Heróis e Vilões - Um mundo de poderes escrita por Felipe Philliams


Capítulo 7
Médicos heterocromáticos


Notas iniciais do capítulo

Oiiii
Mais um capítulo *u* estou com a macaca esses dias



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Fiquei surpresa por continuar normal após alguns longos minutos de escalada. Eu era do tipo que se cansava fácil, fisicamente falando. Alcancei essa meta quando, nos períodos de ferias, resolvi inserir em minhas ideias que eu curtia ficar parada. Não que fosse mentira, mas eu também gostava de caminhar, correr, brincar e fazer atividades que envolviam algum esforço físico.

De qualquer jeito, eu passei a ficar o máximo parada, cultivando o sedentarismo em mim. Vi que, após breves períodos parada, eu precisaria me aquecer antes de ir. Digamos que, na "escalada", minha aquecida foram os minutos iniciais, a caminhada. Outra coisa que aprendi foi que eu precisava fazer os aquecimentos de acordo com o esforço que eu gastaria. Passei a chamar isso de lições, diga-se de passagem. Bem, vamos às lições de hoje: O que não fazer se for escalar um monte para tirar um pouco de sangue.

1) NUNCA coma ou beba algo antes. Se fizer isso vai se arrepender muito. Pelo pouco que eu comi me arrependi.

2) NUNCA olhe para baixo. Você pode até não ter medo de altura, mas olhar para baixo vai te causar uma breve tontura - isso se você já não for tonto o suficiente para fazer tal coisa.

3) NÃO puxe conversa. Qualquer coisa que falem vai obrigatoriamente acabar em alguma coisa sobre altura, o que vai dar náusea e uma vontade louca de pular dali. Sem bem que...

4) Se desistir na metade no caminho NÃO TENTE correr para baixo, ou vai levar uma queda e quebrar a porcaria do seu pescoço.

Bem, é isso.

Comecei a escalada com um sorriso no rosto. Era aquela sensação do tipo: "putz, hoje eu vou ser maioral!". Eu sentia que estava nas alturas, o que pode ser irônico, sendo que ainda estava no pé do monte. Eu parecia ser a pessoa mais amada do mundo.

Na metade do caminho eu queria desistir. Sentia que se virasse para trás e saísse correndo eu iria desenvolver magicamente o poder de correr em alta velocidade. Sentia que ia ser mais rápida que o Flash. Claro que isso não passava de ilusão. Sabia que se realmente corresse, eu tropeçaria e cairia para a morte.

Quando eu estava quase acabando, analisei meu percurso. Havia completado duas voltas em torno do monte e estava indo para a terceira. Estávamos caminhando havia um hora ou mais. Minhas pernas estava doendo e meus olhos pesados. Eu estava cansada e com sono. Assim que notei estar com sono, a porcaria do meu cérebro resolveu se concentrar em qualquer fagulha de sono. Logo me achei tentando lutar contra meus próprios olhos. Fernanda deve ter percebido meu desconforto, por isso façiu em uma voz ofegante:

– Ei... - Não fique para baixo.

– Está... Bem...

Então fechei os olhos para a inconsciência. A gravidade tomou conta do meu corpo e fui puxada para baixo. Acordei no meio da queda. Vi o chão se aproximar mais rápido que o som. Mesmo assim não gritei. Fechei os olhos para não ficar cega pelo vento batendo em meus olhos. Eu sentia a adrenalina em meu corpo subir ao passo que chegava cada vez mais perto do chão. O vento chegava a ser reconfortante em meu rosto. O som dele se propagando em meus ouvidos me deixou relaxada.

Eu tinha a consciência de que estava despencando para a morte. Sabia que tudo o que existia estaria acabado naquela hora. Não iria mais falar com minha mãe, nem com Fernanda. Eu ia tirar um grande fardo debaixo das costas de todas elas. Não acordaria mais. Minhas memórias íntimas perderiam-se comigo naquela hora.

