cerca das janelas, mas as duas estavam bem presas. Sem muita escolha, o garoto espalhou ainda mais as grandes caixas de presente pelo chão, escolheu uma amarela no meio, abriu a tampa, colocou seus pés dentro e encolheu-se, para conseguir caber. Após conseguir, fechou a tampa e tentou ficar parado máximo possível.

O interior da caixa era quente e a respiração se tornava difícil a cada segundo. Porém, ele precisava aguentar firme. Pelos seus cálculos, teria poucos segundos para escapar dali. Sua chance de sair vivo era de uma em cem.

Ouviu passos pesados dentro das botas clássicas da fantasia de Papai Noel. Os passos pareceram chegar perto de seu esconderijo e um arrepio subiu pela espinha de Mark. Ele suava frio e uma gota de suor escorreu pela sua testa. Sua respiração começava a ficar ofegante mas ele precisava aprender a controlá-la, para não se auto-denunciar.

O som da lâmina cortando o ar foi audível e Mark ouviu o machado atingindo alguma outra caixa. O corpo do garoto se contraiu mais ainda e ele tampou sua boca com a mão, para evitar soltar algum gemido de aflição.  

Mais uma vez a lâmina dupla cortou o ar e ele ouviu mais um embrulho de presente ser destroçado. Dessa vez, pareceu ser mais perto dele. Seus olhos estavam arregalados e começavam a lacrimejar. Ouviu os passos do Noel se aproximarem.

Pensou que mais uma vez haveria o som da lâmina cortando o ar e que dessa vez ele seria atingido pelo machado, mas então, ouviu algo sendo arrastado. Uma dúvida brotou em sua cabeça. As botas do assassino indicaram que ele estava se afastando dali. Teria desistido? Então Mark estava a salvo.

O garoto se preparou para sair e empurrou a tampa, que se encontrava na parte de cima da caixa, porém, não conseguiu. Algo bloqueava a abertura. Mark começou a empurrar a saída com mais força e até conseguiu abrir uma pequena fresta, mas que logo se fechou. Nisso, conseguiu avistar o assassino vestido de Papai Noel parado, ao seu lado.

O primeiro golpe de machado na caixa em que estava quase atingiu sua perna. Mark se encolheu ainda mais e soltou um grito. O segundo e terceiro golpe quase atingiu sua cabeça. O assassino começava a destroçar a caixa. O quarto golpe atingiu de raspão sua perna, causando um rasgo na calça e arrancando um filete de sangue.

Mark, em um momento de desespero, socou a parte da caixa próxima a sua cabeça, que já havia recebido duas machadadas. A caixa se rasgou completamente e o garoto se arrastou pelo chão como um lagarto, desesperado por uma saída. O Noel o encarou. Então, levantou seus braços, pronto desferir mais um golpe.

O jovem rolou pelo chão no momento em que a lâmina atingiu o local em que ele estava. Mark ficou de pé e avistou diversos blocos de tijolos em cima da caixa em que ele estava, o que explicava o bloqueio de sua saída. Ele virou-se, correndo aos tropeços em direção à abertura, quando sentiu um golpe em cabeça.

Seu corpo imediatamente foi ao chão, tombando para frente. Olhou para trás e avistou um tijolo perto de seus pés. Sentiu algo escorrendo de sua cabeça, deslizando pela nuca. Levou dois dedos ao local e ao avistá-los, viu uma mancha de sangue.

Sua visão ficou turva e ele começou a perder os movimentos do corpo, junto com sua consciência. O Papai Noel parou ao seu lado, com o machado encostado no chão, então, largou a arma. Segurou o corpo de Mark pelas pernas e começou a arrastá-lo pelo chão. A parte esquerda de seu rosto começava a ficar suja e esfolada.

O Noel Maníaco o levantou e colocou na mesa de madeira, perto da churrasqueira. A cabeça de Mark tombou para o lado e ele sentia a inconsciência se aproximando.

***

Quando Mark recuperou sua consciência, sentiu um ardor perto dele. Virou a cabeça e logo sentiu uma dor intensa na mesma. Abriu os olhos, tentando focar sua visão. Havia desmaiado apenas por alguns minutos. Sangue do ferimento, causado pelo tijolo, escorria pela mesa, começando a pingar no chão. O garoto tentou se levantar, porém não conseguiu.

Olhando para os lados, viu que estava em cima da mesa, com seus braços e pernas esticados. Nos pulsos e tornozelos, estavam fitas de presentes amarradas com fortes nós, que também estavam amarradas nas pernas do móvel, prendendo-o.

