Após o beijo, ele me encara por alguns segundos e franze o cenho levemente, então olha de Cara para Peter e pergunta:
–Precisamos provar mais alguma coisa ou vão parar com essa história ridícula de namoro de mentira? - ele tenta soar calmo, e talvez aos ouvidos de quem não o conheça ele tenha conseguido, mas eu sei que ele está com raiva.
Peter sorri para nós e olha com desdém para Cara.
–Idiota, se quer fazer cena de ciúmes, procure algum otário para te fazer plateia. - ele diz, logo após se vira e vai rumo ao grupo de amigos que estava no outro lado da arquibancada.
–Eu sei que vocês dois estão mentindo, só não sei o porquê! - ela diz com raiva.
–Deixa de ser ridícula, garota! - explodo, para a surpresa dela e de Tobias, que me olha com uma expressão totalmente surpresa. Não costumo perder o controle, mas Cara me irrita cada dia mais, e sinto que ela não pretende parar por aqui, sei que ela vai longe quando quer alguma coisa, ou alguém.
Ela sai bufando e batendo os pés, mas não fala mais nada.
Olho para Tobias esperando que ele fale alguma coisa, mas ele está olhando para os pés, e sua cabeça parece estar longe. Será que ele está assim por causa dela? Bem, talvez ele quisesse mantê-la por perto pra quando tudo isso acabar... Mas ele sabe que se estalar os dedos ela volta, não? Sou tirada de meus devaneios quando o ouço falando, mas não pareço ter ouvido o que ele disse.
–Desculpe, não ouvi o que você disse. - digo negando com a cabeça. Ele fecha brevemente os olhos parecendo cansado.
–Eu disse pra irmos, o dia foi longo...
–Claro - digo acenado positivamente com a cabeça.
Seguimos o percurso até o carro totalmente em silêncio, diferente de hoje cedo, onde ele mesmo estava animado. O percurso até a minha casa foi de igual silêncio, eu apenas não consigo entender o porquê, sei que ele já beijou inúmeras garotas, eu sou só mais uma.
Quando paramos em frente à minha casa, faço menção e abrir a boca para me despedir, mas ele fala antes:
–Me desculpe, tudo bem? - ele diz passando as mãos pelos cabelos. - Eu sei que não deveria ter feito aquilo.
–Está tudo bem - digo sorrindo fraco - Não foi nada de mais, nós sabíamos que talvez isso fosse necessário...
Ele me fita com seus olhos azuis que agora estão mais escuros, parecendo que há uma tempestade em seu interior, durante o que me parece uma eternidade, mas suponho que seja apenas alguns segundos, então diz:
–Você não entende... Eu nunca deveria ter feito isso, não com você... - Ele termina cerrando os punhos em cima do volante e fechando os olhos. O quê? Será que ele não gostou? Quero dizer, não beijo tão mal assim... Por que ele está falando assim? É claro! Ele gosta da idiota da Cara e sabe que ela vai ficar brava com ele por ter visto tudo aquilo! Eu não tenho culpa por ele ter agido sem pensar, como ele pode dizer isso? Olho pra ele sem expressão.
–É só isso que você tem pra dizer? - pergunto com a voz mais fria do que o esperado. Ele fecha os olhos e assente com a cabeça.
–Sim.
Saio do carro sem olhar para trás e entro em casa subindo rapidamente as escadas rumo ao meu quarto. Quando chego lá, atiro minha mochila em um canto qualquer e vou direto para o banho, preciso relaxar e esquecer tudo isso que aconteceu hoje. O que ele quis dizer com aquilo? Não sou boa o suficiente para beija-lo? Ele não parece ter se preocupado com isso quando me pediu para ser sua namorada, sabendo de tudo o que teríamos que fazer pra manter essa farsa.

Quando termino meu banho, visto uma roupa aleatória, não estou com um bom estado de espírito para ficar combinando roupas, ainda mais sabendo que passarei o resto do sábado em casa. Como meu desjejum e almoço foi uma barra de cereal, resolvo descer para comer alguma coisa. Na cozinha, encontro Caleb mordiscando alguma coisa, então ele me vê e sorri.

–De pijama essa hora da tarde? - ele pergunta rindo. Olho para minha roupa e dou de ombros sorrindo.

–Parece combinar com esse sábado. - digo abrindo a geladeira e escolhendo algumas coisas aleatórias pra fazer um sanduíche.

–Aconteceu alguma coisa?

–Não... - digo tentando sorrir sem muito sucesso, ao que ele franze o cenho, - Apenas não foi um bom dia.

Ele vem e me abraça de lado, depositando um beijo em minha cabeça.

–Se você precisar conversar, sabe onde me escondo, não é? - sou obrigada a rir com isso, pois quando eu era pequena, ele fez uma barraca de cobertor para nós, e disse que era ali que ele se escondia.

–Sei sim, obrigada - sorrio e ele me lança uma piscadela saindo da cozinha, não sem antes pegar seu lanche.

Quando termino meu sanduíche, vejo que o sol ilumina fracamente as janelas, então guardo as coisas e resolvo subir para meu quarto, mas como vejo que meus pais não estão pela casa, bato suavemente à porta de Caleb e ouço um pode entrar.

–Onde estão papai e mamãe? Não os vi pela casa... - pergunto à meu irmão, que está fazendo alguma coisa em seu computador.