Mas nesse momento minha queda parou bruscamente. Meu pescoço quase saiu do lugar, minhas pernas sumiram - não DE FATO. Acordei em uma superfície arenosa com cheiro de terra molhada. Olhava para o grande sol das quatro horas da tarde quando abri os olhos. Ainda estava com o processador lento por culpa da queda, por isso demorei uma segundos breves para entender o que o sol das quatro horas significava. Assim que os pensamentos me invadiram, berrei:

– Quando tempo fiquei assim??!!

– Sete horas.

Pensei várias coisas ao mesmo tempo. Minha cabeça foi invadida por pensamentos, correndo a mil por hora. Fernanda ali, esperando eu acordar; minha mãe em casa morrendo de preocupação; Luzia no carro entediada e faminta; eu perdendo meus poderes.

– Você já foi lá? - perguntei a Fernanda. Minha voz ainda estava em um tom abalado pela queda.

– Sim.
Ela mostrou-me o pulso. Precisei de mais concentração do que pensava para ver. Havia um circulo irregular encima do antebraço dela. A veia dela estava ao lado, pulsando rápida, como se fosse explodir. Sim, isso me assustou muito. Apesar disso, o mais intrigante era a marca dela, uma bolinha da cor verde-fraco que parecia flutuar no pulso dela. Eu tinha uma impressão de que viria na minha face, se não estive presa ao pulso dela.

– Pode ir lá, Marcela, está bem aqui perto.

Levantei-me com uma certa dificuldade, caminhando até o topo do monte. Me acalmei ao ver que eu não tinha morrido. Só de me pensar sorrindo com minha mãe no futuro mais uma vez... Aquilo me fez consideravelmente melhor.

Não demorei mais do que sete minutos para chegar lá. Contemplei com um certo ar de vitória meu percurso quando terminei. Quando olhei para o topo daquela montanha vi que não havia neve; nem uma grande casa. Contrariando meus pensamentos, não havia nada ali, a não ser uma área irregularmente redonda, o chão feito de rocha. Fiquei assustada por um pequeno período de tempo, imaginando que já era tarde demais e que eu não tinha mais poderes. Então me lembrei do que Wilson me falara. Eu vinha praticando essa frase para não me esquecer.

Fechei os olhos, tendo que segurar uma risada, e berrei:

– Venho no nome de Leatrice Smith, dona da maldição!

Abri os olhos, esperando uma grande casa branca enfeitada com fitas e flores brancas. No entanto apenas vi um altar, dois caras e alguns sacos nas mãos de ambos. Um dos caras vestia-se com branco; tinha a roupa branca no corpo todo e até nas botas longas. A mesma máscara que eles usam para não respirar vírus nos hospitais parecia estar viva, com a mesma velocidade da respirao do seu portador. Como ele estava com a boca coberta eu só vi seus olhos, brancos como a roupa dele. Olhavam-me sinistramente, como se quisesse me usar para um ritual satânico. Seu cabelo era preto e curto, bem curto mesmo, quase careca. Na mão, ele tinha um saco plástico verde-azulado, dentro do qual haviam seringas, soro, agulhas e etc.

O outro cara tinha os mesmos 1,70 metros de altura, e usava a mesma roupa de médico. Também tinha a máscara, mas isso era detalhe. Imagine que o segundo era IDÊNTICO ao primeiro, em aparência física. Ainda imagine o segundo como idêntico ao primeiro, mas adicione este detalhe: As cores invertidas. Era assim o segundo médico. Até os olhos eram pretos e vívidos, como um olhar de "Venha para o lado negro". Na mão ele tinha um saco maior, cheio de bolsas de sangue.
Eram diferentes do que eu imaginava - homens vestidos como monges e com facas ensangüentadas na mão; uma tempestade se formando no topo e uma aura azul me envolvendo após eu fazer o corte -, mas eu estava certa sobre uma coisa: o olhar assassino. Tive a impressão de que iam me matar.

