Akai Tsuki escrita por Fada Dos Tomates


Capítulo 7
Fraco, Covarde e Indigno




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–O quê? Outro eu? De novo? – fico mais confuso. Por que tantos “eu”?

Ele me atira uma lança num movimento brusco. De onde saiu àquela coisa? Só sei que me atravessa rapidamente e dolorosamente. Caio de joelhos no chão arfando, lágrimas incômodas começam a encher meus olhos por causa da dor.

–Que...

O outro eu soca meu rosto com toda força. É como se uma pedra tivesse me acertado, sinto meus dentes se deslocarem de tão forte que foi. Cambaleio pra trás desnorteado com o golpe estonteante. Então recebo outro, de novo, por uma lâmina. Ele perfura meu coração friamente. Arregalo os olhos sem conseguir gritar nem fazer nada, cuspindo sangue negro sem parar.

Porém o outro eu insensível não para de me ferir. Ele me joga no chão e me apunhala cruelmente com sua lâmina. Berro desesperadamente me debatendo e contorcendo no chão, afogando-me na poça negra de meu próprio sangue. A dor toma conta de meu corpo forçando-me a fazer aqueles sons meio ridículos que fazem minha garganta doer mais, gritos, guinchos, gemidos. Mas é inevitável.

Só não entendo por que aquele outro eu frio e insensível está me machucando dessa forma. E ainda preciso salvar o garotinho do espelho... O garotinho! Tinha esquecido ele! Preciso ajudá-lo!

–Não... – tento levantar recusando-me a ser apunhalado mais uma vez, tento segurar a lâmina com as mãos nuas.

No entanto sou muito fraco e estou vulnerável a qualquer ataque, tremo ao segurar aquela lâmina rasgando minha pele e me enchendo de sangue negro.

O outro eu é certamente mais forte, ele não precisa fazer muito esforço e enterra a lâmina fundo em minha barriga quase parando de mexer para respirar. Não consigo respirar direito, não sei se é por causa do sangue que sai do meu nariz ou por causa das cutiladas cruéis e irreparáveis que levei. Choro de forma infantil e ridícula, se alguém além de mim e o outro eu estivesse aqui provavelmente riria dessa cena.

O outro eu não pega a lâmina afundada em mim, faz uma pequena pausa, como se estivesse pensando em uma forma mais cruel e dolorosa de me matar.

Mas ao invés de fazer isso, se vira e corre em direção ao nada. Não, não em direção ao nada. Ele atira no chão drasticamente alguma alma azarada que passou por aqui sem querer. Olho para a cena de relance, a garota esperneia de modo histérico, consigo ver um vislumbre de sua roupa íntima por debaixo da saia escolar. Tento não olhar pra isso, não é hora de ceder à luxúria e às armadilhas da adolescência.

A garota grita:

–Hitasura-kun!

Vejo seu rosto choroso, implorando pra que alguém a proteja.

O primeiro pensamento que me ocorre é: Eu vi a calcinha da Fukawa! Mas isso é tão idiota e inútil que o descarto. Ela está em apuros, tenho de me concentrar nisso, preciso ajudá-la.

É estranho novamente desempenhar o papel de herói, mas é a Fukawa, ela é tão gentil e bondosa para sofrer assim. E eu ainda estou em dívida com ela, apesar de isso tudo parecer tão surreal quanto um sonho. E se não for? Vou ficar aqui ouvindo-a gritar e dando uma olhada em sua calcinha? Ideia mais besta! Preciso fazer algo!

Trêmulo e gemendo agarro a lâmina e tento arrancá-la de meu coro, tudo o que consigo são cortes profundos, sangue e mais dor. Arquejo tremendo ainda mais. Engulo um pouco de sangue antes que eu vomite e me preparo para a próxima tentativa. Os cortes em minha mão vão se aprofundando, não posso me importar com a dor ou estarei acabado, Fukawa estará. Faço força para tirar aquilo de dentro de mim, requer muita força e sofrimento. Urro enquanto a coisa vai saindo. Fukawa está berrando loucamente e esperneando no chão, pois o outro eu também a fere com outra lâmina que ele tirou de não sei onde.

Consigo retirar a lâmina de mim, mas fico tão exausto que não aguento o peso dela e a deixo cair. O barulho feito quando o objeto cai é o suficiente para fazer o outro eu desviar sua atenção a mim. Ele sai de cima de Fukawa que fica chorando no chão e pronunciando meu sobrenome.

Devo agir rápido, mas não consigo ser veloz o suficiente e levo um murro no rosto.

Rosno de raiva atirado no chão tremendo de fraqueza. Se não consigo nem sustentar a mim mesmo, como salvarei Fukawa?

O outro eu chuta meu rosto novamente, não tenho força para levantar e lutar. Mas tenho que tentar. Levante-se seu fracote! Levante-se e lute! Deixe de ser covarde e fraco! Lute pela Fukawa!

Quando estou quase conseguindo ficar em pé, o outro eu me segura pelos cabelos, bate minha cabeça em seu joelho rapidamente e me empurra para trás. Vôo longe e rolo no chão sangrando e gemendo. Eu não teria ido tão longe se não estivesse tão fraco. Pelo menos a essa distância tenho tempo de levantar, consigo mesmo debilitado, mas não por muito tempo. O outro eu aparece em alta velocidade e investe contra mim. Caio no chão novamente e ele pisa em meu estômago. Não consigo enxergar quase nada, quero ir embora daqui de uma vez. Morrer quem sabe? Mas já estou morto então não há como escapar.

