Hunter - A caçada começou escrita por Julia Prado


Capítulo 11
As conchas de Lynn Call


Notas iniciais do capítulo

Nos falamos lá embaixo ;*



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Eu não sei o que imaginava quando as aulas finalmente acabassem. Acho que mais gritaria, folhas de cadernos rasgadas e deixadas ao chão... Mas então me lembrei que não era o fim das aulas. E que eu ainda tinha mais um semestre letivo quase. Então dirigir de volta para casa. Austin ficando na praia novamente.

Minha cabeça estava doendo durante toda a semana. Mas eu atribuía isso ao estresse que estava passando, pois ficar esperando pelas notas estava me matando. Então eu não dormia bem e quando dormia tinha pesadelos. O mesmo pesadelo de sempre. O do penhasco com Farad. Mas as pilhas de corpos mudavam, as vezes eram pessoas que eu conhecia, outras que eu desconhecia.

Tentei observar meu pai também, em busca de sinais que mostrassem que outra pessoa havia morrido. Mas ele não fez nada de estranho e urgente nessa semana. Na verdade, ficou bastante tempo em casa. Agora eu o via mais do que antes. Tinhamos até voltado a brigar, por ficar tempo demais no mesmo local. Isso era bom em partes, ruim em outras. Imaginei que talvez Jacob teria afastado meu pai dos assuntos da reserva, já que eu estava tão na cola dele. Mas não parecia algo vindo de Jacob.

Meus olhos estavam latejando. Proveniente das dores de cabeça, que costumavam durar o dia inteiro. Eu estava tomando remédios e eles ajudavam, até o efeito passar e eu sentir novas dores. Como era o caso agora.

Por outro lado, eu estava muito aliviada. Minhas notas tinham vindo altas, mas em Biologia e História eu vim com A+. Eu deveria sair para comemorar, mas não estava com cabeça para isso. Agora a única coisa que eu queria fazer era chegar em casa e terminar de ler o livreto, que eu tinha parado desde quando Austin me interrompera no quarto.

Eu sentia falta de ler ele, de me impressionar e aprofundar em suas histórias. Mas essa semana não foi fácil. O bom é que agora eu tinha dois meses livres. A neve já estava mais forte, assim como o frio. Tive que trocar meus pneus, colocando correntes para evitar que deslizassem tanto ou atolassem quando a neve começasse a ficar mais densa.

Estacionei o carro e corri para dentro, com mais frio do que eu jamais senti. Jane estava em casa, vendo um programa de entretenimento enquanto meu pai olhava uma pasta parda. Se ele tivesse continuado a vê-la, talvez não teria atraído a minha atenção. Mas assim que entrei, ele se atrapalhou e fechou depressa a pasta. Para depois me olhar e sorrir de um jeito que nunca sorria: calmo.

Fingi que não notei, mas se ele não guardasse bem essa pasta, eu daria uma olhada. Para mim, tudo o que meu pai escondia tinha a ver com as mortes. Eu não sabia da minha necessidade de monitorar essas mortes, pois só me traziam mais pesadelos. Mas eu precisava saber o que estava acontecendo. Me sentia mais segura com isso.

Deixei minhas coisas no quarto. Por mim, ficar deitada na cama e dormindo o dia inteiro poderia funcionar. No entanto, eu tinha coisas mais importantes para fazer, como escrever minhas cartas de indicação. Então passei horas fazendo isso, mas fui distraída com uma nova onda de dor. Larguei o lápis enquanto massageava minhas temporas. Eu tinha tomado há pouco tempo o remédio, não é como se eu pudesse simplesmente tomar outro.

Terminei de assinar a última carta e coloquei as coisas de lado. Eu não ia conseguir me concentrar agora. Deitei meu corpo na cama e fechei os olhos, deixando que o cansaço me abatesse. Só de pensar que eu teria dois meses para descansar antes do ritmo frenético que seria no segundo semestre, eu já me sentia bem.

Talvez fosse o efeito tardio dos remédios para dor de cabeça, mas um sono me alcançou tão forte que nem pensei em resistir. Puxei a manta um pouco por cima do ombro e me aconcheguei mais na cama. Dormindo de forma profunda, com o leve bater dos galhos da árvore em minha janela, eu deixei que meu sono preenchesse o corpo e relaxasse, por milagre, as dores de cabeça.

“Havia uma luz forte me cegando, vinha de cima. Demorei um tempo para notar que era o sol. As minhas bochechas esquentaram com o repentino calor. O dia estava abafado de um modo opressivo. Bufei tentando refrescar o repentino calor.

Abaixei meus olhos, tentando ignorar o sol. Eu estava no penhasco de La Push. O mar estava azul escuro, com a maré tranquila e baixa. Eu mal conseguia ouvir a água salgada batendo no rochedo do penhasco. O vento levantou meus cabelos, trazendo o cheiro de terra molhada, flores ao sol e sal. Sorri por um breve momento, sentindo minha pele esquentar com o sol. Era, sim, muito opressivo aquele calor, mas eu sentia falta dele. Sentia falta de suar enquanto corria na praia, ou tomar sorvete como se minha vida dependesse daquilo.

Braços rodearam minha cintura. Eram quentes, fortes e firmes. Eu não me sobressaltei. Poderia ter o feito se o cheiro amadeirado não chegasse em mim. Poderia também me incomodar com a proximidade dele, na forma como minhas costas se moldavam com perfeição em seu peito. Ou em como sua respiração batia em meu pescoço quando ele se abaixou para sussurrar.

– A vista é linda – falou, sua voz baixa, rouca.

Um arrepio desceu pela minha coluna e eu não consegui evitar o sorriso. Eu estava tão feliz que mal cabia em meu peito. Tentei extravasar essa felicidade com um riso tremulo. Não adiantou muito.

– É sim. – encostei mais nele, deitando minha cabeça em seu ombro. O sol ainda se esforçava para me queimar viva e cegar ao mesmo tempo, mas eu estava resistindo bravamente.

