O inferno de Jill escrita por BlueDaze


Capítulo 2
Capítulo I


Notas iniciais do capítulo

E finalmente eu consegui postar esse capítulo. Aleluia, senhor!

Eu queria ter postado ontem, mas o sono me venceu, não consegui, não deu.
A universidade não perdoa na hora de pisar na nossa alma, fruta que caiu @.@
Mas enfim, espero que curtam esse capítulo curtinho ;3

Nos vemos nas notas finais!

Música que me inspirou: youtu.be/LdpmOwGO-TY



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“Eu não preciso da promessa do paraíso.

Mas da promessa de me ver livre desse inferno.”

“O que você fez comigo?!” Eu engasgava e gritava, acuada e nua no chão, enquanto ele me observava, impassível. Meu cabelo estava caindo e caindo e caindo, e os fios que ficavam em minha cabeça eram pálidos e quebradiços, mortos apenas. Em meus dedos, cabelos loiros com um pouco de vermelho existiam. Demorou para perceber que não eram os fios que estavam em queda.

Era eu que os estava arrancando.

***

Jill desviou o olhar, derrotada, de seu reflexo no espelho.

Aquele reflexo estranho, com o cabelo castanho emaranhado na ponta. Um castanho falso, com a raiz loira crescente bem visível para lhe confirmar isso.

E ela finalmente desistiu. Não importava mais.

Ela apenas ligou a torneira ao máximo, mandando o pote com tinta para baixo da água. Ela observou o plástico transbordar em uma mistura estranha, enquanto apertava o mármore fortemente, dizendo que aquilo era besteira, pensando que não deveria surtar com algo tão pequeno.

Mas não era nem um pouco sem importância para ela.

Não importava o quanto ela tentasse tingir seu cabelo de volta para a cor com que cresceu acostumada... Nada voltava atrás. Aquilo era só um estranho lembrete de que o tempo havia passado, de tudo o que havia passado, e nada do que fizesse mudaria as coisas.

Ela sabia que ainda estava cedo, mas... Ainda parecia tão difícil.

Ela era uma mulher forte, mas existiam momentos em que tudo parecia prestes a se estraçalhar dentro de si, e ela tinha que se segurar.

Ela simplesmente se sentia uma adolescente tentando lidar com todas as mudanças de seu corpo. Mas quem dera que a situação fosse um simples caso de amadurecimento na puberdade.

Com a água começando a encher o fundo da pia, Jill fechou a torneira, fazendo um coque em seu cabelo e uma nota mental para comprar um descolorante no dia seguinte.

Quanto mais cedo aceitasse os traços de sua realidade, melhor ela se sentiria.

Ela abriu a porta do banheiro, dando de cara com um Chris que entrava sorrateiramente pela sala de estar, com várias sacolas do supermercado próximo em mãos.

Ele sorriu para ela.

Desde que haviam voltado da África, o relacionamento deles havia ficado estranho. Indefinido. Eles não se encontravam muito, devido ao fato de ele viver viajando, enquanto ela ainda se recuperava de tudo. Era uma situação nova e inusitada em que tanto um quanto o outro estavam tentando se adaptar. Foram três anos distantes, três longos anos de dúvidas e angústia. E agora que tudo parecia ter acabado, eles ainda não sabiam muito bem como agir um com o outro. Voltar ao que eram antes, do mesmo jeito que agiam, com a mesma intimidade, parecia ser algo bem distante naquele momento. No entanto, apesar de toda aquela situação incômoda, uma coisa que não havia mudado em nenhum momento era o quanto um se preocupava com o outro. E ela sabia, mesmo que a realidade fosse algo com o que ainda estava se acostumando, ainda que fosse algo incômodo e quase que intragável, poderia contar com ele para qualquer coisa. E o resto o tempo resolveria. O tempo sempre foi o melhor remédio para todos os males.

Ela o observou abandonar as sacolas em cima do sofá, enquanto abria as cortinas da casa, revelando um céu alaranjado, prestes a escurecer completamente.

“Ainda bem que não preciso dizer para você se sentir em casa.” Falou, sorrindo, enquanto fechava a porta atrás de si, e sentia o vento atingir seu rosto quando Chris abriu a janela.

Ele soltou uma risada pelo nariz.

“Achei que fosse querer companhia.” Ele olhou para o seu rosto, e para seu cabelo mal tingido. Ela se sentiu um pouco estúpida naquele momento, mas ele nem ligou, se voltando para a janela, e depois para Jill, sério, enquanto ela se aproximava. “E então, como você está? Não é muito solitário ficar aqui sem ninguém?”

