Apenas uma garota... escrita por Luana Nascimento


Capítulo 25
Capítulo 24 - Dia das bruxas... meu dia?


Notas iniciais do capítulo

Olá, povo o/
Consegui terminar o capítulo! Yaaaaay!
Espero que gostem :3



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Olhei-me no espelho, mais uma vez impressionada com minha capacidade de maquiagem. Com o "vestido" branco e o cabelo negro para frente, eu estava uma perfeita Samara do filme "O chamado". Foi decidido que iríamos ao baile de Halloween e acamparíamos logo depois no quintal da casa de Mel. O acampamento de iniciação aos snakes... eu não iria revelar meus maiores segredos. Mas o que eu poderia falar? Suspirei, pegando a minha mochila.

"Estou nervosa", comentei com Elizabeth.

"Achei que você já havia superado essa fase".

"Mas eu não posso falar sobre minha habilidade! O que eu vou dizer?", indaguei, preocupada.

"Algum feito grande?", ela sugeriu, sarcástica.

"Nem venha".

Desci a escada e minha mãe soltou um gritinho ao me ver.

— Meu Deus, menina! Vá dar susto em outro! Mas a fantasia ficou incrível.

— Devo dizer que se todos da noite tiverem essa reação, ficarei feliz.

— Tem jeito para você?

— Claro que não.

Ela meneou a cabeça.

— Ah, meu Deus, minha filha vai me deixar sozinha em casa — Minha mãe é a rainha do drama.

— É só um fim de semana, mãe, vai ficar tudo bem. E a casa de Mel é tão perto.

— Só brincando um pouco. Divirta-se e tome cuidado, ok? Qualquer coisa, ligue. — ela beijou minha testa. — Até logo.

Saí de casa, vendo a decoração da rua. Estava assombrosa. Os vasos de planta com os galhos secos, as abóboras com as velas... minha mãe e eu enfeitamos o carvalho com fantasmas e morcegos de papel. Ficou muito boa a decoração.

Bati na porta da casa dos Pendlebury e Adele abriu a porta:

— Oi?

— Sou eu, Shelly.

— Shelly, sua maquiagem ficou ótima!

Sorri:

— Obrigada.

— Vem, vamos aprontar uma com meu filho.

Quando entrei, vi Robert.

— Você está ótima — ele comentou, um leve simpático.

— Obrigada — repeti.

— Vem, Robert, vamos aprontar com Jaden. Shelly, fique perto da tv. — Adele desconectou a antena da televisão e me posicionou bem perto da mesma. — Fique aqui.

Alguns segundos de silêncio e a mulher começou a gritar. Entendi sua intenção e comecei a simular estar saindo do televisor tentando lembrar dos movimentos que a personagem fazia. Robert procurou gritar também, os dois se encolhendo no canto da sala. Jaden desceu as escadas correndo e sua expressão de susto foi a melhor, especialmente com a sua fantasia de vampiro.

— Puta merda! — ele exclamou em um salto.

Começamos a rir quase que simultaneamente, deixando Jaden vermelho de vergonha, mas depois ele mesmo riu. Senti minha barriga doer de tanto rir. Fazia algum tempo que não soltava uma risada sincera.

— Ah, meu Deus, sua cara... — foi difícil parar de rir.

— Melhor brincadeira de Halloween — Robert comentou, rindo também.

— Engraçadinhos. — Jaden sorriu de lado, começando a rir também ao nos ver rindo. — Caramba, por um momento, você me assustou, Queen Marie.

Bem, nossa relação estava melhor do que na semana passada. Não voltei a visitar sua casa, mas ao menos não estava mais aquele clima estranho de ressentimento, embora ele ainda não houvesse me dito o porquê daquele comportamento estranho. Tentei relevar e deixar para lá.

— Quase? Eu te deixei apavorado! — exclamei ainda rindo.

— E nós ajudamos — Adele comentou, sorrindo, bem-humorada. — Divirtam-se nesse baile, hein? E no acampamento também!

— Tchau, Mrs. e Mr. Pendlebury.

