Evolution: Parte 3 escrita por Hairo


Capítulo 22
As Lágrimas do Dia Seguinte


Notas iniciais do capítulo

E então? Preparados para o que vem depois do último capítulo?

Esse capítulo vem mais lento, mas depois do que ocorreu, não dá para sair correndo...hahahaha

Espero que vocês gostem. Tem muita coisa a ser explicada ;)
Boa leitura!



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Capítulo 22 – As lágrimas do dia seguinte

Dave e Mindy levaram cerca de uma hora para conseguir levantar e sair do vulcão. O calor, o silencio unicamente interrompido pelo ferver da lava e tudo o que aquele lugar representava não era suficiente para dar-lhes forças para levantar e caminhar para o lado de fora. Nenhum dos dois sabia como se reerguer depois de todos os acontecimentos daquele dia. Jake ficara ali um pouco depois dos agentes Rockets irem embora, mas saiu logo depois, acompanhado de seu Vulpix. Mesmo que seus antigos amigos não ousassem sequer lhe dirigir um olhar, o menino sabia que não era nem um pouco bem vindo para compartilhar das suas dores.

As lágrimas evaporavam rapidamente com a temperatura, e o suor já os deixava desidratados, mas ainda assim eles se demoraram a criar coragem e a se levantar. Caminharam lentamente pelo túnel, de mãos dadas. Ali, depois de tanto tempo próximos ao centro do vulcão, o ar parecia até mais leve e mais fresco. Perderam a conta de quanto tempo levaram para encontrar a saída, mas quando conseguira, a brisa do crepúsculo os fez estremecer e dar novamente um passo para dentro do túnel.

Se abraçaram e saíram para o frescor da noite juntos, lado a lado, ainda sem trocar uma palavra sequer. Estavam em silêncio desde que haviam sido deixados a sós. Passaram pela casa de Blaine temendo encontrar o líder traidor lá dentro, mas ela estava deserta e intocada. Com todos os seus Pokemons em péssimas condições, eles tiveram que andar todo o caminho até o centro Pokémon, e perderam um lindo por do sol enquanto desciam a montanha, pois mantinham os olhos fixos no chão.

Adaptaram-se rapidamente a mudança de temperatura, mas a leve brisa fazia com que suas roupas molhadas de suor grudassem em seu corpo, com um toque gelado arrepiante. Ainda assim, eles continuaram em seu passo lento, quase automático, passando pela cidade. Apenas levantaram os olhos quando cruzaram o antigo ginásio Pokémon da cidade. A construção fora realmente destruída e inutilizada, e isso apenas os fazia se perguntar o que teria acontecido com a arena subterrânea. Mindy se demorou um pouco mais olhando para a estrutura, e surpreendentemente deu um breve riso silencioso.

– O que foi? – perguntou Dave, surpreso ao reparar na reação da menina.

– Acabei de perceber, o Blaine nunca chegou a me dar a minha insígnia...

Dave também não conteve uma leve risada, fazendo um breve carinho na mão da menina, atrelada à sua. Sorrir era ligeiramente estranho depois de tanto tempo, e o ato logo os fez, de certa maneira, se sentirem culpados.

Continuaram a caminhar de mãos dadas pela cidade iluminada pelas estrelas e pelos postes de luz até chegar ao Centro Pokémon. Ninguém parecia notar neles, a não ser os poucos olhares que provavelmente eram atraídos pelo seu cheiro de queimado, pelos seus machucados aparentes ou pelo estado de suas roupas, sujas e ainda molhadas de suor. Ninguém parecia ciente da operação dos bandidos em sua cidade e de tudo o que aconteceram no vulcão. Provavelmente teriam notado a destruição do ginásio, mas tendo acontecido há horas, não se via mais nenhuma movimentação quanto àquilo. Chegaram ao Centro Pokémon e não conseguiram devolver a atenção que a enfermeira Joy lhes dispensou assim que eles passaram pela porta.

– Meu Deus! O que aconteceu com vocês?! Vocês estão bem? – disse ela, correndo de trás do balcão para receber os treinadores – O telefone não parou de tocar procurando por vocês do dia inteiro. O laboratório de Cardo ligou ao menos cinco vezes. Vocês deviam retornar as ligações.

Mindy não se sentia apta para falar com a sua família. Não ali, não daquele jeito. Talvez nunca mais...