“Ah, não. Não, eu estou bem, me virando sozinha, sabe?” Ela tentou olhar para ele, mas desviou os olhos para a parede logo em seguida. “Mas é bom ter companhia de vez em quando.”

“Que bom. Porque essa noite, vai ser só você e eu e uma madrugada inteira sem dormir.”

Jill arqueou as sobrancelhas loiras.

“Assistindo filmes, é claro.”

Ela riu.

“Bobo. Eu nem sabia que estava na cidade. Pensei que estivesse em serviço.”

“Eu acabei ficando livre mais cedo. Achei que seria uma boa passar um tempo por aqui.”

“Sempre sabendo o que fazer, Redfield. Agora não se mexa, fique aí enquanto eu coloco a pipoca no micro-ondas.”

Jill se sentiu bem enquanto se abaixava para pegar o pacote de milho que estava no armário. De vez em quando, ela não sabia o porquê de não conseguir olhar Chris nos olhos, quando o encontrava. Mas naquela agradável visita surpresa, ela percebeu que se sentia feliz ao ver que cada vez mais estava conseguindo se sentir mais confortável com ele, novamente.

E eles se sentaram no sofá, afundando no estofado, enquanto se entupiam de cerveja e salgadinhos nada saudáveis, assistindo a filmes aleatórios que Chris havia surrupiado sem querer de Claire, quando ela o visitou da última vez.

Já era de madrugada quando os olhos de Jill começaram a pesar. Ela estava totalmente encostada em Chris, com o rosto em seu ombro – Ela nem percebeu quando se aproximou tanto assim – até que se sentiu adormecer lentamente, aconchegada pelo calor dele.

***

Estava tudo tão branco. Tão, tão branco.

Eu senti o gosto amargo e horrível e asqueroso daquele líquido estranho em minha boca, enquanto lembrava de onde eu estava.

Bastava apenas um dois três quatro cinco seis sete piscares de olhos para eu recordar. De tudo.

Eu estava no vigésimo primeiro piscar.

Qual ia ser a brincadeira de agora?

Estava com muito sono para pensar.

E jogada no chão, tossindo química, como se meus pulmões estivessem cheios de líquido, eu sentia o olhar deles sobre mim.

Dela, principalmente, a estranha mulher de olhos verdes.

Eu nunca sabia o que esperar dela.

Se eu era um brinquedo para Wesker, para aquela mulher horrível eu era menos que lixo.

Mas eu não ligava.

Eu deveria ligar?

Eu só não queria voltar para aquela cápsula, aquela prisão líquida, nunca mais.

Eu era tão burra. Porque ainda estava pensando nisso?

Porque eu apenas não aceitava aquilo?

Eu senti aquele aparelho horrível incomodar meu peito novamente.

Incômodo.

Incômodo.

Já estava ficando vazio...

Eu não devia pensar muito.

Eu não sabia como deveria agir naquele momento.

Ah...

Toda essa angústia é uma grande bobagem.

*

*

*

Eu senti seus dedos tocarem minha pele, o calor incômodo de sua epiderme contra a minha, minha garganta se fechando com aquele gesto.

E os olhos, meus olhos, fixos nos dele através do espelho.

Os meus olhos, os meus olhos.

Aqueles eram os meus olhos? Eu não entendia. Não pareciam ser aqueles com o que nasci. Eles pareciam admirar aquele homem com um vigor eu já havia abandonado há muito tempo.

Eu já havia tido esse vigor em algum tempo?

Meu corpo, aquele ainda era o meu corpo.

Meus sentimentos, minhas emoções, meus pensamentos, ainda intactos.

Será que ainda estavam?

Eu senti seu hálito em minha orelha, hálito quente e de perfume desconhecido.

Eu senti aqueles olhos estranhos dele, modificados, inumanos, assustadores, terríveis, se fixarem em meu peito nu, o líquido vermelho borbulhando para dentro de mim, eu sentia, sempre sentia aquilo escorrer para dentro de mim. A dor já era suportável, quase passível de se ignorar, mas eu repugnava aquilo com todas as forças que ainda tinha. Existiam momentos que ela me fazia esquecer quem eu sou.

Mas então minhas memórias voltavam, claras e indubitáveis.

Elas iam e voltavam várias vezes no mesmo dia.

Eu odiava tanto, tanto aquilo.

