Ontem contei a Cloe sobre o meu plano de me aproximar de Miguel. E hoje o colocarei em prática.

As aulas de educação física são a minha preferida. O professor sempre deixa os meninos jogarem futebol no primeiro tempo de aula e no segundo as garotas podem jogar vôlei. É uma das matérias que eu mais aguardo durante a semana, pois as turmas 1a e 1b se juntam para realizar as atividades.

Pelo que sei... Miguel não pode participar das aulas devido à bronquite e asma que ele carrega desde criança. Vez ou outra, quase raramente, o vejo usar a bombinha. Por isso, sempre o vejo lendo na arquibancada enquanto os alunos praticam seus devidos esportes. O time é sempre o mesmo: Garotos do 1a vs Garotos do 1b.

— Yan, pro gol. — Doug, o artilheiro do time diz com tom autoritário. — E toma cuidado com os chutes do Vinni do primeiro b. Ele é bom em fazer gols.

— Relaxa, mano! — Digo caminhando em direção ao gol. — Nada passa pelas “mãos de aço”. — Verbalizo dando ênfase no meu apelido.

Posiciono-me no gol e espero o treinador assoprar o maldito apito. O que não demora muito.

Vinni é o primeiro a partir com a bola. Ele vai com o pé direito. Chuta, mas Brener, do meu time rouba a bola e chuta direto na direção de Doug que tenta chutar mais forte e com isso consegue um...

— Gooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooool! — A voz dos garotos do primeiro b ecoa pela quadra de tanta animação. Fazem umas duas aulas que não conseguimos ganhar do primeiro a. Acho que isso começou a ficar um tanto pessoal entre as duas turmas.

Aproveito a oportunidade para olhar pra Miguel que não desgruda nem um segundo do seu livro azul, sentado no ultimo banco da arquibancada. Encolhido como um feto. Às vezes me pergunto como um garoto como ele não tem tantos amigos e nem anda com muitas pessoas em volta. Miguel tem dezesseis anos, olhos claros e cabelos castanhos enrolados. Apesar de ser um pouco tímido, ele parece ser uma boa pessoa e isso é o que importa. Além de ser inteligente e tirar ótimas notas, diferente de mim, ele participou das olimpíadas nacional de matemática e ficou em segundo lugar. Ok, Ok, ele não conseguiu ganhar em primeiro, mas se tivesse uma listagem com os nomes de todos os alunos do país que fizeram essa prova... me procure entre os números 9.999988 e 10.00000. Matemática nunca foi meu forte, mas o que eu perco nisso eu compenso em...

— Yan, a bola! — Ouço o grito de Doug e no mesmo instante que viro novamente minha atenção para o jogo, sinto um enorme impacto no meu rosto e consequentemente caio pra trás, de bunda no chão.

Tudo isso é seguido por um longo silêncio na quadra.

— Essa deve ter doido. — Escuto o comentário de Erick do primeiro b.

— Pelo menos não foi gol. — Doug retruca.

Minha cara está toda ardendo. Tenho certeza que além de avermelhado, meu rosto deve estar com todos os detalhes da bola. Isso é futebol ou queimado?! – penso me levantando e lançando a bola novamente para o campo.

...

No recreio, procuro por Cloe para irmos até a cantina juntos. Mas antes, retiro um papel da minha mochila, arranco um pedaço de durex com os dentes, cheio de pressa e por fim, caminho na direção de Miguel que está caminhando na direção do pátio. Com cuidado, grudo a folha na sua mochila e corro na direção oposta para que ele não me veja.

Eu sei que é estranho, mas foi a única coisa que consegui pensar de ontem pra hoje.

Observo as garotas começarem a rir enquanto ele passa, e automaticamente Miguel retira sua mochila das costas e se depara com a minha folha que dizia: