Hogwarts: uma outra história escrita por LC_Pena


Capítulo 105
Capítulo 105. Vivendo de passado


Notas iniciais do capítulo

Era para ter saído no domingo, mas eu acabei me passando.



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Capítulo 105.

Juliet olhava brava para mim e para Tony, mas até mesmo Rose e Scorp estavam tendo que disfarçar a risada com o último candidato na audição do próximo espetáculo de Hogwarts. Nós quatro estávamos junto com a equipe oficial do clube de teatro, contribuindo para a escolha do restante da equipe.

— Olha aqui, se vocês não pararem com isso de uma vez, vocês serão expulsos! - Ela rosnou brava e Rose resolveu tomar a frente para nos defender.

— Eu ainda não entendi porque você os convidou, quero dizer, eu vou escrever sobre isso no jornal, mas esses três? Não tinha como dar certo... - Ela falou ainda rindo e nós três a olhamos ofendidos. Poxa, Rose, era para você nos defender!

— Eu convidei eles porque eles me devem um favor e são o que nós chamamos de mínimo denominador comum da comunidade. - Juliet pontuou pomposa e aumentou mais um pouco a ofensa. 

— Está nos chamando de burros? - Falei irritado, quero dizer, eu larguei a escolinha nas mãos cruéis de Enrique nas vésperas de um grande jogo para poder está aqui e é assim que ela me trata?

— Estou chamando vocês de sonserinos típicos, se vocês não gostarem da peça, vão fazer da minha vida um inferno... - Ela nos olhou por cima do seus óculos “de diretora” sem utilidade saídos da mesma ótica dos “óculos responsáveis de adulto” de Enrique. – E vocês estão me devendo um favor, claro.

— Isso é verdade, as duas coisas são... - Tony disse sincero, mesmo sob o olhar levemente repreendedor da namorada. – Mas dá pra você esclarecer sobre o que é essa peça? A gente nem sabe o que estamos procurando nos atores!

— É sobre o incidente de Ilfacombre de 1932, Tony, o que há para saber? - Scorp resmungou desdenhoso, mas Rose respondeu no lugar.

— Olha, na verdade eu estive olhando os apontamentos que você nos entregou, Juliet, e tem alguns personagens que eu não sei quem são... - Rose pegou o pergaminho entregue pela chefe do grupo, cheio de rabiscos, enquanto o meu tinha desenhos maldosos de alguns candidatos e o de Tony estava faltando alguns pedaços, perdidos em uma guerra de bolinhas de papel contra Scorp.

A garota de cabelos repicados a lá Grifinória olhou para Rose com seriedade, depois fez uma troca olhares com sua equipe e por fim, nos olhou com aquela expressão de superioridade que tinha aperfeiçoado com os anos nas nossas Masmorras.

— Ok, contarei a vocês um pouquinho da história da peça, começando pelo primeiro ato. - Juliet fez sinal para Fortescue parar a entrada dos candidatos na sala e depois virou de volta para gente, subindo na sua cadeira. Agora sim ela atingiu uma altura decente. – Efeitos sonoros, por favor.

Os dois garotos que estavam sentados ao lado da melhor amiga da quintanista maluca começaram a fazer um beat box estranho, até que o ritmo se tornou uma batida levemente animada e misteriosa e Juliet passou a balançar os quadris acompanhando a melodia.

Ela respirou fundo, como se tivesse encarnando a personagem. Deuses, essa garota é um espetáculo em forma de ser humano. Começou a história como se falasse para uma audiência de mil pessoas. 

Eu revirei os olhos, claro, mas me mantive educadamente calado.

“ Na elegante década de 10, no distante País de Gales, eis que um prodigioso comerciante resolve abandonar toda a sua respeitabilidade no mundo bruxo ao se casar com uma trouxa completamente ignorante dos cânones da magia.

Dessa relação nasceu uma adorável garotinha, que viria a se tornar uma jovem dama bem versada nas artes da feitiçaria, seguindo os ensinamentos deixados no mundo pela grande feiticeira Cliodne!

De retorno ao seu lar para cuidar de seu pai viúvo, essa garotinha, agora uma mulher, descobre que o homem falecera há alguns dias e que seus irmãos caçulas padeceriam de fome, se não cumprissem o contrato com o lorde mais rico daquelas bandas: seu honrado pai, outrora um nobre comerciante de artigos raros e colecionáveis,  tinha passado a ser um simples desgnomizador de jardim, uma profissão honesta, mas com pouco prestígio, como bem sabemos.

