Precisamos Conversar escrita por Rodrigo Caetano


Capítulo 9
Interlúdio - David


Notas iniciais do capítulo

E aí, preparados para conhecer o David?! Acho que todo mundo está um pouco curioso né? heheheheh

Um fato interessante (ou não): Esse interlúdio, na verdade, foi escrito para ficar entre os capítulos 2 e 3... O último interlúdio, originalmente, seria o da Samanta. Mas como ele é narrado pela Samanta no futuro, contando uma história da Samanta no passado, depois de vermos o fechamento da história da Samanta no presente, achei que a coisa tinha ficado confusa e não estava encaixando...
Além disso, as últimas palavras do interlúdio da Sam confrontam com uma das mensagens da história. Isso não faz com que a história seja contraditória, uma vez que vemos a Samanta no passado dizemos uma coisa que a Samanta do presente aprende na história que não funciona, mas ainda assim, seria confuso fechar com isso tendo acabado de reforçar o ponto oposto...

Anyway, espero que curtam o David! Boa leitura! xD



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A Sampa sempre foi muito quieta. Ela levou um ano para me contar que, quando ela se mudou para o Rio, odiava aquele apelido. Sabia que os cariocas implicavam com São Paulo, que não gostavam da cidade e das pessoas de lá, e se sentia mal por ficar marcada por algo que não era visto com bons olhos. Sentia que o apelido tinha um tom pejorativo.

Quando ela me falou isso, a primeira coisa que eu disse foi para ela parar de sentir pena de si mesma e de São Paulo. Ela tentou argumentar, mas eu não deixei. Os cariocas não odeiam São Paulo. Eles não odeiam nada, ou quase nada, para ser justo – a Adriana lembra bem dos dias nublados.

Sampa demorou a entender que os cariocas riem e fazem graça de tudo, e só implicam com quem fica irritado com isso. Eles usam essa irritação como combustível para gerar mais provocação, e, consequentemente, mais risada e mais graça. Mas tem uma coisa que eu sempre admirei na Sampa. Ela podia até demorar para entender algo, mas quando entendia, ninguém precisava repetir.

Pouco depois daquela conversa ela já estava zoando todo mundo, e tinha colocado o apelido na página inicial de todas as redes sociais. Convenhamos, a menina se chama Samanta Paolinni e vem de São Paulo. Sampa era um apelido bastante razoável, e, dentre todos os calouros com quem ela entrou na faculdade, aposto que o dela era um dos melhores.

Depois ela mudou de ideia de novo, e decidiu que não gostava muito do apelido, mas aceitava. Mas aí já eram por motivos próprios. Ela tinha criado toda uma identificação com o nome de batismo e o preferia a qualquer apelido. Tudo bem, mudar de ideia é normal, e, pelo menos dessa vez, ela tinha um motivo mais justo. Eu entendo.

Acho que foi por isso que eu e ela nos demos tão bem. Eu gosto de entender as coisas. Gosto que elas sejam do jeito que têm que ser, não do jeito que a maioria as entende. E a Sampa tinha isso. Ela entendia as coisas como elas eram e aceitava. Ela não questionava muito ou tentava impor as suas próprias opiniões. Conseguia se adaptar a tudo de maneira muito fácil, mais fácil do que muitos dos cariocas, e, uma vez que pegava o jeito da coisa, via tudo com uma clareza quase cristalina.

Quando a gente estava junto, eu gostava de explicar as coisas para ela, de ver os olhos dela brilharem com o entendimento. E ela vivia me chamando a atenção quando eu estava lutando inutilmente contra uma coisa, tentando me impor sobre como ela realmente era.

Não se engane, nós discutíamos bastante, mas isso era bom também. Nós discutíamos sobre tudo. Principalmente sobre as coisas que um ou outro não conseguiam entender. Ela, por exemplo, nunca entendeu a minha coisa com secretária eletrônica. Vou tentar explicar para vocês.

Já parou para pensar no significado do termo secretária eletrônica?

Claro que todos sabem o que é uma secretária eletrônica e o que ela faz. Sabem que ela era uma máquina capaz de atender chamadas telefônicas quando você não pode fazê-lo, e gravar uma mensagem da pessoa que ligou. Ou pelo menos era isso que servia como definição. Hoje em dia a palavra software já substituiu a palavra máquina, tanto nesse como em muitos outros casos.