Ele usou toda sua força para tentar arrebentar as fitas, mas foi inútil. Deitou sua cabeça, em desistência. E então avistou a churrasqueira ligada, com uma pequena fogueira feita nela. O fogo crepitava, faminto, e a fumaça se elevava ao céu noturno.

— Ho ho ho… - a risada modificada chamou atenção dele.

O assassino vestido de Papai Noel estava encostado na parede, com seu machado ainda em mãos.

— Por favor, me deixa sair! – Mark implorou, ainda com espasmos do galo que havia se formado em sua cabeça, após o ferimento - Eu faço o que você quiser!

O maníaco se afastou da parede e parou pensativo por um tempo. Então, começou a caminhar na direção do jovem, com a arma pronta para golpeá-lo.

— Olha, olha, olha! Por favor, eu te imploro! – Mark pediu novamente. Noel parou em seu lado e esticou os braços para trás, para pegar impulso para o golpe – Eu faço o que você quiser! Eu posso matar alguém. Eu até atirei no Peter, eu posso atirar para valer!

O assassino disparou seu primeiro golpe. A lâmina do machado cortou rapidamente o ar e acertou em cheio a mão de Mark. O dedo indicador e o dedo do meio caíram no chão, decepados. O garoto gritou assustado, enquanto jatos de sangue começavam a vazar dos ferimentos.

— Esse é o problema. Peter é meu. – o assassino sussurrou.

O Noel agachou-se e catou os dois dedos caídos no chão. Parou-os na frente de seu próprio rosto, parecendo fazer uma análise. Então, esticou seu braço, parando-os na frente do rosto assustado de Mark. O garoto mantinha uma expressão de terror e dor no rosto, enquanto suava cada vez mais – tanto por estar perto da churrasqueira, quanto pela situação aterrorizante.

O psicopata esfregou a ponta dos dois dedos decepados no rosto de Mark, soltando uma risada louca e modificada. Então, lançou-os na churrasqueira, que crepitou ao receber mais alimento para sustentar seu fogo.

— Que tal seu pé, agora? – o Noel assassino perguntou retoricamente, com sua voz saindo modificada, parecendo um lagarto.

— Não, por favor, não! – Mark começou a gritar, implorando por misericórdia e pena – Me deixa ir embora, por favor, eu me mudo de Reaperswood, mas por favor, não me mata!

Ignorando os apelos desesperados, o maníaco acertou um golpe no tornozelo de Mark, que urrou de dor. A lâmina se prendeu na carne do membro e o assassino começou a golpear cada vez mais no ponto desejado, espirrando sangue para todos os lados. Depois do quarto golpe, o pé do garoto foi expelido, rolando pela mesa até cair no chão. Acompanhando os ferimentos na mão, agora o tornozelo também espirrava sangue.

Mark começava a se sentir fraco. Estava perdendo muito sangue e se não tivesse uma ajuda médica o mais urgente possível, teria uma mórbida hemorragia. O garoto começou a grunhir, pedindo para sair dali, mas o psicopata o ignorava sempre.

Pegando o pé decepado, o Noel analisou-o por alguns segundos e então jogou no fogo, que aumentou consideravelmente.

— Nossa, mas você já está tão fraco? – o psicopata ironizou, olhando para a face de Mark, que começava a ficar pálida.

— Me… Deixa sair… - Mark disse, começando a perder as forças.

— Não desmaia, não, princesa. – o maníaco respondeu.

Com uma mão em formato de concha, o assassino juntou um pouco de sangue que escorria da perna decepada de Mark e jogou o líquido rubro no rosto do garoto, na tentativa de acordá-lo. Inevitavelmente, soltou uma risada macabra.

— Só vou cortar sua outra mão e acabamos com isso.

Papai Noel se posicionou ao lado da mesa e golpeou a mão que ainda estava intacta. Apenas um golpe não bastou, então o assassino começou a golpear mais vezes. Em um deles, acabou errando a mira e acertou no dedo polegar do rapaz, que descreveu um círculo no ar antes de rolar pelo chão. Alguns segundos depois, o maníaco conseguiu decepar a mão.

Agachou-se para pegá-la. Deu leve tapinhas no rosto de Mark com sua própria mão decepada e então jogou-a no fogo, se preparando para o ato final. Com golpes fracos, atingiu uma das coxas do rapaz, que ainda grunhiu de dor, embora estivesse perdendo a consciência aos poucos. Uma das lâminas ainda atingiu as costelas de Mark, fazendo-o perder um pouco de ar.

Parando ao lado da cabeça de Mark, o psicopata mirou na garganta do garoto e respirou fundo. O garoto ainda tentou soltar um último grito de misericórdia, mas não tinha mais forças. A lâmina do machado atingiu em cheio sua garganta, espirrando sangue para todos os lados, acabando com sua vida. Bastou mais alguns golpes para a cabeça se separar completamente do corpo.

