A Chuva dos Sete escrita por Lia


Capítulo 4
IV - Família real.


Notas iniciais do capítulo

esse foi um daqueles capítulos que vc escreve ingenuamente e que fica com MUITAS palavras (4k e pouco) e vc tem que dividir T_T



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Laurel e o garoto que invadiu sua casa ficaram se encarando por um bom tempo. Bastante tempo. Quando os olhos dele desviaram de seu rosto para áreas mais baixas, ela juntou seus travesseiros e cobertores para cima do corpo nú, e seu calor pareceu triplicar.

– Seu quarto?! Esse é meu quarto! - Protestou, sentindo suas bochechas ficarem tão quentes que pensou que seu rosto iria explodir. - Vá embora!

– Não vou a lugar nenhum até você sair daqui! - O intruso retrucou sem paciência.

– Sou Laurel. - Ela mal escutou o que acabara de dizer... Sua mente estava em outro planeta, pensando no que àquele cara estava fazendo em sua casa, se ele havia usado tudo que era dela e se ele fosse um sequestrador nato.

Desviou os olhos de novo, agora subindo para as fotos. Procurou o rosto do desconhecido no meio da multidão, mas não achou. Voltou a encará-lo, exatamente como fez na floresta dos eucaliptos, tentando desvendar os diversos mistérios que ele escondia por detrás daquele cabelo incrivelmente negro, olhos castanhos que lhe dirigiam um olhar brincalhão, apesar da situação. Alto e magro. Sua boca se fechava em um completo sorriso debochado, enquanto seus braços caíram até se apoiarem no vão da porta. Apenas um passo e ele entraria sem pedir licença no único lugar de conforto de Laurel.

– Nick. - Acenou com a cabeça e procurou alguma fresta entre o corpo de Laurel e o cobertor, felizmente, eles estavam unidos como um só. - Pode sair agora?

– Não vou sair da minha casa! Você é o intruso!

– Eu?! O intruso?! - Nick realmente ficou ofendido, ao ponto de caminhar até o lado da cômoda dela e apanhar sua camiseta do chão, lançando na direção de seu rosto.

– Tenho essa casa a muito tempo. Deve ser por isso que minhas fotos estão coladas na parede. - Tinha que sair dessa de um jeito ou de outro. Acabou vestindo a roupa e se levantando, já suada. Caminhou até a porta e apontou para a parede. Nick seguiu sua indicação.

– Droga. Errei de casa de novo? Não é possível!

Ainda resmungando em voz baixa, o garoto caminhou até o armário feminino o tirou um casaco largo, jogando sobre seus ombros e dando uma piscadela para Laurel antes de sair. Deveria ter se lembrado de perguntar qual o parentesco que tinha com Nick, já que aparecia nas diversas fotos distribuídas por sua parede. Ainda sem digerir tudo, ela engoliu seco e balançou a cabeça negativamente, tentando apagar tudo que acontecera desde que chegou em casa. Era uma regra nova: sempre tranque tudo antes de sair.

Caiu no sono sem nem perceber, era uma volta a vida antiga e tanto.

– ❖ -

Acordou em um só pulo, tanto pelos gritos e risadas vindas do lado de fora, quanto pelas batidas fortes em sua porta. Abriu-a com um estrondo, sem nem mesmo tomar cuidado para ver se ia ou não acertar quem estava batendo. Teve tempo apenas para coçar o olho, bocejar e tentar focar sua visão em algo que não seja milhares de desconhecidos andando para lá e cá.

– Você tava dormindo? - A voz conhecida perguntou. Lara estava em cima dos ombros de Chace, que encarava Laurel da cabeça aos pés.

Isaac e Serena viam logo atrás, algo dizia que suas roupas foram obrigações de outras pessoas, pois um estava com terno e a outra com um vestido longo que ia até a grama, roçando na barra. Ela levava uma tulipa azul no cabelo e ele uma no pescoço.

– Talvez... - Conseguiu responder, seguido de outro bocejo, induzindo todos os outros a bocejarem também.