A jovem, que sempre fora muito prática, pegou seu orgulho, seus irmãos e conhecimentos de magia e desgnomizou os jardins do lorde antes da grande festa de aniversário de seu primogênito e herdeiro, que era o orgulho do bruxo.

Ela sempre fizera o que tinha que ser feito e dessa vez não seria diferente.

No final do trabalho, um pouco antes da festa, a jovem feiticeira exigiu o pagamento que salvaria seus irmãos da eminente miséria, mas o lorde riu dela e disse que se a mocinha não podia arcar com os compromissos do pai, não devia ter aspirado uma soma tão alta.”

Juliet agora olhava desdenhosa para cada um de nós, seguindo o ritmo da batida de seus colegas de teatro, que havia ficado mais e mais rápido, nos colocando em uma atmosfera de indignação pela injustiça cometida contra a garota.

— “Como assim não sou capaz de arcar com os compromissos de meu pai? Veja teu jardim, meu senhor! Está limpo, como o prometido!” - Bem, sim! Nem podia ver o jardim, mas a feiticeira, ou melhor, Juliet falou com tanta convicção, que não pudemos duvidar da afirmação. A expressão da quintanista voltou a ser a desdenhosa do velho. – “ Bem, minha cara mocinha, um acordo de serviço começa com as palavras trocadas por cavalheiros, a senhorita nem sequer falou comigo sobre o serviço, não tenho obrigação de pagar-lhe um nada!”

“ A feiticeira o olhava espantada, como assim o nobre lorde não arcaria com o compromisso firmado anteriormente com seu pai? O velho homem riu no alto de sua superioridade: ‘Palavras, criança, é disso que são feitos os acordos entre cavalheiros e foi isso que faltou a ti: a uma mocinha de sangue-ruim falta a força da palavra de um homem puro-sangue em um acordo.’

Ele se riu da ironia do que havia dito, já que ele havia falhado com a sua palavra, mas na boa sociedade, a palavra dele era lei. A mulher o olhou voltar para sua grande mansão para abraçar com orgulho seu filho forte e saudável. Olhou para o jardim limpo e para seus irmãos magricelas, com o olhar de crianças assustadas.”

Juliet parou e mirou o horizonte com um olhar de ódio injustiçado tão profundo, que temi por aquele que ficasse na mira desse olhar. Ela finalizou seu monólogo com a frase final da jovem bruxa, a trilha sonora ficando baixa e misteriosa.

— ‘Verá o poder que a palavra de uma feiticeira poderosa tem, meu senhor!’- Juliet fez novamente aquele gesto de quem voltava para o próprio corpo e nós ainda a olhávamos meio assustados. – Fim do primeiro ato. 

Batemos palmas calorosas, porque Juliet Bertrand em toda a sua loucura havia interpretado o resumo do primeiro ato de sua peça, fazendo dois personagens de um jeito que prendeu a nossa atenção completamente.

Sabíamos que haveria vários atores em cena e que a desgnomização provavelmente envolveria um sem fim de figurantes e alguns feitiços e efeitos divertidos, mas para um resumo, a mensagem principal do primeiro ato havia sido passada com maestria pela nossa colega de casa arrogante.

— Maravilhosa! - Tony exclamou empolgado, mas Rose apenas deu um olhar divertido para ele, antes de falar com a quintanista da Sonserina.

— Certo, isso foi incrível, mas onde se encaixa essa parte da história no Incidente de Ilfacombre? - Olhei sem paciência para Rose, claro que uma chata como ela iria colocar gosto ruim nas coisas.

— Bem, deveria ter ficado subentendido para vocês, o que será revelado apenas no fim do segundo ato: a feiticeira vai transformar o jovem filho do lorde em um dragão verde galês! - Ela falou com simplicidade e eu abri minha boca, impressionado.

— Isso aconteceu de verdade? Porque eu tenho quase certeza que o dragão que caiu naquela praia em Denver era um dragão... - Juliet voltou a se sentar com um sorriso charmoso. Apoiou o queixo no espaldar da cadeira de diretora para responder a Scorp.

— Não, isso foi um acréscimo nosso, alguns aqui acharam que precisávamos encaixar um romance em alguma parte, porque a história de uma mulher forte ganhando uma ordem de Merlin não era boa o suficiente. - Ela deu de ombros com um sorriso irônico, deixando Rose indignada.

