Ah Se Você Soubesse escrita por Ágata Arco Íris


Capítulo 35
As marcas


Notas iniciais do capítulo

Tinha ficado maior esse capitulo, mas resolvi dividir em dois. Posto o outro hoje ou amanhã, não passa disso também.

Bem é só isso que tenho para dizer. Boa leitura! ^~^



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Dara_Pov(On)

 

 

Estava voltando calmamente para casa, não estava correndo, não havia tentando ultrapassar nenhum sinal fechando, tinha tempo de sobra para poder ir devagar. Era um mais de nove da noite, havia saído com as meninas, mas elas não acharam o que procuravam. Lily recusou minha carona, não a questionei, pois iria ficar um pouco mais com as gêmeas.

Cheguei em casa, Sombra não estava. Hoje é segunda e ele não costuma sair esse dia da semana, não iria preocupar, mas ele havia preparado a janta para mim. Embrulhado na geladeira havia um prato montado com macarrão à bolonhesa, acompanhado de um bilhetinho do Sombra, a avó dele tinha passado mal, ele estava no hospital com a velha.

Achei estranho, ele mal cozinha para si mesmo, não por falta de habilidade, pois, diga-se de passagem, ele até tem bastante, mas é a preguiça o impede. Me preparar o jantar, isso era novidade para mim, mas tudo estava tão ajeitado naquela casa, as tigelas dos gatos estavam cheias e ele havia limpado a pia também, acho que alguém só estava tendo um bom dia.

Esquentei o prato no micro-ondas e me sentei no sofá, não quis ligar a televisão, mas o silencio sufocante daquele apartamento me obrigou, que mesmo não estando passando nada de interessante, foi uma ótima companhia. Fluppy estava dormindo sobre a braçadeira quando cheguei, e ali permaneceu quando cheguei em casa, mas não vi o Almíscar em lugar nenhum. Chamei, ele não veio, e também não me preocupei em ir procurá-lo, ele não tinha como fugir do apartamento mesmo... Aliás, não vi o Sr. Almíscar desde o café da manhã.

 Falando em gatos, eu estava comendo quando Lady Fluppy teve uma convulsão, larguei meu prato de qualquer jeito e fui socorrer a bichana. Ela estava na braçadeira do sofá como tinha dito e caiu quando o mal-estar veio, fez um barulho enorme, tive medo dela quebrar alguma coisa, não da sala, mas alguma coisa no frágil corpinho daquela bolinha de pelos. Fiquei desesperada, ela nunca havia dado uma crise estando sozinha comigo, e mesmo sabendo que estava fazendo tudo que podia, parecia tão pouco. Por sorte passou rápido aquele mal-estar e agonia toda, não sei se ela sente dor ao ter convulsão, mas é triste de ver. E quando voltou a si estava toda manhosa, queria só colo e carinho, não a culpo, eu também iria querer isso se tivesse acabado de dar um bug daqueles.

Havia perdido a fome, e de brinde também havia cagado o sofá inteiro com molho de tomate no meio da confusão. Limpei aquela bagunça o mais rápido possível para não manchar, mas ainda ficou um pouco escuro o  estofado, ainda tenho esperança de limpar isso amanhã. Dormi quase onze da noite e Sombra ainda não havia chegado, ele realmente estava no hospital com a velha dele, a coisa deve ter sido séria.

Acordei às quatro da manhã, e Sombra estava em casa e dormindo, pude 

Acordei às quatro da manhã, Sombra estava dormindo, pude vê-lo pela porta do seu quarto estava aberta, parecia ter caído de qualquer jeito sobre a cama, Lady Fluppy estava dormindo enroscada sobre suas costas. Estava indo preparar um café para mim quando vi a pequena sombra do “Sr. Gato Sumido da Silva”, ele estava atrás das cortinas da sala. Peguei no colo o gato, que protestou com um breve miado, o levei até a cozinha, lhe dei água fresca e ele me fez companhia enquanto eu tomava meu café, mas depois sumiu novamente. Ele estava fascinado com algo do lado de fora do apartamento, olhei e não vi nada, ele não havia miado também, presumi que quisesse dar uma volta.