– Por que estava dormindo até agora? Lau, todos já estão indo para Sunshine! - Lara protestou, dando um peteleco fraco na lateral do pescoço de Chace, que sorriu com uma careta.

Por algum motivo, esse apelido ainda a perturbava, deixando-a mais desconfortável que o normal. Certos dias ela acordava como pensamento em outro mundo, principalmente por pensar que aquela não era ela. Lembrava-se de seu nome e sua idade, pais e familiares, mas lembranças do Bosque ou quando chegou no Vilarejo Sunshine não passam de borrões que transformam sua mente uma cidade repleta de névoa e memórias-fantasmas. Laurel fechou a porta na frente de todos e marchou para seu banheiro, decidindo tomar um banho relaxante antes de partir com todos. Ficou bastante tempo ali, parada, tentando colocar sua vida em ordem. Pensou em Nick. Pensou em Lara. Pensou em Alex. Pensou em Chace. Julieta West. Recado da Rainha. Ansiedade. Era uma mistura de tudo, e se ela pudesse, ficaria em baixo daquela água morna a vida inteira. Infelizmente puxou o último fio de coragem que restava e foi para seu quarto, mudou de roupa, colocou o cinto e subiu em sua cama de novo, analisando as fotos com mais confusão ainda. Sem ter noção de seus atos, colocou a mão sobre os papeis e arrastou suas unhas por tudo, até sentir o suor voltando pelo canto de seu rosto e seu pescoço. As fotos estava por cima de sua cama inteira, tampando seu sapato. Quando tomou um tempo para respirar, analisou o resultado. A ponta de seus dedos estavam vermelhas e ardiam por culpa da força que usou, parte das fotos estavam rasgadas e outras intáctas. Uma ideia repentina tomou conta dela novamente, e uma por uma foi separando aquilo que acabara de destruir, procurando achar as pessoas que mais apareciam, quando feito, colocou no bolso e partiu para fora.

Admirou a paciência que seus amigos estavam, pois todos ainda se encontravam aonde ela tinha deixado. O alvoroço aumentou, alados tomavam conta do azul do céu, com suas asas belíssimas eles partiam na direção indicada. Lara estava no meio de vários, suas pequenas asas eram proporcionais ao seu corpo minúsculo, ficando a alguns metros abaixo dos outros. Isaac e Serena conduziram a dupla para perto de um lago, que, segundo eles, era a única ligação que as sereias e os tritões tinham para chegar em Sunshine, sem ser andando. Contaram também que eram um dos únicos que conseguiam andar livremente na terra, diferente das sereias que Laurel viu no restaurante em que foi, elas tinham um tempo limitado para ficar fora da água.

Finalmente ela teria sua amostra grátis de uma transformação. Serena foi a primeira a pular, juntou seus dois palmos por cima da cabeça e respingou água em Chace, por estar perto demais. As suas roupas se desintegraram em um pó dourado, sua cauda surgiu logo em seguida, prateada; as escamas brilhavam lá em baixo, do mesmo jeito que os olhos dela tomaram três colorações: azul, amarelo e roxo, alteravam a ordem a cada vez em que Serena piscava. Em seguida, foi a vez de Isaac. Laurel deu dois passos para trás, puxando Chace para que não se molhasse de novo, enquanto ele secava o rosto e o cheiro de cachorro molhado permanecia, incomodando as narinas de sua amiga.

Nem tão diferente de sua irmã, suas roupas foram desintegradas no mesmo tom, pela água estar agitada não deu para notar. Sua estrutura era maior da sereia, cauda mais ágil e de cor diferente: um cinza predominante, sem brilho. O corpo definido de Isaac deixou Laurel encantada, e seu rosto normal passou para algo incrivelmente angelical, seu cabelo flutuava por cima de seu rosto e ele sorria. Talvez esse fosse o efeito que as sereias e tritões causavam em marinheiros ou donzelas no passado, sem nem mesmo perceber, ela já estava a dois passos de cair no lago, seus olhos brilhando e quase babando. Chace não estava tão diferente, sua atenção era toda depositada em Serena, brotando o mesmo efeito. Quando os gêmeos notaram o efeito, viraram para o lado contrário da dupla e dispararam para o fundo, sumindo de suas vistas.

