Hogwarts: uma outra história escrita por LC_Pena


Capítulo 71
Capítulo 71. Como ganhar inimigos


Notas iniciais do capítulo

Olá, people! Devo dizer que nem sempre o que Cesc pensa é verdade.



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Capítulo 71. Como ganhar inimigos 

O pequeno porto de desembarque dos primeiranistas era um ótimo lugar para se cuidar das correspondências, ainda mais das ilegais, que exigiam que eu cortasse letra por letra de jornal para fazer uma mensagem bizarra, de filme de terror. 

Havia colocado um impressionante feitiço contra o vento vindo do lago e agora estava nessa missão impossível de procurar uma letra X nas últimas manchetes do Profeta Diário. Um barulho me fez levantar os olhos, mas apenas sorri para Tony e sua fiel bengala. 

—Estou fazendo uma cartinha ameaçadora para Tracy, veja... 

Mas o toc toc irritante na bengala de Tony marcou um ritmo engraçado, então foi com muita surpresa que vi meu amigo semi-aleijado começar um impressionante número de sapateado a lá Broadway, usando a bengala na performance. 

—Tony, eu... – Ele fez um passo impressionante e meu queixo caiu.– Tony, seu joelho está curado! 

Ele parou ante minha animação e me deu um de seus piores sorrisos de tubarão. Cruzando o joelho machucado por trás da perna boa e se apoiando com as duas mãos na bengala, ele me olhou divertido. 

—Não, mas pode ficar! Basta um pedido teu. – Argh, ninguém merece. 

Devia ter desconfiado da situação estapafúrdia, porque demônios eu estaria fazendo uma carta para Tracy Harmond, com uma mensagem com a letra X ainda por cima? Só não fiquei tão irritado com a presença do djinn porque realmente queria falar com ele. 

— Gostaria de saber qual é o critério para a sua escolha dos cenários de nossas conversas...  

— Perguntas a mim? Sua mente fértil molda o palco, cabe a mim apenas adaptar meu espetáculo. – Ah sim, já tinha notado quão dramático essa criatura é. 

— Que seja, dessa vez não vou enxota-lo como a um cão sarnento... – Ele franziu o cenho estranhamente, mas estava vestindo a pele de Tony melhor do que vestiu a de Rebeca, o que só prova que meu amigo é mesmo um ser das trevas.– Estava mesmo querendo falar com você. 

—Farás o pedido? 

— Não. 

—Já vejo. – Ele se sentou ao meu lado, em um ato humano muito perturbador para os padrões de gênio do mal.– És uma criança muito indecisa, como posso ajudá-lo a se decidir? 

—Primeiro comece me contando se tem parte no acidente de Tony. – Ele me olhou falsamente ofendido, mas com a cara de Tony, a parte falsa fica muito mais clara para mim.– E não se faça de desentendido! 

Ele deu de ombros, mergulhando a ponta prateada da bengala no lago escuro a nossa frente, fazendo círculos com ela. Eu continuei o encarando com uma expressão acusadora. 

—Nada fiz dessa vez... – Ele soou magoado e eu revirei os olhos.– Não tenho culpa que vives em uma moradia moribunda... 

—O que? Do que está falando? – Ele sorriu feliz por ter me tirado do sério.– O que sabe sobre Hogwarts, coisa ruim? 

—Sei de tudo sobre todos, mas sabes que não me é permitido falar sobre isso, teu amigo já tentou. – Lembrei da pergunta não respondida de John. Assenti com a cabeça em seguida. 

— Pode curá-la? 

—Poderia... 

— Pode curá-lo? – Não precisei dizer a quem, porque ele não havia colocado a pele de Tony por acaso. Caso ele pudesse, isso só pioraria minha culpa por não fazer o pedido. 

— Ele sente dor, sabes? Dói e lateja quando ele dorme e piora quando desperta, sentar é uma agonia, mas ficar de pé... 

— Tony tomou a própria decisão e pedir para ele se curar do nada levantaria suspeitas... – Disse a contragosto, esse era meu principal empecilho para fazer o pedido por Tony, queria ajudar, mas tinha que ser racional antes de tudo.  

— Se construíres o discurso correto, esse tipo de problema é facilmente solucionado... Entretanto... Sabes o que eu acho? Que não queres desperdiçar um desejo com o teu melhor amigo.  

Respirei fundo e não dei os biscoitos que essa criatura tanto queria. Eu sabia que aquilo não era verdade, a questão é que Tony não pode aparecer bem de uma hora para outra e logo mais ele estaria curado mesmo, então não havia verdadeira necessidade de fazer o pedido,  só isso. 