— E acha que um romance entre esse... Esse dragão galês e quem? Tilly? Acha que um romance entre ele e Tilly será mais interessante do que a história de uma das mulheres mais influentes do último século? - A ruiva estava brava e Juliet olhou com uma falsa compaixão. 

— Nunca disse que o romance será entre o dragão e Tilly... - Ela falou inocentemente.

— Entre quem então? O dragão e a feiticeira? Pior ainda, irá tirar o protagonismo da verdadeira heroína do Incidente de Ilfacombre! - Rose estava bastante irritada e o resto de nós apenas assistia aquela interação com curiosidade.

— Também não disse isso... - Juliet sorriu enigmática e eu dei uma gargalhada, finalmente entendendo onde ela queria chegar com isso. Rose me olhou sem entender.

— Ela vai colocar as feiticeiras para terminarem a peça juntas. - Falei divertido, fazendo Tony e Scorp olharem impressionados para Juliet Bertrand e seu pioneirismo. Rose olhou curiosa para a garota.

— Você vai mesmo fazer isso? - Rose perguntou chocada. Juliet piscou docemente e fez sinal para que Fortescue voltasse a trazer os candidatos da audição. 

— Eu não, querida, quem vai fazer é a Arte! - Riu malignamente, depois se virou para frente para cumprimentar o garoto que acabara de chegar para fazer seu monólogo. – Ok, querido, me diga seu nome, ano escolar e para qual papel você fará o teste.

Olhei para Tony, Scorp e Rose me controlando para não rir de nervoso. Essa peça do mais novo grupo de teatro de Hogwarts vai dar muito o que falar, já estou vendo tudo. Ainda bem que Brenam não é mais o diretor da escola...

***

Me encontrei com Enrique em seu quarto dividido com Potter e ele estava terminando de aplicar alguns feitiços curativos nos dedos. Franzi o cenho para isso, meu Merlin, o que ele havia feito?

— Enrique, por favor, me diga que machucou as mãos, eu sei lá, caindo da vassoura! - Pedi encarecidamente e ele apenas me encarou com seu melhor sorriso “inocente”, depois deu de ombros assim que viu que eu não cai nessa.

Enrique Dussel inocente? Não nessa vida!

— O que eu posso dizer? Sabia que seus alunos são muito indisciplinados? - Me sentei assustado, sentindo meus órgãos gelarem de medo. Meu Merlin, Enrique bateu nas crianças! Socorro, vou ser processado! – Tive que quebrar a cara de alguns, mas relaxa, Marco eu conheço desde a época que ele ainda usava fraldas e Lily...

— Por Salazar, Enrique! Você bateu em Lily? - Eu perguntei horrorizado e ele me olhou como se eu tivesse sido possuído por um espírito ruim.

— Quem bateu em Lily? - James entrou feito uma fúria no quarto, mas Enrique apenas o imobilizou com um aceno de varinha.

— Ninguém bateu na Potter fêmea, eu só ia dizer que ela é uma apanhadora mais decente que o irmão mais velho dela aqui. - Ele riu daquele jeito entojado dele e eu respirei aliviado, todo mundo sabe que eu não posso receber outro processo nas costas. –  Eu não bato em garotas, a menos que elas me peçam com jeitinho...

Olha, mas que traste e ainda tem coragem de me dizer isso com um sorrisinho malicioso.

— Ok, vamos cortar esse papo sem futuro, que... Solta James, Enrique, ele não vai fazer nada contra você, não é, James? - O olhar do grifinório congelado não parecia muito simpático e não é como se Enrique me obedecesse de qualquer jeito, então dei de ombros pra isso. – Mas e então, como foi o treino com a escolinha? Acha que eles estão preparados?

Meu namorado começou a se despir dos equipamentos de treino e eu voltei a me sentar na cama, já James... Continuou congelado onde estava, fazer o quê? Tenho certeza que ele e Enrique irão entrar em algum entendimento mais tarde ou ao menos morrerão tentando. 

— Na verdade eles são bons! - Ele falou surpreso e eu ri, porque é claro que são! Não estaria perdendo meu tempo, se fossem um bando de lesmas mucosas. –  E no fim das contas eu encontrei um meio termo com Longbotton e vamos jogar com direito a substituições, o jogo ficará mais divertido assim.

