Elandrik escrita por NM


Capítulo 7
Ann Lu


Notas iniciais do capítulo

Eaí, gente!!
Espero que gostem do capítulo ;)



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17.09.2099 23h00min

Aqueles fios descalços cortavam o céu em pedaços irregulares de negritude. A noite era sem estrelas, porém a lua alta teimava em brilhar no céu, mais solitária que nunca.

As luzes multicoloridas da cidade alcançavam até mesmo aquele ponto, não tão próximo ao centro, onde os LEDs não alcançavam tal magnitude. As luzes das faixadas já não eram tão sublimes, tornando a área um local pouco atrativo, mas ainda assim interessante.

Aquele devia ser o local perfeito.

Uma porta de entrada para os aquém da sociedade, um esconderijo para os viciados, um ganha pão aos mais miseráveis. Talvez fossem essas as características que a guiaram até ali.

De longe, avistou belas garotas exibindo-se como numa vitrine em que a mercadoria em questão denominava-se prazer. Homens passavam e entravam, sem resistir a um único gole daquele coquetel barato.

Como uma mulher conseguia se sujeitar àquilo?

Dando passos confiantes encarnou quase que uma entidade, de forma a tomar um papel contrário a seus valores. Era como um teatro, onde o improviso guiava cenas imprevisíveis.

Sentiu o suor percorrer sua espinha.

Seus quadris moveram-se de um lado a outro, mudando trejeitos e trazendo à tona uma natureza felina. Aquela pessoa não era ninguém senão Luxcy.

Cumprimentando as garotas na porta e adentrou em um ambiente à meia luz. Gelo seco nublou seus passos, trazendo-a a sensação de que não pisava em chão algum, a música em som ambiente esquentava o espírito com uma suavidade excitante, lembrando aos presentes que não havia vida se não havia prazer. Mulheres mostravam-se e esfregavam com seus polly dances e usavam suas melhores táticas, os homens arrepiavam a nuca, cediam o ouro, compravam o tesouro.

O objetivo ali era vender-se.

Luxcy rodou o lugar.

Passou os olhos pelas mais diversas garotas que pôde avistar, nenhuma delas era a que desejava encontrar. Viu fêmeas irem e virem, das mais variadas idades, dos mais variados tamanhos, com os mais diversos homens e seus mais diversos semblantes.

Avançavam nos mais tímicos como urubus em carne podre, assanhavam-se e paqueravam, e não deixavam de lado os mais ousados. Para cada qual havia uma tática.

Rapazes olhavam e escolhiam e tinham sua atenção chamada para a mulher e seu cabelo rosa em um Chanel clássico, pernas torneadas e um metro e setenta. A mesma quase esquecia-se de sua atual situação e, por diversos momentos, sentia-se desconfortável com aqueles olhares pedintes.

Aproximou-se do bar, a fim de tomar um drink e relaxar, fez o pedido e logo viu-se surpreendida por um homem no auge de seus quarenta anos. Com ar inquisidor ele a olhou de cima a baixo sem soltar seu braço um instante sequer.

— E você!?

— Você tá me machucando! -- reclamou

— Não tô te reconhecendo...

Ann Lu tentou se desvencilhar do homem, em vão.

— Quem é você?

— Deck. Um nome que devia conhecer muito bem.

Soltou-a. Aquela pobre coitada estava encurralada.

— E você, quem é?

— Eu... Luxcy... Eu sou nova aqui!! — tentava desvencilhar-se.

— Impossível, não tem como uma garota ‘entra’ aqui sem ‘passa’ pela minha avaliação.

Ann Lu ficou sem reação.

— Mas eu... Eu tava justamente te procurando. Eu...

Deck avaliou-a bem. Não era de se jogar fora. Seu linguajar era livre de vícios das favelas, o que explicava aquela terrível confusão.

Olhou-a novamente.

Examinou sinais de olheiras, tipo físico e constatou que uma drogada desesperada a ponto de se prostituir não estaria naquela situação.

“Essa mulheres...” foi o que pensou.

Estava a anos no ramo e constatou o que muitos outros, com mais ou menos experiência, não muito demoraram a constatar.

Mulheres. Uma mercadoria?

Não, um mistério.

Coçando o cavanhaque bem feito, o homem corpulento sorriu.

— Bem...

Olhou em volta.

Um movimento além do normal chamou a atenção de ambos.

Quando uma jovem com pouco mais que vinte anos aproximou-se, Deck percebeu que descobriria em breve o causador de tal assombro.

— Chefe, você tem que vir! Uma das garotas foi encontrada desacordada no beco!!

“Ah, então ele é o chefe...”

Esquecendo-se da conversa anterior, Deck levou o charuto à boca e foi atrás da jovem. Tudo o que pensava era em praguejar contra os trombadinhas da vez.

***

Coberta por um casaco dez números maiores, Keth viu-se despertando em um colchão fino e desconfortável. Estava assustada.

Ao olhar em volta, deparou-se com duas amigas aparentemente preocupadas, reparou em Deck e seu semblante inquisidor um pouco mais afastado.

O homem pôde observar que, por mais que aparentasse calma, a prostituta mostrava-se atenta à qualquer novo ataque. “Reflexos de quem acabou de passar por um enorme susto” pensou.

Não era hora de cobri-la com indagações, sabia que na hora certa as palav...

— Elandrik... — foi o que disse, respondendo uma pergunta imaginária que pairava no ar.

