Castelo de Vidro escrita por Purple Sparkle


Capítulo 30
Ironias


Notas iniciais do capítulo

Olha eu aqui mais uma vez. Tive pequenos problemas para postar antes, mas o importante é que tô aqui né? Boa leitura!!



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# Narração Clara (ON):

 

O momento mais difícil não é na hora da perda,e sim no dia seguinte,onde procuramos e não encontramos e temos a certeza que nunca mais teremos.

Estava desolada e tentava me recuperar da tragédia que aconteceu. Minha filha está escapando pelas minhas mãos, na verdade ela já escapou tem muito tempo.

O interfone toca e eu fui atender. A recepcionista falou que eu tinha uma visita, preferi não perguntar quem era, afinal as únicas duas pessoas que sabiam aonde eu estava eram o meu irmão e a minha ex-sogra.

Escuto o barulho do elevador chegando no meu andar e logo em seguida o barulho de sapatos de salto alto. Fui em direção a porta esperando recepcionar a minha ex-sogra, mas quem aparece não é ela, mas sim Miriam, a minha ex-melhor amiga.

Que ironia do destino ela aparecer aqui nesse momento. Isso só reforça a ideia de que preciso renovar o meu Karma. Sim eu acredito em Karma. Acredito que para toda ação existe uma reação de força equivalente em sentido contrário, ou seja, cada ação tem suas consequências. Melhor explicando, aqui se faz, aqui se paga.

 

— O quê você veio fazer aqui, Miriam?

— Só quero conversar.

— Não temos nada para conversar.

— Ah… nós temos sim, e muita coisa.

— Tá bom.

 

Fomos até o sofá e nos sentamos. Não tinha um bom pressentimento sobre essa conversa, mas eu precisava continuar enfrentando os meus demônios, e Miriam era um dos piores.

 

— Diga Clara, por que você voltou? Por um acaso você acha que as coisas são como há oitos anos?

— Não, eu não acho. Eu voltei para restabelecer laços com a minha filha.

— A monstrinha? Duvido que ela queira algo com você. Na verdade, só pela sua cara de peixe morto, dá pra perceber que as coisas não estão se saindo bem como planejado.

— Se eu fosse você não teria tanta certeza disso. Não chame a minha filha de monstrinha.

— Você continua mentindo muito mal. Isso é ótimo.

— Eu não estou mentindo.

— Vamos fingir que eu acredito nisso. Clara, eu sei as suas reais intenções. Não fique achando que vai conseguir cumprir o seu objetivo.

— Já que você sabe, me fala, quais seriam as minhas intenções? É claro que eu vou conseguir o que eu quero.

— Tirar o Carlos de mim. Acredite, você nunca vai conseguir nos separar.

— E nem quero. No fundo vocês se merecem.

 

# Narração Luiza (ON):

 

Nunca gostei de misturar com aquele grupinho, mas ultimamente isso ficou quase impossível. Anna Júlia mora no mesmo condomínio que eu. Felipe e Daniel a adoram. Daniel começou a ensiná-la a tocar violão. Felipe é o melhor amigo do irmão da ruiva sem noção. Parece que tudo nos arrasta pra eles, como se eles fossem como a força da gravidade.

Nesse meio tempo só consegui sossego no Natal. Acho que as minhas preces foram seriamente ouvidas quando não nos chamaram pra passar com eles. Fiquei junto com Daniel e nossas famílias. Aquilo era perfeito. Até a ligação de Anna foi engraçada. Aquela garota não é normal, mas se não fosse pro causa dela, não estaria junto dele.

Felipe não passou Natal conosco esse ano. Ele estava lá como sempre. Pagando pau pra ruiva. Tenho pena dele certas horas. Aquela garota o trata como cachorro. No fundo eu sei que ela não é uma pessoa ruim. Ela só é fruto do meio em que vive. Acho que eu também seria daquele jeito se tivesse aquela criação.

Eles no fundo são pessoas legais. Pelo menos é o que eu acho nesse momento. Como eu descobri isso? No ano novo é claro. Eles são loucos. Muito loucos. Ter passado ano novo com eles no Rotary Club foi diferente. Diferente nesse caso é bom. Recebi o convite da Anna Júlia  junto com Daniel e ela falou “se preparem pra sair ensopados de lá” e não é que sai ensopada mesmo. Pulamos treze ondas e depois nos sentamos na areia. Se me perguntarem o porquê de treze ondas eu nunca saberia responder de imediato. Depois descobri que é a ruiva maluca e Anna gostam desse número, mas Felipe me falou também que elas gostam do sete. Talvez seja alguma simpatia, ou somente loucura. Eu só sei que eu estava começando a gostar dessas loucuras.