Acomodei Sr. Almíscar debaixo do meu braço e subi com ele até o terraço, fiquei com medo que sumisse, mas ele ficou o tempo todo do meu lado, eu deite-me em minha espreguiçadeira e ele ficou ao meu lado no chão, se lambendo como se não tivesse ninguém lá. Não entendo esse gato, quando o Sol nasceu ele se quer olhou, não parecia se importar. É, acho que eu fiz algo inútil, para um gato sem personalidade.

 

 

Dara_Pov(Off)

*____________***____________*

Lily_Pov(On)

 

 

Estava meio tonta essa manhã, acho que vou ter que fazer exames, e isso terá que acontecer o mais rápido possível, não faço a mínima ideia do que fazer daqui pra frente. Sei que tem aquele negócio de “pré-natal” e tudo mais, mas não faço ideia nem de qual médico eu devo ir.

Por sorte minha tontura passou depois do almoço, mas fiquei com medo de voltar quando fosse nadar, acho que minha pressão devia estar baixa ou algo do tipo. Infelizmente esse não era meu único problema a enfrentar durante a aula. Credo, virei a principal pauta das fofocas no momento, mas acho engraçado, ninguém fala do Clarck, sendo que essa gravidez não é só culpa minha. Mas é claro, ele é homem, somente esse fato já o redime de muita coisa, e não é ele que carrega essa criança, no final das contas. Não sei por quanto tempo vou aguentar isso, o povo só sabe falar sobre mim e como eu “sou promiscua”, sem escrúpulos, a vilã da história; ficam inventando histórias eróticas horríveis que me envolvem, e tenho nojo só de pensar tal coisa.

As pessoas não perdoam! Mas eu também não me importo, pelo menos não devia me incomodar. Ah, a verdade é que estou quase mandando todo mundo à merd@! Falar para eles calarem e irem cuidar da vidinha medíocre deles. E não posso fazer isso, porque tenho que manter tanto a pose quanto a calma.

Eu estava no vestiário, guardando minhas coisas, me preparando para entrar na água. Quando do nada apareceu a Alice e sentou-se de frente para mim. Estava focada no que fazia, acho que focada não é a palavra certa, mas não a vi, ela teve que chamar minha atenção para eu perceber que queria falar comigo.

—Lily, você pode me dar um pouco do seu tempo? — Disse Alice com pernas dobradas sobre o banco de madeia — Sei que não conversamos muito, mas é importante, é sobre a Dara.

—Hum... O que tem a Dara? — Fui interrompida.

—Meninas, vamos! Não quero começar atrasada hoje, de novo, não! — Disse a treinadora chamando nossa atenção.

—É claro Alice, fica do meu lado e vai me falando nos intervalos — Fechei meu armário e já me dirigia às piscinas — Ok?

—Não, isso não vai dar certo — Ela me segurou pelo braço —Não acho que isso possa ser dito desse jeito, preciso de sua exclusiva e total atenção. É sério.

Sabe qual a pior fala já inventada pela humanidade? Bem, na minha opinião, o infeliz que disse a primeira vez “—É sério”, deveria ir para o inferno, mas só acho. Pois, por mais simples e inofensiva que pareça essa frase, comparo à frase ao ato de tirar a camisa, independente da ocasião, deixa tudo mais preocupante e dramático. E falar “É sério” sempre acaba com nosso psicológico, pois quase nunca podemos atender prontamente a pessoa que disse isso; então geralmente não fazemos nada no dia sem pensar em mil e uma possibilidades de acontecimentos que a pessoa querer falar, as vezes mal dormimos pensando nisso.