No entanto, não pude deixar de sentir o aumento do calor. E era Jacob. Seu corpo quente e forte aumentando a temperatura do meu, também adicionando ao fato de meu corpo sempre esquentar quando estava perto dele. Então eu estava suando um pouco.

Decidi abandonar aquela vista maravilhosa da imensidão que se estendia na minha frente. Não me senti mal por isso, eu tinha um bem melhor logo atrás. Virei meu corpo para ele. Às vezes era quase surreal a beleza de Jacob Black. Os traços maduros de seu rosto, o mistério que rondava sua íris. No entanto, dessa vez era diferente. Eu conhecia os segredos que estavam ali. Havia tanta intimidade e tanta cumplicidade na troca de olhares que eu me senti maravilhada. Era o Jacob que eu sempre quis conhecer. O Jacob que poucas pessoas conhecem, aquele que ele força as pessoas a não verem. E eu tinha esse privilégio.

Sim, ainda havia muito mistério que me atraía, eu não o conhecia por completo. Acho que me levaria uma vida inteira para isso. Mas era diferente agora. Parecia que o mais importante eu já sabia. Todavia, não conseguia me lembrar o que era.

– Já falei o quão linda você é? – ele perguntou aproximando seu rosto do meu. Também me esquecia às vezes de como ele era alto.

Ergui meu rosto, já pronta para beijá-lo. Meu corpo ansiava por isso. Meus lábios formigavam pelo contato. Meu corpo implorava o que eu não conseguia fazer por meio de palavras. Jacob sorriu, umedecendo seus lábios. Um frisson me atingiu e eu suspirei. Era quase uma tortura essa demora toda.

Mas ele parou a centímetros de mim. De início achei que era para me provocar – eu acho que já era muito claro o prazer que Jacob sentia em me provocar -, mas estão observei suas feições com mais cuidado. Não. Alguma coisa tinha acontecido. Era uma posição que eu conhecia muito bem dele. De repente, Jacob parecia distante dali. Parecia estar se concentrando em escutar algo. Sua cabeça levemente virada por cima de seu ombro.

Com um arregalar de olhos, ele levantou seu corpo novamente. Jacob sempre tinha aquela postura confiante, mas dessa fez era diferente. Era uma posição de comando, tensa e preparada. Ele virou lentamente.

O sol de repente sumiu. Uma nuvem densa e escura o cobrindo. Quase perdi todo o calor do meu corpo se Jacob não estivesse tão próximo de mim, o suficiente para que eu não tremesse de frio. Ele ficou de um modo no qual estava claramente me protegendo. Os braços levemente abertos, a postura tensa, os joelhos um pouco dobrados. Parecia pronto para a briga.

– Não olhe. – ele disse por cima de seu ombro.

Eu quase obedeci. Sua voz possuía uma liderança tão grande que eu realmente quase o obedeci. Parte de mim mandou que eu o ouvisse e não bancasse a idiota. Mas eu geralmente escutava a parte idiota da minha cabeça. Meu corpo queria obedecer, ele queria fechar os olhos e se esconder, mas minha vontade era maior. Mantive os olhos abertos, por mais que soubesse – de uma forma inconsciente – que eu não iria gostar do que fosse ver.

Levei a cabeça um pouco para a esquerda, olhando pelo lado do braço forte de Jacob. Havia uma casinha entre as árvores. Ela quase não aparecia por causa das árvores grandes e fortes, com suas raízes saindo grossas da terra e rodeando a casa. Formavam um semicírculo em frente da casa. Havia algo ali que Jacob via, mas que eu não conseguia.

Então começou a chover.

Grossas gotas de chuva que me encharcaram em minutos. Eu queria entrar na casa. Lá parecia ser mais seguro do que aqui fora, eu só precisava de um espaço apertado para me sentir segura, algo com quatro paredes e uma só entrada. Isso sim me faria sentir mais segura no quesito ambiente. Não tinha como eu me sentir desprotegida com Jacob comigo.

– Jake. Vamos entrar. – falei, usando o apelido que agora parecia cair perfeitamente nele.

Ele apenas balançou a cabeça, suas feições sombrias.

Olhei na direção que ele mirava tão insistentemente. Ainda não via nada, mas eu sabia que algo naquela direção estava perturbando Jacob. E Jacob não era uma pessoa que se perturbava com facilidade. Foi quando seus braços começaram a tremer que eu notei o quão sério era.

Não conseguia me lembrar o problema que era quando seus braços tremiam, parecia que muitas coisas estavam escapando de mim, mas aquilo nao era nada bom.

Eu queria dizer que estava com medo, mas não o faria. Jacob precisava de alguém forte do lado dele, e eu estava tentando ser.

Um movimento atraiu minha atenção no local que Jacob e eu encarávamos. Era uma mulher. Não era muito alta. Sua pele era branca como a neve, os cabelos de um dourado quase igual ao sol, de suaves e brilhosas ondas perfeitas que caiam até sua cintura. As roupas eram modernas, mas ela trazia um quê de antigo no modo como andava ou nas linhas de seu rosto. O queixo era fino, alongado, maçãs altas e levemente coradas, os lábios eram finos e rosados. Olhos de um negro preocupante. Não conseguia me lembrar o motivo da cor de seus olhos serem um problema também.

Ela sorria. Um sorriso de predador, de alguém que sabia que estava em vantagem. Apertei o braço de Jacob, que continuava a tremer, dessa vez mais forte. No entanto, ele ainda parecia ter o controle da situação.

E eu não entendi o motivo daquela mulher ser um problema para nós.

Outro movimento. Logo atrás dela.

O ar escapou de meu corpo. E eu entendi o porquê Jacob havia me mandado fechar os olhos. Um pavor se desprendeu de meu corpo, fazendo meus músculos travarem de medo. Era do tamanho de um urso de pé. Eu quase não o vi, seu pelo era longo e esverdeado, se camuflando na floresta. Mas a partir do momento que ele pisou fora da orla da floresta eu consegui ver melhor. E desejei que não tivesse visto.