Somos acostumados a julgar as pessoas sem conhecê-las. Muita gente nega isso, mas sabemos muito bem que isso ocorre e com frequência na maioria das pessoas. Se me perguntassem no começo do ano passado o que eu achava dos riquinhos da minha escola que moram em castelos de vidro eu simplesmente responderia que eles eram fúteis e mesquinhos e arrogantes. Daniel e Felipe concordariam sem pestanejar. Já a seis meses atrás eu manteria a mesma resposta, mas teria algumas exceções. Amanda era uma dessas exceções. Ela nunca tratou ninguém mal. Era visível que ela não era um monstro que nem os seus amigos. Ela participa do clube de jornalismo e do de artes da nossa escola. É claro que quase ninguém sabe disso. Desconfio levemente que nem os amigos dela sabem disso. A conheço do clube de jornalismo e ela sempre foi muito solícita e amigável. Mesmo com as indiretas que recebia de muitos alunos ela nunca destratou ninguém.

Muita coisa mudou desde o começo do ano passado até agora. Muito mais coisas mudaram de seis meses atrás até hoje. No fundo fico feliz com a maioria das mudanças. Consegui me desprover de pré conceitos que tinha de algumas pessoas e passei as entender melhor.

Fui desperta de meus devaneios por Daniel. Ele me olhava intrigado. Parecia estar tentando entender o que estava acontecendo. O conhecia muito bem para entender os seus olhares.

 

— Lu, tá tudo bem?

— Sim. Só estava viajando.

— Percebi. Estava pensando no quê?

— Em como as coisas mudaram desde o começo do ano passado e em como mudei a minha forma de pensar sobre algumas pessoas.

— E quem seriam essas pessoas? - ele me perguntou risonho. Estava na cara que ele sabia quem era, ele só queria que eu admitisse em voz alta.

— Você sabem quem são as pessoas. Não vou citar nomes.

— Tá bom. Mas acho que é melhor você parar de pensar neles e vir comigo encontrar o Felipe.

— Ele tá bem? - comecei a ficar preocupada.

— Mais ou menos. A ruiva viajou e você sabe… - não o deixei terminar.

— Ele é louco por ela. Isso está mais do que óbvio. - falei e suspirei logo em seguida.

— Acho que ela também gosta dele. -

— Eu não sei. Você e essa mania de achar que sabe o que todo mundo tá sentindo.

— Vamos logo vê-lo. Eu sei que ele tá bem, mas vai que né?

— Vamos logo.

 

Saímos da minha casa e fomos caminhando até a dele. Tocamos a campainha e sua mãe atendeu a porta. Ela quando nos viu, sorriu e nos mandou entrar. Ela nos acompanhou até a porta do quarto dele e nos deixou à sós. Felipe estava tocando algo em seu violão e cantarolava.

 

Nem tudo lhe cai bem

É um risco que se assume

O bom é não iludir ninguém

 

Nem tudo lhe cai bem

É um risco que se assume

O bom é não iludir ninguém

Às vezes faço o que quero

Às vezes faço o que tenho que fazer

Às vezes faço o que quero

Às vezes faço o que tenho que fazer

 

# Narração Luiza (OFF):

 

# Narração Felipe (ON):

 

Que tédio. Que fossa. Ela foi embora e parece que tudo estagnou. Tudo fica monótono sem ela aqui. Ultimamente a minha vida tem girado em torno dela. Como se ela fosse o centro do meu universo.

 

Eu nunca tive muito a ver com ela

O livro que ela ama eu não li

Eu nunca tive muito a ver com ela

O filme que ela adora eu não vi

Como chegar nela eu nem sei

Ela é tão interessante e eu aqui pichando muro

Como chegar nela eu nem sei

Ela é tão indiferente e eu igual a todo mundo

 

Eu sei que ela vai voltar, mas será que ela vai voltar a ser a mesma pessoa de antes? Fria e distante. Sabia que estava destruindo as barreiras que ela construía, mas esse período longe poderia ser bem ruim para o meu progresso. Eu sei que ela está correndo atrás dos seus objetivos, esses que eu tenho plena certeza que ela vai alcançar.