Como se fosse uma bola de lixo qualquer, o maníaco usou o próprio machado para impulsionar a cabeça de Mark para a churrasqueira, alimentando o fogo.

Apoiando o machado em seu ombro, Papai Noel saiu dali assobiando, deixando o resto do corpo amarrado a mesa, enquanto o que sobrava de seu sangue escorria pela madeira.

***

— Meu filho! – Pâmela Van Der Hills gritou ao ver seu filho.

O grande salão de festas foi iluminado por diversos equipamentos de iluminação. Mesas e balões coloridos, que alternavam suas cores entre vermelho e preto, decoravam o ambiente. Comidas com temáticas natalinas estavam espalhadas. Em um canto, vários biscoitinhos em formato de papais noéis estavam espalhados. Caixas de sons e canhões de luz pareciam prontos para agitar a noite, assim que fossem ligadas.

— Mãe?! – Phillip gritou em resposta.

A matriarca da família Van Der Hills estava pendurada em uma das vigas do teto. Por todo seu corpo, fios de pisca-pisca estavam entrelaçados, um pouco mais folgados em seu pescoço e em seu rosto, o que possibilitava sua fala. As pecinhas coloridas e desligadas davam um aspecto alegre para uma cena macabra, porque além do enfeite natalino, arame farpado estava junto com a fiação luminosa, espalhando-se pelo corpo da mulher, mas sem feri-la. Ainda.

Tanto a fiação dos piscas-piscas, quanto o arame farpado, se esticavam até ficarem enrolados em um globo de festa, com vários espelhinhos refletores.

— Mãe, o que aconteceu? – Phillip perguntou assustado, encarando a mãe pendurada.

— É um… É um jogo, meu filho. – Pâmela respondeu, com os olhos começando a lacrimejar – Ele está nos observando por câmeras agora. Me prendeu aqui e disse que ia te fazer escolher entre mim e Peter, mas então, quando voltou… Voltou só com essa chave.

Tudo começava a fazer sentido na cabeça de Phillip. Reaperface usaria Peter para o atrair ali e executar aquele jogo de maníaco, mas então se aproveitou da chance que Mark lhe deu e incrementou ainda mais sua psicopatia.

— Ele disse que assim que você tirar essa chave, a energia da decoração vai e eu vou… Vou… - a mãe engoliu a palavra “morrer” e encarou o filho – Mas por quê você precisaria dessa maldita chave, Phillip?

A alma do gêmeo mais novo desabou dentro dele ao receber a pergunta e só então percebeu a gravidade da situação. Abaixando a cabeça, evitou contato direto com o olhar acolhedor de sua mãe.

— Peter está meio que… Preso. Ele foi ferido e está perdendo muito sangue. Estamos sem sinal de celulares e sem como pedir ajuda… Ele só será liberto e só conseguiremos ajuda depois que pegarmos essa chave… Mas… Mas… - o garoto silenciou-se. Não queria ver a reação de sua mãe. Não queria saber o que viria a seguir.

Alguns segundos de silêncio predominaram-se entre os dois. Então, Pâmela cortou o silêncio:

— Leve a chave, filho.

— Mas, mãe…

— Leve a chave, Phillip! – ela disse, rígida, assim como brigava com os garotos quando aprontavam – Por favor. Salve seu irmão. Salve vocês. Esse resquício da maldição de Tommy Warland que está caíndo sobre vocês é minha culpa.

— O quê? Mãe…

— Não importa. Leve a chave. Agora! – Pâmela disse, com lágrimas escorrendo sobre seu rosto.

Phillip também começou a lacrimejar. Não queria ter que fazer essa escolha, mas caso não a fizesse, todos poderiam acabar morrendo. Seu coração partiu-se ao meio e metade dele ficou naquele local. O gêmeo encostou seus dedos na chave em cima do banco e olhou uma última vez para a mãe, que tentava segurar as lágrimas, falhadamente.

— E Phillip, lembre-se: eu amo você e seus irmãos.

— Nós também te amamos, mãe. – Phillip disse, com uma lágrima escorrendo de seu olho esquerda. Mesmo hesitando, o garoto pegou a chave de uma só vez, tentando não olhar para a mãe.

Como esperado, os canhões de luz ganharam a vida, iluminando todo o salão com feixes de diversas cores. As caixas de som foram ligadas, começando a espalhar uma música com clima oitentista e de baile colegial. Em poucos segundos, o globo de festa começou a girar lentamente, puxando e enrolando em si mesmo a fiação dos piscas-piscas e o arame farpado.

