Sixteenth Moon escrita por Nath Schnee


Capítulo 2
Primeiro Capítulo – 2 de Setembro


Notas iniciais do capítulo

Um agradecimento especial para a Jackqueline S que comentou no prólogo! Muito obrigada! Beijos!

Bem, agora sim o capítulo. Boa leitura.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/619543/chapter/2

Sonhos


Despencando.

Eu estava em queda livre. Logo eu estaria nas trevas que havia no fim daquele abismo, e sabia que não haveria mais volta.

— Ethan!

Eu o chamei, sabendo que estaria ali, caindo comigo, como estivera das outras vezes.

Não!

Ele gritou e senti a maior segurança possível ao ouvir sua voz. Mas apenas sua voz não me salvaria.

— Ajude-me!

Eu pedi desesperada. Ele esticou a mão. Ele também estava caindo, ainda assim queria me ajudar. Tentou me alcançar, mas eu estava longe. Eu não conseguia esticar o braço o suficiente e só sentia o ar em minhas mãos. Não havia chão sob meus pés e de alguma forma eu sentia estar sendo enfiada em lama. Consegui encostar meus dedos nos dele e houve fagulhas verdes na escuridão.

Não consegui segurar e escorreguei em seus dedos que arranhavam minha pele.

Não olhei para baixo. Já sabia que estava no fim.

Não senti medo, mas não havia mais segurança. Tudo o que eu sentia era a perda.

Não consegui me salvar, não consegui alcançá-lo.

E também sabia que nunca mais alcançaria.


Acordei e me sentei bruscamente enquanto tentava recuperar o fôlego. Olhei ao redor, esperando a visão voltar. Eu não estou morta. Devo estar em meu novo quarto. Devo estar em uma nova casa. Chovia lá fora e eu tinha quase certeza que o motivo era eu.

Voltei a deitar um pouco zonza. O sonho se dissipou aos poucos e pude enxergar meu quarto completamente de novo. Estava em segurança, estava em Ravenwood, com toda a proteção que achavam necessária para mim. Tentei me acalmar. Aquela fazenda, apesar de assustadora para algumas pessoas, não era do tipo que pessoas caíam por buracos negros feitos de lama até ir parar nas trevas. Ou pelo menos eu esperava que não.

Já havia meses que eu tinha esse sonho. Nunca consegui ver o final, como se algo sempre impedisse de terminar. Eu via pouquíssimo do rosto do garoto, sabia apenas que tinha cabelos castanhos grandes o suficiente para cobrir os olhos e que se chamava Ethan. Não conseguia me lembrar de mais nada, nem mesmo de como descobri seu nome. Apenas sentia sua falta e sentia que nunca mais conseguiria voltar para ele. Mas eu sabia que havia algo errado. Eu sentia a falta dele quando acordava, sentia que não poderia viver sem ele. Queria estar com Ethan mais do que nunca. Como? Ele existia apenas em meus sonhos. Era como um amor, mas sendo antes da primeira vista.

Levantei e coloquei os lençóis no cesto de roupa suja. A Casa teria algum trabalho para limpá-los, pois hoje, como sempre, estava cheios de lama. Outra coisa estranha dos sonhos: eles se misturavam à realidade. Sempre acordei suja e agora tinha arranhões em minhas mãos de quando caí. Como era possível?

Estava seguindo para o banheiro quando minha viola começou a tocar em cima da cadeira que ficava no canto. Olhei para ela, espantada. A música que soou tinha minha própria voz, mas eu não estava fazendo aquilo.

Dezesseis luas, Dezesseis anos
Dezesseis dos seus mais profundos medos
Dezesseis vezes você sonhou com minhas lágrimas
Caindo, caindo ao longo dos anos...

Acabou tão rapidamente quanto começou, apesar de continuar se repetindo em minha mente. O som era meio deprimente, quase hipnótico. Eu estaria com medo se não soubesse que quase toda música que minha família escuta é assim. O que realmente me dava medo era o fato de eu não ter tocado nem feito nada para a viola tocar, além de estar sonhando o mesmo pesadelo noite após noite sem saber como acaba ou quem está ali comigo.