Em um movimento rápido eu abaixei meu corpo e cobri meus ouvidos com os braços, mantendo a cabeça entre as pernas. Tentei escutar apenas minhas respiração acelerada, focando os olhos na terra abaixo de mim. Eu estava entrando em pânico. Não consegui anular o barulho ao redor de mim. Havia rosnados, muitos, dentes batendo, um choro de dor.

E então tudo escureceu.

Não havia mais grama, nem terra, nem gritos e rosnados. Eu só conseguia ver minha calça jeans por que estava perto demais do meu rosto. Mas senti a presença. Era como se gelo fosse jogado em meu corpo.

Uma respiração em meu ouvido, quente e controlada.

– O que corre de noite na floresta? – perguntou.

Estremeci e gritei”.

Pulei da cama. Caindo com tudo no chão. Se não fosse meus reflexos eu teria batido a cabeça, mas consegui colocar os cotovelos e endurecer o pescoço. Meu corpo estava extremamente úmido, minha respiração acelerada. Não consegui abrir os olhos, pois a dor de cabeça estava intensa. Cegamente eu tateei a cama e consegui voltar para ela.

Deitei e tentei acalmar a respiração ao mesmo tempo em que absorvia a dor de cabeça. Abri os olhos novamente e consegui enxergar meu quarto com mais nitidez. Aos poucos tudo foi entrando em foco novamente e eu me senti um pouco mais aliviada. A impressão da escuridão ainda percorria meu corpo.

A porta se abriu rapidamente e meu pai entrou com cara de assustado. Ele trazia um taco de beisebol nas mãos e olhava ao redor do quarto, como se quisesse encontrar por onde o intruso tinha entrado e onde estava escondido.

– Você está bem? O que aconteceu? – ele disse vindo até mim, mas não diretamente. John verificou o trinco da janela, para confirmar que ainda estava trancada. Depois suspirou um pouco mais tranquilo, mas seu nariz estava levemente franzido.

– Tive um pesadelo e cai da cama. Só isso. – falei ignorando o nariz franzido dele e massageei minhas temporas. – Minha cabeça vai estourar.

– Vou pegar um remédio para você, querida. – Jane disse saindo rapidamente do quarto, tinha a feição pálida.

– Que cheiro é esse no quarto? – John disse olhando pela bagunça que era minha cama, como se quisesse identificar de onde vinha o cheiro.

– Sei lá, pai. – falei brava. Porra, eu estava quase morrendo de dor de cabeça e ele estava preocupado com o cheiro do quarto? Tentei sentir o que ele tanto estranhava, respirando fundo. Mas não senti nada além do meu perfume e um pouco do de Austin.

Jane voltou com um corpo de água e mais remédios para dor de cabeça. Eu ia acabar parando no hospital dessa forma. Mas nao fiz objeção e tomei.

– Quer ir ao hospital?

Uh, eu não ia para o hospital de Forks, preferia ficar em casa. Nada contra ele, mas não acho que o médico faria grandes progressos comigo. Era só uma dor de cabeça, nada demais. Neguei suavemente, para que minha cabeça não doesse muito.

Voltei a deitar quando os dois sairam do quarto. Olhei para meu celular e vi que tinha dormido por breves trinta minutos. Bufei. Desbloqueei a tela e respondi as mensagens insistentes de Naomi. Estava chegando o dia em que ela viria me visitar... Bom, faltava quase trinta dias ainda, mas ela estava tão ansiosa que era como se fosse amanhã. Já estava planejando suas malas há dias.

Abri um pequeno sorriso com essa pequena distração. Eu sentia falta dela, mas não como no início. As coisas pareciam diferentes depois de quase seis meses em La Push. Estava ansiosa para a vinda dela, mas essas mortes me preocupavam, assim como o sádico do Farad... Não, eu não ia pensar nele.

Joguei o celular para o lado quando paramos de conversar. Eu estava com fome e minha cabeça ainda doia. Isso estava tirando o meu humor. Entrei no banheiro decidi tomar um banho para tirar todos os arrepios do sonho esquisito. Não vou mentir que tinha começado muito bem, mas depois foi um tanto... O que corre de noite na floresta? ... O pensamento me atingiu em cheio.

Engoli em seco pelo bolo que havia se formado em minha garganta. A pergunta rondou minha cabeça durante todo o banho. Sai do chuveiro quando estava quente o suficiente para ficar corada e com a pele um pouco avermelhada. Enxuguei meu corpo com o pensamento ainda na pergunta. Eu tinha tanta coisa para poder lembrar do sonho – como Jacob e seus lábios -, mas minha mente parecia travada nesse pensamento.

O que corre de noite na floresta?

Como é que eu ia saber disso? Balancei a cabeça para tentar esquecer. Era apenas um sonho. Apenas impressões de meus pensamentos e experiências que estavam tomando imagem em minha mente. Não tinha nada de verdadeiro por trás daquilo. Eu nunca tinha visto aquela menina na minha vida, nem estado naquele maldito penhasco... Balancei a cabeça novamente.

Eu não ia ficar pensamento sobre isso.

Precisava de ar puro, de algo para fazer que não me desse sono novamente. Eu poderia ir até a praia com Austin, Lali e Graham. Sim, seria uma boa. Eles geralmente conseguiam me distrair dos problemas. Vesti minhas calças jeans de cintura alta, uma blusa leve de mangas cinza, um pulôver amarelo e meu casaco grosso caramelo escuro por cima. Sentei no chão para puxar as caixas de sapato que estavam embaixo da minha cama, pois nao tinha conseguido colocar no armário. Puxei meu coturno marrom, o deixando longo, assim não sujava minha calça de lama. Enrolei uma echarpe mesclada no pescoço e estava pronta para sair.

Não havia jeito de arrumar meu cabelo, ele estava cada vez mais impossível com toda essa umidade de La Push, então deixei o coque bagunçado mesmo, com alguns fios enrolados ainda molhados por causa do banho. Joguei o celular no bolso. Eu até ligaria para Austin, só para confirmar que ela ainda estaria lá, mas aquela garota tinha uma severa aversão a tecnologia. Ela nunca atendia ao celular, então decidi arriscar. Nem fazia muito tempo que eu estava em casa mesmo.

