A Chuva dos Sete escrita por Lia


Capítulo 14
XIV - Irmãs de sangue.


Notas iniciais do capítulo

fiquei b a s t a n t e tempo sem postar, mas agora estou aqui, firme e forte



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Fazia dias que estava sendo bombardeada por perguntas que nunca teriam uma resposta fixa. O fato dela desaparecer antes da apresentação dos ilusionistas não quer dizer que a envolveu em qualquer decisão. Clarie sentia-se sufocada com todo aquele alvoroço que seus pais faziam por cima de suas custas, havia dias em que ela apenas queria desligar-se do mundo em que vivia e ficar trancada em seus aposentos reais até suas criadas irem embora por vontade própria. Seu pai começou a passar mais tempo em seu escritório e menos tempo com ela, teve certeza absoluta que algo estava errado e pensou na primeira hipótese que veio em sua cabeça: rebeldes. Seus ataques estavam ficando mais recentes em relação ao castelo, tanto para roubarem o poder da família Boodlaire, quanto para assumir e ter posse do corpo e mente das princesas. Ela não tinha medo de nenhum dos lados - sul e leste -, achava que perdiam o tempo tentando invadir Sunshine. Até hoje.

Estava sentada em sua poltrona fazia dias, não saía do quarto para nenhuma aventura ou brincadeira que mal gosto desde que deixou o evento de seus pais. Sua criada, Li, vivia tentando encorajá-la a sair daquela bagunça infernal que seu quarto se encontrava, parte de seus pedidos era para ela conseguir fazer seu trabalho com perfeição, outra parte era por pena. Ouviu duas batidas rápidas em sua porta, sem nem se tocar, já sabia de quem se tratava.

– Entre.

– Vossa Alteza... - Quebrando o silêncio, gaguejou. Sua astúcia e coragem diminuíram bastante desde que Clarie permaneceu jogada sobre o assento incrivelmente chique e com tantos números em seu preço que assustaria qualquer um. - Como a senhorita se sente hoje? Pronta para seu compromisso? Que tom de vestido você acha apropriado?

– Tom de morte. - Respondeu, fria e sem sentimentos. Lançando sua cabeça para trás e simulando seu dedo como uma lâmina, passando por toda a região de seu pescoço.

Li era uma criada excepcional. Seu cabelo negro como um corvo sempre estava preso de um modo diferente, o que deixava a princesa impressionada, já que sua criatividade era além dos limites da gravidade; hoje era um coque feito de tranças, o modo em que ela enrolou os filhos uns aos outros e os uniu para ficar dentro de sua touca era incrível, ou como seu uniforme estava sempre alinhado em seu corpo, deixando a curva de sua cintura destacada. Os olhos eram enormes, castanhos e incrivelmente claros, como se chamas crepitassem em suas íris e dançassem dentro de sua gentileza. Os lábios sempre vermelhos pela quantidade de mordidas que ela dava nos momentos de nervos, os dedos finos e delicados, tão lisos quanto pele de bebê. O canto esquerdo de sua boca era carimbado por uma marca preta bem pequena, uma pinta. Sempre teve um carinho incrível pela Princesa Clarie, principalmente por estar com ela desde seu nascimento.

– Bom, creio que este tom está excluso do estoque. - e sorriu, entrelaçando suas mãos e fechando a porta atrás de si, tateando seu uniforme como se algo estivesse errado, o que nunca estava. - Você tem visitas, princesa. E tem o compromisso.

– A princesa se encontra ausente, volte quando ela estiver disposta. Deixe seu recado após o bip. Bip.

– É para eu ir embora mesmo...? - Relutante e sem entender nada do que ela dizia, coçou seus próprios braços, totalmente confusa.

– Não, Li. Pode ficar. Só não sei o que fazer.

– Bem, a senhorita tem visita de Daryl. Sua mãe está te esperando no jardim e seu pai pediu para avisar que receberá um presente de sua avó hoje a noite, aliás, ela está vindo para cá! - Seu entusiasmo foi a chave de ouro para Clarie decidir querer morrer, literalmente. A criada caminhou com saltito na direção da princesa e tocou seu ombro, erguendo seu queixo com o indicador. - Creio que tenho permissão para lhe tocar quando precisa de um apoio, correto?