— Tchau!

— Não façam nada errado! — Adele gritou antes de Jaden fechar a porta. Saímos da casa.

— Meu Deus, os snakes vão me zoar muito por causa desse susto. — o garoto afirmou.

— Eu sei — sorri, sarcástica.

— E então, já tem um segredo incrível para contar aos snakes?

Minha expressão murchou.

— Acho que não.

— Estou um pouco preocupado com isso também. Não tenho feitos épicos ou segredos catastróficos para dizer, acredito.

— Podemos dizer o segredo da minha perna. É algo interessante.

— É uma ideia — ele respondeu, contudo não pareceu muito confortável. Fiquei tentada a perguntar qual era o problema, mas limitei-me a comentar:

— Seu cabelo está grande.

E estava mesmo. Os fios loiros penteados para trás estavam quase no meio na sua nuca. Jaden sorriu:

— Pretendo cortar depois do recital. Acho violinistas de cabelo grande muito fodas.

— São... inspiradores.

Entramos no ônibus e tinha uma boa quantidade de pessoas fantasiadas. Tinha até uns adesivos de fantasmas e abóboras. Quis deixar Jaden ir na janela, mas ele disse que eu precisava bagunçar mais o cabelo e que ele tinha que mantê-lo no estilo vampiro arrumado.

— Ainda não entendi o motivo da sua atitude — comentei depois de um tempo em silêncio.

— Qual?

— Ter se afastado e pedido para eu me afastar.

— É só comigo, não é muito relacionado a você. — ele respondeu, natural. — Só esqueça. Está tudo bem agora.

— É algum problema?

— Algo antigo.

— Um segredo. — deduzi.

— Algo do qual eu não me orgulho muito, eu diria.

— Você vai falar hoje?

— Eu não sei. Só vamos curtir o baile, por enquanto. Acho que vai ser divertido.

Gostei da dica dele. Você é muito ansiosa. Só fique calma e aproveite a vida”, Elizabeth comentou.

Suspirei.

— Talvez você tenha razão — respondi aos dois. — Nervoso para o recital?

— Um pouco. Afinal, é o último.

— Imagino.

— Nunca mais lhe vi atirando. — ele parecia querer puxar conversa.

— É, eu... me livrei da balestra.

— Por quê?

— Me senti mais confortável com o arco e flecha.

— Ah.

— Vamos descer.

Descemos do ônibus e encontramos Clint, Dave e Melinda. Os garotos estavam de vampiro também e a garota estava vestida como uma sobrevivente dos índios, toda cheia de tinta vermelha.

— Mel, isso assustou — comentei, impressionada.

— É a intenção — ela respondeu sorrindo.

— Se bem que sua fantasia está perfeita — Dave opinou. — Está a legítima Samara.

— Isso é verdade. — Clint afirmou.

— E vocês? Quiseram fazer o clube dos vampiros? — retruquei.

— Tipo isso. — Dave concordou.

— Cadê Ben? — Jaden perguntou.

— Ele está chegando, afinal, ele quem está trazendo as barracas — Mel respondeu.

— Ah, é mesmo — lembrei.

Pouco tempo depois, um carro prateado estacionou em frente a nós. Ben saiu do carro, um legítimo Conde Drácula, os cabelos penteados para trás com o início dele fazendo uma espécie de seta em sua testa, uma capa com uma gola vistosa, assim como os outros garotos. Sorri:

— Bem, é um efetivo clube dos vampiros.

— Minha mãe está dirigindo — Ben pareceu curioso. — Por alguma razão, ela quer conversar com você, Shelly.

— Ah, claro, tudo bem — resolvi. Encaminhei-me ao carro, tentando ficar calma. Eve McCarthy desceu do carro e fechou a porta, sem salto, uma roupa discreta.

— Ben, meu filho, pode chamar seus amigos para ajudar com o material, certo? Só trocarei algumas palavras com Shelly.

— Tudo bem — ele se dirigiu ao porta-malas e chamou o pessoal: — Vamos lá, meninos e Melinda. A não ser que você ache pesado.