Quanto mais os fios eram puxados em direção ao globo, mais se apertavam no corpo da senhora Van Der Hill. O arame farpado começou a fincar-se em sua pele. Filetes de sangue começaram a escorrer por onde era possível. Os piscas-piscas ligaram-se e pareciam dar um ar infantil à cena macabra.

Em pouco tempo, todo o corpo de Pâmela começou a ser prensado pelos fios, que eram puxados cada vez mais. O arame começou a fincar-se em seu rosto, fazendo pequenas quantidades de sangue escorrerem pelo seu rosto angelical. Seus olhos foram perfurados e ela pensou em gritar, mas não queria deixar uma última visão sua como uma mulher desesperada para seu filho, e sim, uma mulher guerreira.

Os fios também enrolaram em seu pescoço, que logo começou a sangrar. Phillip não conseguiu assistir mais aquilo e saiu, com lágrimas em seu rosto. O globo de festa girou mais rapidamente, e os fios esticaram-se ao máximo, então o corpo da senhora Van Der Hills começou a ser puxado, mas ainda estava pendurado ao teto.

O globo deu uma leve travada, pois o que ele puxava – Pâmela – não acompanhava seu ritmo. Porém, os fios que a penduravam ao teto se arrebentaram e ela caiu em direção ao chão, mas foi puxada pelo globo. No impulso do puxão, os fios foram ainda mais puxados. O arame adentrou ainda mais na pele de suas mãos e rosto, e o que estava ao redor de seu pescoço cortou a pele dele, atingindo a jugular e rasgando a garganta da mulher. 

Sangue foram espirrados no chão, enquanto sua cabeça tombava, com grande parte da garganta degolada e o corpo já sem vida. O corpo ainda ficou pendurado no globo de festa, enquanto ele girava ao ritmo de um “sha la la la” musical.

***

O táxi seguiu seu caminho pela rua, para voltar de onde veio. Skarlett estava parada no grande portão da casa, com sua bolsa em uma mão, enquanto a outra analisava os grandes cadeados que trancavam a entrada. Havia ligado para seu informante e pediu a localização de seus primos. O homem então lhe deu um endereço, dizendo que eles estariam em uma festa natalina.

Sky resolveu se dirigir à casa. Poderia não ser a surpresa mais agradável de todas, mas eles corriam perigo. O assassino estava entre eles e ela precisava avisá-los. Porém, quando viu os cadeados impedindo a entrada – ou saída – e notando que não havia nenhuma movimentação na casa, percebeu que o assassino já começara a agir.

Estudou algum jeito de entrar na casa. A única maneira seria escalar e pular o muro, o que seria arriscado. Mas ela estava disposta. Quando iria começar a agir, viu que seu celular estava com quase nenhum sinal. Temendo precisar de ajuda e ficar totalmente sem sinal lá dentro, ligou para a emergência:

— 911, qual sua emergência?

— Preciso de um ambulância e ajuda policial. Tem uma suspeita de ataque aqui. – Skarlett começou.

A atendente pediu o endereço do local e Sky repassou. Alguns segundos depois, a ligação terminou. Skarlett respirou fundo, retirou seu salto alto, guardando-o em sua bolsa, e começou a escalar o muro da casa, usando alguns relevos da construção como apoio. Estava acostumada com escalada, pois fazia muito disso enquanto esteve fora do país.

Alguns segundos depois, já se encontrava pousando no campo gramado do outro lado. Achou melhor não colocar seus saltos, caso precisasse correr. Então, adentrou na penumbra da residência.

***

Blaire acordou com uma tontura terrível. E ela poderia estar começando a delirar, pois parecia ouvir alguém chamar pelo seu nome. Blaire… Blaire…

— Blaire? – ela conseguiu identificar a voz de Peter, após alguns segundos. Ele parecia estar com dor, mas segui a firme – Blaire, você está bem? Acordou?

— Oi… Ahn, Peter. – Blaire respondeu, se apoiando no chão com uma das mãos enquanto colocava a outra ao lado da cabeça, que doía. Esta mesma mão estava dolorida e parecia ter sido torcida na queda.

Algumas batidas na porta da frente chamaram a atenção da dupla.

— Blaire? Peter? – uma voz delicada disse – É a gente. Rowen e Riley.

A garota levantou-se do chão, se apoiando nas paredes. Passou por Peter, que parecia estar com dor, devido a sua expressão. Chegando até a porta, abriu-a. A dupla de amigos logo adentrou a casa, e depois, a porta foi fechada.

— O quê aconteceu? – Rowen perguntou olhando para o pulso inchado de Blaire e sua expressão de derrotada.