Mesmo com medo e meu cérebro gritando "Perigo! Morte certa!" como louco, obriguei-me a chegar mais perto.

– Então, querida - os médicos falaram ao mesmo tempo, com uma voz normal, mas ecoada -, vai ser Herói ou Vilão?

– Herói - falei, esforçando-me a manter a voz firme.

– Ok - disse o médico branco. - Chegue mais perto e ponha a mão com a palma para cima, encima do altar.

Aproximei-me daquele amontoado de pedras que acabava em uma superfície um tanto irregular. Repousei meu braço sobre o altar e esperei. Observei o outro médico de afastar consideravelmente, ficando na beirada e olhando para nós, como se estivesse com inveja.

O médico branco tirou da bolsa uma agulha pequena e enfiou em minha veia, sem nem ver quem era e quem não era veia. Você já tomou injeção? Óbvio, né? Pois se você for um mutante, NÃO ESCALE um monte gigante para tirar sangue. A picada daquela agulha é muito dolorosa, como se alguém pegasse uma faca e enfiasse na sua unha, arrancando-a sem hesitações. Não evitei me retorcer de dor na hora. Ele só tirou uma gota de sangue, mas sentia como se minha essência inteira estivesse sendo brutalmente arrancada de mim. Tive a impressão de que realmente minha vida estava se esvaindo junto àquela gota de sangue.

Quando ele retirou a agulha e afastou delicadamente minha mão, a dor cessou imediatamente, deixando-me um pouco atordoada. Olhava para meu pulso, no ponto onde ele enfiara a agulha. Apesar de focalizar minha vista ao máximo, não conseguir achar a marca. Enquanto tentava reorganizar minha vida ele pingou o sangue no altar e balbuciou:

– Ó, Leatrisse Smith, aquela que nos reservou tal destino tão cruel! Aceite mais um mutante no mundo, como Herói!

Não aconteceu nada. O céu continuou parado, viajando; o sol ainda estava se pondo.

– Ok, já pode ir, mas não olhe para trás - disse o médico branco.

– Só?

– Sim. Achou que fôssemos pegar uma faca e cortar seu pulso te enviando a um ritual?

– Sim!

– Pois estava errada. Agora, tchau. Até nunca mais.

Dando as costas, forcei-me a não olhar para trás. Tenho de admitir que até ali, não olhar para trás fora a coisa mais difícil que eu tivera de fazer.

Ao passo que voltava meu caminho até Fernanda, observei o sol se pondo, sumindo ao horizonte. As cores dançavam em meio a uma festa amarela, vermelha e laranja.

Cheguei até Fernanda. Olhava para cima com uma expressão que dizia "que lindo".

– Vamos para casa? - perguntei.

Ela assentiu com o silêncio.

[...]

Já estava dentro do carro, olhando a paisagem que se formava ao passo que retornava para LL, Parte Dois.

Bem, vou aproveitar para esclarecer uma coisa: Fernanda e eu nascemos no mesmo dia. Sim, tínhamos a mesma idade. Nascemos no mesmo hospital e no mesmo dia 25. A única diferença era o fato dela ter nascido algumas horas antes que eu, o que a deixava mais velha. E foi por essa coincidência que Mariana e Luzia, minha e a mãe de Fernanda, respectivamente, se conheceram. No fundo eu não acreditava nisso. Havia alguma coisa a mais naquela história. Eu não entendia como eu poderia ter nascido no mesmo dia e hospital. Concluí várias outras pessoas nasciam ao mesmo tempo no mundo, nem por isso ficam impressionadas.

– Como se sente? - perguntei à Fernanda, tentando afastar pensamentos.

– Excitada.

– Cara, você é muito pervertida.

Ela olhou para mim como se eu tivesse dado a volta o mundo em um minuto.

– Não NESSE sentido! Estou excitada, feliz! VOCÊ é a doida aqui - falou, rindo.

– Ok, sei.