 

Logo eu, que sempre achei legal ser tão errado

Eu que nem sempre calmo, mas nunca preocupado

Logo eu, que sempre achei legal ser tão errado

Eu que nem sempre calmo, mas nunca preocupado

 

Nem tudo lhe cai bem

É um risco que se assume

O bom é não iludir ninguém

Nem tudo lhe cai bem

É um risco que se assume

O bom é não iludir ninguém

 

Às vezes faço o que quero

E às vezes faço o que tenho que fazer

Às vezes faço o que quero

E às vezes faço o que tenho que fazer

Um dia eu volto pra fazer só a sua vontade, mas

Se eu não puder fazer você a pessoa mais feliz

Eu chego mais perto disso possível!

 

Ficar dentro desse quarto só vai me fazer pensar mais nela, apesar que passar um tempo com o seu irmão também vai me fazer pensar nela e até perguntar por ela. E com seus amigos também vai acontecer o mesmo. Só tem um dia que ela foi e eu estou sentado no chão do meu quarto tocando violão pensando nela. Que loucura, eu estou tocando “Vícios e Virtudes” do Charlie Brown Jr. o mais irônico disso tudo é que a música se encaixa muitas vezes no nosso cotidiano. Nosso, meu e de Melissa. Minha ruiva. Meu furacão ruivo.

 

Todos os inconvenientes a nosso favor

E diferenças sim, mas

Nunca maiores que o nosso valor

Logo eu, que sempre achei legal ser tão errado

Eu que nem sempre calmo, mas nunca preocupado

Logo eu, que sempre achei legal ser tão errado

Eu, que nem sempre calmo, mas nunca preocupado

 

O tempo às vezes é alheio à nossa vontade, mas

Só o que é bom dura tempo

O bastante pra se tornar inesquecível

Qual será o defeito da fala se a tua boca me cala

Nós dois deitados na sala

 

O livro que ela ama eu tenho certeza de que não li. Eu nem sei qual é o seu livro favorito. Mesmo que eu soubesse, acho que seria difícil eu ler, não sou muito fã de leitura. Provavelmente o filme que ela adora eu nunca vi. Dependendo do filme eu assistiria, por ela eu faria isso. Melissa é tão interessante e misteriosa e eu? Eu sou apenas um garoto que toca na banda do irmão dela. Nas palavras dela eu sou o outsider inconveniente. Ela é indiferente a maioria das coisas. Ela tem o seu mundo. Somos opostos. Nós dois nos complementamos. Fico me perguntando se a posso fazer feliz. Espero que sim. Se eu não puder, eu espero chegar o mais perto possível disso.

Quando decido levantar e tomar um ar. Parar um pouco de pensar nela. Sei que isso é uma tarefa difícil, quando tudo o que você vê remete a ela. Vejo Luiza e Daniel parados no batente da porta do meu quarto. Como não percebi que eles dois estavam ali antes?

Olho para eles e faço um sinal pra eles ficarem a vontade e se sentarem. Luiza olhou pra mim e sorriu. Daniel lançou um olhar cúmplice pra ela e naquele momento eu sabia que estava ferrado. Muito ferrado.

 

— Ganhei a aposta Dani! - Luiza fazia o sinal de vitória.

— Que aposta? - Não estava entendendo o que estava acontecendo.

— Eu e Luiza apostamos quanto tempo você demoraria pra perceber que estávamos aqui. Eu falei que menos de dez minutos e ela apostou que era mais. - Daniel me respondeu.

— Como assim? - estava levemente assustado. - Há quanto tempo vocês estão aqui?

— Mais ou menos vinte minutos. - Luiza respondeu.

— Vinte minutos? - arregalei os olhos.

— Na verdade dezessete minutos. A gente até te chamou umas cinco vezes, mas aí desistimos e decidimos apostar. - Daniel falou.

— Ganhei cinquentinha com essa brincadeira. - Luiza riu da cara de Daniel.

— Desculpa Daniel, eu estava meio desligado. - falei me sentindo um pouco culpado. O cara tinha acabado de perder cinquenta pratas numa aposta.

— Tá tudo bem. Vamos fazer alguma coisa. Não é muito legal você ficar viajando. - Daniel falou.

— Eu ia até o quintal tomar um ar, mas sinceramente não quero ir lá. Muitas lembranças. - falei me lembrando de Melissa andando na beira da piscina.

— Então vamos ficar aqui e tirar um som. Gostei da vibe Charlie Brown que tava. - Luiza falou e me lançou um olhar cúmplice.