Quando eu era mais novo, eu me preocupava mais com o que eu achava que deveria ser uma secretária eletrônica, e não com o que ela realmente era. Quer dizer, pare bem para pensar. Se você não soubesse da existência da máquina, o que você pensaria quando ouvisse o nome “secretária eletrônica”. Eu juro que mesmo sabendo o que era, eu sempre imaginei um robô com um caderninho, atendendo o telefone para mim.

Tendo me formado em arquitetura, contudo, eu nunca cheguei nem perto de construir um robô que me servisse de secretária, apesar de ter feito alguns desenhos, de brincadeira. O ponto é que, de qualquer maneira, eu queria dar um jeito de fazer a minha secretária eletrônica fazer mais do que simplesmente anotar – ou gravar – recados. Como ela não era mais uma máquina, e sim um software, eu conhecia alguns amigos que podia tomar providencias.

Convoquei um programador e criamos uma secretária capaz de passar o meu celular, caso a pessoa apertasse a tecla “um” e respondesse uma pergunta pessoal sobre mim — eu não queria qualquer um recebendo meu celular. Caso quisesse me convidar para um evento, digitava o número dois, e então a data e o horário do evento, e o programa me enviava uma mensagem de texto.

Tudo isso, é claro, levou anos para funcionar direito e, eventualmente, dava tanto trabalho para mexer que as pessoas simplesmente desistiram de me ligar – além, é claro, de isso afastar pessoas normais que achavam muito esquisito um arquiteto interessado em secretárias eletrônicas. Depois de um tempo e de algumas tentativas fracassadas de vender o programa como um aplicativo, percebi que a pobre da secretária já estava há muito ultrapassada.

Isso foi no início, antes de conhecer a Sampa. Quando eu contei para ela, a menina me zoou um bocado por causa desse lance, mas eu, bom carioca que sou, nunca me deixei incomodar.

Ainda com uma pulga atrás da orelha, não conseguia me sentir confortável em gravar uma mensagem genérica para quem estivesse me ligando quando eu não podia atender. Então, um belo dia, no início do meu namoro e para o delírio de Sampa, decidi que o mínimo a se fazer era avisar a minha secretária onde eu estava indo, sempre que eu fosse sair de casa. Me tomava alguns minutos extras, mas eu sempre gravava uma nova mensagem, mesmo quando estava atrasado. E aquilo virou um hábito mais difícil de largar do que alguns vícios de jovem.

E, bom, a minha “secretária” acabou tendo um papel um tanto quanto interessante no desenvolvimento do nosso relacionamento, não é?

Eu demorei a entender porque ela tinha ido embora. Demorei um pouco a perdoar, confesso, mas nunca duvidei que iria superar aquilo. E quando ela disse que foi embora por que as coisas não estavam fazendo sentido dentro dela, eu não pude deixar de compreender. Afinal, quem é que já compreendeu, direitinho, tudo o que acontece dentro de si?

Só para deixar claro, eu nunca duvidei que a gente ainda iria conversar. Sabia que ela não ia deixar tudo terminado com a secretária. E se ela precisava largar tudo para compreender o que quer que fosse que precisava compreender sobre si mesma, antes de voltar, que fosse. Eu esperava. Não dá para explicar o quão importante é conhecer e aceitar as coisas dentro de você.

Sabe, é como o lance da secretária. É como se aquilo fosse uma parte de mim, por mais estranho que isso seja. Entendo isso agora como não entendia antes. Era uma parte de mim que eu havia descoberto, enquanto não conhecia direito nenhuma das outras. E eu não queria largá-la de lado, de jeito nenhum, mesmo que a minha namorada não compreendesse. Acho que a Sampa não tinha entendido isso naquela época, e precisava entender.

Mas hoje ela sabe. Eu sei que sabe. A Sampa, meus amigos, hoje em dia, é o tipo de mulher que sabe de tudo. Não temos dúvidas disso...


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Notas finais do capítulo

E então? O que acharam? Interlúdio final, ninguém mais para conhecer. História oficialmente fechada...

Só que não... hahahahah

O epílogo está saindo agora também galera! Ele é curtinho, e não é exatamente necessário para compreender o que eu pretendia passar, mas é um gostinho final para quem curtiu as personagens. Por que eu sou assim. Preciso dizer tchau várias vezes...hahahahah

Espero que tenham gostado! Espero vocês nos comentários! xD



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