— Como é que é,  criatura? Você e Longbotton o quê? - Levantei querendo apertar o pescoço dele, mas o sem noção apenas colocou as mãos na cintura, já sem camisa. Ele parecia indignado e eu quis matá-lo mais ainda!

Não faz nada sem transformar tudo no show do Dussel, essa peste goguenta!

—  Você devia me agradecer, mas não vai, então: de nada, garotinho!  Sabe o quanto seria ruim para sua escola se no dia da formatura alguns dos alunos ficassem de fora do jogo final? - Ele me perguntou como se fosse um ser humano razoável e eu apenas revirei os olhos. – É o dia da formatura deles e eles terão toda a pompa e circunstância! E você não terá que se preocupar com nada, eu e Longbotton seremos os técnicos e cuidaremos das trocas.

— Que trocas? A seleção só vai ter James de apanhador, Scorp de goleiro, já que Fred ainda não está 100% e os batedores serão Connor e O'Brien, porque Tony vai me ajudar na organização.  - Enrique cruzou os braços para os meus ótimos argumentos.

— Realmente não temos nada a fazer quanto a James, ele é uma tragédia e vai ter que jogar, a propósito: Finiti Incantate! - Ele disse tardiamente, liberando o grifinório de sua prisão. – Mas Fred disse que pode jogar meia partida sim e o principal objetivo de Longbotton é dar tempo de jogo aos artilheiros, então está tudo certo.

— Parece que decidiram tudo sem mim, não é? - James havia sentado do meu lado e olhava Enrique com a mesma indignação que eu. Parecia que o grifinório estava planejando uma morte bem elaborada para o meu namorado, mas Enrique estava indiferente a tudo.

— Não é como se você não tivesse feito a mesma coisa com esse negócio de marcar o jogo sem avisar a ninguém, garotinho. -Ele falou irônico e eu olhei para James como quem diz “olha a cara de pau da criatura!”, mas ele estava apenas tentando reestabelecer a circulação em suas mãos, coitado.

— Por que todo mundo continua me dizendo isso? Eu cortei 20 horas de trabalho comunitário da minha lista, vocês não podem apenas ficar felizes por mim não? - Levantei chateado e ok, dei risada quando Enrique tentou me agarrar, mas eu ainda estava muito chateado com ele.

— E o meu pagamento? - Ele perguntou rindo também, até que eu o ameacei com a varinha. Ele levantou uma sobrancelha questionadora.

— Seu pagamento é esse aqui. - Apontei para um James sentado com cara feia na cama e depois terminei meu discurso com um sorriso, enquanto abria a porta do quarto. – Mas durmam cedo, porque amanhã temos um dia longo pela frente. Boa noite, garotos.

Sai do quarto largando os dois lá, bem certo de que ao menos um estaria vivo amanhã pela manhã e isso até que não é de todo ruim, quero dizer, eu só preciso de um apanhador para a final, não é assim?

***

Ok, eram quase onze horas, fim da noite anterior ao tão esperado - brevemente, eu sei - jogo entre a escolinha para crianças que não jogam bem e que não fazem outras coisas bem também e a mal-falada finalista do campeonato intercolegial. Enquanto o mundo bruxo aguardava a partida entre Durmstrang e Uagadou no final do mês de abril, eu aguardava um evento muito mais importante.

Terminei de conferir toda a minha adorável lista de afazeres para um jogo não-oficial nos territórios de Hogwarts e no fim das contas, era impressionante o quão longa ela era. Os preparativos estavam encerrados, a estrutura final do estádio havia sido concluída antes do jantar e até mesmo os professores pareciam animados com o dia de amanhã. 

Me recostei no sofá, ao lado de um Enrique aparentemente ileso, muito satisfeito com o rumo da minha vida agora.

— Um golpe de mestre essa homenagem a dona Minervina antes do jogo, Scorp. - Falei observando o pergaminho de atividades que estavam sob a incumbência de John. Devo ou não ligar para ele? A criatura ao meu lado começou a brincar com a mão nas minhas costas, por baixo da camisa.

— Dona Miner... Ah, sim, a diretora McGonagall. - Scorp respondeu, saindo da sua própria lista. Sorriu para mim. – Achei que todos ficariam mais colaborativos com a sua ideia de última hora, se soubessem que havia sido pensada por uma causa nobre.