– Vai onde? – John perguntou.

– Para a praia com Austin, Lali e Graham. – falei já me encaminhando para a porta.

– Não vai de carro? – ele perguntou quando não peguei as chaves.

– Não, vou andando mesmo.

Sai de casa rolando os olhos com a careta estranha que John me lançou. Como se eu estivesse doente por não ir de carro... Tudo bem, tudo bem, eu tinha uma grande e eterna preguiça de andar por La Push sem carro, mas hoje era diferente. Assim como no dia em que brigamos. Eu precisava andar.

Soquei as mãos no bolso do casaco enquanto andava. Aquela fina garoa chata tinha parado por um tempo, mas os flocos de neve estavam com mais força agora, quase chegando ao chão. Uma fumaça densa e espeça de calor saia de minha boca sempre quando eu respirava fundo o ar gelado.

Essa era a pior estação para se estar em La Push. Aqui ia fazer um frio dos infernos. Olhei para o chão enquanto andava, tentando bloquear qualquer pensamento sobre o sonho. Minhas botas já estavam sujas de lama. Isso provocou um pequeno sorriso em meu rosto e depois uma risada por ver prazer em ter minhas botas sujas de lama. Era algo que só La Push poderia fazer com você.

Eu andava pela orla do porto, acompanhando o movimento que nunca cessava durante o dia. Os pequenos e grandes barcos pesqueiros balançando de um lado para o outro. Barcos já encostados no píer, homens e mulheres trabalhando duro para tirar as mercadorias – geralmente frutos do mar – de dentro dos pequenos e precários barcos.

Havia uma vida ali. Não tão pulsante como Los Angeles, mas discreta e calma. Se não fosse um local tão esquecido eu até poderia ficar ali. Dormir segura todos os dias, o suficiente para deixar a porta destrancada ou até aberta, como o povo quileute fazia. Poderia chegar nos lugares em menos de dez minutos. Conheceria todo mundo, faria amigos para a vida toda.

Mas essa comodidade não era muito a minha cara. Por mais que eu amasse La Push, por mais que minha decisão em ser bióloga tenha sido por causa das pequenas explorações que John fazia comigo na floresta, eu queria conhecer o mundo. Uma pena que La Push não poderia suprir toda essa minha sede de conhecimento.

Cumprimentei algumas pessoas enquanto andava, mais por educação do que qualquer outra coisa. Desci as escadas podres de madeira para alcançar a orla da praia, com suas pedras cinzas. Não havia crianças brincando no mar, mas havia famílias comendo por ali. Passeando com seus cachorros.

Parei para observar o mar agitado. Mas nao somente ele, observei a Ilha de James, depois, mais para o meu lado direito, estava o penhasco. Um frio desceu por minha espinha. Haviam dois. Alguns habitantes de La Push gostavam de se arriscar no primeiro, que era mais baixo. Nunca vi ninguém tentar o mais alto, mas ele estava lá, me parecendo muito mais ameaçador agora.

– Gaele! – escutei o grito distante de Graham.

Procurei de onde o grito veio e os encontrei há bons metros de distância. Eles acenavam como se a praia estivesse tão cheia que eu não conseguiria encontrá-los. Rolei os olhos rindo e comecei a andar na direção deles. Lali estava com os pés um pouco úmidos, suspeitei que teria sido uma brincadeira de Graham, ele provavelmente quase a jogou no mar. Era bem a cara dele.

Austin estava logo atrás, sorrindo mais relaxada agora. Meu peito se apertou em culpa por tê-la levado até a floresta. Eu realmente não deveria ter feito aquilo.

– E aí? – perguntei enquanto Graham apoiava seu braço em meus ombros e fazia com que eu o acompanhasse.

– Graham quase me jogo no mar. – Lali reclamou. Lali era muito bonita, de formas simples. Assim como Austin, só que um pouco mais pronunciante. Suas linhas eram mais feitas, como o arco dos olhos, as bochechas altas. O mais interessante era o quão claro seus olhos cor de mel eram. Quase âmbar.

– Imaginei. – falei sorrindo.

– Vamos! Estamos indo ver as piscinas. – Graham disse, parecia muito feliz com o início das férias. Eu sabia que ele não tinha ido muito bem na maioria das matérias, que se não se esforçasse para valer, provavelmente repetiria de ano.

Acho que eu e Austin não éramos os únicos ali em busca de uma distração.

Eu amava as piscinas! Eram cheias de corais e de uma água cristalina. É claro que eu já tinha escorregado pelas pedras e quase me afogado – por isso eu não gostava muito de entrar nas piscinas ou no mar-, mas a beleza delas era inegável.

Começamos a caminhar conversando até a ponta da praia, para poder pegar a trilha até a First Beach. Eu teria que tomar muito cuidado para não cair hoje, o tempo não estava perfeito para isso. Subimos as escadas para sair da praia de La Push e passamos pelo estacionamento.

– Ei, não é a moto de Jacob? – perguntei olhando para a Harley estacionada. O preto dela reluzia em contraste com o metal brilhoso. Olhei ao redor, como se conseguisse encontrá-lo, mas ele não estava por perto.

– É uma moto bacana. – Graham disse tentando fazer pouco caso, mas seus olhos brilhavam de admiração.

Rolei os olhos e ri. Os puxei para a trilha, mas notei que Austin hesitou antes de entrar na floresta. Lali e Graham seguiram na frente, fazendo gracinhas entre si. Um empurrando o outro ou tentando fazer o outro tropeçar. Peguei na mão de Austin e sorri da maneira mais confiante que pude.

– Hei. Tá tudo certo.

– E se encontrarmos...?

– Não vamos. – eu esperava que não.