— Pesado? Seremos as primeiras a montar a barraca, não é, Shelly?

— Com certeza.

— Boa maquiagem. — ela elogiou. Antes que eu pudesse agradecer, ela convidou: — Acompanhe-me.

Afastamo-nos um pouco do carro, o suficiente para não ouvir tanto a algazarra deles e para que eles não nos ouvissem.

— Eu só queria agradecer por ter conversado com Ben sobre nós. Foi muito gentil de sua parte.

— Não acho que o abismo que tinha entre vocês era bom.

— Você tinha razão. Ele é gentil, um bom garoto. Devo dizer que estou apaixonada pelo mural de fotografias.

— Ben deixou você ver?

— Não da primeira vez — ela deu um sorriso travesso, coisa que eu não a imaginaria fazendo um tempo atrás. — Ainda estou um pouco preocupada com ele. Vez ou outra, ele acorda de madrugada, não sei se ainda tem dor. — Olhamos para os snakes. Ben parecia satisfeito, uma postura um tanto autoconfiante. — Só queria pedir para que você cuide dele, se não for pedir muito.

— Se depender de Melinda, eu não precisarei fazer muito.

Ela pareceu sobressaltada:

— Melinda?

— É, ela é uma preocupada eterna com ele. Sempre pergunta sobre a dieta, se ele sente dor... Claro que Ben é um pouco turrão em relação a isso, mas cede com ela. Acho que eles dariam certo juntos.

— Talvez — Eve e Ben tinham o mesmo sorriso satisfeito.

— Uma coisa: por que conversar comigo e pedir isso a mim, exatamente?

— Não sei. Você parece ser a mais madura. Como se já soubesse o que é a vida.

Pensei um pouco antes de responder:

— Talvez eu tenha uma ideia.

— Devo dizer que foi um prazer. Bom acampamento.

— Obrigada.

Aproximamo-nos do grupinho, que havia esvaziado o porta-malas. Cada um segurava algo.

— Espero que se divirtam. Ben, se tiver algum problema, me ligue, por favor.

— Tranquilo, mãe. — Ben concordou dando de ombros.

— Tchau, vocês.

— Tchau, Mrs. McCarthy.

Assim que ela entrou no carro e ligou a ignição, Dave comentou:

— Ok, o que deu na sua mãe?

— Ela está assim desde que fiquei doente. Provavelmente, ela ficou impressionada com a tentativa de assassinato.

— O que você acha sobre isso? — indaguei a Ben.

— Foi... inesperadamente esperado.

— Uh... O quê? — Mel ficou surpresa aparentemente.

— Bem, minha mãe é... Ok, era bem mais autoritária, desagradável. Só não achei que fosse chegar nesse cúmulo. Mas enfim, Halloween! Vamos encher o armário de Shelly!

— Mereço — comentei ao ver o pessoal correndo ao portão da escola. — Bem, hora de incorporar.

Joguei os cabelos para frente o suficiente para que eu ainda enxergasse e caminhei. Percebi alguns olhares surpresos. Chegando à recepção, vi a representante de turma com uma fantasia de bruxa. Pensei em ir de bruxa só pela ironia, mas a de Samara pareceu mais viável.

— Boa noite! Quer participar do concurso de fantasia?

— Claro, Chloe. Por que não?

— Eu... te conheço?

— Shelly Revenry, esquisitona desenhista generalista...

— Shelly, sua fantasia está perfeita! Sério, você pode ganhar esse concurso.

— Obrigada.

— Boa festa e circule! Vão curtir muito essa fantasia!

— Ok!

Entrei e me dirigi ao meu armário, onde Jaden tentava decifrar o código da fechadura. Ouvi um clique e o armário se abriu. Ergui as sobrancelhas e creio que minha expressão ficou irritada, pois Clint recuou em receio:

— Essa expressão com essa maquiagem é assustadora.

Jaden fez sua melhor expressão apaziguadora:

— Está tudo bem, certo?

— Não, não está.

— Puta merda, alguém está fodido — Dave comentou, assustado. Dei um tapa meio forte na testa de Jaden.