— Reaperface esteve aqui. – ela contou – E me jogou da escada, mas agora estou bem.

— Precisamos achar gelo para seu pulso. – Rowen se aproximou da amiga – Vem comigo, vamos até à cozinha.

— Tomem cuidado. – Riley pediu ao ver os dois se deslocando do cômodo.

— Relaxa, lá na cozinha tem facas, e eu sei usá-las. – Rowen piscou em resposta.

Riley suspirou pesadamente. Se aproximou de Peter e agachou-se, para seu rosto ficar no mesmo nível que o dele. Encarou o gêmeo e encostou as costas de sua mão na testa dele.

— Você está um pouco febril. – ela comentou – Mas pelo menos se sente bem?

— Tirando a parte que tem uma bala alojada no meu corpo e que um psicopata está perseguindo meus amigos, estou ótimo. – Peter respondeu, soltando um riso fraco.

— Você tá fodido, mas não perde o jeito, hein? – Riley soltou uma risada.

A garota deu a volta e examinou o relógio em contagem regressiva.

Ainda faltava uma hora e meia.

***

Johnny corria apressado, olhando para todos os lados possíveis, tentando ver alguém. Em suas mãos estava um rolo de corda. Seguia em direção ao buraco em que Roderick e Cindy haviam caído. O gótico havia procurado algo para ajudá-los, mas na iluminação fraca da casa, estava cada vez mais difícil.

E, achar o buraco em questão também estava dificíl.

— Rod? Cindy? – ele falou o mais baixo que pode, tentando chamar a atenção dos amigos.

Deu mais alguns passos desprentenciosos, até achar novamente o buraco. Ajoelhou-se e lançou uma das pontas das cordas para dentro dele, porém, notou que não havia mais ninguém ali.

— Cadê vocês? – ele disse, olhando ao redor.

Ouviu alguns passos pisando na grama, e pareciam estar perto dele. Como não conseguir ver se era Roderick ou Cindy por perto, Johnny correu, em direção ao casarão.

***

Skarlett caminhava cuidadosamente, sentindo a grama embaixo de seus pés descalços. Ao longe, uma música em estilo de baile colegial parecia estar tocando, mas estava distante demais para a loira identificar alguma coisa além do ritmo.

As árvores pareciam ganhar altura e proporção cada vez mais, engolindo Skarlett para dentro delas. Algumas estavam enfeitadas com piscas-piscas, causando pontos aleatórios de iluminação. Ao longe, o casarão mantinha luzes acesas. Mais distante ainda, Sky pode observar o início de um labirinto no jardim e ao observá-lo, sentiu um arrepio percorrer suas costas, estranhamente.

Caminhou o mais silenciosamente possível, com o objetivo de adentrar a residência. Ouviu alguns passos ao seu redor e então ficou paralisada. Virou seu rostou para um lado e depois para o outro. Não via nada, e tudo parecia igual. As mesmas luzes, nas mesmas árvores. Na mesma escuridão.

Skarlett recomeçou a andar, com passos mais acelerados. Ouviu novamentes passos diferentes dos seus. Algo parecia perseguí-la. A loira virou o rosto, enquanto ainda se movimentava, e pelo canto do olho pôde ver uma figura vestida de Papai Noel, e em suas mãos, parecia ter uma espécie de machado.

— Que fantasia conveniente… - ela sussurrou para si mesma.

A loira abriu sua bolsa e retirou seus saltos alto. O primeiro arremesso atingiu diretamente o rosto do maníaco, deslocando um pouco sua máscara. O segundo salto foi lançado na direção de suas pernas e o fez tropeçar, e consequentemente, cair na grama. Skarlett aproveitou a chance e se embrenhou entre as árvores, tentando despistá-lo.

Estava ofegante, com a respiração pesada. Sentia o sangue palpitar em suas veias. Estava com adrenalina correndo pelo seu corpo, mas não se renderia desse jeito. Começava a contornar as árvores, enquanto ouvia os passos do Noel Assassino tentando achá-la.

Depois de alguns segundos nesse jogo de gato e rato, Sky corria em direção de uma casa da árvore. Começou a subir os degraus de uma escada presa ao tronco. Quando estava quase na metade, o psicopata a avistou e começou a perseguí-la. Como o machado atrasaria sua escalada, o Noel depositou a arma no chão e retirou, de dentro de umas de suas botinas, uma faca média e começou a escalar também.

Skarlett se aproximava da entrada da casa da árvore, quando percebeu o maníaco a seguindo. Tentava não perder o auto-controle, precisava estar focada para sair viva dali.

Perto dos últimos degraus, o Noel conseguiu alcançar a loira e depositou alguns golpes em sua perna. A lâmina da faca fez alguns cortes em seu tornozelo. Skarlett rangiu de dor e olhou para baixo.