E seguimos o resto do caminho em silêncio. À propósito, você deve estar se perguntando como nós descemos do monte tão rápido. Simples! Fernanda envolveu-me em uma cápsula de terra e se jogou lá de cima. Não senti nenhum tipo de dor, simplesmente uma sensação de estar caindo e depois havia chegado ao chão.

[...]

A Parte Um era realmente a mais bonita. Estava lotada de carros refletindo holofotes e colorindo ainda mais aquela cidade democrática. As luzes brilhavam em uma dança linda que era perseguida pelos nossos olhos. Pessoas passeavam rindo, com sacolas e/ou crianças. Algumas raras pessoas andavam tentando esconder-se e acabavam passando despercebidas dos olhares atentos à felicidade que emanava daquele lugar.

Ok, parei. O negócio é que... É tão contagiante que... Não DÁ para ir lá triste e voltar triste. Quase impossível.

Quase.

Quando estava chegando em casa, Luzia pediu-me para ir na casa , pois queria tratar de um certo assunto comigo. Eu simplesmente entendi na hora o que aconteceria, por isso não fiquei surpresa ao entrar lá com as luzes apagadas. Assim que mexi no interruptor, mamãe gritou:

– SURPRESAAA!

Com um coral de conhecidos. Eu vi amigos da escola, amigos de mamãe e de Luzia e uns parentes com quem eu não falava havia anos. Não valeria a pena descrever uma festa de confetes, doces, um bolo, presentes e música alta. Durou bastante, das 19h25 às 23h30. Mas apenas acabou, como uma festa normal com início e fim.
Sim, claro, foi divertido e ótimo. Bebemos refrigerantes, comemos coxinhas, pizza e abrimos presentes, que foram apenas um para mim e outro para Fernanda. Eu ganhei uma roupa íntima. Minha mãe me dera. Fernanda, uma lata de energético, ganhou da mãe dela. Nossos amigos foram safados, só viendo para comer e beber. Não trouxeram presentes - bando de fdp.

E só.

Acordei às dez horas da manhã, sentindo uma breve dor de cabeça, com balões pairando no canto do meu quarto. Olhava para uma parede verde-azulada quando abri os olhos.

Levantei-me, fiz minha higiene e fui até a cozinha. Minha mãe estava no banheiro.

– Mãe? - chamei.

– Oi? - a voz saiu com um breve eco.

– A senhora está, an, fazendo o que?

– Estou... An... - ela hesitou um pouco, o que me fez rir loucamente em silêncio - Usando o toalete!

– Sei! - tentei manter a voz firme, mas ainda estava levemente embargada pela risada.

– Ah, do que está rindo, ainda sou metade humana!

Não aguentei-me depois dessa. Minha caixa de risada foi elevada à máxima potência ao passo que eu ria cada vez mais. Quando me controlei, percebi que havia chorado de rir. A sensação de rir é altamente deliciosa e faz você relaxar. Não é a toa que todos gostam de rir.

Minha mãe saiu do banheiro tão silenciosamente que eu só notei isso quando ela apareceu detrás de mim, vestida com uma calça jeans azul bebê e uma camisa vermelha de algodão.

– Vai sair, senhora Sabão? - perguntei, ainda rindo e seguindo ela até a sala.

– Muito engraçado, senhora Falta de Respeito - falou, sem emoção. - Sim, vou sair com Luzia um pouco. É bom que ela e eu possamos sair como "pessoas normais" às vezes.

– Hum, e eu?

– Você pode fazer o que quiser até às 21h00. Desde que não envolva policiais; drogas; festas de arromba, se você me entende; filhos; almôndegas; unicórnios; macacos brasileiros gritando HU3 e etc.

– Desculpe-me, acabou a tinta na metade da lista, pode repetir as últimas quinhentas proibições?

Ela deu uma leve risada; em seguida começou a repetir, mas eu a interrompi dizendo que fora sarcástica.