Se isso normalmente acontece, por que agora seria diferente?  Eu iria ouvir Alice, ela parecia preocupada demais para estar apenas blefando, ou fazendo alguma brincadeira de mal gosto. Mas claramente nossa treinadora não teria tempo para esperar essa nossa conversinha potencialmente longa.

—Lily, Alice, vocês trocam a receita depois! —Gritou nossa treinadora — Já para a piscina, anda!

—Ok treinadora — Dissemos nós duas juntas.

Alice já estava quase passando por mim quando a parei novamente.

—Espera, deixe me pensar um pouco... — Disse eu, meio receosa, sabia que havia combinado com Clarck — Podemos conversar depois do treino, Alice?

—Perfeito!

Ela passou por mim e eu já comecei a me arrepender do que tinha dito, eu iria falar com Clarck depois do treino, a segui e a professora pôde finalmente começar o treino. Estávamos apenas nos aquecendo e minha cabeça não parava, pensava em um motivo para Alice querer falar comigo, pois, além de cumprimentos rápidos e piadas casuais, não conversávamos muito. Tirando que eu realmente precisava falar com o Clarck, mas olhei para o lado, enquanto tomava folego para mais um mergulho e a vi sorrir para mim, ela estava duas raias a minha esquerda. Vendo aquilo lembrei que ela realmente gostava da Dara, mais do que eu, se brincar...E talvez a mereça mais do que eu. Enfim, se é sobre a Dara, acho que vale a pena ouvir, seja lá o que for.

Estava focada em treinar bem, já que havia praticamente matado o último treino, e estava conseguindo ir bem. Só que de repente minha tontura voltou, e para não abandonar a água, fui obrigada a diminuir o ritmo, tinha esperança que passasse a qualquer momento. E fui nadando assim, por um tempo, mas de repente tudo começou a girar e me vi obrigada a literalmente parar de nadar, estava na metade da piscina e levantei bruscamente, tirei a cabeça puxando folego meio desesperada, pois havia engolido um pouco de água no meio da confusão.

A treinadora tocou aquele apito irritante dela e mandou que todos parassem, ela não moveu um musculo para ir me ajudar, mas gritou de seu posto:

— Droga, o que houve Lily?!

—Não estou muito bem hoje treinadora, estou me sentindo um pouco tonta — Tirei meus óculos de natação — acho melhor eu dar uma paradinha.

—Está tudo bem, filha? — Ela se levantou — Está doente?

—Ah, se um bebê contar como doença, ela está muito doente — Disse uma menina, mas não vi quem foi, ainda estava me recuperando da tontura.

Todas em volta começaram a rir de forma baixa, debochavam de mim de forma contida, aquilo doía mais do que abertamente rirem da minha cara. Revirei meus olhos e tentei não me irritar, nem fazer nenhuma besteira, e não foi muito difícil de conter, já que o mundo resolveu girar novamente quando meus olhos reviraram.

—Shhh... Silêncio! — Disse a treinadora — Isso é verdade Lily, está grávida?

Apenas sim que sim com um simples movimento de cabeça, todas riram novamente. A treinadora novamente mandou elas se calarem.

—A gente vai ter que conversar depois então — Concordei com a cabeça — Vai para a enfermaria, talvez possam te ajudar lá.

—Obrigada — Disse cabisbaixa.

—Professora, deixa eu ir com ela — Disse Alice — Se ela está tonta, não é bom ficar andando sozinha.

—Verdade Alice, vá com ela, então! — Concordou, nossa professora.

Alice mais que depressa atravessou as raias até a minha, me empurrou até a borda e quando saí, pôs uma mão em minha cintura e apoiou meu braço sobre seus ombros, estava realmente servindo de apoio. Umas meninas começaram a cochichar e outras a rir, eu não mal saído da piscina ainda quando começaram a fazer isso, achei muita falta de educação e muita maldade também. Alice disse para não me preocupar, pois meninas assim uma hora ou outra se davam mal, e que elas não eram perfeitas como pareciam se mostrar. Não entendi muito bem aquilo, também não disse nada para discordar ou concordar, ficou como se eu não tivesse ouvido.