Virei-me para a porta do quarto e vi um grande animal me encarando. Ele podia muito bem se passar como um lobo por seu tamanho, mas não passava de um grande cachorro preto e possivelmente assustador para aqueles que não sabem de sua existência. Usava uma coleira de couro de aparência pesada e provavelmente era tão leve quanto uma folha para ele. Quando ele moveu sua cabeça, a lua prateada que havia ali pendeu para um lado e ficou balançando.

Ele não era o único que tinha algo pendurado no pescoço o tempo todo. Uma das coisas que chamavam atenção de algumas pessoas era um colar que eu tinha com vários objetos diferentes. Nele havia um anel de metal de lata de refrigerante, uma conta de vidro preta, um corvo dourado, entre outros. Aquela corrente de prata que para muitas pessoas normais seria considerada como lixo tinha pedaços de mim, pedaços que deixei para trás em cada viagem que fiz. O anel de metal me lembrava Savannah, a antiga casa de minha avó, a conta de vidro me lembrava Barbados, a casa de minha tia Twyla, e o corvo dourado me lembrava minha mãe, que eu nunca soube quem era.

— Oi, Boo. Como vai? — eu tentei sorrir e ele virou a cabeça para o lado parecendo um pouco confuso. Eu podia apostar que não estava mais do que eu.

Entrei para o chuveiro enquanto esperava meu coração parar de dar saltos. A água me ajudava a me acalmar. Os últimos pedaços pretos do sonho que ficaram em minha visão sumiam lentamente. A terra que havia em meu corpo desceu pelo ralo e tentei esquecer completamente o sonho. O problema é que não importava o quanto eu me esfregasse, eu ainda sentia suas mãos agarrando e ferindo as minhas. Eu ainda ouvia a música no fundo da minha mente como se houvesse alguém ali dentro do banheiro comigo, sussurrando para mim cada palavra de forma sombria com minha própria voz.

Olhei para minhas mãos. A lama havia sumido, mas elas continuavam mostrando para mim que era impossível escapar daquilo. A vermelhidão dos arranhões continuava e eles tinham o formato de meia lua.

Quando é que eu me livraria do pesadelo? Nunca?


Desci até hall. A casa estava diferente de quando cheguei ontem. Quase tudo havia mudado. Tio Macon deveria estar de bom humor, pois a mansão poderia ser resumida em uma palavra... Luz. As paredes estavam beges e o teto era branco. Os sofás e poltronas de veludo e com aparência aconchegante tinham a mesma cor. O chão era de porcelanato. Em meio a estes, jaziam mesas de vidro transparente, algumas com livros em pequenas pilhas em cima de si. Ao me aproximar, percebi que elas estavam organizadas em ordem alfabética. Perguntei-me se não fora o próprio Tio Macon em vez da Casa que os tinha organizado.

Esculturas de mármore estavam espalhadas — porém organizadas — pelo recinto. A escada em espiral pelo qual eu descia era a única que não havia mudado, mas ainda assim conseguia se encaixar perfeitamente em meio à decoração com sua cor de marfim. Havia também uma lareira, que ontem não estava ali.

Tudo refletia a luminosidade do sol de um modo realmente incomum, pois não havia sol do lado de fora, apenas um céu obscurecido por conta das nuvens e um sol quase inexistente em meio a elas. Mas aquela não era a única coisa estranha, pois as cortinas cor creme, que anteriormente eram persianas, se moviam em uma brisa suave inexistente.

Segui para a sala de jantar e tudo estava igualmente claro, exceto a mesa. Era a única coisa que não havia se transformado. Talvez a Casa não gostasse de mudar tanto assim. Ela era de mogno escuro e tinha pés em formatos de garras.

Meu tio estava sentado ali, lendo o jornal. Qualquer um que o visse não acreditaria que é o recluso da cidade. Estava vestido impecavelmente como todas as outras poucas vezes que eu o tinha visto: estava usando uma blusa cinza claro com botões prateados e um smoking que ficava perfeito em seu corpo, sem nem um lugarzinho amassado. Assim como eu, seu cabelo era negro e sua pele pálida. A frente de seu cabelo era cinza e era a única coisa que mostrava um pouco de sua idade.