— Ai!

— Espero que você esqueça bem rápido.

— Relaxe, Queen Marie.

Começamos a guardar as estruturas das barracas e os colchonetes. O armário quase não fechou.

— Porra, isso cansa — Ben reclamou, forçando o armário enquanto eu o fechava.

— Vamos, chorão. — Mel chamou, sorrindo. — Vamos nos divertir um pouco.

Entramos no ginásio e a música estava alta, naturalmente. O som mudou para uma sonoplastia sinistra. Haviam abóboras com lanternas dentro, cortinas negras nas janelas com rasgos de teias de aranha e árvores sem folhas. Espantalhos aqui e ali tornavam o ambiente mais sinistro juntamente com a esporádica fumaça de efeitos pirotécnicos.

— Para que tanta fumaça, gente? — Mel reclamou.

— Estou me perguntando a mesma coisa. — comentei.

— Música bacana, até, mas por que está com algum odor de maconha? — Jaden questionou.

— Porque provavelmente fumaram aqui. — Clint respondeu, prático.

— Provavelmente.

— Vou circular por aí para ver se curtem minha fantasia. — informei. — Curtam a música.

— Algum ponto de encontro? — Dave indagou.

— Comida, talvez — apontei para as barracas de comida e os snakes concordaram.

Dirigi-me ao último banco da última arquibancada: uma garrafa de vodca pela metade. Tomei uns goles. Precisaria de umas três doses daquilo para não pirar antes do acampamento. Quando me senti um pouco mais relaxada, deixei a garrafa no mesmo lugar.

"Isso é perigoso", Elizabeth comentou.

"Bem, eu não vou dirigir mesmo".

"Engraçadinha. Você devia evitar esse tipo de coisa. Não é nada bom você recorrer a esse tipo de coisa para relaxar".

"Só essa noite e eu nem vou beber mais hoje".

Andei um pouco, brinquei com alguns conhecidos, bebi um copo de água, belisquei uns salgadinhos e voltei para onde os snakes estavam. Ben parecia apreensivo.

— O que foi, Ben?

— Ah, nada não — ele respondeu dando um sorriso tímido, totalmente não ele. Depois, sacou a Polaroid e tirou uma foto minha.

— Ben! — reclamei.

— Ficou ótima, não se preocupe. Juntem-se, quero tirar uma foto de vocês.

— Sem você, Ben? Não vale. — Jaden comentou. — Você é o líder dos vampiros! O conde Drácula do século XXI! O...

— Já entendi, já entendi... Alguém que saiba tirar fotos? — Ben olhou ao redor. — Acho que não. Por enquanto, tiro algumas fotos de vocês. Só se divirtam.

— Boa noite, alunos! — a diretora falou ao microfone. — Ficamos muito felizes ao ver tantos alunos em nossa festa de Halloween. Agora vamos anunciar o vencedor ou vencedora do concurso fotografia da escola!

Alguns gritos entusiasmados fizeram-se ouvir.

— Você se inscreveu? — Dave perguntou a Ben.

— Sim.

— E não disse nada para nós? — Mel questionou, falsamente irritada. Ben soltou um sorrisinho.

— O prêmio de $50 vai para... Benners McCarthy!

A foto de Ben apareceu em um telão e nela estava o pátio da escola em um ângulo incrível. Raios solares apareciam ao fundo iluminando a árvore, as pessoas estavam interagindo e um skatista estava no ar, o skate invertido aos seus pés. Pude ver Jaden, Mel, Dave, Clint e eu conversando na sombra da frondosa árvore. Que. Sacana. Aplaudi enquanto Ben se dirigia ao palco, com pessoas lhe dando tapinhas de congratulações.

— Parabéns, Ben! — gritei. Os outros me acompanharam.

Ben subiu no palco com um grande sorriso, pegou um troféu simples e a recompensa, abraçou amistosamente a diretora.

— Quer falar algo, Ben?

— Só agradecer pelos que votaram em mim. Obrigado.