Como já era de se esperar, não fomos para a enfermaria, nem Alice acreditava que eu não estava bem, ficamos nas escadarias. Pelo menos ela pegou uma toalha antes de sairmos da área das piscinas, me enrolei naquele pedaço de pano, me escorei na parede e fui escorregando até poder me sentar.

—Nossa, genial essa história de passar mal para fugir da sala —Disse Alice, em pé à minha frente.

—Não inventei isso, acordei sem enjoo essa manhã, mas tô mais tonta que tudo, também.

—Ah é, esqueci que você está grávida —Alice se sentou ao meu lado — Então você realmente quer ir à enfermaria, mas eu preciso mesmo falar com você...

—Na verdade, não quero ajuda da enfermeira, tenho medo de ligarem para meus pais.

—E qual o problema nisso?

—Tenho medo de descobrirem que estou grávida.

—Mas você não...

—Ainda não, eles não sabem ainda.

—É bom contar... O mais rápido possível...Se possível.

—Estou ciente disso — Ri apoiando minha cabeça na parede — Mas então, o que queria falar comigo?

—Vou ser bem direta — Ela respirou — Sua namorada está se mutilando.

—O que?! — Me assustei — Não entendi, como assim se mutilando?

 Me toquei também que ela tinha chamado a Dara de minha namorada, senti uma pontada de felicidade por ouvir aquilo, mas não podia sorrir, se não a Alicie entenderia que não estou levando a sério a conversa dela.

—Ai, a Dara me contou que teve depressão...  —Disse Alice sentando ao meu lado— Aquele sábado que vocês brigaram...Bem, depois que isso aconteceu ela veio até mim, apareceu basicamente chorando na minha porta, estava muito ruim pelo o que tinha acontecido.

—Espera aí, ela não me contou que estava com você aquele dia...

—Nem deveria, estava chateada com você. Tanto que encheu a cara. Eu juro que tentei ajudá-la, e parecia estar funcionando... — A interrompi novamente

—Mas não entendi por quê... — Mas fui interrompida de volta, por Alice.

—Olha, você deve estar pensando, nossa, “uma concorrente”. Já que sua namoradinha veio até mim depois de uma briga.

—Na verdade não somos namoradas — Alice riu da minha fala — Mas é verdade!

—Então, eu acho que estão namorando e você nem sabe. Enfim, eu não sou um problema para vocês duas, tudo que eu quero é ver ela feliz, não importa com quem. Porr@, eu desisti dela para poder ficar com você, isso deve valer alguma coisa? —Alice respirou fundo — Estou perdendo o foco. Enfim, aquele dia, depois de tanto álcool ela me contou sobre a depressão dela e falou que quando melhorou um pouco decidiu se mudar de cidade.

—Acho que ela já me disse essa história.

—Mas te mostrou os cortes?

—Cortes?! Que cortes? —Indaguei assustada — Oh meu Deus! Dara se corta?

—Pelo visto sim, mas não nos braços como já vi antes...Ela se corta nas pernas para ninguém perceber, ela me mostrou, é horrível pensar que ela mesma fez isso. Dara disse que ganhava um corte novo à cada briga com seu pai, então pensei que isso devia ter acabado depois que se mudou. Mas ela brigou com o irmão no sábado, então fiquei preocupada.

—E com razão... Mas... Quer dizer, só não entendi por que está me contando isso?

—Ela fugiu de mim a última vez que tentei conversar sobre isso, então achei melhor te contar. Ela com certeza te ouvirá mais que a mim — Alice pôs a mão sobre meu ombro— Ajude-a, por favor, é tudo que peço!

