Um Coringa na festa das Cartas escrita por V M Gonsalez


Capítulo 5
Penas e Cinzas


Notas iniciais do capítulo

Para aqueles que tem um coração de ouro...



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Uma rua cinzenta corria para o infinito céu, tão vazia era de esperanças quando era de um fim. Não havia Sol para iluminar a avenida, aquecer seu asfalto frio de natureza corrompida. Havia apenas cinza, grande oceano cinza. Pessoas cinzentas andavam em suas vidas cinzentas sem parar para pensar no cinza que produziam por serem cinzas.

Havia, porém, alguma matiz naquele oceano cinzento. Penas.

Essas pequenas penas eram reluzentes, macias e graciosas, douradas, azuis, lilases, verdes, laranjas... Todas as cores das almas podiam ser exibidas naquelas singelas penas. Cada pessoa possuía uma pena, que carregava orgulhosamente em seu bolso da frente, as vezes mais escondida, no bolso de trás, algumas verdadeiramente tímidas as traziam trancadas em suas maletas ou bolsas, mas evidentemente todas as pessoas carregavam ao menos uma pena, um pequeno pedaço de cor. Haviam de se orgulhar, pois tais penas eram suas vidas, ou o significado de suas vidas, na verdade tanto faz.

Existia, porém uma garotinha, de longos cabelos cinzentos como todos, porém que carregava, como um anjo, um grande par de asas, tão graciosas e brilhantes naquele mar monocromático que era estranho não chamar atenção da atarefada massa cinzenta. Porém, a garotinha sorria.

Ela trazia nas costas um grande volume de penas, daquelas graciosas e brilhantes, de todas as cores, macias como carícias amorosas de anjos. Ela trazia nas costas tanto amor quanto em seu sorriso inocente. Enquanto andava pela rua cinzenta aos saltitos, observava as pequenas penas das pessoas e se encantava com o brilho e a beleza delas, eram tão reluzentes quanto seus sonhos de dias de Sol. Ela não achava suas próprias penas tão bonitas quanto aquelas, embora não houvesse diferença entre elas na verdade. Mas ela se encantava com aquelas pequenas penas, ah como se encantava.

Ao longe, a garotinha avistou duas pessoas discutindo, eram evidentemente um casal. Uma delas tinha uma cara carrancuda e saiu pisando forte em direção ao vazio, com sua pena a brilhar vermelha; a outra caia no chão em prantos, sua pena lentamente se esvaziava em escalas de cinza cada vez mais escuras. A garota, assustada, correu na direção da chorosa massa cinzenta e rapidamente deu-lhe uma de suas pequenas penas, como forma de tentar ajudar a pobre alma. Seu gesto singelo e sincero funcionou, e de lá a pessoa saiu, saltitante.

Lentamente a garotinha buscou na multidão outras pessoas que tivessem suas penas morrendo e ajudou-as, dando-lhe suas próprias penas. Algumas a enganaram, outras a roubaram, mas ela continuava com um grande sorriso em seu rosto, embora suas costas doessem com as penas arrancadas e em seu coração crescesse um grande choro de dor e tristeza que ela não sabia explicar.

Ela continuava sorrindo.

Quando ela já andava cambaleando, com apenas uma pequena pena dourada que ela carregava abraçada contra o peito, resistindo a tentação de chorar sem motivo. Ela tinha medo do seu redor, sabia que não podia ajudar mais ninguém. Andando se arrastando pelas paredes, porém, ela encontrou uma jovem pessoa, com as faces ainda clareadas quase rosadas, ela chorava desconsoladamente sobre algo que não parecia fazer sentido. O coração da menina se encheu de tristeza diante daquela figura, cuja pena estava rasgada sobre o chão, pulsando de forma cada vez mais lenta. Ela queria poder consolar aquela pessoa, essa era a única vontade de seu coração, então com o braço trêmulo ela entregou a pena para a pequena pessoa, que a agarrou com entusiasmo e saiu correndo.

Enquanto a via correr, a garotinha caiu no chão lentamente, uma grande dor atordoava suas costas e a tristeza mordia seu coração. As pessoas a sua volta a olhavam de forma triste, enquanto observavam suas próprias penas, muitas delas dadas pela própria garotinha. Elas estavam receosas, mas continuaram seu caminho, fingindo indiferença pelo pequeno anjo que morria a seu lado. No fundo de seus corações elas estavam tristes, embora não soubessem bem o porquê. A garotinha olhava em volta, sabia que não viria nenhuma ajuda, ela não esperava por isso; ajudar era sua função, não a de outras pessoas. Ela morria lentamente enquanto suas penas pulsavam nas mãos de outras pessoas, que a viam agora, com uma alegria estranha, morrer. Ela as olhava com uma melancolia sorridente, pois estava feliz que estivesse felizes. Seu corpo foi escurecendo lentamente enquanto a dor de suas costas diminuía.

E quando a morte finalmente a beijou, ela sorria.


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Notas finais do capítulo

...E não pararam de sorrir.



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