Aplausos e uma discreta despedida. Quando Ben voltou, Clint perguntou:

— Por que não disse nada para nós?

— Estava nos murais! Ninguém lê aquilo não?

Nós nos entreolhamos e a resposta foi unânime:

— Não.

Ben bateu na própria testa.

— Ok, ok. Também não falei nada por não querer um sucesso roubado e tendencioso.

— Ok... — Dave respondeu como quem apenas aceita, mas não entende.

Começou a tocar Come on Eileen.

Hostie! — praguejei. — Essa música me persegue!

— Meu Deus, essa música... — Clint rolou os olhos.

— Essa música é tão infância! — Melinda exclamou. — Ben, você vai dançá-la comigo.

— Eu?!

O falso conde Drácula só teve tempo de me passar a Polaroid e o troféu a Dave antes de Mel o arrastar até o centro do salão. Ele parecia totalmente desajeitado, mas ela procurou ajudar. Dave soou confuso:

— Mas o que foi isso?

Sorri, sentindo-me contente e satisfeita com a cena que via:

— Amor, Dave. — respondi sem olhá-lo. — Amor.

Peguei a câmera e tirei uma foto justamente no momento em que Mel riu de algo que Ben falou para ela e eles pareceram incríveis. Depois que guardei a câmera, Jaden e Clint me arrastaram até o centro, onde fizemos um círculo e começamos a pular como loucos. E foi tão divertido.

"Vocês estão estranhamente incríveis", consegui ouvir a voz de Elizabeth por cima do barulho.

"Eu sei", respondi, entusiasmada.

— Somos incríveis! — gritei, rindo. O grito foi repetido.

************

Depois de três horas, saímos da festa, risonhos e com os pés doloridos. Sei disso porque todos reclamaram da mesma coisa. Depois da dança, Ben criou coragem e pegou o tripé da câmera, tirando uma foto de todos. Ganhei o concurso de fantasia por pouco e fiquei muito sem graça, mas recebi o prêmio.

— Ok, vamos para a minha casa, queridos — Mel convidou. — A noite será longa.

Fomos à parada de ônibus. Ben e Mel pareciam mais próximos. Eles estavam se ajudando com as partes da estrutura das barracas. Jaden, Clint e Dave estavam carregando os sacos de dormir e suas bagagens. Pegamos o ônibus e dessa vez sentei no corredor, com Clint ao meu lado, Mel e Ben atrás, Jaden e Dave na frente.

Chegamos à casa de Mel e fui lembrando do motivo do acampamento: iniciação, segredo, fatos relevantes e feitos épicos. Senti-me pesada novamente ao lembrar-me da minha infeliz habilidade. O que eu falaria para eles?

— Terra chamando Shelly... — Jaden passou a mão diante dos meus olhos. — Onde sua cabeça está, Queen Marie?

— Na festa — menti, sorrindo levemente. — Foi muito divertida.

— Verdade. — ele concordou.

— Ei, Shelly, temos que montar nossa barraca! — Mel chamou.

— Ok! — aceitei o convite.

Levantei-me e criei ânimo para montar a barraca. Em dez minutos, estava pronta.

— Vocês podem nos ajudar? — Jaden perguntou com um sorrisinho infantil.

— Quatro caras e nenhum sabe montar uma barraca? — Mel reclamou cruzando os braços. — Está enferrujado, hein, Dave?

— Só me ajude a relembrar e poderemos fazer isso sós. — seu irmão respondeu, taciturno.

Mel o ajudou enquanto eu desembrulhava meu saco de dormir dentro da barraca. Depois, nos reunimos em um círculo onde no centro havia algumas velas aromatizadas para termos claridade ao invés de uma fogueira, pois não queríamos incomodar os vizinhos.

— Vamos começar o acampamento! — Ben anunciou. — Trouxe marshmallows.

— Faremos na vela mesmo? — indaguei.

— Na necessidade...

— Tudo bem.

