A Fabulosa Cova Da Incoerência escrita por blblblbl


Capítulo 13
Chá mate.


Notas iniciais do capítulo

Desculpe a demora, de novo. O mostro Matemática deu uma aparição bem loka aqui ;u;



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– Onde estou? – pergunto, olhando para os lados.

– Quem sabe? Eu nunca estive interessada em saber onde estou.

– Mas isso é doentio! Sempre devemos saber onde estamos!

– Nem sempre, querido. Nem sempre...

A figura acorrentada em minha frente mudava várias vezes o tom de voz. Eu não conseguia descrever seu semblante; ás vezes via uma pessoa, outras vezes um animal. Ela parecia uma pessoa vaga e ignorante, presa em um mundo de sonhos. Eu simplesmente não sabia aonde eu havia parado.

– Eu entendo que está confuso... – ela diz. – Mas você quer um pouco de chá? Quero dizer, não tenho fogão ou ervas, mas mesmo assim posso fazê-lo. É difícil pegar as xícaras com essas correntes...

Verdade, ela estava presa com correntes.

– Sim, eu quero chá. – respondo. – Pode ser mate?

– Talvez, se eu tivesse um pouco de mate. Quero dizer, eu posso fazer qualquer coisa aqui, sabe? Na verdade quero dizer que isso é ultrajante, apesar de eu não saber o que significa ultrajante.

– Nem eu, mas é uma palavra bonita.

– Verdade. Palavras são bonitas.

Me sento a mesa, que aparecera de repente em minha frente, e reparo na xícara escaldante de chá mate em minha frente, com alguns cubos de açúcar dispostos ao seu lado.

– Eu sempre quis usar cubos de açúcar. – disse a figura. – Mas eu nunca recebo visitas, e eu nunca tive oportunidade de usá-los. Quero dizer, eu tenho grande consideração por visitas.

Eu que mundo eu vim parar? Eu estou sentado em uma mesinha tomando chá, com uma coisa acorrentada que trocava de forma várias e várias vezes enquanto dizia coisas fúteis. Parecia que ela iria mudar de personalidade e opinião a qualquer momento, e sem aviso prévio iria jogar uma verdade terrível na minha cara só por sadismo. Mas afinal, o que estou dizendo? Ela não merece confiança. Pouso a xícara sobre a mesa e tento olhar outra vez sua silhueta. É borrado, vejo um cão, um cavalo, mas por alguma razão, sabia que era uma pessoa ali. Uma pessoa especifica, ou uma versão psicodélica dela.

– Quem é você? – pergunto, com cautela.

– Quem sabe? Eu nunca estive interessada em saber quem eu sou.

– Mas isso é doentio! Sempre devemos saber quem somos!

– Nem sempre, querido. Nem sempre.

O que aconteceu agora? Tenho a impressão de já ter passado por aquele diálogo. Sinto uma coisa estranha subir pelos meus joelhos em direção ao meu peito. Eu estou... De que adianta saber como estou? Ela falou que não importava, então não importa. Nem sempre...

– ...Desculpe, isso sempre acontece quando vem visitas. – diz ela, tristemente. – Apenas respire fundo e pense em coisas legais. Quero dizer, existe um monte de coisas legais, como quebra-cabeças. Na verdade quero dizer que nunca consegui montar um inteiro, apesar de nunca ter tido um.

– Eu já tive um quebra-cabeça. Tinha um cavalo na frente.

– Interessante. Existem quebra-cabeças de cavalo.

Olho para os lados e me vejo em um grande e vasto cubo branco, sem horizonte nem limite. Era como se eu tivesse entrado na toca do coelho branco, e não conseguisse sair da casa do chapeleiro. Na verdade, essa situação me lembra muito isso.

– Você gosta de livros? – pergunto, tentando não me deixar levar pela situação corrosivamente maluca.

– Depende. Uns eu gosto, outros não, mas de que importa. Neles há palavras, e palavras são bonitas.