— Vai para o inferno! – ela disse, depositando um chute na cara do assassino, que começou a cair, mas conseguiu se segurar.

A loira conseguiu adentrar na casa da árvore. Mesmo mancando por causa dos ferimentos, arrastou uma pequena cômoda até a “tampa” de abertura, para que isso impedisse a entrada do assassino.

Depois parou para analisar onde estava. Parecia ser a sala da casa na árvore, e parecia ter mais três ou quatro cômodos. As paredes eram inteiramente rosas, e algumas até tinham um pouco de glitter espalhado. As janelas, com bordas arroxeadas, eram grandes e belas. Vários pequenos móveis e sofázinhos enfeitavam a sala.

Sky se assustou ao ouvir o barulho da cômoda se mexendo. Obviamente, o assassino havia chegado e tentava entrar, arrombando a abertura. A loira saiu daquela parte da casa, fechando a porta atrás de si mesma. Chegou em uma pequena cozinha, onde tinha um pequeno frigobar e alguns armários. Retirando uma pasta de arquivos de sua bolsa, a colocou dentro de um dos armários, no meio de copos e pratos empoeirados. Se tratava do arquivo sobre o massacre de vinte anos atrás e relatos sobre a filha dele. Iria esconder outro arquivo, que mostrava as fotos, porém, um barulho chamou sua atenção.

Um estrondo ecoou pelo local e então Skarlett percebeu que o assassino tinha conseguido entrar na casa. Vasculhou rapidamente a cozinha, na tentativa de achar alguma faca ou objeto que pudesse usar como defesa. Mas foi em vão, só achava colheres de plástico.

A porta da cozinha se abriu e Skarlett avistou um Papai Noel segurando uma faca, já suja de sangue. A mulher tentou correr, mas já estava ferida. O maníaco a segurou pelos cabelos, fazendo-a gritar. A faca, então, perfurou sua costela, lhe causando uma dor aguda.

Quando a lâmina saiu de dentro de seu corpo, estava quase inteiramente suja de sangue. O Noel jogou Skarlett no chão, com um líquido rubro escorrendo de suas costelas, manchando seu belo vestido azul. A mulher ainda jogou sua bolsa na direção dele, enquanto se arrastava para fora da cozinha.

Durante o arremesso, o segundo arquivo caiu aberto de dentro da bolsa, aos pés do maníaco. O psicopata analisou aquilo, com sua máscara de pele derretida. Agachou-se e viu as fotos e do que se tratava. Quando viu a foto dos Van Der Hills, viu seu próprio rosto na foto e encaixou tudo o que Skarlett planejava. Estava perseguindo a loira apenas para divertir sua mente sádica, mas agora sabia que sua identidade podia ser revelada, então só sobrava uma alternativa: a mulher tinha que morrer.

Skarlett já estava de pé, saindo da cozinha, mancando. Uma de suas mãos ajudava a apoiar-se na parede, enquanto a outra tentava conter o sangue advindo do ferimento nas costelas. Suas pernas fraquejavam e ela quase foi ao chão duas vezes, mas precisava aguentar firme. Estava perto da saída.

Na abertura da porta, atrás dela, a imagem do Noel Psicopata apareceu. Aproximou-se em passos lentos e quando estava perto o suficiente, depositou mais algumas facadas nas costas dela. Cortes rápidos. Uma, duas, três, quatro… Dezessete facadas.

Skarlett quase caiu no chão, mas apoiou-se em uma das janelas. Virou-se e tentou atacar o maníaco, em uma tentativa desesperada. Porém, ele a segurou e empurrou com força contra o vidro da janela, que rachou e espatifou-se.

Neste momento, o vidro parecia uma pequena e frágil cortina de água em uma bela cachoeira para Skarlett. O corpo da mulher, de encontro com a janela, teve forças suficientes para quebrá-la, e assim o fez, mesmo que ela tenha tentando impedir, com sua mão ensanguentada. Ainda com dor em sua costela, a loira despencou da casa na árvore.

Rápido como uma pedra, o corpo de Sky caiu de costas sobre a grama verde e recém cortada, que misturou o verde natural com o vermelho rúbro do sangue. Sua visão começava a ficar escura e borrada, enquanto dava os últimos sinais de vida, com pequenos espasmos em seus braços e peito, que tentava capturar o máximo de oxigênio para os pulmões, mas falhava.

Antes de perder totalmente a consciência, colocou novamente a palma de sua mão, cheia de sangue, no ferimento em sua barriga. O líquido rubro ainda escapou por entre os dedos de Sky, antes de seu olhar fixar-se no céu.