Começamos a assar marshmallows e comer enquanto conversávamos sobre os impedimentos diários de se acender uma fogueira. Sim, isso virou pauta de discussão. Logo após, cantamos músicas aleatórias e éramos tão desafinados. E então, veio a hora com a qual eu tanto me preocupei:

— Agora vamos ao nosso ritual de iniciação — Mel fez sua voz se ouvir. — Decidimos recontar nossos segredos e feitos épicos a vocês e em troca, vocês nos contam os seus. Ordem do círculo, ordem alfabética...?

— Ordem aleatória — Clint decidiu. — Eu não recontarei meu segredo, tenho algo novo para compartilhar. — A atenção foi toda voltada para ele, que se esforçava para dominar seu nervosismo. — Eu... estou namorando um cara.

— Puta merda — Melinda soltou a frase, a expressão surpresa.

— Caralho! — Jaden levou as mãos a boca, sorrindo.

— Wow. — Dave ergueu as sobrancelhas.

— Por essa eu não esperava — simulei surpresa.

— Isso é que é segredo surpreendente! — Ben exclamou. — Conte-nos tudo.

Clint contou os fatos e por fim, desabafou:

— Não sei como meu pai vai ficar quando souber disso. Só espero que fique tudo bem.

— Vai ficar, Clint. — Melinda sorriu, confiante.

— É isso? — o garoto questionou. — Nenhuma colocação contra?

— Ué, por que teríamos? — Dave retrucou. — Você continua o mesmo, continua nosso amigo. Tudo bem, acho estranho imaginar sexo entre dois homens, mas respeito. Não é como se eu fosse deixar de falar com você, cara.

— Digo o mesmo. — Jaden concordou.

— Pois é, Clint. — Ben suspirou. — Só estou com raiva por um motivo: por que não nos disse isso antes?

— Sei lá, eu não acabei falando?

— É... — Ben apenas aceitou.

— Sgi. — Dave falou.

A palavra estranha foi repetida como um lema de guerra, porém respeitoso e baixo.

— O que significa?

— Obrigado em um dialeto dos cherokees do leste. — Melinda esclareceu.

— Interessante.

— Ah, por favor, somos fodas. Que grupo de amigos faz um agradecimento em iroquês? — Dave comentou em um sorriso orgulhoso. Sorrimos.

— Quem será o próximo?

— Ok, posso ir — Ben se pronunciou. — No meu caso, recontarei meu segredo. Nada novo.

— Eu discordo dessa parte — comentei ao mostrar a foto dele e Mel. O garoto ficou vermelho e riu:

— Nada novo.

Melinda deu um tapa nele.

— Isso doeu! — ele reclamou e ela estirou a língua pra ele. — Mas enfim. Fui trancado no espaço de fotografia do meu avô pela primeira vez quando tinha seis anos. De início, tinha muito medo, mas recorria as fotografias do estúdio vermelho para me imaginar nas paisagens abertas. É, sou claustrofóbico, fico muito desconfortável em espaços fechados, mas controlo na maioria das vezes. E é isso.

— Sgi — a palavra foi dita mais uma vez.

— Eu falo agora — Mel falou. — Fugi de casa aos sete anos. Nosso pai era um homem horrível e nos tratava desse jeito, então, fugi para Oklahoma e fiquei morando com minha avó e os cherokees por uns seis meses até que fui obrigada a voltar para Missouri. Depois, nosso pai passou dos limites e decidimos finalmente nos mudar para cá, para o Canadá.

— Essa não foi uma recontagem muito completa — Dave comentou.

— Tudo bem, tudo bem. — ela pareceu irritada. — O porco nojento tentou me estuprar, ok? Foi esse o principal motivo para que minha mãe finalmente se livrasse daquele homem. Meu avô conseguiu uma casa em Armstrong e ficamos morando lá. Termino meu relato.

— Sinto muito, Mel. — lamentei olhando para ela. — De verdade.

— Sgi — ela respondeu e a palavra ecoou novamente.

— Bem, eu não tenho muito o que contar, mas... — Dave começou, mas deu uma pausa. — Sei lá, sempre gostei de ler. Foi como uma fuga ao pai horrível que eu tive. Já ajudei algumas crianças do meu bairro a aprender a ler. Acho que é uma das coisas que eu mais me orgulho.