—Tanto tempo junto e ainda acha que eu me importo com o que você pensa. – Ele sorriu de lado, olhando para o horizonte.– Mas eu tenho um pedido para você. 

— Sim... – Ele se virou perigosamente interessado, um brilho maligno brilhando por trás dos olhos de café do meu irmão escolhido. 

—Desejo que Hogwarts volte a ser forte como era antes, sem problemas na magia. 

— Não posso “voltar”! – Ele disse irritado. 

—Desejo que ela seja consertada então. – Disse, sorrindo com a exasperação do djinn. 

—Não posso dar-lhe o que terás e estás ciente disso! – Tudo ficou inesperadamente negro e eu pisquei confuso.– Achas divertido me provocar, criança? Pensas que pode abusar de teu direito de mestre? 

Engoli em seco, porque o sonho vivido no lago havia acabado: sem mais cores, cheiros e ruídos do ambiente bucólico que minha mente tinha escolhido para essa conversa. Havia apenas a escuridão e aquela voz cavernosa, que nada se parecia com a de Tony. 

— Achei que queria que eu pedisse! – Engoli em seco, não porque estivesse com medo da criatura e sim porque a cegueira era muito incômoda. 

Peça... 

— Agora você me chateou, não quero mais. – Senti uma sensação de sufocamento leve, como se uma força estivesse apertando meu pescoço de maneira gradual. Mantive a calma, porque tinha um ponto.– Sabe... Sabe o que eu li a seu respeito? 

Que posso fazer de tua  existência algo amaldiçoado? 

—Não. Descobri que você não pode fazer muita coisa sem minha permissão. – A sensação de sufocamento havia passado, então acho que o djinn estava curioso para me ouvir.– E certamente não pode fazer mal a seu querido mestre. 

Ainda posso destruir o que lhe é mais quisto: a sua mente. Não tinha a quem encarar naquele completo breu, então apenas respirei fundo para me acalmar, sabia que aquilo não era verdade.– Pense, criança: noite após noite mergulharás em teus doces sonhos e cá estarei eu, aguardando-te para as mais perturbadoras aventuras. Em um dia, mortes, no outro, humilhação e então terror puro e simples, teus maiores temores desfilando ante seus olhos impotentes, até que não sobre um fiapo de tua sanidade, o que te pareces? Entretido? 

Antes de chegar a isso, um único desejo sairia de minha mente doente: volte para o inferno de onde saiu, djinn! 

Não há caminhos de volta, criança. O som soava divertido, mesmo em uma voz que não parecia ter sabido nunca o que era a verdadeira graça, uma graça que não fosse cruel e malvada, digo. 

— Veja como soaria meu pedido então: desejo que a lamparina que um dia apaguei em Uganda, tenha sua chama acesa pelas mãos inocentes de uma criança africana e que o mal que estivera ali um dia seja dragado pela luz dos primeiros bruxos e que faça se cumprir a pena por seus crimes hediondos. 

Não se atreverias...  

—E então meu segundo desejo, porque ainda estaria submisso a mim, seria que nenhuma criatura viva ou morta, qualquer uma que alguma vez tenha passado pelas linhas do Destino, jamais pudesse te libertar novamente de sua prisão. 

Ele não disse nada e eu sorri para o negrume em que minha mente havia se transformado. 

—E por fim, desejaria que as mais profundas lembranças que eu ou qualquer outra pessoa houvesse tido com um maldito djinn preso nas entranhas de Uagadou fossem completamente apagadas do mundo. – Passei a língua nos lábios, mesmo sabendo que eles não estavam ressecados de verdade.– Vê? Sou um ótimo orador e sei que por mais que tenha acesso a minha mente, não pode dominá-la: eu sou seu mestre. 

És meu mestre até que tua própria chama da vida se apague. 

—Sei disso. 

Devo segredar-te então que não falta muito para que isso aconteça? 

É por isso que está com tanta pressa para que eu faça os pedidos? – Perguntei irônico, ignorando o medo natural da morte em favor da possibilidade de colocar o maldito gênio em seu lugar de uma vez por todas.– Sei muito bem que se eu morrer sem fazer os pedidos, você estará ainda atrelado a mim e que aquela baboseira de apagar a chama não serviria de merda nenhuma então. 

Atrelado a você pela eternidade... Buscar-te-ia no além véu, perturbaria teu descanso eterno e faria desejares nunca ter nascido, ter encontrado a mim e certamente faria com que desejasses nunca ter morrido. 