Principalmente por sentir minha consciência vazar lentamente para um abismo bem distante de mim.

Fumaça presa em minhas mãos.

“Jill” Ele me chamava.

Aquele ainda era o meu nome. A única coisa de que eu não tinha dúvida.

Mas que Jill eu era?

Que Jill eu era?

“Mate-o” Aquilo era como mel escorrendo para dentro de meus ouvidos, doce e doce e doce e doce.

E meus músculos simplesmente obedeciam, era o certo, era o inevitável, era a única coisa que não poderia ser desfeita, as ordens dele, as vontades dele, as certezas dele, tudo dele.

E meu corpo tremia em êxtase ao sentir um osso se partindo em minhas mãos. O estalo do inevitável, a garganta arranhando o ar em desespero, os pulmões falhando, o coração enlouquecido, o sangue quente escorrendo por minhas mãos e braços e barriga e rosto, era aquilo que o satisfazia, não o grotesco, mas a submissão de todos sob o seu poder.

Naquele momento, eu era o seu poder.

Eu estava sob o seu poder.

Eu era a sua máquina, o seu brinquedo, uma extensão de seu corpo.

Eu era tudo.

E nada.

“Muito bem, Jill.” Mais mel escorria para os meus ouvidos, para minha língua, para minhas células.

Eu ainda era Jill. Aquele corpo branco e desnudo, coberto de química e sangue, era Jill.

Mas que Jill eu era?

Que Jill eu era?

Que Jill eu era?!

“Jill.”

Me solte!

“Jill.”

Me deixe!

“Jill.”

Não sou eu!

“Jill.”

Não sou eu.

***

“Jill! Jill!” Ela ouvia alguém gritando.

Ela não conseguia abrir realmente os olhos, não conseguia enxergar nada, estava assustada, os pulsos presos em algo, os dedos apertando algo, e ela se debateu e debateu contra seu algoz, seu carcereiro, sua prisão.

“Me solta!” Ela sentiu algo cair ao chutar o ar.

“Jill, se acalma!”

“Não!” Algo se rompeu sob seus dedos.

“Jill, sou eu, Chris!”

Ela abriu os olhos, confusa.

Ah.

Ele estava pálido e assustado, lhe segurando, os punhos fortes apertando seus ombros, os olhos claros arregalados em preocupação.

Ela vasculhou a sala com o olhar meio vago, como que em um sonho, a mesa com todas as porcarias que haviam consumido revirada, jogada no chão, a televisão com os créditos do filme deslizando incomodamente pela tela negra, e Chris, com enfeites vermelhos e escuros e amarelados em toda a parte visível de seus braços.

As unhas dela cravadas e enterradas em sua pele.

A camisa rasgada.

Farrapos nos dedos dela.

E Jill subitamente acordou.

E não conseguiu se conter.

Era uma mulher forte, ela. Mas realmente existiam momentos em que tudo se estraçalhava em seu coração, e ela não conseguia se segurar.

E ela nem percebeu quando seus olhos se transformaram em uma barragem rachada, rubros e úmidos, prestes a desabar.

“Oh, Chris...” Ela não pôde aguentar. Começou a soluçar. “Me perdoe, eu...”

“Está tudo bem. Está tudo bem.”

Chris a envolveu em um gentil abraço, o rosto dela em seu peito, para ela não enxergar nada, ouvir nada, pensar nada, apenas para se sentir livre para fazer o que precisava.

E ele também não disse nada, pensou nada, apenas ouvia ela fazer barulhos estranhos, apenas sentia o corpo dela e o calor dela e a respiração dela contra seu peito.

Eram amigos, simples e totalmente. Eram parceiros, eram corpos separados, unidos, eram o que precisassem um para o outro. No meio de tanta confusão, Jill ficou em paz quando percebeu que Wesker, mesmo tentando com afinco, não havia conseguido arrancar essa importante parte de si.

E ela apenas colocou seus braços ao redor de Chris, as unhas arranhando delicadamente sua costa, enquanto suas lágrimas molhavam a camisa esfarrapada que apertava contra o rosto, e sentia as mãos dele acariciando seu cabelo, lentamente.


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Notas finais do capítulo

Se tudo der certo, o próximo capítulo sai no final da semana que vem! - Eu sempre falo isso, mas é pra ver se consigo me manter nesse ritmo XD
É só torcer pro prof. tá de boa com a gente ;3

E qualquer crítica, sugestões, elogios



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