— Não há absolutamente nada de nobre nas causas de Cesc, mas eu até hoje me impressiono como ele faz parecer que sim. - Enrique falou carinhoso e eu retribui o elogio com uma piscada agradecida.

Já dizia minha amada monstra Rebeca: “Cesc é especialista em distorcer o certo e o errado com um sorriso no rosto!”

— Fez isso pelas criaturas mágicas hospitalizadas, pela volta da diretora, como uma compensação pela falta de campeonato interno, pela formatura dos alunos dele... - Tony falou inexpressivo e depois finalizou com um tom conclusivo e sarcástico. – Mas nenhum desses motivos é o verdadeiro.

Meu Deus, que Tony lamuriento do caralho!

— Você assumiu a personalidade de Scorp agora? Porque na minha ficha de registro mental, se não vejamos... - Fingi puxar uma gaveta de arquivo, procurar entre as milhares de pastas, puxar a que eu queria e finalmente ler as informações arquivadas. – Sim, estou certo: Tony não é o pessimista do grupo, esse seria Scorp.

O aludido me olhou enfezado e eu fechei a minha pasta imaginária com um sorriso. Enrique me puxou para um abraço de lado e eu tive que me ajustar a sua postura largada no sofá. 

— E qual seria esse objetivo escuso, que colocou toda a escola em polvorosa? - Meu namorado falou tão junto da minha orelha, que me fez um pouco de cócegas, ri, tentando fugir dele, mas ele não deixou.

— Cesc foi informado por uma caixa de música misteriosa de Uagadou que algo aconteceria em cinco dias. - Tony respondeu desagradável, tenho certeza que só porque não foi ele que planejou tudo, essa sendo a função dele no esquadrão classe T de Troll. – Acreditamos que ela possa prever o futuro.

— A caixinha, que pode ou não prever o futuro, disse “cinco dias”, ela não disse que “algo” aconteceria, você está colocando suas opiniões pessoais a frente dos fatos, Tony! - Falei acusador e depois dei um sorriso amarelo para Enrique, que agora me encarava com uma sobrancelha arqueada. – Não foi nada demais, quais as chances de algo grandioso acontecer tão pouco tempo depois do djinn?

— E se ainda for o djinn? - Enrique me perguntou sério e eu xinguei Tony mentalmente. Pra quê causar tanto, Tony? – Vou mandar uma mensagem para meus irmãos checarem como vão as coisas com Erick, se ele estiver prestes a se soltar ou...

— Você não disse que ele ficaria sob a guarda dos aurores e que estava completamente isolado? - Scorp perguntou, levemente alarmado e Enrique deu de ombros.

— Ele está, mas obviamente o caso ganhou contornos complicados, porque teoricamente os crimes dele e de Váli já prescreveram e ele fez tudo que fez com Salem e Uagadou sob a influência dos encantamentos de sua punição e pedidos de seu mestre. - Olhei para Enrique sério, porque ele não havia me dito nada disso. – Mas você não tem com o que se preocupar, Cesc, sua punição foi dada e todos acham que é mais do que suficiente.

— Isso significa dizer que, sem crimes, Erick vai ser libertado? - Tony perguntou sem mostrar nenhuma entonação na voz, mas depois me olhou com uma cara de poucos amigos. – Por acaso será amanhã? 

— Não, levará pelo menos um par de meses até que se consiga definir o quanto de liberdade ele terá, quero dizer, ele não tem mais toda a magia da lâmpada, mas Erick tem muito conhecimento... - Enrique parou de falar, meio pensativo. – E conhecimento é poder.

Que filosófico.

— Mas ele não tem mais aquele poder todo de, você sabe, destruir escolas e mexer com as linhas do tempo, né? - Scorp perguntou a qualquer um que pudesse responder, mas Enrique fez as honras de novo, já que era o mais informado sobre o destino de Erick.

— Ele sabe como fazer e eventualmente aquela coleira vai ser retirada. - Olhei nervoso para Enrique, que me devolveu um sorriso tranquilo. – Tudo o que pode ser feito agora é garantir que Erick use seus conhecimentos para coisas produtivas, tipo no Departamento de Mistérios ou até mesmo em Alexandria... Hector adoraria tê-lo conosco, mas ninguém vai deixar um trunfo desses na mão de uma empresa particular. 