Suspirei cansado dessa conversa, porque de verdade não queria medir forças com uma criatura milenar, estava apenas garantindo que ele não se metesse na minha vida e acho que deixei claro meu ponto, assim como ele deixou claro o dele. 

Aquelas horas me preparando para o confronto não foram a toa. 

—Não precisamos chegar a nada disso, quero apenas que não fique me aborrecendo ou me pressionando com suas aparições. – As cores rosáceas do céu de Hogwarts no pôr do sol apareceram novamente, então percebi que estava de volta ao porto, deitado, observando as nuvens.– Quando tiver um pedido, o chamarei e nem um segundo antes disso. 

— Assim será, mestre.  

A voz de Tony foi a última coisa que ouvi antes de voltar a escuridão nada sobrenatural do meu dormitório dividido com um Longbotton que ressonava baixinho na cama ao lado. Resolvi que não me mexeria, não coçaria os olhos, porque isso apenas faria ser mais difícil retornar ao meu sono anterior. 

E sim, eu consigo dormir como um bebê depois disso. Pesadelos não me assustam há muito tempo. 

*** 

A seleção de Ilvermorny tinha acabado de chegar em uma geringonça que parecia uma giro-esfera esquisita, mais tecnológica do que mágica. Eles vieram sem bagagens aparentes e a esfera de um tipo de energia dourada saiu direto do lago, em frente a onde o nosso dirigível estava atracado. 

Eram os nossos primeiros e talvez únicos hóspedes, porque, caso não passemos para as semifinais, não teremos mais nenhum visitante aqui, o que é uma pena, porque é bom estar em ritmo de festa. 

Vi a recepção animada para os quase cem americanos - entre atletas, alunos, professores e imprensa - através de um dos vitrais. Haviam ainda aqueles que tinham chegado em Hogsmeade, já que não tínhamos condições de comportar todos. Não somos uma Uagadou ou uma Salem da vida. 

Ainda bem que tínhamos os Lufa-lufa para fazer a recepção feliz do povo, porque eu tinha coisas mais importantes para cuidar. Os corredores da escola estavam obviamente vazios, mas eu sabia de uma sala que estaria ocupada. 

—Weasley, posso entrar?  

Fui tão educado que até eu me surpreendi. Ela levantou o olhar de sua mesa de editora-chefe do Hogs News e me fez uma expressão estranha de confusão. Sorri simpático e cheio de boas intenções. 

—Não devia estar cumprimentando o capitão da equipe americana nesse exato momento? 

Sim, eu deveria. 

—Longbotton pode fazer isso por mim. – Ele pode, mas provavelmente não fará e eu ouvirei o sermão de Potter até meu dramático suicídio por exaustão. Muito triste isso, será que Longbotton não tem vergonha não? 

—Então, Fábregas, no que posso ajudá-lo? – Weasley estava com um rabo de cavalo baixo desleixado e nenhuma maquiagem no rosto sardento. Sorri com sinceridade dessa vez, porque essa ruiva era autêntica e confiante o suficiente para não mudar as milhares de coisas imperfeitas nela e ainda assim Tony - o superficial Tony - está atraído por ela. 

E por isso mesmo estava aqui, porque se tem alguém com coragem o suficiente para enfrentar Tony, esse alguém é uma grifinória cheia de marra, embora seja chata como a bunda de Harmond na saia do uniforme. 

—Preciso que convença meu amigo idiota a tomar as poções para o joelho. – Ela sabia que amigo idiota era e não esboçou nenhuma reação para o meu pedido. 

—E por que ele não está tomando? – Fiz menção de falar, mas ela continuou, voltando a escrever em seu pergaminho tranquilamente.– Talvez ele tenha um motivo plausível. 

—Ele não tem. A menos que... Ele te disse algo? – Ela fez um “rum” sarcástico, ainda sem me olhar. 

—Não tenho falado com Antony há algum tempo. – Ela finalmente me olhou, apenas porque precisou molhar a pena no tinteiro.– Até onde sei, ele estava saindo com Ava Stozen ou ao menos estava no dia do acidente... Você devia pedir ajuda a ela. 

Ah, então é isso. 

—Weasley, Tony é um idiota. – Ela sorriu com sinceridade para isso. 

—Isso não é novidade. 

—Mas é novidade que uma garota tenha feito tão bem para ele como você fez. – Ok, isso foi exagerado. Rose me olhou cética, então voltou para seus pergaminhos.– Geralmente a gente não percebe a diferença, mas com você, notamos. 

—Ele melhorou as notas? 

—Bem, não, mas... 

—O comportamento? 

—Você sabe, é... 