— Beleza. Senta aí.

 

Assim que eles se sentaram eu comecei a tocar e cantar. Luiza logo reconheceu a música e começou a cantar comigo. “Não uso sapato”. Essa música me fazia pensar nas ironias da vida. E que ironias. Daniel logo em seguida nos acompanhou.

 

É assim que é...

Eu vou mudar, tudo que não me convém

Hoje tenho tudo que eu podia querer mas,

Dinheiro não é tudo tenho muito a fazer.

Quem não respeita o pai, não respeita ninguém

Porque um homem de verdade vai ser pai também,

Ame seu pai, mesmo se ele for um porco capitalista.



Eu não sei fazer poesia... mas que se foda!!!

Eu odeio gente chique eu não uso sapato... mas que se foda!!!

 

Cantávamos a plenos pulmões. Somos aquele tipo de pessoa que acreditam em canções, daquelas que descrevem sonhos, compartilham teu íntimo e ainda assim não te conhecem. Canções são histórias que cantam risos, gritam alegrias, completam rimas e acima de tudo preenchem a vida.

 

Hoje você pixa quem já te ajudou,

E vem falando mal de quem já te fortaleceu.

Mas um homem de verdade não se faz só com palavras,

Você perdeu a moral e quem perdeu, perdeu.

Se você pisar na bola, aí rapa você vai ser encontrado.

E se você pisar na bola, aí moleque tu vai ser cobrado.



Eu não sei fazer poesia... mas que se foda!!!

Eu odeio gente chique e eu não uso sapato... mas que se foda!!!

 

Aue, aue, aue, aue!

Everybody move! Everybody move! Everybody move, move, move, move!!!



Eu odeio hipocrisia... mas que se foda!!!

Eu odeio gente chique eu não uso sapato... mas que se foda!!!

 

Estávamos anestesiados depois dessa música. A música é a anestesia da alma.

 

# Narração Felipe (OFF):

 

# Narração Anna Júlia (ON):

 

Minha vida sempre foi uma montanha russa. Cheia de altos de baixos. Um turbilhão de emoções. Fui trouxa ao pensar que esse turbilhão de emoções diminuiria com o tempo. Na verdade ele só aumentou. Aumentou de uma maneira fora do normal. Me mudei para casa da minha avó. Terminei o meu namoro com Miguel. Virei amiga ou quase isso de um intrometido chamado Daniel. Achei uma pessoa incrível chamada Felipe no meio dos outsiders. Juntei Daniel com Luiza. Vi Luke e Mands começarem a namorar, é claro depois de os pegar no flagra algumas vezes. Conheci Bernardo. Vi Melissa e Felipe trocarem farpas muitas vezes. Tive contato com a minha mãe. Descobri que tenho um irmão. Beijei Nathaniel.

A ordem dos fatores nesse caso não muda o produto. Não muda a quantidade de coisas que aconteceram. Não muda nem o pouco em como me senti com cada um desses acontecimentos.

Olho para o teto do meu quarto e suspiro. Meu celular têm tocado incessavelmente. Estava quase o tacando na parede. Não queria falar com ninguém, estar com ninguém. Queria ficar sozinha.

Torcia para que a bateria do meu celular acabasse logo. Não queria levantar e desligar o aparelho. Isso é irônico né? Mais irônico é o fato do celular estar plugado no carregador. A bateria não ia acabar. Continuaria escutando o seu barulho estridente. Continuaria ignorando a ligação de quem quer que fosse.

A porta do meu quarto é aberta num rompante. Odeio com todas as minhas forças quando entram no meu quarto sem bater na porta. Odeio mais ainda quando a pessoa acha que está certa por fazer isso.

 

— O quê você quer? - Fui grossa sem me importar com quem estava falando.

— Sua avó está te chamando. - Sr. Matias falou.

— Não vou descer!

— Mas… - ele tentou falar algo, mas eu não deixei.

— FALA PRA ELA QUE EU NÃO VOU DESCER QUE DROGA! - gritei.

 

Escuto a porta sendo fechada e eu fecho os olhos pensando que finalmente teria um pouco de paz e sossego. Que ironia foi eu pensar isso. A porta mais uma vez foi aberta num rompante e dessa vez não era o Sr. Matias, mas sim a minha avó. Os barulhos de seu salto alto a denunciavam. Isso não era nada bom, a velha não gosta de ser contrariada.

 

— Levanta dessa cama agora, Anna Júlia.

— Não quero levantar não.