Depois de alguns segundos, o Noel Maníaco desceu da casa da árvore, com o arquivo que o incriminava em suas mãos. Estava pronto para esfaquear Skarlett mais algumas vezes, para garantir sua morte, mas ouviu as sirenes. O mais rápido que pôde, saiu dali.

***

Blaire e Riley foram as primeiras a sair da casa, ao ouvirem as sirenes policiais e das ambulâncias. Phillip chegou logo após, com uma expressão de dor em seu rosto. Esticou seu braço e mostrou a chave para Blaire, que encheu seus olhos de lágrimas.

Phillip e Blaire voltaram para dentro da casa, o mais rápido que puderam, enquanto Riley fazia sinal para as ambulâncias e policiais. Sentado no piso da sala, Lucky se encontrava com a cara fechada. Sangue estava espalhado pela sua roupa, mas depois o gêmeo descobriria porquê. Rowen, que estava sentado nos degraus da escada, levantou-se ao ver a volta do Van Der Hill.

O gêmeo mais novo se aproximou do irmão, que estava mais ou menos acordado, com requícios de consciência. Adicionou a chave ao cadeado especial e a girou, desprendendo tudo aquilo.

Peter quase caiu ao chão, mas Phillip o segurou e o envolveu em um abraço carinhoso. Haviam tido o pior natal de todos os tempos, e uma hora ou outra, o mais novo teria que contar o que aconteceu com a mãe deles.

Dois enfermeiros entraram com uma maca. Em poucos segundos, arrumaram Peter, para levá-lo a ambulância.

Vince e Brenda adentraram na casa, e Johnny acompanhava a gótica, com uma corda entre as mãos. Da porta dos fundos, surgiram Roderick e Cindy.

— Hey, onde vocês estavam? – Johnny perguntou, meio emburrado.

Porém, não obteve resposta, pois o Xerife entrou correndo no local, apontando o dedo para Peter.

— Olha, mauricinho, você vai pagar pelo que você fez, ouviu? Sei o que você fez com Leon! – ele gritou – Você vai ser detido!

Phillip estava pronto para avançar contra o Xerife, mas Edward parou acalentou a situação.

— Xerife, calma, o garoto está ferido, amanhã você conversa sobre isso.

O Xerife ainda olhou para Edward e Phillip, mas resolveu aceitar a sugestão, saindo dali. Evelyn acompanhava o ex-marido.

— Espera, como vocês entraram aqui…? – Blaire indagou.

— Nós entramos juntos com as ambulâncias e viaturas. – Evelyn respondeu.

— É, mas os portões estavam cadeados e… - Phillip começou a contra-argumentar, mas resolveu se calar.

Do lado de fora, a voz de Tory, que estava junto com Jac, resoou, dizendo que havia visto uma mulher loira caída perto da casa da árvore. O gêmeo mais novo foi o primeiro a sair em disparada, enquanto levavam seu irmão para uma das ambulâncias.

Phillip chegou correndo perto da casa da árvore e viu Skarlett perdendo sua consciência aos poucos. Seu rosto parecia familiar, mas não a conhecia. Então, houve um estalo em seu cérebro.

— Skarlett?!

— Phillip… Phillip, me escuta! – ela disse, agarrando a gola da camisa do primo, sujando-a de sangue – O armário… O armário na casa da árvore. O arquivo…

— Você está sangrando, precisa de ajuda. – Phillip virou-se para a multidão e gritou – Chamem mais enfermeiros! Agora!

— O armário… - Skarlett disse por último, mas então sua fala foi ficando fraca, até parar.

Até morrer.

***

Peter acordou achando que havia morrido e que se encontrava no céu. As paredes brancas amenizavam seus pensamentos e lhe traziam um clima pacífico. O lençol sobre seu corpo e os móveis, da mesma cor, geravam uma sensação igual. No balcão, ao lado de sua cama, um jarro de vidro com algumas flores de diversas cores coloriam o local, dando um toque mais alegre ao ambiente. E para finalizar o clima angelical, Blaire estava sentada em uma cadeira, ao lado de sua cama, sorrindo, calorosa.

— Que bom que você acordou. – ela falou.

Com dificuldade, Peter apoiou-se na cama para conseguir se levantar. Durante o movimento, sentiu uma dor no local machucado.

— Ainda acho que vou demorar mais um pouquinho para me curar completamente, mas estou bem. - e então ele avistou  a faixa enrolada no pulso da garota - O quê você fez aí?

— Ahn... O Reaperface me atacou enquanto você estava desmaiado. - ela explicou – Riley me disse que ela e os outros vão sair da cidade. Já estão de saco cheio dos assassinatos, e também temem que possam ser as próximas vítimas…

Peter pensou em xingar o psicopata, mas engoliu suas próprias palavras.