— Isso é meio absurdo, no fim das contas, Erick é uma pessoa, ele deveria poder dizer algo sobre isso, não? - Tony falou incomodado e antes que eu pudesse taxá-lo de idiota - porque o djinn é tudo, menos ‘uma pessoa’  - ele completou.  – Se colocarem ele em um lugar que ele deteste, eventualmente ele vai planejar algo para escapar, quero dizer, conhecimento e paciência ele tem, isso para não dizer coragem.

— Ele é perigoso, não importa onde esteja, mas tenho que concorda com você, Tony, o melhor é dar a ele o que ele quer logo, porque ele vai acabar conseguindo de qualquer forma... Só que agora ele é mortal, não consigo vê-lo desperdiçando muito tempo. - Falei voltando a sentir aquela sensação de que tinha que lidar com algo muito mais forte do que eu. – Ele fica ainda pior quando está impaciente, posso garantir.

— Fico feliz de saber que não namoro apenas um rostinho bonito, mas devo dizer a todos, que vocês não tem mais com o que se preocupar, Erick é de carne e osso como nós e parece estar sofrendo os efeitos disso na pele. - Olhei para Enrique, sem entender, mas a entrada de Lia e Sienna no salão comunal do time, interrompeu meus pensamentos.

Esperei as duas entrarem em seu quarto, ambas animadas - Lia até me deu uma piscada coquete - já que todos vão jogar amanhã e elas não precisam mais ser rivais. Assim que a porta se fechou, voltei a olhar para Enrique.

— Que efeitos Erick está sofrendo? - Perguntei realmente interessado.

— A mente dele é algo espantoso, ele parece se lembrar de tudo que viu, leu e viveu nos últimos milênios! Dá para acreditar? Milênios! Isso para uma mente humana seria mortal, quero dizer, as memórias sobrecarregariam tudo e a pessoa não conseguiria lembrar de mais nada! - Enrique falou, parecendo fascinado com a ideia. – Seria como um cálice de água cheio, transbordando sem parar!

— Bem, realmente, ninguém se lembra de tudo o que acontece, na verdade, tem coisas que fogem da memória assim que a gente aprende. - Tony falou por experiência própria, nossas aulas de poções estão aí para provar isso! Sorri para ele, entendendo o ponto. – Como Erick consegue manter isso tudo na sua mente humana?

— Esse é um dos mistérios que estão influenciando na decisão do que fazer com ele, a mente de Erick é extraordinária e os olhos amarelos mostram o quanto ele está longe de ser um simples humano, mas o corpo dele tem sofrido um pouco. - Enrique falou e fechou os olhos, como se isso encerrasse o assunto, eu o sacodi para ele continuar.

— Erick está sofrendo com o quê, criatura? Não pode acabar a história assim! - Falei indignado, mas passado o susto inicial com minha sacodida, o filho da mãe voltou a fechar os olhos, com um sorriso divertido. 

— Ele tem tido problemas com a comida, nem tudo faz bem para ele, porque o corpo dele é antigo, de um lugar diferente, então ele parece um bebê comendo, faz careta e passa mal com qualquer coisa mais forte. - Ele falou divertido e eu sorri um pouco, mas no fim das contas, estou com pena.

Juro, estou com pena de Erick, com comida não se brinca.

— Talvez não tenha sido uma boa ideia voltar para o corpo que ele tinha antes, você foi meio cruel no seu pedido, Cesc! - Scorp me acusou e eu o olhei ofendido.

— Eu não sabia que isso iria acontecer, eu pedi para ele ser um bruxo normal e não para que ele voltasse para sua forma antiga, ele que fez isso a si mesmo! - Me defendi e olhei para Enrique, procurando por apoio. – Ele que não pensou nas consequências e acha que nada muda, que todos os humanos são iguais! Bem, coitado dele, descobriu da pior maneira a bomba que um McDonald’s pode ser em um estômago fraco, os americanos são verdadeiros terroristas! 

Tony riu e Scorp maneou a cabeça negativamente, mas ele tinha achado divertido meu comentário, estava franzindo o nariz para não rir. Enrique revirou os olhos, com um quase sorriso no rosto.

— Mas essa nem é a parte mais triste: ele fica confuso com a passagem do tempo. - Enrique falou, tendo voltado a fechar os olhos. O sacodi para ele deixar de ser besta. – Tem um relógio enorme no quarto dele, mas Erick continua dizendo que a gente acabou de sair, fica irritado porque não o deixam dormir e acusa todo mundo de ficar entrando e saindo do lugar a toda hora.