“Qual é o seu desejo Kori?” ouço a voz de uma garota em minha mente.

Não é alguém que eu conheça, a voz de Fukawa é mais melodiosa, a de Dely é inquietante por causa de sua loucura, a de Tsumi é infantil e boba. Poderia considerar a voz de minha mãe, mas é diferente. Uma voz com um tom mais inocente e puro, porém amedrontadora ao mesmo tempo. Quem estaria em minha mente dizendo tal coisa?

“O que você quer Kori?” continua insistindo.

–Salvar... – não consigo terminar a frase, pois o outro eu me puxa pra cima, faz um movimento estonteante que não consigo ver e torce meu braço. O quebra sem problemas como se eu fosse um boneco, berro e esperneio tentando me livrar dele. Choro, mas é inútil.

“Você quer salvar a Fukawa?” questiona a voz.

Óbvio, nem precisa perguntar.

–Si... – não tenho tempo de afirmar.

O outro eu me atira no chão e se joga por cima de mim, ouço os estalidos ficando sem fôlego, estou todo quebrado e não posso nem respirar.

“Socorro” penso, esperando que o portador da voz em minha mente me socorra.

“O que você deseja?”

Parece alguma zombaria, mas preciso de ajuda e não vai custar nada pedir por algo útil nesta situação.

“Força! Eu quero ser forte! Quero força e coragem!” peço desesperado como uma criança querendo doces. O pedido é meio infantil, mas preciso disso.

“Então você será forte e corajoso” decide a voz antes de ficar em silêncio.

Nada acontece e fico frustrado. O outro eu se prepara para atacar, ergo as mãos pra me defender apesar de saber que não adiantará em nada.

Espero pelo soco, mas quando ele me golpeia não dói, não tanto quanto deveria. Ele fica confuso com o feito impossível. Até eu estou impressionado com essa loucura. Será que estou mesmo mais forte? Ou isso é uma ilusão? Bem, não me sinto mais quebrado, não sinto dor e estou mais disposto do que nunca. Isso significa que meu pedido foi atendido.

Sorrio e me levanto pronto para a briga.

O outro eu investe contra mim e eu o derrubo. Ele me encara e balança a cabeça negativamente.

–Mesmo que você se torne Deus, jamais conseguirá o coração dela – diz ele.

Fico confuso com esse comentário. Coração dela? Ele quis dizer a Fukawa? Não tenho como saber, pois ele desaparece poucos segundos depois.

–Hitasura-kun! – Fukawa corre até mim freneticamente – Hitasura-kun!

Ela se atira em meus braços agarrando-me com força e chorando.

–Hitasura-kun que bom que você está bem! Não me assuste assim de novo por favor! Não me deixe aqui sozinha Hitasura-kun!

Não sei exatamente o que sinto neste momento, é como estar vivo de novo. Ela não deveria poder me tocar, mas esse fato me enche de alegria, apesar de que sei que não a mereço. Até minha vitória de agora foi uma farsa, eu trapaceei fazendo aquele pedido. Mas o que aconteceria se eu não tivesse pedido? Só sei uma coisa, não quero voltar a ser um espírito, quero poder sentir este abraço pra sempre. Não que eu goste de Fukawa, sei lá, é bom ter mais uma vez um abraço verdadeiro, um abraço de amor.

–Hitasura-kun eu...

–Pode me chamar só de Kori – permito.

–Ah, Kori eu não queria voltar – fala ela.

–Por quê?

–Você vai estar morto –responde – Não quero poder te ver e não poder tocá-lo ou...

–Fukawa – a corto – Fukawa depois de tudo, só depois de morto que vi o quanto você é incrível...

Eu queria dizer outras coisas, mas as palavras ficam presas na garganta. Vejo que estou um pouco nervoso e me coração está acelerado. Fukawa tem um olhar tão inocente. Quero...quero dizer a ela...

–Você é uma pessoa muito especial pra mim – digo.

–Como assim? Especi...

A puxo pra mim impulsivamente e a beijo.

Eu não deveria fazer isso, mas ela estava tão próxima, tão ansiosa como se esperasse isso, tão amável...

Ah, nem sou digno de seu amor. Mas o que importa? Devo aproveitar ao máximo este momento, pois quando eu voltar retornarei a minha forma espírita. Vou fingir que foi só um ato de compaixão já que ela não vai poder me tocar quando voltarmos.

Não deixo de pensar que aquele outro eu era meu antigo eu, aquele garoto frio que feria as pessoas que se mostrassem uma ameaça enquanto eu estava vivo. Era assim que eu machucava Fukawa? Eu era tão horrível assim? Isso era totalmente errado. Porém o outro eu está certo quanto a uma coisa: jamais merecerei o amor de Fukawa.


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Notas finais do capítulo

Quem será que era o portador daquela voz que deu força a Kori? E quanto ao garoto do espelho? Será que é verdade que ele não merece Fukawa? Se não gosta dela por que a beijou?



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