– Eu imagino que nosso coração seja um grande livro que aos poucos vai sendo escrito, porem nunca é lançado á tempo.

– Não é por causa disso, querido. – ela diz, alegre. – Esse livro está completamente escrito desde o momento em que nascemos, mas nós revisamos e alteramos tantas vezes que quando ele é impresso, o que há são apenas páginas rasgadas ou manchadas de tinta.

– Afinal, será que o coração pode ter uma forma definitiva?

– O coração não foi criado para ter um padrão. Ele está sempre mudando de forma e de proprietário, ás vezes sai machucado e outras vezes sai apodrecido. Quero dizer, mudar um coração não é fácil, por isso a coisa se faz aos poucos, e isso destrói várias páginas.

Eu posso entender com quem estou lidando. Eu posso saber com quem estou lidando. Eu posso convencer com quem estou lidando. Afinal, nós estamos falando exatamente com esse indivíduo.

O Coração de Mimi é louco e vago; Sua aparência é embaçada e indefinível, e desde as primeiras palavras sabemos que não é confiável. Porém, não é como estar lidando com uma fera ou alguém dissimulado. Eu estou falando com alguém que pode provocar uma tempestade a qualquer momento. Cautela, para falar com um Coração, é preciso ter cautela. “Isso exige sabedoria.” “Não confie em seu coração.”

– Você sabe o que está havendo com Mimi? – pergunto sem maiores pausas. Ela para de mudar suas formas e minha visão sobre si tornasse menos embaçada. Ela parece um cão híbrido, ou uma raposa escaldada.

– ...Desculpe. – ela diz sem maiores emoções.

– Desculpar pelo que?

– Pelo incomodo. As pessoas sempre perguntam isso quando vêem aqui, e eu nunca consigo respondê-las. Quero dizer, eu não as respondo, pois não sei quem elas são.

Na verdade quero dizer que eu não confio nelas.

– Confiança é uma espada de dois gumes. Você fala sobre ela, mas a possui o bastante em mim para convidar-me para o chá, com os cubos de açúcar.

– Verdade. Eu tenho por ti muita consideração.

– Vai responder?

– Você já sabe.

Olhamos-nos por um certo tempo. Logo, eu entendi a resposta dela. Conclui: Afinal, quem sou eu para culpá-la? Ela merece e desmerece a tal culpa, portanto não há um bom julgamento.

– ...Você conheceu Ela? – a figura quebra o silencio. Entendi a quem se referia.

– Sim. Ela me trouxe até aqui.

– Entendo. Ela sempre sabe a coisa mais sensata, julgando pelo o que Ela é. Ela não tem a mesma capacidade de sentir culpa como eu, ou remorso.

– Eu não entendo...

– Não entenda. Ela dizia que a amava e que faria qualquer coisa por ela. É certo que Ela fazia de tudo, mas duvido muito sobre o “amava”. Ela não ama ninguém, é pura necessidade. Quero dizer, eu deveria agradecer Ela por não permitir que Mimi se tornasse outro Coração quebrado, mas existem coisas que Ela não pode entender como eu...

– Quanta modéstia.

– Não vou discutir. É Ela quem participa de discussões e resolve contas, eu apenas sinto...

Alguém está abrindo a porta, eu não quero olhar para trás. Quero entender algo sobre ela...

– Não tente entender Mimi. Não se entende as mulheres. E Ela se vai, pois Mimi já sabe o que Ela é. Mas afinal, o que define o que é real e o que é irreal? O mundo é uma grande ficção para mim.

– Adeus. – grito, sendo puxado pela porta de meu quarto.

– Por que “Adeus”, querido? Eu estou a sua frente, chorando em seu ombro e encostando meu peito no seu. Não seja tolo, todos somos Mimi de qualquer forma...

Mamãe abre a porta de meu quarto e Mimi sai de meu ombro. Seus olhos, eles haviam de alguma forma voltado a brilhar.


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Notas finais do capítulo

Hum...



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