— Como assim? A vida está passando acelerada para ele? Isso sim seria uma punição cruel do destino, quero dizer, ele é mortal agora, se tudo passar rápido demais, vai acabar antes mesmo que ele tenha vivido! - Scorp falou triste, me fazendo olhar para ele com uma careta. Qual é? Vai ficar com peninha do cara que fez da minha vida um inferno agora?

— O tempo está normal, mas a percepção dele está quebrada. Ele acha que horas são minutos e fica irritado, porque, por mais que a gente diga que ele ficou sozinho por tempo suficiente, ele não acredita. - Enrique suspirou, como se também estivesse chateado com isso. – Váli tem nos infernizado para ajudá-la a tirá-lo das mãos dos aurores, porque ela não passa por isso, mesmo sendo velha como ele e quer ver se consegue ensinar a lidar com a passagem dos dias de uma maneira melhor.

— Ele deve estar com um humor do cão, com fome e meio perdido...- Falei simpático ao seu sofrimento, apesar de não ter notado nada disso quando ele estava me infernizando naquela conversa de vilão maligno se gabando. – Tem algo que possa ser feito para reverter isso?

— A situação da comida está se resolvendo por si só na base da tentativa e erro, Erick se recusa a tomar poções, mas o negócio do tempo... - Enrique deu de ombros. – Só se apagassem a memória dele, mas ele também não concorda com isso.

— E por que apagar a memória resolveria o problema? - Falei irritado com essa lógica fredística que todo mundo pareceu entender, menos eu.

— Porque a mente humana é assim, quando você é velho, coisas que aconteceram a vinte anos atrás parecem que foi ontem, enquanto para os jovens é muito tempo. - Enrique me olhou sério e eu franzi o cenho de leve, tentando ver a lógica. – Apagando a memória dele, seria uma forma de rejuvenesce-la. Mas ele não quer.

Ok, eu tenho gente velha na família e até mesmo meus pais ficam surpresos quando descobrem que um filme já tem mais de 10 anos ou que a última vez que foram no restaurante de um grande amigo deles foi há dois anos. Meu avô então... Consegue lembrar de coisas que fez quando tinha a minha idade e fala como se tivesse sido mês passado.

A mente humana envelhece de um jeito estranho.

— E se apagar somente algumas coisas? Só o que ele não precisa para viver? Talvez ajude... - Scorp falou como se realmente quisesse fazer a vida de Erick uma coisa bonita de ser vivida. O olhei com impaciência, porque ele vai se acostumar ou encontrar um jeito de lidar com isso sozinho, não precisa da gente chorando por ele!

— Isso funcionaria se ele fosse um de nós, mas Erick é diferente, suas memórias são o que fazem ele ser ele e nem mesmo a lâmpada conseguiu lhe tirar isso, ele não permitiria voluntariamente essa atrocidade. - Levantei a sobrancelha para esse discursinho cheio de conhecimento de causa de Enrique. – Ele me disse isso pessoalmente.

— E vocês tem conversado muito? - Perguntei querendo soar normal, mas saiu algo atravessado, o que fez ele me olhar com paciência. 

— Falei só uma vez, assim como você. Tem sido uns dias cheios pra ele, Erick tem conversado com Heitor, com Jweek e até ficou alguns minutos com Hector e Hermione Weasley, mas no mais ele fica calado. - Enrique deu de ombros. –  Ele se recusa a falar com os aurores, até mesmo com Váli, mas acho que eles não precisam falar para se comunicar.

— Ok, isso tudo é muito interessante e eu sei que ele é uma espécie de tio para você, Cesc, mas a gente tá perdendo o ponto: se não é sobre o djinn e se não é sobre Hogwarts, o que o “cinco dias” da caixinha de música significa? - Tony perguntou, exasperado.

— Descobriremos amanhã, independente do que seja e eu realmente espero que seja algo bom. - Falei otimista e me levantei para ir para o quarto, porque precisava estar descansado para o dia de amanhã. – Afinal, foi para isso que trabalhamos tanto, não? 

Deixei os três olhando pensativos espalhados pelas poltronas da sala comunal da seleção, já que todo mundo havia ido dormir. O que mais tinha para ser dito? O que mais há para ser feito?

Bem, que venha o quinto dia...


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Notas finais do capítulo

Ai, Lara lesada, cadê esse jogo q não vem? Vem sim, próximo capítulo, juro.

Bjuxxx