Austin assentiu e entrou comigo. Foi como sempre era, mas cada vez trazia uma intensidade maior. Era como uma volta ao lar. Não havia medo em meu corpo que pudesse me atingir quando eu estava aqui. As copas das árvores eram tão altas que eu mal conseguia ver seu final. Havia um barulho quase ensurdecedor de pássaros.

Nós caminhamos em silêncio. Senti que Austin aos poucos ia relaxando seu aperto em minhas mãos, assim como a tensão em seus ombros ia diminuindo. Ela estava relaxando também. Eu escutava parcialmente a conversa de Graham com Lali. Ele reclamava de como alguns meninos da escola estavam agindo ao redor dele.

–... Quero dizer, não é minha culpa que a irmã de um deles quer sair comigo. Não é algo que eu ou elas possam evitar. Mas acho que tenho que tomar cuidado, Tomas estava muito bravo na aula de educação física, se eu não tivesse saído em tempo da frente dele, tenho certeza de que ele teria me acertado um murro na cara e depois diria que confundiu com a bola de basquete.

– Ah sim, Graham, por que você é realmente muito desejado. – Lali disse rolando os olhos e todos nós rimos.

– Estou falando sério! Esse cara quer me pegar! – disse.

– Bom, então mostre a ele que você não quer nada com a irmã dele. – dei de ombros – Não é como se ele fosse realmente te bater, Graham. Os pais saberiam antes mesmo de acontecer, do jeito que La Push é.

Lali abriu um curto sorriso – um de seus raros – enquanto Austin rolava os olhos para o meu comentário.

– Se eu fosse você, acertava um soco bem no queixo. Ele ia apagar na hora. – Lali comentou, fazendo uma breve representação de um soco no ar.

– Ah sim, todo mundo sabe como você resolve seus problemas, Lali. – Graham bufou, um vapor quente se formando a sua frente. – Diversifica um pouco, vai.

Lali trombou com ele e os dois começaram uma breve e mal sucedida luta. Onde Graham escorregou e levou Lali junto, os dois caindo em uma poça de lama. Eu tive que parar de andar para poder rir, meus pulmões não aguentando mais ar frio. Austin também ria, só que tinha se apoiado na árvore mais próxima para não cair também.

Os dois foram se xingando até a trilha acabar e sairmos da floresta. As piscinas de água salgada eram bonitas por si só. As rochas altas e escuras formavam pequenas e espaçadas barreiras que mantinham a água da maré alta ali. Alguns peixes e outros animais marinhos ficavam presos também quando as pedras eram muito juntas.

No entanto, não éramos os únicos ali.

Um grupo de quileutes estavam se divertindo. E era bem a cara deles. Um local reservado, em um dia que alguém dificilmente iria até ali. Eles poderiam ser quem eram – seja lá o que fossem quando estavam sozinhos e entre eles. Porém, pararam assim que chegamos.

Ficou um breve momento de desconforto, até Collin empurrar Brady para dentro de uma das piscinas. Eu ofeguei. A água deveria estar congelando! Brady provavelmente teria uma pneumonia ou morreria de hipotermia. Lali e Austin pareceram pensar o mesmo que eu, mas não se moveram.

Fui correndo até onde Brady tinha caído, tentando ao mesmo tempo manter o equilíbrio nas rochas escorregadias. Brady nadou de volta até a rocha se içou. Tirei meu casaco, pronta para cobrí-lo, mas ele só sorriu para mim.

– Hei! Olha quem veio! – pegou uma toalha no chão. – Não se preocupe, Gaele! Estou bem. – disse enquanto tentava enxugar as roupas molhadas.

– Brady... Pelo amor de Deus, a água deve estar congelando. Você vai acabar morrendo. – insisti.

– Ele vai ficar bem. – Collin riu.

– E você! – falei brava, me aproximando dele. Collin coçou a nuca de forma desengonçada. Na verdade, tudo o que fazia parecia ser desengonçado por causa de sua altura impressionante. – O que é que você acha que estava fazendo ao joga-lo na água, Collin?

– Eu... Era... Era só uma brincadeira... Er... Quero dizer, ele não se machucou nem nada...

Eu nem precisei dizer mais nada. Acho que meus olhos estavam fazendo o serviço, pois Collin parou de falar na hora e olhou para trás, como se buscasse ajuda de seus outros amigos. Mas todos estavam ocupados se divertindo e se jogando nas piscinas. Eles não pareciam se importar com a temperatura.

E essa não era a primeira vez que eu os via fazer isso.

– É sério, Gaele. Estou bem. Foi só uma brincadeira. – Brady disse sorrindo largo para mim.

Abri a boca para dizer mais algumas coisas, que aquilo era imprudência, que eles estavam tão entediados nessa cidade que procuravam se matar todos os dias ao sair desprotegidos do frio... Mas então lembrei que nenhum deles parecia realmente se importar com o frio. Não como eu, Austin, Lali e Graham. Ou como qualquer outro cidadão de La Push.

Brady me encarava de forma tão inocente que não consegui ralhar mais com ele ou com Collin. Bufei, uma nuvem de vapor se formando na minha frente, e coloquei de volta meu casaco.

– Vocês são doentes. – falei.

– Ah! É o primeiro dia das férias! – Collin disse passando seu braço em meus ombros, mais feliz que eu não estava brigando. – Temos que comemorar!

Rolei os olhos.

– Com certeza, por que pegar pneumonia no primeiro dia das férias é uma comemoração e tanta! – vibrei. – Devíamos fazer todos!

Os dois tiveram a cara de pau de rir. O corpo de Collin era tão quente eu parecia que estava perto de uma fogueira, confortavelmente aquecida. Não pude, no entanto, deixar de notar a diferença do calor de Collin para o de Jacob.

Falando nele...

Jacob estava sentado um pouco mais além, com os mais velhos daquela turma. A diversão deles, todavia, era outra. A pequena Lynn atraía as risadas de todos com sua busca por uma concha bonita, mas que sempre acabava por quase cair dentro das piscinas – se não fosse por seu pai jovem e de aparência cansada.

