Já havia passado por várias portas desde que saíra do porão e o que afligia Merida era a contínua passagem das horas em que estava perdida pela casa de Rapunzel. Por mais que não quisesse admitir, estava começando a se arrepender de ter deixado Jack para trás. As pequenas pistas em que encontrara já começavam a ficar marcadas pela força que a garota as apertava enquanto torcia para não dar de cara com Gothel ou os Gêmeos gorilas ruivos que perseguiam sua amiga por onde quer que fosse. Suspirou aliviada quando reconheceu a escada da sala de estar em que subira quando entrou, ao lado de uma porta que chamou sua atenção no início do corredor que estava. Algo em sua mente dizia que havia algo importante por trás daquela porta. 

"Definitivamente não Merida" reprovou-se mentalmente enquanto caminhava a passos lentos até o local "Você já deveria ter saído daqui a muito tempo. Mais um pouco aqui e colocará tudo o que encontrou a perder" 

Por mais que quisesse se afastar dali não conseguiu evitar segurar a maçaneta entre seus dedos. De uma coisa Jack estava certo: precisavam de mais pistas. Girou o mecanismo o mais silenciosamento que conseguiu e suspirou irritada. Estava trancada. Provavelmente a tia da garota havia guardado tralhas que ela julgava desnecessário ser do conhecimento da sobrinha. Olhou ao redor e se lembrou que o quarto da mulher ficava duas portas a direita de onde estava parada. Por mais que houvesse odiado o que o irmão fizera, tinha que agradecer a ele por mostrar a chave de seus problemas: onde Gothel guardava seus segredos. 

— Agora veremos por que você tanto tranca a Rapunzel nesse lugar. - disse em tom baixo, avançando na direção da porta de seu quarto. - Eu vou acabar de uma vez por todas com essa escravidão. 

O quarto de Gothel era escuro, misterioso, e por mais incrível que parecesse, tinha um cheiro muito bom. As grossas cortinas vermelho escuras nas janelas espalhadas pelo cômodo estavam fechadas e obrigaram a garota a ligar o interruptor perto da porta. As paredes tinham a cor vinho escuro intenso. Todos os móveis eram feitos de madeira e traziam um sensação desconfortável para Merida, que queria pegar a chave do armário do corredor e dar o fora dali o mais rápido possível. Olhou ao redor e viu um criado mudo isolado no canto de uma parede. Com sua curiosidade falando mais alto, ela começou a vasculhar as gavetas a procura daquilo que necessitava. Encontrou brincos, escovas, colares e anéis, mas nada de chave. Abriu a segunda gaveta e se assustou quando viu o que continha ali. Sentiu o sangue gelar quando tocou a pequena e carregada pistola que a mulher guardava ali. Foi o suficiente para sua consciência gritar em sua mente que já havia passado dos limites ali dentro. Fechou ambas as gavetas rapidamente e torceu para que não encontrasse mais nenhuma surpresa na terceira e última parte do móvel. Entre outros objetos Merida pegou a chave que viera buscar ali. Não tinha como saber se era a chave certa, mas ela a pegou assim mesmo, só por precaução.

Era a hora de descobrir o que era tão importante para que o armário precisasse estar fechado.

***

Jack estava maravilhado como daquela vez estava certo sobre alguma coisa. Após a saída de sua meia-irmã o garoto encontrara diversas coisas que poderiam ser de grande interesse para todo o caso de Rapunzel. Fotos antigas do casamento dos pais da garota e diversos objetos ganhos de presente de batizado o fizeram pensar duas vezes sobre o que estava fazendo. Jamais iria querer ver Punzie viver uma vida que não fora feita para ela. Ela iluminava o lugar por onde passava e ele faria de tudo para que continuasse assim. 

Uma última caixa chamou sua atenção. Não era grande, mas estava pesada e ele a colocou no chão com cuidado e a abriu. Dentro, um saco grande protegia uma pilha de papel e livros, que Jack examinou sem muito interesse.

Um dos livros que ele folheou era repleto de esquemas e diagramas complexos. Ele xingou baixinho, não entendendo o que era tudo aquilo e leu a capa. Seu coração falhou uma batida ao ver os dizeres “Sistemas de freios hidráulicos, guia para iniciantes”. Ele chacoalhou a cabeça. Aquilo devia pertencer ao pai de Rapunzel, afinal, homens gostam de carros. Puxou outro livro mecanicamente e leu a capa.

— Freios automotivos, volume I. – Ele franziu a testa, consternado, e puxou outro, e mais outro – Componentes do sistema de freios. Sistema de freios automotivos.

Ele se assustou quando uma folha caiu de dentro de um dos livros. Jack a pegou e abriu sem pensar, sua mente trabalhando furiosamente. Dentro, com a tinta desbotada pelo tempo, uma caligrafia elegante, claramente feminina, com anotações  diversas sobre as páginas do livro. Em alguns espaços haviam desenhos bem feitos, cópias dos esquemas mecânicos dos livros, com pequenas alterações em tinta vermelha.  Ele quase deixou tudo aquilo cair quando percebeu o que estava vendo.  Aquela caixa não pertencia ao pai de Rapunzel.

Sua cabeça girou, juntando as informações num redemoinho louco: o acidente de carro que matou a mãe de Punzie, a polícia tinha dito que houve um problema nos freios. Depois a mãe de Soluço começou a investigar, e Soluço tinha dito a Merida que ela esteve estudando manuais de mecânica, logo antes de sofrer também um acidente de carro que a matou.

Jack arquejou. Aquela caixa pertencia a Gothel.