Johnny tinha uma arma. escrita por Fehliz


Capítulo 2
A caneta e o canhão.


Notas iniciais do capítulo

Agora sim começa a exploração psicológica que havia citado kkkkk



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Segunda-feira, 8:41.

As reações na sala do segundo ano C foram as mais diversas. Alguns prenderam a respiração, alguns ficaram paralisados e alguns outros simplesmente não acreditavam no que estava acontecendo. Porém, a mais notável reação fora a do professor de história.

Ele pontuou a sentença que escrevia antes de se deparar com o cano da arma apontado em sua direção e por trás deste, um rapaz com um sorriso cínico, desafiante.

O homem baixou o pincel e levantou as mãos num gesto de rendição. Olhou Johnny e soube que naquele dia alguma parte sua morreria, seja seu corpo físico, seja sua ideologia.

Ele se chamava Miguel, era graduado por uma imponente faculdade particular e criado numa família ligeiramente abastada. Revoltou-se contra a educação opressora e demasiadamente capitalista que sofria em casa e tornou-se professor pois acreditava que realmente poderia fazer a diferença. Devido a esse sentimento de dever, ele sempre se esforçava para dar aulas interativas e significativas aos alunos de forma que eles pudessem formar um pensamento crítico ao invés de simplesmente decorar as apostilas.

O homem espiou a turma com o canto do olho e foi bombardeado por olhares cheios de expectativas. Sabia que todos eles contavam com sua habilidade de persuasão, afinal durante todos os anos que assistiram suas aulas ele havia realizado debates filosóficos e teóricos com os alunos e era bastante hábil em desmantelar argumentos.

Entretanto, eles não sabiam que aquelas discussões seguiam quase que um roteiro pré-determinado. O conhecimento adquirido no Ensino Médio tem seus limites e as suposições e hipóteses levantadas pelos alunos secundaristas seguem um padrão, caso o professor se preparasse o suficiente e tivesse alguns anos de experiência poderia contra argumentar qualquer proposição. Em alguns momentos surgiam divergências oriundas de jovens um pouco mais intelectualizados, porém nada que ele não pudesse reverter com uma boa maiêutica socrática e voltar ao caminho planejado.

Aquela situação que encontravam-se não era algo que ele pudesse se preparar antecipadamente, nem resolver com suposições pseudofilosóficas. Aquilo ia além de suas credenciais.

Ele voltou seus olhos ao menino que ainda sustentava uma atitude desafiante. Não sabia que tipo de atitude ele antecipava, mas um rapaz com aquele tipo de sorriso só queria uma coisa: Vitória. Miguel conhecia aquela espécie, o adolescente que adora dar o último argumento e deixar todos atônitos em frente à tamanha perspicácia. Diante disse, ele tinha duas opções.

A primeira era esperada por todos que se seguisse, um debate teórico digno de filmes hollywoodianos. Agora que pensava sobre isso, Miguel lembrava de seus tempos universitários e como muitos de seus colegas, e talvez até uma versão mais jovem sua, adorariam uma oportunidade dessas para lecionar e causar um impacto tremendo na vida de seus pupilos. Doce engano. O impacto mais provável que aconteceria naquele dia seria o impacto da bala atravessando seu corpo.

Sabia que não seria capaz de persuadir o jovem em pé. Sabia que não poderia corresponder às expectativas dos jovens sentados. Ele sabia demais sobre a sua própria incapacidade, de alguma forma, o método socrático coube perfeitamente na situação, todavia não da forma que gostava de aplicar.

Restava então a segunda opção, a mais fácil e ao mesmo tempo, mais humilhante. Desistir. Submeter-se ao atirador e revelar toda a sua fragilidade retórica e psicológica, destruir os pedestais que o mantinham naquela posição de líder.

– O que você quer que eu faça? – disse o professor vencido numa guerra que se passava apenas em sua mente. A derrota era audível.

Johnny aumentou seu sorriso e olhou rapidamente para um canto da sala, não se sabia exatamente para quem. Apontou para a porta com o cano do revólver rapidamente antes de voltar a mirar no homem a sua frente.

Miguel naquele momento soube que tomou uma decisão errada.

Assim como usava de um roteiro em suas aulas, o rapaz a sua frente contava também com um script e isso incluía exatamente a sua rendição. O jovem manipulador a sua frente havia lido seus movimentos previamente? Ele era assim tão previsível?

O professor olhou seu aluno em confusão e o rapaz respondeu:– É da natureza humana, professor. Sobrevivência. Tenho certeza que você será capaz de bolar alguma teoria que lhe permita dormir a noite.

Ele suspirou, sabia que ele estava errado.

No fim, Miguel deu a lição sobre Revolução Francesa perfeitamente, pois todos os alunos enclausurados naquela sala de aula sentiam-se exatamente como a plebe da França absolutista: Traídos, humilhados e oprimidos por aquele que deveria ter-lhes salvado.

Assim que a porta se fechou com o professor do lado de fora. Johnny pronunciou:

– Ok colegas, não vai demorar muito até que ele perceba que pode chamar a polícia. Temos vinte minutos.


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Notas finais do capítulo

Os capítulos serão curtos (entre 700 e 1000 palavras) por que já que a narrativa é um pouco densa, fiquei temerosa da leitura tornar-se cansativa. Caso contrário, me deem um feedback para os futuros capítulos serem mais longos.



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