—Mudou o que então? – Ela me perguntou curiosa, mas não esperançosa. Acho que ela só queria saber o que eu inventaria dessa vez. 

—Ele não... Bem, ele está, você sabe... Quieto com as garotas. – Ela fez uma expressão quase sonserina de tão sarcástica.– Ele deixou de ser obcecado pela minha irmã e esse foi o maior milagre que eu já vi ser operado! 

Isso é verdade, então soei sincero,  tanto que Rose me olhou bem surpresa.  

—Antony gostava de Louise?  

—Paixonite de criança! Desde que você apareceu, ele mal fala nela, é impressionante! – Ela mordeu os lábios, parecendo em dúvida. Demorou alguns preciosos segundos antes dela resolver dizer o que estava pensando. 

—Acha mesmo que ele me ouviria? 

—Não com essa insegurança toda! Você tem que ser dura e mostrar a imbecilidade dele, mas de uma maneira sutil, sabe? 

Ela olhou para mim e então para seus pergaminhos, abrindo um sorrisinho charmoso ao pensar em algo bom, provavelmente. Assim espero. 

—Acho que sei o que vou fazer... 

—Você vai seduzir meu amigo, Rose? – Falei insinuante. Ela se levantou sem dizer nada e abriu a porta. Olhei curioso para isso. 

—Cai fora, porque não sou obrigada a te aturar. 

Dei risada com o tom mandão dela, sabia que Tony não poderia resistir a isso. Passei pela ruiva petulante e antes que ela pudesse dizer qualquer coisa mais, dei um beijo surpresa em sua testa. Ela corou, constrangida de uma maneira adorável. 

—Obrigado, Weasley. 

*** 

Estava assistindo Preston Lilles responder a última das perguntas direcionadas a ele. Tinha conseguido cumprimentá-lo no fim das contas e agora, nas entrevistas, o artilheiro e capitão de Ilvermorny havia sido todo sorrisos e simpatia com a imprensa e seu técnico o segurava com as duas mãos em seu ombro, orgulhoso, de pé atrás do garoto com pinta de galãzinho de Hollywood. 

Harry Potter estava sentado à um canto da mesa da coletiva de imprensa, com a varinha a postos. O idiota havia deixado claro que no momento em que eu dissesse algo que comprometesse Hogwarts, ele colaria minha língua no céu da boca, para evitar que eu piorasse ainda mais a nossa situação. 

Tem tanta fé em mim esse homem abençoado! 

Assim que as perguntas ao garoto loiro da Califórnia acabaram, o bruxo responsável passou a palavra para a imprensa me fazer as perguntas. Sorri tão simpático como poderia porque, vocês sabem, eu sou todo um doce, mas isso não transparece, infelizmente. 

NYC Enchanted, Travis Trenton, caderno de esportes. Senhor Fábregas, é a primeira vez que fala com a imprensa internacional por conta de uma suspensão no início do torneio, o que tem a dizer sobre o episódio? 

Olhei para o meu amado técnico e ele me sorriu com os lábios fechados, como se dissesse “Vá em frente, conte ao mundo a verdade sobre sua delinquência”. Ignorei Potter e sorri para o homem de vestes formais, com uma engenhoca que se assemelhava a um gravador nas mãos. 

—Bem, senhor Trenton, tratou-se de uma simples travessura interna, devidamente punida pelas autoridades de Hogwarts. Embora tenha sido de certa forma prejudicial à seleção, não podia esperar uma atitude diferente dos nossos responsáveis

Olhei ironicamente para Potter, que de responsável não tinha nada. O homem chamou novamente minha atenção, tendo direito a pelo menos um complemento a sua pergunta, a qual respondi com o discurso pronto e insosso que fui orientado a dar. 

—O time entrou prejudicado porque além de ter dois jogadores escalados para o jogo suspensos, esse é o tipo de coisa que abala o emocional da equipe, mas são águas passadas, de qualquer forma. 

Finalizei minha resposta e apontei para um senhor negro de terno com um colete laranja berrante. Ele usava um bloco de notas igualmente extravagante e sorriu ao ser escolhido por mim e não pelo responsável pelo evento. Desculpa, cara, mas eu sempre quis fazer isso, escolher que jornalista teria a honra de me perguntar algo, digo. 

— Gideon Grant, Detroigic Today. Capitão Fábregas, novamente terá um jogador fora da partida por conta de um incidente antes do jogo, o jogador no caso tendo sido o melhor de Hogwarts na última partida. Como a equipe tem lidado com esses imprevistos todos? 