– Obrigado, faremos isso – disse Dave, propositalmente deixando de lado quando cumpriria aquela promessa.

– Mas o que aconteceu? Está tudo bem?! – a mulher de cabelos cor de rosa parecia verdadeiramente alarmada – Vocês dois parecem fantasmas. Dois fantasmas imensamente sujos e machucados. O mais novo chegou mais cedo sem falar nada e foi embora. O que está acontecendo?

– Estamos bem, isso que importa – disse Mindy, com uma voz fraca, se encaminhando lentamente para seu quarto enquanto uma perplexa enfermeira tentava entender o que estava acontecendo.

– Ei, espera! Deixaram uma encomenda para você aqui! – disse ela, correndo de novo para o balcão – Blaine deixou uma insígnia. Disse que era sua por direito e me fez prometer que iria lhe entregar.

Mindy virou para trás, sem sorrir dessa vez, e olhou para o pequeno broche em forma de chama nas mãos da simpática e atenciosa mulher. Aquela insígnia representava muito mais para ela do que uma vitória agora.

– Não quero, obrigada... – e voltou a se dirigir para o seu quarto, desaparecendo por entre o corredor.

A enfermeira olhou perplexa da menina para a insígnia e então para Dave. Nunca antes tinha visto um treinador recusar uma insígnia e nem sabia o que fazer naquela situação. A mulher não tinha ideia de nada que havia ocorrido e nem podia começar a imaginar o que o casal estava passando.

– Vocês estavam no ginásio quando ele foi destruído? – perguntou a Dave.

– Não... É melhor você deixar essa história de lado. Eu agradeço a sua preocupação, mas você não pode nos ajudar agora. – ele se aproximou da mulher e estendeu a mão, olhando para a insígnia –Deixe que eu convenço a Mindy a ficar com isso.

A enfermeira hesitou, lembrando-se de que fora instruída a dar a insígnia para a menina, e não para seu namorado. Dave percebeu e então mostrou-a sua própria insígnia, deixando-a um pouco mais tranquila, e então, com a insígnia de Mindy na mão, a seguiu para o quarto.

Encontrou a porta da garota semiaberta e a viu sentada no chão quando entrou. Sem dizer nada, apenas sentou ao seu lado, passou um braço por seus ombros e a puxou para um abraço. Ela apoiou a cabeça em seu peito por um momento, depois levantou e lhe deu um beijo rápido e suave, com gosto de lágrimas e pó.

– Você devia guardar isso – disse ele, lhe mostrando a insígnia em sua mão.

– Não sei se vou conseguir... – disse ela, fechando os olhos para não ver.

– Mindy, nós nunca vamos esquecer o que aconteceu hoje. Queiramos ou não. Você não precisa se prejudicar mais por isso... Guarde ela.

Ela acenou com a cabeça e pegou a insígnia, botando junto com as outras em uma pequena caixinha de madeira acolchoada em sua bolsa. Olhou fundo nos olhos de Dave tentando conter as lágrimas.

– Sinto muito pelo Eevee... – ela disse.

– Sinto muito pelo seu pai...

Eles se abraçaram novamente e voltaram a chorar um rio de lágrimas que já julgavam ter secado. Eles adormeceram pouco depois, ainda no chão, juntos e abraçados.

*-*-*-*-*-*-*-*-*

O som de punhos se batendo contra a madeira fina da porta despertou o casal. Mindy tinha a cabeça apoiada contra o peito de Dave, que, por sua vez, apoiava a sua contra o topo da cabeça da menina. Dormiram sujos e acordaram sentindo-se ainda mais desconfortáveis do que haviam se sentido no dia anterior. A menina se pôs de pé primeiro, ajeitou o cabelo bagunçado por trás da orelha, e fitou Dave no chão, ainda se espreguiçando.

– Porque dormimos sentados no chão, com as costas apoiadas em uma cama? – perguntou o menino, por entre um bocejo.

A menina deu o melhor sorriso que conseguiu e também se espreguiçou, sendo pega de surpresa por um bocejo que não havia previsto. Era impressionante como aquele tipo de coisa se espalhava por um cômodo, quando uma das pessoas dentro dele a fazia primeiro. O som das batidas na porta se repetiu, seguido de um inconfundível bocejo vindo do corredor, que fez com que a menina sorrisse mais uma vez, de maneira mais natural.