Me escorei no ombro de Alice e fiquei olhando o nada, acho que não gostou muito disso, era um sentimento multo. Mas precisava parar minha cabeça em algum lugar para a sensação de tontura, passar, só que dessa vez nem sei se era mal-estar.

—Deixa eu só digerir isso um o momento, por favor.

—Claro.

—Aliás, posso ficar aqui? — Falei olhando para seu ombro — Já me recupero, juro.

—Ah...Quanto mais eu ficar aqui melhor, não quero voltar para as piscinas mesmo.

—Obrigada, acho...

Sorri e continuei olhando o nada, mas graças a Deus minha cabeça parou de girar, pelo menos podia pensar sem sentir que vou cair.

Então todo esse tempo, desde que eu a conheço ela faz isso a si mesma? Ela sofre em segredo, se machucando dessa forma? Me pergunto como eu nunca percebi isso? Acho que ela sempre teve perfil de pessoa depressiva, mas é tão otimista e tão...Uau... Ela é incrível, acho que não tem uma palavra melhor que defina isso. Mas ainda me pergunto, eu poderia perceber sua dor?

Enfim, me senti culpada por não saber desse segredo dela, e ao mesmo tempo senti raiva e inveja por ela ter contado para Alice antes de mim. Eu tinha que ajudá-la, só não sabia como fazer isso.

Lily_Pov(Off)

*____________***____________*

Dara_Pov(On)

 

 

Estava em casa curtindo uma bela de uma preguiça, me joguei no sofá e fiquei vendo coisas aleatórias nas redes sociais, não tinha nada de melhor para fazer mesmo. Aff, Lily iria conversar com meu irmão, mas não queria minha presença lá, queria conversar em separado com aquele traste. Digo sem cerimônias que não confio nele, mas tive que vim para casa mais cedo, ela meio que me dispensou. Disse que estava se sentindo um fardo para mim, por eu sempre a levar em casa e não queria me incomodar mais, ela parecia bem focada nessa “verdade” que tomou para si, escolhi não discutir para não deixar a futura mamãe mais nervosa do que já aparentava estar.

Mas sinceramente dizendo, acho que não valeu de muita coisa fazer isso, pois, às 17:30 ela me mandou uma mensagem. Estava em casa, chateada pelo visto, e queria que eu fosse até ela. Eu deveria me arrumar prontamente e sair correndo, mas para ser sincera, a preguiça já havia se apossado de meu corpo, custei a levantar do sofá.

Parecia estar fazendo tudo em câmera lenta, mas mesmo assim cheguei à casa dela antes das seis da tarde. A porta estava apenas encostada como ela havia dito que estaria, a abri desconfiada, mas a casa parecia vazia. Gritei por Lily, ela respondeu do andar de cima, mas não veio me recepcionar. Subi as escadas, olhei para a direita e já vi seu quarto, a encontrei sobre sua cama, digitando em seu notebook, não parecia nem um pouco triste ou desapontada.  Muito pelo contrário, parecia focada em seja lá o que digitava furiosamente naquele computador portátil.

—Então, como foi com meu irmão? — Perguntei fechando a porta do quarto — O que ele queria falar?

—Ah, na verdade ele só ficou chorando no meu ouvido que não queria ser pai e que não estava pronto para essa responsabilidade na vida dele. Tudo dentro do esperado que ele faria — Lily mal me olhou nos olhos, estava tão focada, geralmente me dá nos nervos as pessoas falarem comigo sem me olhar, mas ela é exceção — Te chamei aqui porque queria falar sobre você.

—Ué, não entendi...

—Eu tive uma conversa com a Alice — Ela fechou seu notebook — Quer dizer, na verdade ela me procurou e falou comigo.

—Hã?! — Cruzei os braços — O que ela te disse?

—Bem, acho que ela contou a metade da história que você não me contou aquele dia, sabe... Que eu dormi na sua casa.

—Aff, eu estou bem, para deixar bem claro — Me sentei na cadeira giratória da sua mesa de estudos — E não foi bem do jeito que ela falou, tenho certeza...

