Hermione mal conseguiu dormir à noite. A imagem da expressão de seu pai não saía de sua mente. A cada palavra ela podia jurar que ele mudava de cor. “Ele vem aqui amanhã, com o pai.” Foram percorridas todas as cores do arco-íris numa única frase.

Passou o dia como um zumbi, vagando pela casa e olhando o relógio. Ao anoitecer sentia-se acabada. Mesmo assim, tomou um banho demorado. Escolheu cuidadosamente as roupas, para não parecer chique demais.
Acabou optando por calças jeans e um cardigã de lã, pesado. Passava batom vermelho – para não abandonar seu estilo – quando bateram à porta.

– Quem é?

– Sou eu, filha. – Disse sua mãe. – É só pra avisar que seu namorado chegou com o pai.

– Ai, meu Deus. Mãe, eles devem estar se sentindo super deslocados. – Ela se olhou no espelho correndo e saiu do quarto. – Vamos antes que meu pai os mate.

Elas desceram as escadas e a pequena Granger viu uma cena que não era exatamente muito esperada.

A primeira coisa que reparou, foi que seu pai estampava um sorriso relaxado no rosto, diferente das últimas horas. A segunda foi que Ronald não estava exatamente como ela se lembrava: estilo urbano, despreocupado. Ele usava um suéter azul marinho de cashmere com gravata para dentro e sapatos Armani. Armani! Do outro lado da sala, de costas para ela, tinha um homem. Seus cabelos quase grisalhos a fizeram sentir uma estranha sensação de deja vu.

Quando Ronald a viu, sorriu e se levantou. Logo depois, o Sr. Granger.

– Você me assustou, sabia filha? Cheguei a acreditar em você.
Então aquele homem se levantou e a encarou, também sorrindo. Ela reconheceu aquele mesmo olhar penetrante e azul que encontrava em Ronald. Mas não só isso: ela reconheceu o vice-diretor, seu professor de Biologia. Ronald Weasley era filho de Arnold W.!

– W... ‘W’ de Weasley! – Ela concluiu, comparando os dois.

Ronald se aproximou sorrindo. Ela deu um passo para trás.

– É por isso que você se preocupa tanto com ele. É por isso que você conseguiu invadir a escola de madrugada. É por isso que você é brilhante em Biologia. É por isso que você estava com os livros aquele dia!

Ele riu, sem graça.

– Meio cômico, não é?!

– Você escondeu isso de mim desde o início! Você mentiu pra mim, Ron!

O sorriso que todos eles traziam desapareceu. Os olhos de Ronald se arregalaram e ele começou a pigarrear freneticamente. Sua garganta estava mais que seca.

– Eu não menti, Hermione. Você resolveu que eu era bolsista e, de alguma forma, todo mundo acabou concordando.

– E por que você não desmentiu?

Nessa hora, Arnold W. – Weasley – se aproximou dela.

– Eu pedi pra ele não desmentir, Hermione. É mais conveniente, querida.

Ela não pôde evitar uma careta ao ouvir seu professor – e sogro – a chamando de ‘querida’.

– Para não acharem que eu sou um... ‘protegido’ por ser filho do vice-diretor.

– Você... Você não sabia? – O Sr. Granger perguntou.

– Parece que não. – Sua esposa respondeu.

Hermione se virou de costas par eles e colocou as mãos nas têmporas. Latejavam.

– Você tinha que ter me contado. – Sussurrou. – Apunhalada outra vez...

Weasley – o filho – se aproximou dela e colocou a mão em seu ombro.

– Não, meu amor. Não entenda errado.

– Como assim, Ron? Como assim? Tudo aquilo que nós passamos juntos... Foi uma mentira? Desde o primeiro dia que a gente se viu. – Ela colocou as mãos na cabeça outra vez. – Olhe só pra você: não é o meu Ron.

– Sou sim, Hermione. Por favor, não entenda errado!

– Entender o que errado? Que nós vivemos uma meia verdade?

Ele baixou a cabeça e voltou par o lado do pai.

– Todos nós temos segredos, não é?!

Por um momento, ela sentiu que não era dele mesmo que Ronald estava falando. Mas então ela o encarou ao lado de Arnold e viu ali, pai e filho. Seus olhos se encheram de lágrimas.

– Não dá pra acreditar. – E subiu as escadas correndo para seu quarto.

Ronald tentou ir atrás, mas seu pai não permitiu.

– Deixe ela se acostumar com a ideia primeiro.

Eles se despediram dos Granger e foram embora.