Não respondi tão no automático como havia feito antes, porque ainda estava amargando um pouco da culpa por ter Tony fora do jogo. Embora não tenha sido responsabilidade minha e eu acredite de verdade em tudo que disse ao djinn, ainda sim poderia ter feito algo mais por ele. 

Vamos ver como Rose Weasley se sairá, antes de pegar o horrível trem da culpa. 

—Bem... Sabíamos que não teríamos tanta variedade de jogadores quanto as outras equipes... – Olhei de soslaio para o capitão americano, que tinha três times onde escolher seus jogadores. Babaca.– Nossos jogadores mais experientes eram formandos, então já começamos o torneio com atletas a menos, por isso temos lidado com os imprevistos com tranquilidade, pensando sempre no que temos disponível para jogo. Não dá para ser de outra maneira.  

—Rita Skeeter, caderno de fofocas do Profeta Diário. – Uma voz feminina saída do nada falou em um tom decidido, forçando a todos procurar a bruxa em questão, alguns realmente tensos, como Harry Potter.– Senhor Fábregas, ouvi dizer que tem tido problemas de estrelismo dentro da equipe, como lidar com crianças famosas querendo medir forças com a sua autoridade de capitão? 

—Primeiro gostaria de dizer que sou um grande fã de seu trabalho. – Assim que encontrei a bruxa de vestes estranhas e óculos de gatinha, sorri divertido.– E segundo... De quem estamos falando? Tenho todo um céu estrelado na equipe, embora nenhum realmente valha tanto quanto pensa que vale. 

A pena de repetição rápida de cor rosa escreveu furiosamente no pergaminho ao lado da bruxa e o meu sorriso se ampliou. Pude ouvir Potter rosnar meu nome em aviso, mas eu o ignorei, claro. 

—Comecemos pelos Potter/Weasleys, evidentemente.  

—Ah sim, James e Fred... Vou acrescentar Frank Longbotton a equação, só porque ele parece um apêndice da família. -  Ela acenou que sim, ansiosa pela fofoca crocante, sua pena nunca parando de escrever.– Devo dizer sobre eles que... Acabei admirando tanto seu trabalho justamente por conseguir fazer uma família incrivelmente aborrecida parecer tão interessante. 

—Perdão... – Ouvi algumas risadas com o meu tom sarcástico e a cara de desentendimento da mulher. Poderia inventar um monte de besteiras para Rita Skeeter vender mais jornais, mas hoje era dia de maldade e eu estava precisando elevar minha moral de capitão. 

— Os três são atletas dedicados e participativos, eles tem me ajudado com boas sugestões e estratégias. – Sorri inocentemente para Potter, que me olhou um pouco menos tenso.– Claro que ainda há algumas rusgas aqui e ali, mas nada relacionado a estrelismo e sim ao fato de ter quatro equipes rivais aglutinadas em um mesmo time. Mas as coisas tem corrido relativamente bem, pena que isso não venda jornais... 

— Não foi isso que minhas fontes me informaram... Parece que James Potter e o herdeiro Dussel tem se estranhado por conta de um embate amoroso. 

—É mesmo? Conte me mais! -  Me fiz de exageradamente interessado e a mulher sorriu como um gato com os bigodes sujos de leite, apesar da maioria dos jornalistas terem sentido minha ironia. Pelo visto as manchetes de Rita Skeeter atravessam o oceano e desagrada seus pares americanos também. 

— O boato corrente é que os dois estavam disputando a atenção de um terceiro jogador não identificado, mas um garoto, com certeza. – Olhei surpreso, assim como os outros presentes. Harry Potter foi o único que se levantou e fez a pena rosa de repetição parar e o bloco de notas da mulher se fechar. – Sabe quem poderi... 

—Se vai nos fazer perder tempo com mais uma de suas baboseiras, o melhor é que se vá! Aliás, como conseguiu entrar aqui de qualquer forma? – A mulher olhava extasiada para o tanto que havia conseguido irritar o famoso Harry Potter, enquanto ele acenava para um auror na porta vir retirá-la. 

Na última entrevista Rita Skeeter tinha trazido à tona a situação dos Zabinis a respeito das acusações de que a família era aliada ao lorde das Trevas no passado e que a nomeação de Blaise Zabini para um alto cargo público era uma afronta a toda a comunidade bruxa. 

Tony não se exaltou tanto quanto poderia, mas ele deu material suficiente para a mulher escrever um artigo sensacionalista, mais sobre Potter não conseguir controlar seus atletas, do que sobre Tony em si. 