– O que acabou de acontecer? - perguntou o garoto, puxando a atenção de Laurel para si.

– Não... Eu não faço ideia... - prestes a cair no lago, recuou, colocando os suspiros apaixonados para seu devido lugar.
Ficaram se encarando por um tempo determinado, até que uma trupe de elfos atrapalhou a conexão dos dois com seus gritos de guerra, enquanto corriam e riam. Os amigos os seguiram sem pestanejar.

O caminho para Sunshine não era algo simples, e sim cansativo. Não era extremamente longe, mas também não era perto. Quando Laurel decidiu reclamar da distância, sentiu braços fortes a enlaçando pela cintura e tirando seu apoio mais amado e venerado... O chão. Seu corpo inteiro flutuava na medida que ela voava com um desconhecido, teve tempo de olhar para o lado e conseguir ter a visão de Chace também sendo carregado, e seu pavor era maior do que o dela.

– Vamos chegar mais rápido assim. - o suspiro de Nick ao seu ouvido tranquilizou todo o corpo de Laurel, pelo menos assim ela sabia que não estava sendo sequestrada. Ou estava?

– Você é louco?! Poderia ter avisado! - Rangeu os dentes de desejou ser solta, porém não naquela altura.

Ergueu os olhos para cima, vendo enormes asas negras batendo para cima e para baixo, seu pânico aumentou. Ele tinha o queixo com um curativo e a bochecha esquerda com outro, seu lábio carregava um corte fino e quase cicatrizado, três coisas que ela não notou na noite passada. Desejou saber o por que de suas asas serem pretas e as dos outros serem brancas. A menina que carregava Chace era exatamente igual à Nick, tirando o fato de seus cabelos serem de um roxo vivo, o resto era exatamente igual, até no modo de se vestir.

– Você sabe por onde vamos passar? - Decidiu quebrar o silêncio, esperando uma resposta do alado.

No instante em que Nick ia abrir sua boca para falar, ele a soltou tão rápido que mal pôde processar. Laurel despencou em frações de segundos, soltando um grito tão alto que teria chamado a atenção de todas as criaturas, se não fosse alto o suficiente. O culpado soltou uma risada e parou de bater as asas, caindo mais rápido em sua direção do que qualquer um pudesse imaginar. Faltando metros para chegar no chão, ele a agarrou de novo, desta vez pelas axilas. Subiu tão rápido quanto desceu, rápido o suficiente para os ouvidos dela fazerem um estalo grande e ficar surda por milésimos de segundos.

– Sairemos do bosque daqui a alguns minutos. Passaremos por cima da Ponte de Transição, que é por onde as sereias vão, chegaremos até o Arco de Sunshine e pronto. Como não sabe disso? - ele soltou um suspiro desapontado e continuou a bater suas asas. - Você mora aqui a muito tempo, deveria saber disso.

E sua mente voltou a girar de novo. Voltou ao seu posto de detetive forçadamente, começou a ligar os pontos. A pergunta que mais martelava sua cabeça era: ele entrou em sua casa por coincidência mesmo?

Ainda calada resolveu guardar tudo. De novo. Conforme Nick ia dizendo, ela estava identificando. De cima era tudo mais bonito, até mesmo aquela construção confusa do restaurante. As pessoas pareciam formigas andando de um lado para o outro, e enquanto observava tudo isso, o tempo passou mais rápido do que imaginara. Em segundos, eles já estavam no rio. Era uma ponte de madeira curva, trabalhada com desenhos e marcas élficas por toda sua estrutura, pois era uma obra dos próprios elfos. Não era tão larga, porém era forte o suficiente para sustentar todos os vilarejos juntos. Ele passou sobrevoando sobre todos sem nem mesmo olhar para baixo. Quando a ponte terminou, acelerou ainda mais.