— Não me interessa. Você têm visitas.

— Não quero receber ninguém.

— Não quero saber o quê você quer. Sai dessa cama agora e desce.

— Ok.

 

Levantei contrariada e fui até o banheiro. Estava com uma cara de zumbi horrorosa. Cruz credo. Como deixei isso acontecer? Melissa me mataria se visse o meu estado. Estou com olheiras enormes, afinal não tenho dormido direito ultimamente. Meus fantasmas têm me assombrado. Tomei um banho rápido e tentei amenizar essa cara de zumbi. Coloquei a primeira roupa que achei no meu armário. Um vestido amarelo. Não sei porque tenho esse vestido, eu odeio amarelo. Na verdade esse vestido nem é meu, mas sim de Melissa.

Desci a escada me arrastando e vou em direção à sala de estar. Vejo Bernado e Nathaniel sentados no sofá. Que estranho o Luke não estar aqui. Provavelmente ele ainda está chateado comigo. Eu ainda estou bem irritada com ele. Não só com ele, mas com o meu tio também e principalmente com a minha mãe. É tão estranho chamá-la de mãe. Esperava sinceramente que ela já tivesse voltado pro fim de mundo onde ela mora.

 

— O quê vocês dois querem? - perguntei sendo um pouco grossa.

— Eu estava preocupado com você. Não te vejo desde o dia da festa. Você parecia chateada. Além disso, você não atende as minhas ligações. - Bernardo falou.

— Não queria falar com ninguém. - o respondi.

— Eu te avisei cara. - Nathaniel falou baixinho para Bernardo.

— Se você sabia, porque você veio com ele?

— Porque você tem a mesma mania irritante da minha irmã de se fechar e se esconder do mundo quando você está chateada. Eu odeio isso. Odeio o fato de te ver sofrendo e você não querer ajuda.

— E quem disse que eu quero a sua ajuda? - sabia que estava sendo insensível, mas aquilo estava sendo inevitável.

— Para de escorraçar ele, AJ! - Bernardo me repreendeu.

— Tá tudo bem, Bernardo. - Nathaniel interviu.

— Mas… - Bernardo tentou refutar.

— Relaxa, cara. - Nathaniel falou.

— Se vocês já terminaram eu vou subir. - falei e virei as costas.

— Tá bom, AJ. Mas se você quiser conversar, me liga. - Bernardo falou.

— Valeu, mas eu não eu não vou querer conversar e nem vou ligar. - o respondi.

— Você vem, Nathaniel? - Bernardo o perguntou.

— Não. Eu vou depois. Não se preocupe comigo. - Nathaniel o respondeu.

 

Subi as escadas e minha avó me olhava com uma olhar de repreensão no fim dela. Sabia que ela não aprovava as minhas atitudes, mas aquilo não era problema dela.

 

— Você exagerou com os seus amigos.

— Eu sei, mas isso foi necessário. Isso não é problema deles.

— Essas coisas nunca são necessárias, Anna Júlia. Você pode acabar os magoando se ficar agindo dessa maneira.

— Como se eu me importasse, vovó.

— Eu sei que você se importa, minha neta. Só não vá se arrepender de suas escolhas. Se você se arrepender eu estarei aqui.

— Não vou me arrepender. - falei convicta.

— Ok. Só quero que você saiba que a sua mãe adiou a volta dela por sua causa. Você a deve desculpas.

— Eu não a devo nada.

— Ela volta depois de amanhã.

— Não quero saber quando ela volta ou deixa de voltar, só quero que ela vá pra longe daqui. Pra longe de mim. Que fique com o meu irmãozinho.

— Você então já sabe…

— Sei… E não tô com vontade de falar sobre isso.

— Tudo bem.

 

Estava quase abrindo a porta do meu quarto quando sou interrompida.

 

— Anna… Por favor… Vamos conversar. - Aquela voz era de Nathaniel. Ele realmente não desiste.

— Não quero falar com ninguém, Nate. - o respondi.

— Eu sei… Mas você não pode ficar assim.

— Escute o menino por pelo menos cinco minutos, se você não quiser papo depois disso ele entenderá e vai respeitar o seu espaço, tudo bem? - minha avó falou.

— Isso mesmo. Muito obrigado, dona Angela. - Nate olhou para minha avó e ela afagou o seu cabelo. - Só cinco minutos, Anna. Por favor. - ele implorou.

— Tudo bem, Nate. Cinco minutos.