Acho que ele sentiu que eu estava olhando para ele, embora eu tivesse a certeza que Jacob havia me visto desde quando entrei no local. Agora ele cravava seus olhos em mim, sem dó nem piedade. O sonho veio a minha mente com força e eu senti minhas bochechas corando enquanto tentava me livrar da nuvem de intensidade na qual ele me envolvia com apenas um olhar.

– Gaele! – Lynn disse assim que me viu.

Fiquei surpresa pela criança ainda lembrar do meu nome. Fazia muito tempo que nos vimos aquele dia na praia, na qual eu lhe dei a concha mais bonita que tinha achado até agora. A garotinha veio até mim cambaleando um pouco por conta das pedras escorregadias. Embry atrás dela, com seus braços sempre abertos à espera de pegá-la no mínimo deslize.

Collin e Brady se afastaram rindo até Austin, Lali e Graham que continuavam atrás de mim, mas entretidos com suas próprias brincadeiras. Faziam como os quileutes também faziam, ignoravam os outros habitantes.

– Oi, Lynn. – falei sorrindo.

Ela abriu um sorriso cheio de dente e covinhas.

– Eu guardei a concha, olha só! – ela disse puxando a bolsinha que parecia carregar sempre. Era pequena e de couro marrom claro, estava atravessada em seu corpo. De dentro saiu a linda concha azul perolada. – Ela fica na cabeceira da minha cama e, você não vai adivinhar, ela brilha de noite! – sua voz foi tão animada que não consegui conter o sorriso.

– Ela não para de falar dessa concha. – Embry disse rolando os olhos. - Foi ótimo, por que assim ela para de me encher o saco por um cachorro.

– Eu não parei de encher seu saco, papai. Só estou te dando um tempo. – Lynn respondeu quase que imediatamente.

– Bom, a concha com certeza é mais silenciosa quem um cachorro. – falei. Lynn sorriu para mim. – Quais outras que você achou depois dessa?

– Encontrei uma rosa clara, uma quase preta, tem também a roxa com marrom, ah sim não posso me esquecer da laranja com preto... – ela ia dizendo e puxando as conchas da bolsinha, suas mãos estavam tão cheias que a concha azul perolada escapou de suas mãos pequenas.

Eu estava vendo ela cair, quebrar e a decepção que seria quando Lynn notasse que a concha se partiria. Por isso tentei agarrar antes que ela caísse. Mas uma mão a agarrou primeiro e no último momento. Achei que fosse Embry, mas quando levantei encontrei com Jacob. E eu não tinha ideia de onde ele tinha saído. Mal o vi se aproximando. E em geral eu conseguia sentir quando ele vinha.

– Essa foi por pouco. – Jacob disse sorrindo de canto. – Lynn, acho melhor guardar suas conchas antes que todas caiam.

Lynn assentiu, os olhos um pouco arregalados pelo susto de quase perder a concha preciosa. Ela, com a ajuda do pai, colocou tudo de volta na bolsa. Então pegou na minha mão.

– Vem me ajudar! Papai nunca consegue encontrar as conchas bonitas, e o tio Jake não tem paciência para conchas coloridas. – ela reclamou enquanto me puxava. – É tão difícil ser eu nessas horas.

Ergui as sobrancelhas achando graça do comentário dela. Consegui reprimir o riso enquanto ela me puxava. Estava bem protegida para o frio, com calças jeans, botas até seus joelhos, um casaco grosso e um cachecol. Suas mãos estavam geladas por estarem sem luva, mas eu via suas pequenas luvas no bolso de Embry.

– Lynn, pare com isso. Gaele veio com os amigos dela, deixa-a ir se divertir. – Embry tentou deter o caminho da filha, mas ela apenas desviou dele.

– E quem disse que procurar conchas não é? Não é por que você não gosta, papai, que ninguém gosta também. – disse.

– Está tudo bem. Eles podem sobreviver sem mim por um tempo. – falei sorrindo.

Não havia atividade mais distrativa do que procurar conchas com Lynn Call. Era de uma calma e leveza tão grandes que durante toda a busca eu não senti nenhuma dor de cabeça. Lynn tinha a sensibilidade de ver coisas belas no meio das apagadas. Tinha um bom olho para isso. Buscava com afinco, olhando sob as pedras.

Era mais difícil achar conchas nessa parte da praia, mas ela não desistia com tanta facilidade assim. E era muito complicado agradar ela, não era qualquer concha e aprendi isso da maneira mais rápido quando, ao oferecer uma concha avermelhada, ela apenas rolou os olhos. Tive de rir disso.

Agachei próxima da piscina, me equilibrando na rocha para não cair. Uma luz havia chamado minha atenção dentro da água. Era uma concha, quase na borda da água. Era amarela, quase dourada. Estiquei a mãos, tocando a pontada dos dedos na água. Estava muito gelada e pareceu queimar meus dedos. Mesmo assim afundei a mão e peguei a concha.

No entanto, meu pé escorregou e eu me vi caindo para dentro da água gelada. Fui puxada para trás bem a tempo. Sendo amparada por Jacob. Eu sabia que era ele, não só pelo toque, mas porque nenhum outro nesse local parecia tão atento a mim como ele. Por um momento eu me teletransportei para meu sonho. Onde era tão natural estar em seus braços como respirar. Onde eu conseguia olhar em seus olhos e enxergar através de seus segredos.

Mas não era o caso. E essa era a vida real. E na vida real eu não via através dos segredos de Jacob. Não ainda.

– Cuidado. – ele disse.

– Obrigada. – falei tentando retomar o equilibrio, mas minhas pernas estavam tremendo. E não era de frio.

– Você parece cansada. – ele disse tocando meu rosto com a mão livre. Meus batimentos dobraram o ritmo, assim como minha respiração. A vergonha era que a minha respiração estava visível agora. – E quente.

Droga.

Ele não podia dizer essas coisas para mim e esperar que eu não desmaiasse de ansiedade. Isso era loucura. Sentir isso por alguém que eu mal conhecia era doideira. E era assim que eu estava me sentindo no momento. Completamente sem controle das minhas reações perto dele.