A Ponte de Sunshine veio logo em seguida. Era totalmente diferente da Ponte de Transição, principalmente por ser feita de mármore branco. Não tinha torres e nem pilastras, apenas um lugar para se apoiar, da altura da cintura de Laurel; era suspensa por culpa do enorme lago que prosseguia com o ritmo de sempre, vinhas pareciam abraçar a divisória da ponte, a cada dois metros era levantado uma estátua pequena de uma criatura mística que vivia no Bosque dos Eucaliptos, de sereia à fada, de tritão até lobos... Todos ali, representados com esculturas do tamanho de um braço de um homem. A ponte era larga o suficiente para seis trolls ficarem enfileirados, um ao lado do outro, a população do bosque passou sem problemas, só não ficaram um ao lado do outro por questões de espaço.

Todos já estavam em Exac Gyl a bastante tempo, um aglomerado de humanos que Laurel não podia acreditar. O centro de Sunshine era aonde o comércio predominava, barracas de comida formavam um círculo mal feito ao redor da população, lojas de madeira e um riacho cercado de peixes rosados eram os pontos principais. O lago que Serena e Isaac apareceram era na direção oposta que todos estavam virados. Um tablado de madeira estava no centro, grande o suficiente para toda a família real. Quando eles chegaram, o evento tinha acabado de começar. Nick pousou em cima do piso de pedras em forma de paralelepípedo com maestria, soltando Laurel e voltando com suas asas para suas costas. Tirou a jaqueta de couro da cintura e a jogou por cima dos ombros, sumindo na multidão sem dizer nada. A menina desconhecida que levava Chace pousou logo em seguida, seguindo o encalço de Nick.

– Vamos, você não vai conseguir ver nada aqui atrás. - Seu amigo seu um sorriso sincero e a puxou pelo pulso, perfurando o aglomerado de pessoas. Só parou de andar quando ambos já estavam em frente ao tablado.

A rainha Boodlaire parecia mais perfeita de perto do que nos jornais lorcais que chegavam no Bosque. Seu rosto era como um desenho feito por um profissional, seu nariz empinado dava um ar de superioridade, enquanto seu cabelo loiro estava preso por completo no topo de sua cabeça, e perto de sua testa estava sua coroa de rainha. Seu vestido era totalmente branco e sem decote algum, apenas um colar de ouro que descia pelo seu pescoço; os braços nus eram angelicais, como asas saindo de seus ombros, seus olhos furtivos transbordavam calma e harmonia, enquanto um sorriso de mãe tranquilizava todos os agitados. Ela era uma rainha de alma e corpo. Sua família estava logo ao seu lado, tão belos como ela. Prince, seu marido, ajudava a comandar Sunshine, suas duas filhas puxaram todas as características que ele tinha. A família carregava caninos pontudos e olhos vermelhos vibrantes. Menos o da Rainha. Diziam que ela tomava uma bebida para ficar no tom azul, não querendo assustar sua população, outros diziam que ela não era vampira de verdade.

A história de Ophelia estava ofuscada por conta do recado de Souzie. Suas filhas estavam inquietas, não tiravam as Ophecx da cabeça. Clarie, a mais nova - com a idade semelhante à de Laurel, porém com uma aparência desigual - da família, era uma menina que mesclava com Prince e Souzie. Seu rosto angelical e nariz empinado, recusava-se a usar vestidos, quase sempre sendo pega com jaquetas pretas e sapatos vermelhos, como seu cabelo. Sempre que sorria suas presas saltavam para fora, enquanto seus olhos cor de sangue disparavam uma sensação travessa para qualquer pessoa que encarasse; nesta cerimônia estava usando calças largas e uma camiseta vermelha, seus ombros cobertos por uma jaqueta preta. Olhos carregados com brincadeiras ainda não finalizadas. Clarie era uma versão oposta de sua irmã, Anneliese. Sempre concentrada no trabalho, usava vestido igual ao de sua mãe, porém de uma cor mais escura. Suas presas permaneciam trancafiadas dentro de sua boca, seus olhos alegres e um sorriso de escanteio.

Definitivamente era uma família invejável.


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