 

Entramos no meu quarto e eu me sentei na cama. Ele fez o mesmo que eu. Sabia que o tinha machucado com as minhas palavras momentos atrás. Não sei lidar direito com os meus sentimentos.Não sabia lidar com Nathaniel. Ele gostava de mim de verdade. Não tinha medo da minha pessoa e não fugiu em nenhum dos momentos que viu a minha fragilidade. Não sabia como agir, principalmente depois da última vez.

 

— Me desculpa, Nate.

— Pelo que?

— Por tudo.

— Não tem motivos para você se desculpar. Não importa o que aconteça, eu sempre estarei aqui por você.

— Você não precisa carregar esse fardo.

— E quem disse que é um fardo?

— Eu sei que eu gritei falando que eu não preciso da sua ajuda, mas que irônico, já que eu pedi a sua ajuda no dia da festa.

— A vida é repleta de ironias, Anna Júlia.

— Eu sei… A maior delas é eu falar que eu não me importo em magoar as pessoas que se importam comigo, mas na verdade eu me importo, e muito.

— Eu realmente fiquei muito preocupado contigo, você não atendia as ligações nem as retornava. Sabia que você estava bem, fisicamente é claro, mas tinha medo do que podia acontecer.

— Não aconteceu nada. Fiquei trancada no quarto esses dias. Estive me sufocando com a minha própria dor.

— Você quer sair daqui? Vou aonde você quiser ir. Faço o quê você quiser, só não me afasta. - seus olhos me suplicavam esse pedido.

— Quero sim. Eu vou também aonde você quiser ir. Só não se afaste de mim, independente do que eu faça. Por favor, não me deixe, mesmo que eu peça, suplique, grite para todo mundo ouvir.

— Você não precisa me pedir isso. Eu não vou te deixar. Você é muito importante para mim.

 

Sorri quando escutei que eu sou importante para ele. Sabia que ele estava sendo sincero. Me sentia especial escutando aquilo. Tentei falar que ele também era especial, mas não consegui. Nunca consigo falar essas coisas.

Senti minha mão ser levemente agarrada e o meu corpo todo se arrepiou. Nathaniel saiu me puxando escada abaixo e logo saímos pela porta da frente.

 

# Narração Anna Júlia (OFF):

 

#Narração Melissa (ON):

 

Esses dias na casa do meu avô estão sendo mais fáceis do que eu pensava. Essas contas nem são tão complicadas, é claro que o clube de matemática me ajudou muito. Quase ninguém sabe que eu faço parte do clube de matemática da escola, só o meu clube e eles não abririam a boca pra ninguém, afinal eles morrem de medo de mim, e o meu avô, acho que é por isso que ele aposta tanto em mim. Ele sabe que eu não sou somente uma cabecinha fútil.

Na minha escola todos os alunos são obrigados a participar de algum clube extracurricular. Isso faz parte da metodologia da escola. No meu grupo não comentamos sobre os nossos grupos e muito menos interagimos com os participantes deles.

Escolhi o grupo de matemática porque sou boa com números. Ninguém acredita nisso devido as minhas notas. Passo na média em todas as matérias, porque me saboto nas provas. Uns diriam que isso é burrice, mas eu falo que isso é o fato de ter atenção. Sou uma pessoa carente por atenção. Nem sempre essa atenção é favorável, até porque já passei horas e horas escutando o meu pai falar que tenho que melhoras as minhas notas. Que o Nathaniel têm notas acima das minhas entre outras coisas. Nesse ano decidi mudar a minha estratégia, vou humilhar as notas do Nathaniel e quem vai escutar o discurso do meu pai será ele.

Fecho mais um balancete da empresa e coloco na pilha no canto da mesa junto com outros dois que revisei. Meu avô tinha me ensinado como funcionava a parte de contabilidade da empresa. Eu recebia os relatórios e balancetes e tinha que os revisar e apontar possíveis erros.

Meu avô entra no escritório e quando ele olha para a mesa percebe que já tinha terminado o serviço.

 

— Já terminou, Melissa?

— Sim, acabei de terminar o terceiro balancete. Revisei os dois relatórios que recebi e apontei nesse papel cada ponto que eu discordo. Na minha opinião não têm nada errado com os balancetes, mas isso é o senhor que decide.

— Você terminou antes do prazo.

— Eu sei… Na verdade eu comecei o segundo e o terceiro balancete antes do prazo também. Se tiver mais alguma coisa pode me mandar.