Nos divertimos na mesa do café com isso - a verdade é que quando se tratava de seus pais, Tony primeiro estoura e depois vem ver que as coisas não devem ser levadas tão a sério – mas por algum motivo desconhecido o convite de Rita Skeeter para outra rodada de entrevistas foi extraviado. 

Uma pena. 

Assim que me recuperei do choque, dei uma risada alta, chamando a atenção da mulher que era escoltada para fora da sala de imprensa oficial de Hogwarts por um dos homens de Potter, que fazia a segurança do evento. 

—Merlin, quero muito ler esse seu conto de fadas, senhorita Rita Skeeter! – Disse de uma forma divertida, a título de despedida. Ela me olhou com um sorrisinho enigmático, que não me deu uma boa sensação. 

—Lerá, senhor Fábregas. Não se preocupe. 

*** 

A escola anfitriã entrava no campo primeiro, então resolvemos que toda a equipe, reservas e titulares, entrariam sob o feitiço do dragão de Hogwarts. Se tratava de uma formação em dragão, que, para quem estava de fora, parecia uma criatura de verdade. Hogwarts optou pelo ultrarrealismo como marca e eu realmente adorei isso.  

Era a primeira vez que víamos o estádio depois das alterações das empresas Dussel, então fomos recepcionados pelas torcidas das Casas e também pelos quatro animais símbolos de Hogwarts de uma maneira que nunca tinha visto antes. 

Os animais gigantes eram feitiços hologramas quase reais de tão perfeitos, interagindo com as torres principais em cada canto do estádio. Havia uma cobra gigante enrolada na torre Norte, um leão tentando pegar os jogadores na Sul, um texugo curioso no Oeste e uma águia fazendo um voo rasante no Leste. 

A torcida também estava bem impressionante, toda colorida, fazendo barulho e ostentando bandeirões que ondulavam sob o vento de final de outono. Quem diria, Hogwarts poética! Terminamos a nossa volta pelo campo, nos posicionando a direita do juiz, aguardando o nosso adversário. 

A equipe de reserva foi para o setor onde o restante do time enorme de Ilvermorny já estava nas arquibancadas. A apresentação de cada um de nós foi seguida de muita festa e nem sequer dava para ver a competição cotidiana de Hogwarts, todos vibraram na mesma intensidade para cada jogador. 

No céu estrelado apareceu Segundo e sua ficha completa, seguido de Potter, Longbotton, Sienna e Romeo. De batedores ficamos eu e Connor, que havia sido escolhido para falar por Hogwarts no vídeo assinatura do jogo. 

Connor foi uma boa escolha para isso, porque a arrogância dele fazendo um trocadilho com o lema de Hogwarts fez a torcida puxar a frase em latim, em um coro ensurdecedor. Até parece que essas pestes sabem alguma coisa de latim mesmo! 

Ainda sobre os gritos de "Draco Dormiens Nunquam Titillandus", Ilvermorny apareceu na sua esfera energética de antes, que dessa vez se abriu com as quatro criaturas patronas deles em uma explosão que me fez fechar os olhos de tão clara. 

A torcida rival começou a gritar, quando duas das criaturas mágicas foram aos céus em suas formas fantasmagóricas e coloridas e mais duas até a grama, formando o símbolo espelhado da escola nos terrenos de Hogwarts. 

Que. Audácia. 

O leão da torre Sul rugiu ofendido e os grifinórios puxaram a vaia para isso, atrapalhando a chamada dos jogadores no céu e provavelmente nos fazendo perder o prêmio Fair Play da rodada. Ok, dessa vez não fiquei irritado com eles, não dou a mínima para esse prêmio mesmo. 

Feita as apresentações e dita a frase de efeito da escola americana pelo próprio capitão surfista, nos cumprimentamos no centro do campo uma última vez e aguardamos o apito inicial com uma energia nervosa zumbindo em nossos ouvidos. 

É agora ou nunca. 

Mal o apito soou e Longbotton fez uma jogada incrível, pulando da vassoura e se impulsionando para pegar a goles solta no ar. A torcida de Ilvermorny soltou um gritinho coletivo de susto, mas todos em Hogwarts já sabiam que o grifinório idiota sempre conseguia voltar para sua vassoura em segurança. 

Tenho que admitir que já passei muita vontade de vê-lo caindo, mas já superei, juro! 

Infelizmente um dos artilheiros de Ilvermorny interceptou o passe de Frank para Romeo e iniciou um contra-ataque que parou nas mãos de Fred. As duas equipes tinham muito a perder nesse jogo, então a festa seria toda defensiva. 