—Mas eu nem te contei o que ela me disse, está se defendendo do que?

—Alice te falou da minha depressão... Mas surprise! Eu tenho psicóloga sim, só não vejo necessidade de ir até ela, no momento. E eu estou me defendendo porque a Alice é MUIITOO dramática.

—Você até que acertou, em grande parte, pelo menos...Mas ela não viria falar comigo se não estivesse preocupada — Lily colocou a mão em minha perna — Sabe, eu também fiquei preocupada. Mas eu fiquei me questionando por que não se abriu comigo aquele dia? Você confiou em mim para contar algo tão íntimo e pessoal, por que não me disse isso também?

—Ham... Entendi, você está preocupada por eu ter ido falar isso justamente para a Alice, não para você. Bem, eu não queria contar para ela, do mesmo jeito que não queria que você soubesse.

—Por quê?!

—Bem, eu contei porque estávamos conversando sobre cicatriz e... Bêbada... Pareceu uma boa ideia mostrar as minhas. Mas assim que mostrei as marcas ela me encheu de perguntas, fui obrigada a dizer a origem delas.

—Táh...Mas o que eu queria saber, é por que não queria que eu soubesse? Você não confia em mim, é isso?

—Não é nada disso, muito pelo contrário, acho que é uma das poucas pessoas que eu posso confiar. Mesmo eu tendo aprendido amargamente que não se confia nas pessoas.

—Mas você pode confiar em mim...

—Não é esse o problema — Olhei bem em seus olhos — É que eu não gosto que sintam pena de mim. Odeio que os outros olhem para mim e pensem: “tadinha, ela tem a mente fraca”, ou talvez “Ah coitadinha, é doida!”. Eu definitivamente odeio isso!

—Dara eu... — Ela sem nenhum aviso breve ela me abraçou — Eu não senti pena quando Alice me contou que se mutilava, foi outro sentimento que me veio, eu senti medo. Senti medo que você tivesse dado uma recaída, que se machucasse ainda mais, principalmente depois da discussão com o Clarck no sábado, ou talvez até por ter brigado comigo.  Eu não me perdoaria se você fizesse algo assim, por minha causa.

—O que?! Lily, eu não faço mais isso. E não precisa se preocupar, você não causou nada de mal, e acho que nunca causará também. Me sinto tão bem perto de você.

—Eu não acredito, você devia procurar ajuda.

—Hum... Na verdade eu não sei o que dizer para você, pelo menos você não está doida tentando me arrastar para um psicólogo como a Alice. Eu te asseguro que estou bem, eu juro!

—Mas como pode me provar isso? — Lily respirou fundo — Sabe, esse tempo todo eu precisei de apoio e sem você, acho que eu teria surtado se não estive ali, bem ao meu lado. E eu sei que meus problemas nem começaram direito ainda, mas eu acabo por esquecer deles quando estou com você e esse teu humor sem graça que adora “quebrar” minhas vibes românticas.

—Lily... Eu vou estar aqui quando precisar, se é isso que tem medo.

—Não, não é disso que eu tenho medo. Dara, você está do meu lado, e eu estou do seu... Então, se você me ajuda... Por que não deixa eu te ajudar?

—Porque eu estou ótima!

—E como pode provar que não faz mais isso? — Uma lágrima tímida escorreu relutantemente pelo seu rosto, ela parecia lutar para não a derramar sobre face — Como pode me provar que está bem? Que não vai se machucar de novo? Como você pode me provar que eu não vou te ver numa cama, sem ânimo para sair dela? Como vou poder conviver comigo mesma sabendo que não fui capaz de cuidar de você se isso acontecer?