— Primeiro você têm quem descansar um pouco, mas antes vamos jantar. Se arrume, vamos naquela churrascaria no centro da cidade.

— Não preciso descansar.

— Precisa sim. Você é que nem a sua mãe. Quando tem algo lhe incomodando você foca em alguma coisa pra tentar esquecer.

— Não consigo esconder nada do senhor.

— E nem nunca vai conseguir. Anda Mel, vá se arrumar. Depois você me conta o que tá acontecendo.

— Sim senhor.

 

Saí do escritório e fui para o meu quarto. Pego o meu celular e vejo que tem três ligações de Bernardo. Retorno a ligação e no segundo toque ele me atende.

 

— Graças a Deus, você atendeu esse celular, Mel!

— O quê aconteceu? Quem morreu?

— Ninguém morreu, mas a AJ ficou meio irritada quando apareci na casa dela.

— Sério? Por que?

— Primeiro que eu fiquei preocupado, essa maluca não atendia as minhas ligações e nem respondeu as minhas mensagens, isso desde o dia da festa. Aí decidi ir na casa dela ver se ela estava bem. O legal era que eu não sabia onde essa garota mora, aí ia perguntar para o Lucas, mas ele ainda está bem irritado com ela. Pensei em perguntar pra Amanda, mas ela vive grudada com o Lucas. Pensei em te perguntar, mas não queria te atrapalhar.

— O Lucas é um idiota e a Amanda é uma imbecil. Você deveria ter me ligado, Bê. Como você fez pra descobrir o endereço da AJ?

— Pedi pra Amanda o número do seu irmão e depois liguei pra ele.

— Já te disse que o Nathaniel é meu meio-irmão. Ele foi contigo?

— Foi e quando a AJ falou que não queria falar com ninguém e depois escorraçou o teu meio-irmão eu achei melhor respeitar a decisão dela, mas antes deixei bem claro que se ela quisesse conversar com alguém, ela poderia me ligar. Depois disso fui pra casa, mas o Nathaniel ficou.

— Como assim eu perdi essa cena? Você gravou o Nathaniel sendo escorraçado pela AJ né? Me diz que sim.

— Claro que não sua ruiva maluca.

— Você é muito estraga prazeres, Bê. Que bad a AJ ter sido escrota com você, mas eu tenho certeza que independente do que ela falou, se ela precisar conversar ela vai te ligar.

— Como você sabe o quê ela me respondeu?

— Ela é minha melhor amiga, trouxão. A conheço melhor que o nosso grupo todo junto. Nunca se esqueça isso.

— Mudando de assunto, como está sendo aí na casa do seu avô.

— Incrível, na verdade está sendo mais fácil do que pensava.

— Que ótimo, fico muito feliz por você.

— Obrigada. Relaxa que eu volto logo. Agora eu tenho que ir. Vou sair com o meu avô. Beijos, Bê!

— Tchau, Mel.

 

Desliguei o celular e comecei a rir sozinha. Bernardo em pouco tempo de convivência já estava mais do que envolvido nas loucuras do nosso grupo. Essas loucuras envolvem desde bebedeiras exageradas por motivos fora do normal, a galerinha gosta de beber pra fugir dos problemas. Envolvem também mudanças de humor fora do normal, o povo é tudo maluco. E envolvem também brigas e patadas rotineiras. Duvido que se perguntarem pra ele se o nosso grupo não se ama e mesmo com tudo o quê acontece e se nós não mataríamos uns pelos outros, ele daria uma resposta negativa. Bernardo responderia que somos loucos, cada um a sua maneira, mas acima de tudo loucos uns pelos outros e que entre nós existe muito amor envolvido.

Fui me arrumar, antes que o meu avô se irritasse com a demora e mandasse me chamar. Me arrumei mais rápido do que o normal. Estava com um vestido tubinho azul ciano e sapatilhas pretas. Coloquei meu celular na bolsa de mão e saí do quarto.

Encontrei meu avô na sala e ele se levantou do sofá. Fomos até o seu carro e ele dirigiu até o restaurante. Não demoramos muito pra chegar.

Sempre gostei desse restaurante. Quando eu era mais nova definitivamente ele era o meu favorito. Pedi a mesma salada de sempre. Salada de quinoa com mix de folhas verdes acompanhados a um filé de salmão. Certos hábitos não morrem.

Meu avô olhou pra mim e depois fez o seu pedido. Somos muito parecidos certas horas. Nós dois seguimos certos hábitos.