— Bom dia, Tio M. — sentei-me a sua frente. Ele abaixou o jornal e me encarou com seus olhos negros que por acaso me lembravam as janelas do rabecão dele.

— Bom dia, Lena. Dormiu bem? — pensei duas vezes se deveria falar a verdade.

— Tive um sonho estranho, mas sim, dormi bem. — não era completamente mentira. Eu só não tinha dormido bem.

Pensei em como o sonho acabou de repente, como se faltasse um pedaço, e resolvi ser direta. Ou tentei.

— Tio Macon... — hesitei, procurando as palavras certas. Era difícil acusá-lo de algo daquele tipo. — Você tem invadido minha mente para pegar meus sonhos?

Meu tio era um Incubus, um tipo de ser das Trevas que se alimentava do sangue ou dos sonhos humanos. Eles provavelmente pensariam que a espécie da família Ravenwood é uma espécie de vampiro, mas está mais para um demônio. Porém meu tio era diferente de todos. Macon Ravenwood era um Incubus de Sonhos, usava os sonhos, as esperanças e os pensamentos dos humanos como alimento. Pelo menos era melhor do que os Incubus de Sangue. Ele disse-me uma vez que trocara de lado por mim. Talvez até seres das Trevas como ele tivessem uma parte da Luz.

Seus olhos, apesar de quase nunca demonstrar emoções, ficaram cheios de surpresa com minha pergunta.

— Claro que não, Lena. Eu nunca faria isso. Sabe que nem o mais poderoso dos Incubus poderia roubar os sonhos de uma Conjuradora, principalmente uma como você. — assenti e desviei o olhar. Peguei-me perguntando se era mesmo verdade que isso era impossível.

Enquanto ele era uma versão estranha de vampiro, eu era uma versão não tão estranha do que os Mortais chamariam de bruxa. Esse não era o nome correto, na verdade, e nem havia um que realmente definisse todos da minha família, mas éramos chamados de Conjuradores. Temos dons, poderes, que podem ser de qualquer tipo de coisa. Eu deveria conseguir várias coisas, mas não consigo controlar direito nem mesmo minha personalidade.

Olhei para o cachorro que estava deitado aos meus pés. Boo Radley estava balançando a cauda animadamente e seus olhos demonstravam felicidade. Afaguei-o e encarei seus olhos estranhamente redondos e negros como os de Tio Macon.

— Vai para a escola? — questiona. Sei que quer mudar de assunto, pois ele não perguntaria algo que já sabe, afinal, por que mais eu estaria com uma mochila?

— Sim. — continuei com meu café da manhã que parecia muito mais atraente do que a conversa.

— Ainda não entendo seu gosto. Escolas Mortais são perda de tempo. Os Mortais são perda de tempo.

Pensei em argumentar, mas nunca o convenceria. Apenas terminei de tomar café da manhã, beijei-o na bochecha, peguei minha mochila e segui para a escola. Estava bastante cedo para ir, mas quem sabe, se eu chegasse cedo, ninguém reparasse em mim.

Ou foi isso o que pensei até a metade do caminho, quando percebi que tinha esquecido o livro O Sol é para Todos em casa. Acabei voltando todo o percurso. O estranho mesmo foi quando eu já estava seguindo para a escola, passei por um carro com uma condição questionável. Por algum motivo, os sons do rabecão e da chuva dissolveram-se em um silêncio estranho. Tudo pareceu se tornar em câmera lenta enquanto o carro passava pelo meu. Encarei-o. Mal conseguia desviar o olhar. Quase me esqueci de virar em uma rua enquanto dirigia.

Quando o tempo e os sons voltaram ao normal, eu já não conseguia encontrar o carro novamente.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Gostaram? Espero que entendam que, como eu ainda nem comecei a fazer o segundo capítulo, talvez demore para eu postar o outro.

Mas, por enquanto, podem comentar. Eu não vou Conjurar contra vocês não, não se preocupem.