– Você disse que quem veio me visitar?

Ignorou a pergunta de Li, sentindo um ânsia de vômito subindo até sua garganta. Era como uma série de socos em seu estômago, prontos para derrubá-la de seu momento infeliz. Não estava pronta para ir ao jardim, falar com ele e muito menos receber sua avó paterna. Porém, a princesa de Sunshine era o tipo de garota que não poderia ser derrubada tão facilmente.

– Daryl, Alteza. - Ela caminhou até a mesa de mármore e madeira polida da vampira, recolhendo os esboços e papéis importantes furtados do escritório de seu pai. Parou para analisar os desenhos feito por ela, admirada e encantada com seu talento.

Recolheu o último pingo de vontade que tinha dentro de seu corpo, batendo os pés no piso e erguendo seu corpo pálido para cima, tentando dar o sorriso mais confiante que conseguia. Estava prestes a fazer uma loucura, que causaria murmúrios em toda a população.

– Lizinha, preciso de um vestido e um penteado maneiro. Você consegue? - Perguntou, apesar de já ter certeza da resposta que receberia, ela era uma estilista sem diploma ou reconhecimento.

– E-espera... A senhorita vai querer usar um vestido?

– Sua surpresa não me surpreende. - Conseguiu sorrir, arrancando risadas amenas da criada. - Não se acostume muito, vai ser pela primeira e última vez. Tem algo preto?

– Sim! Sim! Tem! - Um ânimo incrível percorreu toda a estrutura da mulher, fazendo seu sorriso ampliar de tamanho - Eu fiz ontem! Quando estava sem serviços e havia terminado tudo, fiz um vestido na intenção de mostrar para ti, mas não usa, então deixei em seu closet!

– Espera, no seu tempo livre você faz... Vestidos?

– Bem, minha família não tem muito dinheiro, e tudo que recebo aqui é enviado pra eles... A senhorita quer que eu pare? Eu paro!

– Não! Tudo bem! - Clarie se arrependeu novamente, querendo puxá-la para um abraço apertado.

Deu um sorriso largo e voltou a tatear o uniforme impecável, sempre querendo ficar da melhor maneira. Li estufou o busto e caminhou rapidamente para a multidão de roupas que a princesa tinha em seu armário e nem se dava conta. Era separado em duas partes por uma tábua de madeira da mesma cor de todo seu quarto. Uma parte estava incrivelmente desarrumada, que era aonde ela usava suas roupas típicas: calças, camisetas sem manga e jaquetas de couro. A segunda parte é seus vestidos feitos semanalmente e nunca usados. A criada tamborilou seus dedos pelo oceano de moda e retirou o que ela havia feito no dia passado, erguendo-o para a adolescente em crise, que não demorou muito em seu banho diário, pela ansiedade de vesti-lo, porém irritada pela decisão que estava prestes a tomar. Seus sentimentos eram confusos e complexos, quase sempre acompanhados de coceiras nos pulsos por culpa de uma mania da infância.

Quando seu corpo entrou no vestido tudo ficou claro. Era como uma lembrança que nunca havia passado por sua cabeça. Um vestido que já deveria ter sido usado a muitos anos. Sua cintura larga encaixava como uma luva naquelas curvas, suas pernas estavam totalmente cobertas e seus ombros nus, a alça caindo pelos seus braços, deixando o contraste preto exalar a cor branca que sua pele portava. Foi enfeitada com diversas jóias e seus olhos carregados por uma maquiagem feita com profissionalidade. Caminhou até o espelho e quase saltou de susto. Ela estava impecável. Estava como sua mãe sempre quis. Ela estava como uma princesa.

– Mas... Quê?

– Senhorita... Daryl está a sua espera, logo ao sair daqui vai dar de encontro com ele!