 

— Você continua comendo que nem um passarinho, Mel.

— Impressão sua, vovô.

— Te garanto que não é. Você está tão magrinha.

— Que isso, vovô. Nem estou tão magra assim.

— Tá bom minha neta, vou fingir que concordo com você.

— Quando o senhor vai revisar os balancetes?

— É sério que você quer falar de trabalho?

— Só estou ansiosa.

— Na verdade você está ansiosa pra voltar pra casa. Em quem você anda pensando?

— Em ninguém.

— Será que terei que perguntar ao Nathaniel? Aposto que ele sabe.

— Não é ninguém, vovô. Ninguém importante.

— Se essa pessoa não fosse importante, você não ficaria desse jeito.

— Ele me faz perder o sono, além de ser maluco, afinal ele aguenta todas as minhas patadas sem pestanejar.

— Então ele realmente gosta de você.

— Eu sei, mas eu não quero. Eu não posso.

— Tudo bem. Você já é grande o suficiente para fazer as suas escolhas. - meu avô falou.

 

O resto do jantar seguiu tranquilamente. Mesmo não tendo citado nomes, sabia que estávamos falando de Felipe. Era uma questão de tempo até meu avô ligar os pontos e descobrir quem é a tal pessoa. Será que estava tão óbvio assim?

Terminamos de jantar e fomos para casa. O caminho pareceu passar mais rápido que na ida. Irônico quando você não quer chegar em casa.

 

Well life has a funny way of sneaking up on you / Bem, a vida tem um jeito engraçado de aprontar com você

And life has a funny, funny way of helping you out / E a vida tem um jeito engraçado, engraçado de ajudá-lo

Helping you out / Ajudá-lo

 

 

 

 

Entrei no meu quarto e me sentei no chão. Abaixei a cabeça e esperava sinceramente conseguir chorar para liberar o que sentia. Meu celular começa a vibrar e tocar dentro da bolsa. Pego e o atendo devagar, sem me importar com quem estava me ligando.

 

— Alô. - disse baixinho.

— Olá, ruiva. - aquela voz… Não era possível. Era o Felipe...

— Olá, outsider.

— É tão bom ouvir a sua voz… - ele falou e suspirou em seguida.

— É bom ouvir a sua também. - o respondi baixinho.

— Você está bem?

— Sim, eu estou. Por que?

— Tentei te tirar da minha cabeça o dia inteiro, mas aqui estou eu te ligando essa hora só pra ouvir a sua voz e saber se você está bem.

— Que engraçado… Eu também não consigo te tirar da minha cabeça. - sussurrei. - Não se preocupe comigo eu estou bem, até comi direitinho e mantive a comida dentro do meu organismo.

— Ruiva, eu não consegui escutar direito o que você falou no começo.

— Ah… Eu disse que consegui comer e não vomitei. - me senti aliviada por ele não ter conseguido escutar.

— Isso é ótimo!!! - ele realmente parecia feliz. - Ganhei o meu dia com essa notícia.

— Você é louco, outsider. Você precisa se tratar.

— Louco por você, ruiva. - fiquei levemente rubra com essa revelação.

— Eu tenho que ir… Amanhã vai ser um dia longo.

— Vai lá. Boa sorte amanhã!

— Obrigada.

— Continue comendo direitinho, ruiva. Não me obrigue aparecer aí e te dar comida na boca e depois ficar do seu lado. - arregalei levemente meus olhos.

— Você não seria nem louco. - falei levemente apavorada.

— Eu sou louco de fazer isso sim, e você sabe disso muito bem. - ele ria levemente.

— Tá bom. Tchau.

 

Terminei a chamada e me levantei do chão frio. Fui em direção a minha cama e me deitei. Me sentia levemente estranha. Tinha um sorriso no rosto. Não sabia o motivo de estar com ele, talvez tenha sido algo que o outsider tenha falado.  Com certeza foi isso.

O destino ele gosta de brincar com as pessoas. Que ironia eu tentar esquecê-lo e ele me ligar. Nunca daríamos certo. Somos tão diferentes. A vida é um grande mistério. E quê mistério. Não conseguimos explicar a maioria das coisas que acontecem na maioria das vezes. E no final, o irônico da vida é que aquela pessoa que é mais diferente de você é a que te completa.

 

# Narração Melissa (OFF):


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Notas finais do capítulo

Me conta o quê você achou, não fique com vergonha!! Até o próximo capítulo. Beijinhos!



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