Assistir a um filme com Ariela tinha sido mais divertido do que eu poderia ter esperado. Ela fazia comentários que as vezes condiziam perfeitamente com meus pensamentos e outros que nos faziam entrar em pequenas discussões, como amigas. Decidi esquecer que a tinha promovido para o posto de vadia no segundo em que a tinha visto a tantos dias atrás. E que ela tinha me xingado um dicionário inteiro de nomes injustos.

Fazer o quê? Sou uma pessoa que perdoa.

O único probleminha é que seu humor não tinha ficado tão bom depois de nos reunirmos novamente a Justin e Mikaelle, porque eles estavam amigáveis demais um com o outro. Contra todas as possibilidades, pareciam íntimos.

E agora que ela e a irmã tinham saído do elevador no segundo andar, onde Mikaelle morava, Justin e eu estávamos sozinhos, subindo para o nosso. E eu, que sou eu, não podia ficar calada.

—- Ela te encantou. -- meu reflexo no espelho mostrava meu cenho franzido de preocupação.

Justin me olhou confuso.

—- O quê?

—- A Mikaelle! -- o elevador abriu e eu saí. Justin ficou um segundo parado, me olhando, então saiu também. Agora estávamos no nosso corredor. -- Você me convidou para ir ao cinema, mas nem se incomodou por eu ter ido embora daquela seção.

Um olhar de compreensão se mostrou em seu rosto.

—- Heather, me desculpe -- assumiu uma expressão culpada, não completamente verdadeira, nem mesmo falsa, estava mais para um meio termo. Parece que ele não compreendeu tanto assim. -- Eu não...

—- Pelo visto você não entendeu nada. -- o interrompi. -- Olha, não estou chateada. Sei muito bem que você me convidou com segundas intenções, todos os sinais estavam lá. Mas, as garotas tornaram qualquer coisa impossível. Você não contava com a presença da Mika e nem em como iria reagir a ela.

Um sorriso lento começou a aparecer em seu rosto.

—- Você é esperta.

—- Passei a vida lidando com pessoas que se aproximavam de mim por interesse, pessoas que só levavam os próprios sentimentos egoístas em conta. Foi fácil descobrir que seu único interesse era atingir seu irmão por meio de mim, mas Justin, você está me elevando a um patamar muito alto se acredita que seu irmão seria tão afetado assim.

—- Pensando bem, você não é tão esperta assim, se rebaixa demais para o próprio bem. É claro que ele seria afetado. -- disse secamente. Falar em Samuel não parecia deixá-lo de bom humor. -- Mas, está certa ao insinuar que qualquer planejamento meu ficou como um som de fundo depois que Mikaelle entrou em cena. Ela me chamou bastante atenção...

—- Nem vem com esse sorrisinho canalha. -- avisei. -- Você está atraído por ela, tudo bem, mas se mantenha distante ou como um amigo. E não um amigo tão chegado para ela não correr o risco de se apaixonar por você.

—- Fala por experiência própria? -- provocou.

—- Cala a boca. Bom, Mikaelle não está passando por bons tempos já que um idiota resolveu traí-la e ela não merece ser mais machucada, então, não a conquiste para jogar fora depois. Não a use como queria fazer comigo.

—- Mas, eu não faço isso. -- seu tom era falsamente ultrajado.

—- Menos, Justin. Menos. -- pedi. -- Acho que você deveria rever o modo como trata as mulheres que entram na sua vida e parar de pensar em como derrubar seu irmão. Inveja e ciúmes não fazem bem e você tem o potencial para ser um bom amigo, não desperdice isso.

—- Não fale do que não sabe, Heather. -- ele tinha ficado claramente com raiva. A tensão em seu corpo demonstrava isso.

—- Estou falando para o seu próprio bem. Se não quiser ouvir, o problema é seu, mas eu acredito que você pode mudar, por isso te dei o benefício da dúvida. Tente mostrar suas emoções verdadeiras aos outros, como estava fazendo com a Mika e não ficar fingindo o tempo todo, mostrando aos outros apenas o que quer que eles vejam. Você é bom, Justin -- toquei seu braço. -- Apenas se dê uma chance e ao seu irmão. O relacionamento de vocês pode melhorar. Ele é sua família, também faz parte de você, não desperdice isso.

—- Você o defende porque está apaixonada por ele. -- disse friamente.

Ouvir aquilo sair da boca de uma outra pessoa, com todas as letras, não era estranho para mim.

—- Não. Eu o defendo porque ele não quer te prejudicar e você age como se fosse tudo que ele fizesse. Tente crescer, Justin. Inveja não leva ninguém a lugar nenhum.

Diante de sua expressão fria, a única coisa que pude fazer foi soltar um suspiro e dar-lhe as costas, caminhando em direção ao meu apartamento, mas não sem antes dizer:

—- Obrigada por hoje.