Jacob tirou um cacho que estava solto e atravessou meu rosto. Com isso ele pareceu se aproximar ainda mais. Minha garganta estava seca.

– Está ficando cada vez mais complicado. – ele disse, a voz baixa, exclusiva.

– O que? – perguntei em um tom tão baixo quanto o dele. Tudo parecia anulado ao meu redor, o barulho, as ondas batendo nas pedras. Nada disso mais existia.

– Ficar longe de você. – sua mão voltou a acariciar meu rosto, bem abaixo da mandíbula, próxima a orelha. Seus dedos brincaram de leve em minha nuca, como se refletisse se me puxaria para um beijo ou não.

E então eu estava tremendo por dentro. Eu queria beijá-lo, queria isso mais do que qualquer outra coisa no momento. Parecia existir apenas esse pensamento na minha cabeça. Mas mais do que beijá-lo, eu queria ser dele. Isso era possível? Uma pessoa pertencer a outra?

– Por que não saímos daqui? – disse de forma intensa, seus olhos negros cravados em mim, provocando uma breve letargia mental.

Já que eu não conseguia responder com um olhar daqueles sobre mim, apenas assenti sem nem me importar com as consequencias disso. Eu lidaria com elas depois. No momento, só queria estar com ele.

É claro que não estava nos meus planos andar de moto. Olhei insegura para aquele veículo tão simples e tão frágil. Um sopro poderia nos derrubar. Franzi meu cenho quando ele me entregou um capacete. Eu nunca o vi usar um.

– Não podemos ir andando, para onde for que você esteja nos levando? – perguntei.

Jacob riu.

– Vamos lá, não seja tão covarde.

Empinei meu queixo em desafio, fuzilando ele com os olhos. Eu não era covarde. Só precavida. As chances de escorregarmos na pista e deslizar para uma morte iminente eram enormes! Mas eu tinha essa mania de provar para os outros que não era tão frágil quanto pensavam. Então peguei o capacete de suas mãos e o coloquei.

Tive problemas com o fecho, mas ignorei a ajuda de Jacob e fechei por mim mesma. Vamos lá, eu não era fã de motos, mas sabia pelo menos colocar um capacete. O problema é que minhas mãos estavam tremendo. Eu ia ficar com Jacob sozinha depois de... Bom, não muito tempo, mas em um momento em que as coisas parecem estar avançando.

Ele ligou a moto e eu subi logo atrás. Mas a moto tinha suas vantagens. Em qual outro veículo eu tinha a desculpa de ficar tão próxima dele? Escondi o sorriso de diversão em suas costas, para que ele não visse pelo retrovisor. Jacob deu a partida na moto, o motor vibrando abaixo de mim.

Suavemente nós saímos do estacionamento. E então ganhamos a Ocean Drive. Era uma sensação muito boa, na verdade. Por mais que o vento pudesse estar congelante, ter Jacob como escudo para o frio estava funcionando muito bem. Eu continuava quente.

Pela primeira vez não me importei em saber para onde estavam me levando. Não me importei em ficar no controle da situação. Eu apenas afastei minha cabeça das costas de Jacob e observei o mar, que passava rápido por nós. As ondas pareciam mais violentas agora, com a chegada de uma tempestade. O cheiro de sal e terra encheu meu nariz e eu sorri um pouco.

Eu notei para onde ele estava me levando com curiosidade. Não achava que Jacob fosse forçar algo comigo, por isso não me importei. Mas era curioso o local.

– Por que sua casa? – perguntei assim que ele parou a moto dentro de sua garagem. O carro preto parecendo novo em folha.

– É o único lugar que consigo ser eu mesmo. – ele disse saindo da moto. Havia um sorriso malicioso em seus lábios. – Achei que você queria me conhecer. – ele levou suas mãos até meu pescoço para abrir o fecho do capacete. Seus dedos passaram mais tempo do que o necessário ali.

– E você vai deixar? – perguntei balançando um pouco a cabeça enquanto ele tirava o capacete.

– Que outra escolha eu tenho? – refletiu.

Eu saí da moto. Ele parecia estar cedendo, mas eu não sabia sobre o que. Não sabia se ele cederia sobre os mistérios que rondavam La Push, ou seus próprios mistérios. Ele com certeza nao me revelaria o motivo por incentivar minha leitura no livreto. Não me explicaria a anomalia que o atingia e aos outros garotos da reserva. Então até onde ele me permitiria ir?

Jacob tomou minha mão na sua enquanto me guiava até a entrada de sua casa. Acho que meu coração não deveria ter pulado com esse simples ato, mas ele pulou. Sua mão era grande perante a minha, e era quente também. Bem, bem quente.

Como todo mundo da reserva, a porta de Jacob não estava trancada. Entrar em sua casa pela segunda vez foi engraçado. A casa parecia estar do mesmo jeito que da última, mas as situações eram diferentes. Então ela parecia mais clara – principalmente com a parede de vidro que dava para o deck.

– Quer beber alguma coisa? – perguntou, mas seus olhos estavam tão intensos que não tinha como eu comer ou beber no momento. Então neguei com a cabeça, a letargia mental voltando.

Jacob sorriu, parecia bem calmo – por mais intensos que seus olhos pudessem estar. Ele tocou minha bochecha bem suavemente. Era de tanto cuidado e maciez que eu fechei meus olhos por breves momentos, curtindo a sensação de sua pele quente esquentando a minha. Ao abrir, encontrei olhos em chamas negras.

Entreabri meus labios como se isso fosse me ajudar a respirar melhor. Jacob deu um passo na minha direção. Minhas costas encostaram na porta fechada. Eu conseguia ouvir meu coração, fiquei imaginando se ele também poderia.

O momento mudou com um clique de botão. De repente havia o magnetismo que sentia tantas vezes quando as coisas ficavam intensas demais. Ele me puxava forte na direção de Jacob, mas não somente em sua direção como também em sua vida. Parecia não haver possibilidade de distância agora. Eu havia cruzado a linha com o seu pedido. Sentia que não tinha volta.