A animação da criada a espantava mais do que estar de vestido. Seu cabelo estava arrumado em um penteado perfeitamente alto, como para mostrar superioridade e uma princesa madura. Teve de respirar fundo várias vezes e tomar a posse de uma garota que algum dia governaria o Vilarejo Sunshine sem nenhuma ajuda familiar. Abriu a porta de supetão e dispensou a serva, que tateou sua mesa na procura de novos desenhos espalhados pela princesa, uma arte incrivelmente linda, mas não recebia a atenção que necessitava. Como o dito, o garoto estava parado do lado de fora, com as mãos afundadas no bolso e o cabelo totalmente desarrumado, um charme que ele dotava ser bom, os olhos castanhos procuravam qualquer vestígio da vampira, enquanto seu rosto sujo de fuligem deixava claro de que ele se metera em outras brigas, o nariz reto e incomum; seu peitoral estava amostra pela camiseta que um dia fora branca, suada e grudada em seu corpo, seus músculos avantajados por culpa do treinamento brusco que sua família o forçava a ter. O cinto repleto de armas de fogo, proibidas em qualquer parte do palácio. Sem dúvidas, Daryl estava lá do modo mais clandestino possível. Com certeza Li seria punida por isto se descoberta.

– O... O que...? – Ele tentou dizer algo, mas sua dúvida e medo eram maiores.

– O que foi? Nunca viu uma garota de vestido? – Respondeu, tomando proveito da situação. Sua criada saiu de supetão do quarto, sem nem chamar atenção.

– Já, mas não acho que você se encaixe no perfil. Quer dizer... – Tomou um tempo para escolher as palavras com cautela. Conversar com Clarie era como andar em minas explosivas. – Você está... Deuses! Você está linda!

– Eu sei. Tem mais algo a dizer?

– Quer... Dar uma caminhada?

– Não.

– Estou falando sério, Clarie.

– Eu também.

– Aonde você quer ir?

– No jardim.

Era como uma briga entre gato e rato, mas bons amigos nunca deixam de ser bons amigos. Passaram pelos corredores enormes e com tapetes avermelhados, paredes com enfeites e pinturas feitas por elfos e também pela princesa caçula em sua infância. Ao chegar no hall de entrada, uma porta repleta de vidro deixava o jardim amostra, como uma passagem transparente para o paraíso. Uma grama esverdeada e tão bem cuidada que dava dor nos olhos, com uma fonte de água cristalina e uma escultura de um anjo, curvando-se para as flores. Uma estrutura de mármore era erguida no canto superior direito do recinto, como uma cabana sem portas, janelas e paredes, apenas algumas pilastras de um teto em forma de cone, foi projetada para suspender o piano real do rei Prince. Um jardim de diversos tipos de flores amontoava um espaço específico, dando cor e vida; cadeiras de madeira e bancos eram distribuídos em diversas partes para o conforto da família real e seus convidados. De certa, era o lugar em que a princesa mais detestava em todo seu castelo.

– Um belo lugar, não? – O adolescente quebrou o silêncio, passando o braço ao redor dos ombros gélidos da menina. Seus olhos se encontraram por segundos.

– Depende do ponto de vista. – Respondeu, criando uma avalanche de dúvidas dentro do humano.

– Clarie! Clarie? Oi? - Novamente, o espanto pelo vestido voltou. - Espera... Clarie?!

Anneliese permanecia com sua elegância de sempre. Seu rosto era incrivelmente nivelado com seu busto, o cabelo solto em ondas que desciam até seus ombros, olhos e lábios em um tom vermelho vivo. O vestido que estava usando aquela tarde deixava todo seu corpo em uma incrível sintonia com a natureza, de uma cor leve e enfeites dourados, sem nenhum enfeite no cabelo, tirando a coroa. Ela encarava o amigo de sua irmã mais nova com uma expressão confusa, mas preferiu não manter contato.

– Estava precisando justamente de você! – Infiltrou seus palmos cobertos com luvas brancas entre o casal enquanto falava, puxando a princesa pelos ombros e a distanciando do garoto. – Longe de pessoas como ele. É importante.

– Pede para aqueles seus amiguinhos, não estou disposta.

Com a raiva transbordando os olhos, a vampira desvencilhou-se dos palmos da mais velha e recuou alguns passos, fazendo seu belo vestido flutuar no ar quente que o Vilarejo Sunshine banhava seus camponeses. Sem pensar duas vezes, tomou posse novamente da garota, firmando seus palmos com uma força extrema contra seu pulso até sentir o estalo de seus ossos internos. De supetão, iniciou uma corrida de velocidade extrema de volta para o castelo, perdendo o controle de sua paciência a cada passo.

– Felizmente, irmã, ninguém fala não para mim.


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