Todos na sala, preocupados demais com a integridade da vítima, surpreenderam-se ao ouvir um nome conhecido.

— Elandrik apareceu! – sua voz tremulava — Ela ’tava’... Diferente. Ela me ‘ataco’!

Deck observou. Tudo o que fez foi tragar seu charuto e tentar encontrar algum nexo nas frases proferidas.

Elandrik?

A garota sumira a dias... Ele ousava dizer que fora vítima de um reles golpe. Dera chance à garota e a mesma voara junto com seu dinheiro.

E ele... Achando que a empreitada não passava de um investimento!

Parecia até piada.

Elandrik tinha talento. Tinha porte. Era inteligente.

Uma Mulher com “M” maiúsculo.Uma garota de ouro.

Que, aparentemente, dera-lhe uma rasteira.

Soltando uma nuvem de fumaça no ar, chegou à conclusão de que as perguntas não poderiam ser deixadas para depois.

***

Ann Lu não pôde resistir, aquela série de acontecimentos só serviu-lhe para atiçar sua sede. A conversa, que rolava do outro lado daquelas paredes, deixava sussurros inaudíveis que colocavam em dúvida se valia à pena, realmente, analisar aquela pauta.

Suspirou.

Só percebeu que baixara a guarda instantes depois, quando viu uma porta abrir-se. Num movimento rápido tentou disfarçou, em vão.

— Cê ainda tá aqui!? – Indagou incrédulo.

— Err... Eu... – Olhou as moças que se afastavam ajudando a colega assustada.

—Tô falando com você! – Parecia irritado.

As três não se abalaram, seguiram seu caminho até uma curva no corredor.

Quando ouviu as vozes já quase inaudíveis deixarem de alcançar seus ouvidos, pensou que talvez fosse aquela a hora de pôr toda a operação em risco. Colocando as mãos para trás, puxou uma pistola tão pequena quanto pesada e num rápido movimento apontou-a para o homem corpulento à sua frente. Deck continuou parado, encarava-a friamente, o suor escorrendo lhe pela testa.

— Eu devia ter adivinhado – disse com determinada frieza.

— Calado, senão eu atiro! – Ann Lu parecia mais segura de si agora. Seus traços orientais garantiam-lhe toda a seriedade de que precisava – Entra na sala – Garantiu o tom para que ninguém os ouvisse.

Levantando as mãos, o homem deu ré, seus passos cessando apenas quando ele e a moça já estavam dentro da sala.

Ela fechou a porta, sem baixar a guarda uma só vez.

Sua postura era notável, perceptivelmente uma pessoa habituada a tomar tais medidas.

— Agora fala! O que você ‘qué’? Quem te mandou aqui?

Ann Lu observava-o, analisava-o, buscando entender a reação. Era como se ele já esperasse um ataque, seja de qual lado fosse.

“Um homem em alerta, como um felino. Provavelmente a vida o moldou assim” compartilhou com seus próprios pensamentos.

— Não quero nada, tudo isso é uma mera coincidência.

Em uma microexpressão o homem torceu o nariz.

— Coincidência? É uma coincidência minhas garotas estarem sumindo?

— Como disse... Não passa de uma coincidência. Minhas investigações me trouxeram para cá.

“Então é isso...” Pensou, sagaz como sempre. “Outras garotas também estão sumindo.”

— Investigações? Você é da polícia, então – olhou-a com desdém.

Aquilo era um jogo.

Enquanto vangloriava-se pela frase solta, o outro caçava palavras chave, montando parte de sua identidade como um quebra-cabeça.

— Bem sabia que você não era daqui – sorriu irônico – Vô te falar bem uma coisa... Ratos como vocês não costumam sobreviver por muito tempo nos subúrbios – após uma risada abafada, tornou à seriedade que a situação requeria -- Não sabia que os poderosos vinham se interessando quanto à integridade de meras prostitutas.

Seu braço doía, mas era preciso. Com o membro direito pegou de dentro do minúsculo short uma foto.

— Olha bem.

A fotografia, leve como pluma, passeou no ar até que caiu no chão, deslizando aos pés do homem à um metro e noventa acima do chão. O homem observou a linda garota de olhos violeta sorridentes, tinha as feições de quem tivera tudo o que sempre quis. Com certeza nascera com a bunda virada pra lua.

“As pessoas são bichos curiosos... Certamente”

— O que disse!?

— Pensei alto – sorriu caustico.

— Já a viu por aqui?

— Porque eu deveria responder?

— Porque sou eu que dou as regras.

Silêncio.

— Quem é Elandrik? – tentou outra abordagem

— Uma das minhas garotas, ela também desapareceu... Por um tempo... – na última frase ponderava, perceptivelmente, quase como se falasse consigo mesmo.

— Quer dizer que a garota da foto também desapareceu? Assim como Elandrik?

Deck irritou-se.

— O que você quer?

— Que você me responda – respondeu, quase dando-lhe um tiro de nervoso.

O homem sorriu.

— Então está mais que na hora de negociarmos...

Ann Lu rendeu-se. Com aquele tipo de gente não havia conversa.

— Afinal... – continuou – O que eu ganho?

Suspirou.

Ela estava mais do que certa.

— Pois então... – Abaixou a arma – Que comecem as negociações.


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Notas finais do capítulo

Muito obrigada por lerem!
Se gostaram, que tal deixar um feedback? Hein, hein?
Se não puder, tudo bem também!

Até a próxima. ;)



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