— Shelly, você está chorando? — Ben indagou.

Enxuguei as duas lágrimas que escorregaram pelo meu rosto.

— Sei lá, foi só o momento.

Eu estava pensando na história de cada um: Clint sem sua mãe, os Callahan e o seu pai, Ben e seus problemas. Eles eram pessoas incríveis e suas histórias eram únicas: superação, amor, sentimentos. A vida é fascinante. Um pouco efêmera, verdade, mas fascinante.

— Enfim — Mel sorriu. — Sgi.

Novo eco coletivo.

— Agora é a vez de vocês — Ben notou. — Digam seus feitos épicos, seus segredos, suas vidas. Permitam-nos lhes conhecer.

— Ordem alfabética? — indaguei olhando para Jaden.

— Ordem aleatória — ele lembrou.

— Ok, vou tentar dizer alguns aspectos da minha vida. — comecei. — Já fiz hipismo...

— Que foda! — Ben interrompeu.

— Parei depois de um tempo. Já esquiei algumas vezes, mas tem algum tempo que não o faço.

— Algum segredo importante? — Dave perguntou.

Senti-me perdida. Dizer ou não dizer? Pensei um pouco.

— Acho que nenhum — menti e aquela mentira me deixou mal. Não queria mentir para eles, mas não sabia se eles iriam entender. Procurei comentar mais sobre minha vida: — Já fiz regência, mas disso vocês sabem. Teve um fato interessante, mas... não sei se devo contar.

— Mencionou, contou — Clint determinou.

— Já fui a um psiquiatra quando eu tinha 7 anos por alguns problemas e ele foi bem rude.

— Rude? Rude como? Por quê? — Ben indagou.

— Ele estava bêbado, soube que acabou morrendo por cirrose hepática depois de dois anos, provavelmente por abuso ao álcool. É só isso que tenho a dizer.

— Sgi — Mel agradeceu, mesmo não aceitando completamente. A palavra foi repetida.

— Sua vez, Jaden — Dave avisou.

— Para ser franco, não sei bem o que falar.

— Bem, você fez um feito épico para mim, Jaden. — lembrei, mas interpretaram de forma errada:

— Huuuuuum... — Isso foi coletivo.

— Não é nada do que vocês estão pensando — o loiro rolou os olhos. — Teve uma madrugada em que acordei com pedrinhas sendo jogadas na minha janela. Quando olho para fora, Shelly estava lá e notei algo errado, talvez na forma que ela andava, não sei. Bem, eu estava certo: a garota estava com um corte fodidamente grande na perna.

— Caramba — Dave verbalizou a surpresa.

— E estava saindo muito sangue. Tive que fazer um torniquete para parar a hemorragia, fazer o curativo e uma doação de sangue com uma seringa de 20ml. Foi desesperador.

— Que madrugada louca. — Clint comentou.

— E hoje, eu tenho uma cicatriz enorme na minha coxa direita — complementei a história. — Fim.

— Nada mal, anjo xingador — Ben elogiou, parecendo sinceramente impressionado.

— Ele salvou sua vida. Wow. — Clint comentou.

— Bem, isso foi para nos conhecermos melhor, talvez um pouco de autorreflexão. — Dave informou. — Vocês estão dentro.

— Estamos desde que resolvemos ser amigos — retruquei sorrindo.

— Só oficialização — Mel deu de ombros, sorrindo também.

Conversamos sobre o baile para desfazer o clima um pouco tenso, mas depois fiquei com sono. Deitei no chão e vi as estrelas, senti a claridade das velas enquanto a conversa foi ficando tão distante... pensei em como vi as várias faces dos meus amigos, mas não consegui refletir muito. Logo minha mente ficou embotada demais pelo sono e eu só me permiti estar ali.


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Notas finais do capítulo

E então? Acham que Shelly deveria ter dito sobre sua habilidade?
Críticas, comentários, sugestões, desabafos da vida e relatos abaixo vvvvvvvvvvv
Até o próximo :)



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