–Saíram com os Eaton, se bem me lembro foram resolver coisas do Senado, e ouvi mamãe falando alguma coisa sobre compras. Acredito que voltem só amanhã.

–Certo - reviro os olhos ao ouvir esse sobrenome e agradeço fechando a porta.

Quando estava entrando em meu quarto, ouço o meu celular tocando e por alguns breves segundos, sinto um frio na barriga, quem pode ser? Ora, que estupidez é essa de frio na barriga, Beatrice? Olho no visor e vejo que é Christina, que a essa hora já deve saber do ocorrido, então me atiro na cama e atendo ao telefone.

–Vocês se beijaram e eu não estava junto para ficar olhando emocionada?– diz Chris, praticamente berrando.
–Sim... Não! Quer dizer... Ah! - expiro com força mostrando minha frustração.- Sim, eu e Tobias nos beijamos, mas eu sei que foi apenas pra provar à Peter e quem mais seja, que nós estamos namorando, e a prova disso é que no beijo não parecia haver nada além de necessidade.
–Tris– começa Christina com cuidado - O que isso significou pra você? Quero dizer, o que você pensa à respeito?
–Nada, não penso nada! sei que ele fez isso por puro impulso e necessidade de mostrar à Peter.
–E se tiver sido mais do que isso?
–Impossível, ele mal falou comigo após o beijo, apenas me trouxe pra casa, só quebrou o silêncio para se despedir. - decido omitir nossa conversa no carro, pelo menos ate eu mesma saber direito o que pensar, ou mesmo até entender o significado das palavras. - Se porventura pra ele representasse mais do que um beijo como qualquer outro, ele não teria agido assim, certo? E além disso, nós somos namorados, eu sabia que quando fosse necessário eu teria de fazer isso... Ele me avisou, então já esperava que fosse acontecer. - digo divagando.
–Sim, eu sei que você sabia de tudo isso, mas a minha pergunta é: esse beijo mexeu com você?– fico em silêncio por alguns segundos, eu apenas não sei o que responder, e Chris parece compreender minha hesitação. - Tudo bem, apenas pense nisso, certo?
–Vou tentar - respondo cansada.
–Boa noite Tris, até logo.
–Até logo, Chris. - digo encerrando a ligação.
Esse beijo mexeu comigo? Sinceramente, não sei! Mas eu desejo do fundo do meu coração que não tenha mexido com nada, que não tenha despertado nada, pois Tobias ainda é meu melhor amigo, e ao fim de todo esse circo, espero que ele ainda continue sendo.
Droga, onde eu fui me meter? Eu sabia que isso não daria certo, como pude ser tão tola de achar que namorar meu melhor amigo não daria em nada? Espero vê-lo logo, só assim saberei se ele realmente mudou comigo ou foi o choque do acontecido. Parte de mim concorda em vê-lo, pois quero entender o significado de suas palavras, se ele realmente se arrependeu de me beijar, mas outra parte, e a maior, por sinal, diz que ainda não é o momento ideal.

Sem nem perceber, acabo adormecendo em meu quarto por o que penso ser horas, sem sonho algum, apenas a inconsciência que leva os problemas embora. Acordo com a sensação de ter alguém em meu quarto, que está totalmente escuro, pois nas janelas não há nenhum resquício de sol, apenas a escuridão. Quando olho para os pés da cama, para meu total desespero, tem alguém sentado lá. Me encolho rapidamente da cama, e a pessoa levanta e vem em minha direção.

Deus, estou tão apavorada que não consigo emitir som nenhum. Então a pessoa susurra:

–Calma Beatrice, sou eu! - identifico a voz de Tobias.

–O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO AQUI? - praticamente berro, e ele hesita - Como você veio parar aqui? Que inferno Tobias, você quase me matou de susto! - Ouço sua risada rouca e sinto ele sentando perto de mim.

–Seu irmão deixou que eu subisse, ele disse que sabe que eu posso te animar, já que você parecia estar chateada, estava? - eu bufo revirando os olhos, mesmo sabendo que ele não pode ver.

–Não, só estava irritada. - falo rispidamente.

–Com quem?

–Você! Idiota. - falo levantando da cama e me afastando dele. - O que você quer?

–Vim me desculpar. Eu só não quero que nossa amizade mude Beatrice, você é importante demais pra mim, não posso perder você por um capricho meu.

–Você acha que um beijo faria com que nossa amizade terminasse?

–Não é esse o problema! - ele esfrega as mãos nos cabelos como se estivesse nervoso - Você é diferente, é minha melhor amiga, eu só não quero ser idiota e estragar tudo...

Então foi por isso? Mas eu não sou tão boba a ponto de estragar nossa amizade por um simples beijo... De qualquer forma, não consigo ficar brava nem chateada com ele por muito tempo, então me sento novamente ao lado dele.

–Tudo bem, mas você não precisa se preocupar comigo, está tudo sob controle, certo? - ele me olha e sorri.

–Quando esqueço o porquê meti você nessa furada, você vem e me lembra de que sempre posso confiar em você! - então ele me abraça de lado, e eu descanso minha cabeça em seu ombro. - Eu acordei você, não é?

–É - digo resmungando.

–Nós já fizemos isso várias vezes, vou ficar aqui até você dormir, tudo bem pra você?

–Tudo. - digo sorrindo e sentindo ele próximo a mim, e assim adormeço novamente, mas dessa vez sabendo que tudo está bem.