– Ok, tenho que ir. Os tobogãs me aguardam.

– Tchau, só tome cuidado com Vilões.

– Você também. Vejo você às nove.

Então foi embora.

Dei meia-volta até o sofá maior, onde deitei-me. Estiquei os braços e as pernas para um breve momento relaxante.

– Estou livre - balbuciei.

Então ouvi meu celular tocar. Quando vi, apenas chequei a caixa de mensagens.
– "Marcela, preciso falar c vc, de amigo p/ amigo. Pode vir na Burger Kings às 16h00? John".

Fiquei um pouco irritada com os erros, mas fora isso não evitei ficar nervosa. John fora um grande amigo meu quando estávamos em treino. Ele, então, decidiu estudar na mesma escola que eu, afim de não sair de perto da "melhor amiga" dele. Então fomos conversando, interagindo, conhecendo um ao outro até que, quando percebi, estava afim dele. Eu não sabia se o sentimento era mútuo. Isso passou a me deixar nervosa ao estar junto dele. Eu tentava me controlar, para que ele não me achasse uma louca com problemas mentais, mas eu tinha uma leve impressão de que ele sabia de minha pequena paixão.

Aí ele vem e me convida para lanchar. E ainda afirma que "precisa falar" comigo.

Levantei-me do sofá e andei até a casa de Fernanda. Sinceramente, eu não passava um dia sem ver aquela doida. Ela tinha seus defeitos - que, nossa, eram muitos -, mas isso só me fazia querer estar mais perto dela. Notei que sua personalidade mudou ao longo do tempo. Andava mais tristemente, conversava menos, gostava de passar mais tempo com a mãe ocupada e sempre que possível, saía comigo.

Bati na porta. Ela me cumprimentou com uma cara de "Ah, você de novo. Entre.".

Então entrei. Olhando para a casa dela, concluí que ainda estava como quatro anos antes. A única diferença era a televisão nova. Imagem digital e antena parabólica. A televisão estava ligada no canal de novelas mexicanas, onde passava um episódio de "A feia mais bela". Tinham confeites no chão, pelo fato da festa ter sido na casa dela. Fora isso, tudo o que tinha no chão era o piso branco detalhado de cinza espalhado pela casa. Notei um cheiro de galinha vindo da cozinha dela.

– Você vai, hum, comer galinha? - perguntei, após sentar-me no sofá.

– Vou. Por quê?

– Porque você não é muito fã de galinha.

– Mamãe me falou que isso também estava amaldiçoado - Fernanda falou aquilo tão naturalmente...

– Isso a minha mãe não me falou.

– Sim. Ela disse que uma feiticeira Vilã amaldiçoou as galinhas.

Então gargalhei.

– A merda da Vilã... Amaldiçoou GALINHAS?! - perguntei, a voz embargada por causa da risada.

– Sim - Fernanda tentava manter-se séria.
Demorei uns minutos para me acalmar quando Fernanda comentou:

– Você ri como se estivesse com vergonha.

– Você não ri.

– Vamos mudar de assunto? - ela parecia levemente com raiva.

– Sim. Assistiu o último episódio de AVQAG?

– AV-o quê? - perguntou Fernanda, confusa.

– AVQAG.

– O que é isso?

– A Vilã Que Amaldiçoa Galinhas!

Então gargalhei por mais uma minutos. Nessa hora, Fernanda também cedeu à "zueira". Rimos muito, até que um plantão interrompeu uma discussão na novela.

– E foi anunciado o novo presidente do Brasil. O senhor Emílio...

Fernanda mudou de canal, nervosa, e interrompendo o repórter.

– O que foi? - perguntei, já mais calma.

– Não gosto de política.

Então ela deixou em um canal onde passava o filme "Godzilla". Achei estranho, pois geralmente propagandas políticas de televisão passavam em todos os canais nacionais.

Assisti todos os filmes possíveis antes de dar 15h50 e eu perceber que iria me atrasar.
– Fernanda, tenho que ir!