Desviei um balaço que iria atrapalhar Fred no reinicio de jogo e assobiei para Connor se posicionar perto de David Gray, o senhor estrela da equipe. Obviamente não iriamos marcá-lo somente, mas esse posicionamento inicial fazia parte da nossa estratégia: 

Eu e Tony havíamos proposto a equipe forçar e usar a criatividade de Ilvermorny a nosso favor, através da imobilização de alguns atletas chaves da equipe. Isso faria com que o restante do time tivesse que ser mais agressivo e inventivo, aumentando a chance de erros. 

Estava parecendo dar certo, já que Romeo e Sienna conseguiram roubar em conjunto a goles da mão do capitão Lilles, fazendo o passe para Frank finalizar o lance. Nosso primeiro ponto e a primeira discussão acalorada na borda esquerda: Connor era uma irritante sombra do jogador de cabelos escuros e compridos de Ilvermorny e é claro que ele estava odiando a marcação. 

Não se passou nem cinco minutos de jogo, eu já aguentei os corvinais por anos! Esse Gray não duraria um dia nas terras áridas daqui, já vi tudo. 

—Romeo, presta atenção! - O setimanista deixou a goles cair quando quase foi acertado por um balaço vindo de trás. 

— Você supostamente deveria cobrir minha retaguarda! - Apontei para ele, sem dizer mais nada, mas ainda assim dizendo tudo: não ouse me dizer como fazer o meu trabalho! 

O ponto de empate dos americanos não foi nada impressionante quando comparado ao ponto que Sienna fez alguns minutos depois, a loira bonita interceptou uma goles rápida usando o protetor peitoral e praticamente deu para ouvir o slogan soando para os espectadores em casa: 

Protetores Dussel, a marca da vitória! 

O regulamento de vestes e equipamentos do campeonato era bastante liberal nesse ponto: contanto que não oferecesse nenhuma força, velocidade perigosa ou reflexos extras, podíamos usar praticamente de tudo! 

Os americanos tinham uma farda que parecia um daqueles macacões de motoqueiros na cor vinho e azul escuro e a única parte que se salvava do uniforme estranhamente colado no corpo era a bota de motocross, com suas três travas grafite. 

Roubarei uma para mim quando ninguém estiver olhando.  

Tá, não vou, mas o desejo continuará aqui no meu coração. 

Assim como Ilvermorny, Hogwarts optou por seguir uma linha diferente das capas com capuz negro de Uagadou. Usávamos um uniforme de fundo cinza com listras finas com as cores das quatro casas intercaladas. Era horrível, então ficamos muito felizes em adotar o exoesqueleto negro com um enorme brasão prata, em linhas finas, de Hogwarts fornecido pelas indústrias Dussel. 

Tirando o de Potter, que é feito de algum material nojento, Enrique roubou o coração de todo mundo com os nossos novos equipamentos. Ele fez o pai dele prometer dar uma vassoura nova da coleção dessa temporada deles pra cada um, caso a gente passe para as semifinais. 

Não abandonaria minha Twigg, mas uma Arrowy Misty 3.2 custa o preço de um rim e tem a melhor relação aerodinâmica versus força de arranque e eu adoraria por minhas mãos em uma, então, obrigado por me dar mais um sonho de consumo, Enrique. 

Mas voltando para a vida real, acabamos assumindo a vantagem do jogo, o que ficou claro nos primeiros minutos que aconteceria, apesar de Segundo estar irritado lá em seu aro com os 50 pontos feitos por Ilvermorny. 

Tínhamos acabado de chegar a 110 pontos e Weasley é, oficialmente, um fresco. 

—Abrimos uma boa vantagem, por que essa cara? – Cheguei perto o suficiente dele para ser ouvido, mas não encostei porque tinha que ficar perto do jogo. 

—Perdi todas as disputas diretas com aquele tal de Gray lá! – Revirei os olhos, arrumando a postura ao ver o dito cujo vir para cá. Connor enviou um balaço nele e resolveu a situação. 

Bom. 

—Está vendo? Estamos deixando ele sem ação, com os outros dois artilheiros você pode lidar! – Fred desceu de sua vassoura, apoiando o pé no aro esquerdo e abraçando o círculo branco de metal com um dos braços. 

—Eles caíram que nem patinhos na estratégia, nunca atacam o lado que eu deixo desprotegido, sempre tentam onde estou e eu sempre pego. 

Nós rimos da obviedade da criatividade de Ilvermorny. Eles tinham lances individuais incríveis, mas quando se adota o imprevisível como norteador, fica meio difícil coordenar o trabalho coletivo.  