— Você vai receber alta daqui alguns dias, o médico me disse. – Blaire avisou.

— Isso se eu não for preso pelo seu pai… - Peter devolveu, confessando que havia ouvido as palavras do Xerife.

— Olha, Peter. - Blaire começou a dizer. Encostou sua mão livre em uma das mãos do garoto - Meu pai está querendo ferrar contigo. Eu até entendo o lado dele, mas sei que você não tem culpa por nada disso que ele está dizendo.

— Blaire, eu estou pronto para me defender do que quer que seu pai me acuse. Eu não fiz nada ruim. - Peter mentiu.

— Você precisa encontrar seu irmão. - Blaire disparou - Mas não aqui. Preciso saber se você confia em mim.

Blaire encarou Peter, olhando no fundo de seus olhos, e então já sabia a resposta.

***

Phillip estava deitado na cama do hotel em que se hospedou. Estava com olheiras profundas, pois nem conseguiu dormir a noite, e seus olhos estavam vermelhos de tanto chorar. Em seu colo, estava o arquivo que Skarlett havia escondido no armário.

Na noite anterior, após dar seu depoimento para os policiais e dos enfermeiros checarem se estava tudo bem com ele, Phillip voltou a casa da árvore. Foi difícil ver a janela quebrada por onde Sky caiu, e também a trilha de sangue deixada por ela. Porém, precisava fazer aquilo. Achou os arquivos e escondeu, levando consigo.

Lia e relia todos os depoimentos. Descobriu que Warland não tinha um filho, e sim uma filha. Descobriu também que sua mãe, junto com seu pai e o papai Hardy, foram os responsáveis pela prisão de Tommy Warland. Então era disso que mamãe falou antes de morrer…

Só de pensar na mãe e em como contaria para o irmão, lágrimas começaram a escorrer pela sua face.

When it gets real

Just know that I'll be there

I got your back

Like it's just you and me here

Lucky estava apenas de cueca, perto da lavanderia de sua casa. Terminava de arrumar a máquina de lavar, para limpar suas roupas. Não queria deixar mais rastros de sangue por onde passou.

I’ll go to war for you

Let them bring it

I’ll take on the world for you

Better you believe it

Leda pousou um livro na mesa da sala de estar. Caminhou lentamente até seu quarto. Abriu seu guarda-roupa e vasculhou entre seus sapatos um fundo falso. Após achá-lo, retirou de dentro dele uma faca reluzente. Estava pronta para seguir com o seu plano.

So if you need me

Just holler my name

We ain't never scared

No we're not afraid

A perícia tirava mais fotos do corpo pendurado na janela do escritório de advocacia no centro da cidade. O rosto de Larry estava sujo de sangue e um buraco saía na parte traseira de sua cabeça. Nas mãos ainda estava a arma que colocou em sua boca e disparou. Em sua mesa, estava um jornal e na primeira página, estava estampado a matéria sobre seu pai corrupto.

A culpa o levou ao suicídio.

We’re never worried

But no one’s here for life

I’m your ride or die

Johnny estava deitado na cama, observando o teto. Seu celular apitava a todo o momento, mas ele não queria visualizá-lo. Já sabia do que se tratava: Roderick pedindo desculpas. Porém, o gótico já não sabia se o rapaz era confiável. Levantou-se e saiu. Brenda o esperava, para irem juntos ao enterro de Mark, que teve o corpo encontrado perto do jardim.

When the night gets cold

And the lights go out

The sun is gone behind the clouds

Ed Hardy estava parado perto da janela. Sua expressão parecia séria. Devido ao calor, estava sem camisa, apenas com uma bermuda confortável. Sentiu uma presença atrás dele e virou-se. Evelyn carregava duas taças de vinho. Ofereceu uma ao homem e os dois brindaram.

Eles estavam comemorando.

When you feel lost, then I'll reach out

To guide you home with my lighthouse

Wo-oh, wo-oh

I'll guide you home with my lighthouse

Phillip estava lendo novamente o artigo, tentando juntar todas as peças do quebra-cabeça, quando ouviu algumas batidas na porta do quarto. Gritou que estava indo e largou os arquivos sob o lençol. Caminhou até a porta e abriu a mesma. Ficou surpreso, ao ver Blaire parada do outro lado, e se apoiando na garota, estava…

— Peter? – Phillip perguntou ao ver o irmão, fugitivo do hospital.

Wo-oh, wo-oh

I'll guide you home


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado. Não esqueçam de comentar! Quem acham que é o assassino?



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