– Ah, por quê? Eu ia te seduzir!

Dei uma risada.

– Estou com fome. Vejo você depois.

– Tá. À propósito, mamãe disse que a sua mamãe deixou uma quantia de vinte reais encima da televisão de vocês, caso precise.

– Obrigada por falar. Agora tchau.

Então saí.

[...]

Já no ônibus e olhando para a janela, não pude deixar de pensar sobre minha vida. Geralmente o tempo passa rápido e sorrateiro, como se você dormisse criança e acordasse com sessenta anos de idade. Mas isso não fora meu caso. O tempo parecia nunca correr nos últimos quatro anos. Passara lento ao máximo, fazendo-me desfrutar de cada momento bom. A parte ruim era que tinham momentos ruins. E eles também passavam lentos. Meus pensamentos comçaram a aprofundar, ao passo que memorias de quando eu era menor surgiam como flashes. Eu parecia lembrar de tudo o que acontecera na minha vida. Desde que nasci... Até o momento que eu andava, falava, dava minha primeira risada... Tudo parecia vir a minha cabeça naquele momento de reflexão. De onde poderiam ter nascido meus gostos? Quando passei a ter como verde minha cor favorita? A partir de que momento passei a gostar de John?

Quando pensei em John, minha visão foi focalizada na lanchonete ao fundo. De longe olhei a logo da lanchonete, o nome "Burger King" como se fosse o hambúrguer, com dois pães fechando-o.

Então vi que minha vida foi uma farsa. Sempre chamei "Burger Kings", com s, e então vi não tinha "s".

Dei uma risada. Pensava nisso quando desci na parada em frente.

Olhei a lanchonete que brilhava em cores vermelhas, mesmo sendo quatro horas da tarde. Como citado antes, era um grande negócio. Era o mais famoso ponto de encontro das pessoas, mas ela costumava ficar cheia só à noite.
Meus dedos enrolaram-se em torno da nota de vinte reais que minha mãe deixara. Não precisava de tanta grana, as coisas costumavam ser baratas. Eu só... Não reclamei.

Caminhei até a lanchonete, desviando de pessoas andando com celulares nas mãos. Só então notei que não havia trago o MEU celular.

– Ótimo - pensei -, nada de WI-FI.

Entrei. Dentro, havia um cheiro de carne e de noz queimada exalando das paredes (bem, pelo menos eu achava). Cadeiras vermelhas em torno das mesas brancas e com detalhes da logo da lanchonete. Um balcão ao fundo com atendentes entediados. Uma grande coluna branca com comerciais de ofertas sustentava o teto de gesso. Um grande ar-condicionado deixava o local frio e aconchegante.

Sim, eu sempre amava estar aqui.

Olhei para baixo, não deixando de ver minha roupa; uma calça Jeans preta e uma camisa laranja fraco, junto a um sapato azul detalhado de amarelo. Não escolhi minha melhor vestimenta, até porque se escolhesse a melhor, levaria horas.

Eu sabia que ia ser um desconforto andar pelas mesas sem estar segurando nada, então levei minha bolsa verde-oliva, pequena. Dentro estava o dinheiro e só.

Levantei minha cabeça e andei. Vi John sentado em uma cadeira perto da parede. Quando o vi, fiquei nervosa. Ele olhava atentamente para os guardanapos, como se o resto do mundo não fizesse diferença.

GOSTAVA dele. Sabia disso. Mas não sabia que gostava tanto ao ponto de não agir naturalmente perto dele. Quando cheguei mais perto, ele me viu. Esperei qualquer reação que envolvesse cavalheirismo, raiva, amizade, tristeza, ternura...

Mas quando me viu abriu um sorriso de orelha a orelha, ao passo que falou, feliz:

– Marcela! Você veio! Você veio MESMO!


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Notas finais do capítulo

LOL SERÁ QUE NASCE-SE UM SHIPP??!! opiniões, pls :3



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