Fiquei olhando para ela, parada, ela se recusava a chorar, mas parecia estar difícil conter as lágrimas. Estava sendo obrigada a fazer algo que não deveria fazer novamente, sentia que só iria piorar as coisas, e eu realmente não queria fazer isso, não gosto de lembrar de coisas que deixei no passado. Mal olho para minhas pernas, para ser sincera, mal olho para meu corpo, não acho ele bonito, mas é o que tenho, então o jeito é conviver. Mas enquanto estava em devaneios, ela me questionou novamente se confiava em mim, acenei com a cabeça de forma positiva, mas não disse nada.

Levantei, desabotoei os dois botões da minha calça, desci o zíper e abaixei calmamente o pano até a altura dos meus joelhos. Ela encarou minhas coxas, logo depois olhou para mim e suas lágrimas tímidas finalmente venceram sua força de vontade. Mostrei para ela as cicatrizes que ainda estão em minha pele, mas uso bastante produtos para acabar com elas, então não estão tão feias assim.

—Posso tocar? —Perguntou Lily.

Acenei positivamente, ela encostou suavemente o indicador sob a maior das feridas, que começava perto da virilha e descia até um pouco antes da metade da minha coxa esquerda. Depois de tocar com o indicador, pousou os outros dedos e por último a palma da mão.

—Não dói fazer isso? — Ela me indagou.

—Na verdade, nem sei dizer. Estava tão estupidamente nervosa quando fiz cada uma delas, que nem sei dizer. Deve ter doído, mas não me lembro da dor.

Arregacei as mangas da minha blusa e lhe mostrei as velhas, mas não esquecidas cicatrizes em meus punhos. Ela novamente passou a mão sobre minhas cicatrizes, em silencio, apenas observando cada curva daquela degra&@ em minha pele.

—Esses sim doeram, mas eu não me importava com isso... Então fazia mais... Mas um dia, enquanto minha mãe limpava meu sangue, acho que voltei à mim e vi a merd@ que estava fazendo a mim mesma. Ver ela chorando foi demais para mim, um tapa daqueles no meu coração, odeio vê-la chorando, mas acho que foram as lágrimas mais milagrosas da minha vida.

—Como eu nunca vi isso? — Ela se perguntou — Eu a vejo todo dia e nunca reparei em seus braços, acho.

—Tudo bem, eles não têm nada de especial também.

—Como não, você está viva! Sabe que podia ter morrido nessa brincadeira, neh?

—Na época era exatamente essa a vontade.

—Dara!

—Que?! Estou sendo sincera. Mas não penso mais assim.

—Bom, pelo menos não parece ter nenhuma muito recente — Ela ria sem graça — Eu fiquei com tanto medo que ela estivesse certa, e que você tivesse recaído depois de tudo que o Clarck falou aquele dia.

—Ah tenha dó, ele é um idiota, não vou ter uma recaída só porque um idiota me chamou de nojenta. Eu quero mais é que ele pegue a merd@ da opinião dele e enfie de volta no....

—Dara! — Gritou ela, me interrompendo —Não precisa falar tanto palavrão, também, já entendi.

—O que?! — Ri brevemente —Desculpa, Lily.

—Eu fiquei com medo que isso tivesse acontecido, que ele tivesse te afetado. Graças a Deus você está bem.

Lily abraçou minhas pernas e recostou a cabeça em meu abdome, me senti um pouco exposta, quase frágil por estar naquela posição. Já havia sentido isso antes, mas dessa vez, me senti protegida por ela me abraçar.

Infelizmente tudo que é bom dura pouco, estávamos em silencio naquele abraço. Pode se considerar aquilo um abraço, afinal? Mas voltando à realidade, quando ouvimos a porta do hall de entrada se abrir, sabíamos que a mãe de Lily havia chegado. Entrei um pouco em pânico naquele momento, subi minha calça rapidamente com medo que nos encontrasse naquela situação e já pensasse besteira.

—Ela chegou mais cedo — Perguntou Lily olhando seu relógio — Não, são 18:40, perdi a noção do tempo. Droga!

 

 

Dara_Pov(Off)


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