—Mas não baixe a guarda, eles parecem estar notando o que estamos... – Não completei a frase, porque a torcida americana começou a vaiar algo e o replay projetado na grama mostrou o que: 

Connor havia sido bastante literal com o sábio conselho de Tony pré-jogo que se resumia a um “mete o pé!”. O jogador profissional John Ginns - primo dele e revelação da Grifinória há alguns anos - é quem tem esse estilo absurdo e um pouco inconsequente, que resulta em penalidades indesejadas para o time. 

Tony contaminou um ótimo batedor, que beleza. 

—Segundo, você tem trabalho a fazer. – Voei para longe, deixando o afro-ruivo rilhando os dentes, provavelmente xingando Connor por ter colocado ele de novo frente a frente com o melhor artilheiro de Ilvermorny em uma penalidade cavada. 

Como pessimismo é o caminho para o fracasso, lá estávamos agora na frente com 110 pontos e Ilvermorny com 60, se aproximando. Mas isso pouco importava, porque James havia avistado o pomo e a apanhadora americana também. 

—Merda... 

Voei rápido, realmente pensando em dar uma força para Potter- mesmo que o meu balaço estivesse lá do outro lado do campo sendo usado por Connor para desequilibrar o goleiro adversário - mas quer saber? Vou deixar James lidar com isso sozinho, está na hora dele crescer! 

Pena que Adelaide Martinez pensou diferente e mandou um foguete contra o nosso apanhador concentrado na jogada. Estávamos ambos, eu e ela, pajeando a disputa pelo pomo, então eu estava perto o suficiente dela para colocar meu bastão na frente do seu balaço rebatido com toda a força do mundo! 

A bola redonda e mortal pegou de jeito no meu bastão, voltando com tudo na barriga da garota e quase quebrando meu braço no processo. Deixei o meu amado companheiro de guerra cair pela primeira vez na vida, porque a vibração da pancada começou no punho e reverberou até o cotovelo. 

Merda, isso ia doer como o inferno depois! 

A quem eu estou enganando? Dói como o inferno agora, mas o jogo tem que continuar, então mergulhei para catar o bastão no gramado, mas nem precisava, porque a torcida de Hogwarts me avisou que o trabalho havia acabado. 

—Graças a Merlin, Potter! – Finalmente o imbecil fez jus à fama e salvou o dia. 

*** 

Na festa da vitória, o grifinório idiota correu para onde? Claro que ele se jogou em sua torcida e o leão holográfico quase conseguiu abocanha-lo, pena que era só um holograma. Iria parabenizá-lo depois, mas ao invés de descer ao gramado para comemorar com o restante do time e torcedores que já invadiam o campo, fui até a ala sonserina do estádio. 

Meus colegas também estavam orgulhosos do jogo, afinal, mesmo eu não aparecendo no telão com a jogada que sempre seria lembrada, o resultado da partida teve um toque de serpente e, para nós, isso era mais do que suficiente. 

Aceitei os cumprimentos efusivos dos meus companheiros de casa, mas tinha uma criaturinha que eu queria ver especificamente. Os cabelos ruivos de Pottinha se destacavam no mar verde e prata, essa sendo a ala menos colorida da torcida, então a puxei do meio de seus colegas animados. 

—Cesc, Cesc! Aí meu Merlin, você viu? James conseguiu! Ele conseguiu! -  Ela falou tão empolgada que eu não iria cortar seu barato dizendo que estava lá quando aconteceu, até porque não vi o lance mesmo. 

—Vem, vou te levar para a terra dos leões para comemorar! – Ela não parecia ter entendido, então a puxei pela manga das vestes até a borda da arquibancada.– Vamos. 

Montei na vassoura e Lily finalmente entendeu o que eu quis dizer. Ela usou meu pé como apoio para montar atrás de mim e antes que a ruivinha começasse com seu interminável “Obrigada, obrigada, obrigada”, mergulhei bruscamente, a fazendo gritar. 

Eu quis gritar também, mas no meu caso não era de excitação e sim porque meu pulso estava doendo. 

Depois de dar uma volta completa pelo estádio, que foi em parte exibida no telão, já que o gramado estava tomado agora por malucos, levei Lily até onde o seu irmão e primos celebravam a vitória com uma certa dose de histeria. 

Lily desceu estabanada e pulou nas costas de Sev, mas depois foi abraçar James, que finalmente me avistou parado na vassoura, com um dos pés na amurada de seu território. Fiz um cumprimento ao estilo militar com a mão boa, recebendo um sorriso seu em retorno. 

Bom trabalho, garoto estranho. 


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Notas finais do capítulo

That's all, folks!

Bjuxxx