As mãos foram até minha nuca e eu estremeci esperando pelo beijo. Foi uma sensação mil vezes mais potente do que no sonho. Eu nao conseguia implorar por seus beijo, mas meu corpo o fazia.

Jacob inclinou seu corpo na minha direção e eu fechei os olhos, a respiração alta e rápida, o corpo quente e um pouco úmido nas roupas de frio. De leve, provocando e torturando, Jacob roçou seus lábios nos meus, mal dando para sentir a textura lisa deles. Achei que ia ter uma parada cardíaca. E acho que ele também se preocupou com isso, pois me olhou de maneira curiosa.

Que se danasse os joguinhos ele. Eu ia ter do meu jeito, então. Icei meu corpo para frente e o beijei.

Não há palavras que possam descrever a sensação dos lábios quentes de Jacob nos meus. Não há nada melhor, nem mais prazeroso e nem mais sensual. Eu só podia sentir tudo o que ele fazia comigo em silêncio. Sentir seus labios se movendo sob os meus, de uma maneira tão simples e tão perfeita. Sentir sua língua quente tocar a minha. Não era um beijo exploratório, em nenhum momento pareceu assim ser. Ele sabia como me beijar, não como beijar alguém, mas como beijar a mim.

Nunca senti o que estava sentindo com apenas um beijo.

E eu queria mais. Queria cada pedaço dele, cada respiração, cada pensamento. Queria fundir meu corpo no dele, por que mesmo nos apertando não estava sendo o suficiente. Eu tinha minhas mãos em sua nuca o trazendo mais para mim. Jacob tinha suas mãos em minha cintura, puxando meu corpo em direção ao seu. E mesmo assim não era o suficiente.

Fui encostada novamente na porta, dessa vez não tão suave. Havia uma clara necessidade ali, de ambos. Mas não que fossemos saciá-la nesse momento. Era como lidar com as tentações, mas sem realmente cair nelas.

Em um momento inútil eu precisei de ar. Então o beijo foi parando aos poucos. Suavemente e sem pressa para terminar. Quando enfim terminou, encostei minha cabeça na porta, os olhos ainda fechados e tentando recompor o oxigênio que meu corpo pedia. Ele ainda tinha seu corpo colado no meu, ainda estava perto. Mas agora respirava em meu pescoço, os dedos afastando os cachos soltos.

Sim, eu ia ter uma parada cardíaca.

Também não conseguia sentir minhas pernas direito, isso era algo para se preocupar?

Os lábios dele voltaram a roçar na minha pele, e agora não havia nada que eu pudesse fazer para que ele finalmente me beijasse ali. Então eu só podia permitir que ele me torturasse dessa forma. E rezar para que ele não prolongasse demais.

Senti sua mão deslizar de meu pescoço para meu ombro, e depois pelas minhas costas. Suas mãos se infiltraram em meu casaco de frio, queimando por cima do pulôver. Eu estava muito quente, sentia o suor brotando na minha nuca. Elas pararam na minha cintura, encontrando uma brecha de pele ali.

Eu poderia me preocupar com a temperatura de sua pele se não estivesse esquentando também. Jacob normalmente já era quente (quero especificar no quesito temperatura corporal), mas agora parecia ainda mais. O dedo brincou com a pele da cintura. Seus labios finalmente beijaram meu pescoço. E eu estava indo para o céu.

Apertei seus braços, como se isso fosse aliviar a emoção que entrava em ondas poderosas em mim. Não ajudou muito, só atiçou minha curiosidade física naquele momento. Minhas mãos tomaram vida própria ao explorar seus braços, sentindo a firmeza dos músculos, mas a forma natural na qual eles eram também. Depois toquei seus ombros, Jacob tinha ombros largos, uma das mãos caminhando para sua nuca enquanto a outra descia em direção a sua cintura. Fechei os olhos novamente quando Jacob mordeu de leve meu pescoço assim que apertei sua cintura.

E mesmo sem estar beijando ele, eu precisava de ar.

Nem precisei dizer nada. Eu não sabia como Jacob às vezes parecia me entender antes mesmo de eu falar algo. Mas ele se afastou aos poucos, não o suficiente para quebrar aquele magnetismo, mas pelo menos consegui recuperar o ar aos poucos.

– Você me parece fraca. – ele sorriu de canto, os olhos ainda em brasa, mas o sorriso era calmo.

Fiquei um pouco decepcionada ao ver que ele não estava como eu (quase desfalecendo encostada na porta). Umedeci os lábios e tentei me ajeitar melhor, para não ficar tão idiota. Jacob sorriu e me ajudou, arrumando o casaco que estava caido em meus ombros.

– Convencido. – consegui dizer, mas minha voz saiu mais rouca do que eu esperava. Senti meu rosto corar ainda mais, só que dessa vez de vergonha.

O sorriso de Jacob em reposta me tirou qualquer vergonha da mente. Era deslumbrante e cheio de energia. Atingiu-me impiedosamente, me pegando de guarda baixa. Não consegui não sorrir de volta. Ele só precisava sorrir assim para mim que eu fazia o que ele quisesse.

– Vou pegar um copo d’água. Pode se sentar, acho que você vai querer conversar agora, certo? – ele disse, ainda com os olhos em chamas, mas a voz o traindo e trazendo uma preocupação antiga.

O que é que Jacob tanto escondia?


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Notas finais do capítulo

Primeiro de tudo: SUPER OBRIGADA ISABELLA BLACK PELA LINDA RECOMENDAÇÃO! *pulinhos de alegria*
Garota! Você soube como animar meu dia! Beijo especial pra ti!
Agora vamos ao capítulo........ O que acharam? *eu bancando a inocente*
Falem-me de suas expectativas sobre o beijo, consegui suprir? Quero opiniões!
Logo mais logo mais nosso lobinho se revela.
Beijo para todxs!!
Nos vemos semana que vem!
;*