– Quem é? – perguntou, coçando os olhos e se aproximando da porta. Provavelmente a enfermeira nos chamando para comer...

– Sou eu, abre a porta! Acho que precisamos conversar...

A voz do pequeno Jake fez com que o sorriso desaparecesse do rosto de Mindy e com que Dave se colocasse de pé com um pulo.

– Desaparece Jake! – disse Mindy, antes mesmo que Dave pudesse fazer alguma coisa.

O casal se entreolhou durante os segundos em que o silencio rondou no quarto. Mindy parecia surpresa, sem saber o que fazer, mas não restava espaço em Dave a não ser pela raiva que ele estava sentindo do menino mais novo.

– Não dá... Eu não sei para onde ir...

A sua voz estava chorosa, mas aquilo não parecia mudar o que Dave estava sentindo. Não podia acreditar que estava há tanto tempo com um traidor em seu grupo. Já havia sido traído por Mary Jane, Jake era demais para que ele pudesse processar. A única coisa que o impedia de bater mais no seu antigo amigo era a porta que os separava.

– Isso não é problema nosso... – disse Mindy, ainda com um olhar fixo em Dave, tentando acalmá-lo – Vai pra casa...

– Mindy, me deixa explicar... Por favor...

– Você não tem o que explicar Jake! Sai daqui! Desaparece! Antes que eu mesmo desapareça com você! – ameaçou Dave, não conseguindo mais se conter.

– Dave, é você?! O que você está fazendo ai dentro? – Jake parecia genuinamente surpreso.

O menino de Grené fechou os punhos, mordeu o lábio inferior e deu um passo decidido em direção a porta, focado em ensinar de uma vez por todas o significado de “vai embora” para o menino mais novo, mas Mindy se colocou em sua frente, com uma mão estendida em seu peito, falando “calma” com os lábios, lentamente para que ele pudesse ler.

– Não importa o que ele está fazendo aqui – disse Mindy – O que importa é que você não deveria estar aqui...

– Pelo seu próprio bem, vai embora! – completou Dave, irado, dando alguns passou para trás e dando as costas para a porta, para tentar se controlar.

– Deveria estar aqui sim... – Jake agora estava com certeza entre lágrimas – vocês podem até não querer mais a minha companhia, mas vocês merecem saber o que aconteceu. Merecem saber por que eu fiz o que fiz. Eu nunca quis o mal de vocês...

– Você nunca... – Dave estava prestes a passar por cima de Mindy e abrir a porta definitivamente, com os punhos fechados prontos para encontrar o rosto do garoto. Estava tão nervoso que sequer conseguia terminar a frase que estava falando.

Foi então que, mais uma vez, Mindy o surpreendeu. Ela segurou seus dois braços com as mãos e olhou fundo nos seus olhos, não com o olhar carregado de tristeza e luto que ela estava usando até pouco mais de um minuto atrás, mas com um novo tipo de determinação e vontade. Algo novo, movido pela tristeza e pela dor que ela sentia, mas ainda assim, algo muito familiar a Dave. Como se uma nova faceta do rosto que ele conhecia tão bem. Ela lhe falou quase sussurrando, em um tom tão baixo que ele mesmo teve dificuldades de ouvir.

– Ele merece se explicar? Talvez não... Mas nós merecemos saber o que aconteceu, e precisamos ter o máximo de informações que pudermos ter.

– Como assim? – disse ele, um pouco mais alto.

– Olha, eu não sei você, mas eu não quero deixar isso barato. Eu vou atrás dos Rockets e do seu Eevee. O Eevee merece a liberdade e os Rockets não merecem aquele Pokémon. Eles tiraram o meu pai de mim, eu vou tirar pelo menos isso deles...

Dave não havia se dado tempo para pensar naquilo ainda. Todas as descobertas e acontecimentos do dia anterior ainda não faziam o menor sentido, e as coisas ainda não haviam se encaixado. Era impossível definir racionalmente o que fazer, pelo menos naquele momento, mas as palavras de Mindy e a emoção que ela passara através dela o fez lembrar de que aquela não deveria ser uma decisão racional. A Equipe Rocket provara que era infinitamente superior a eles, e talvez aquela fosse uma missão suicida, mas o sentimento do garoto era o mesmo que ele sentira quando segurava Eevee no colo, já sem Pokemons para lutar, mas disposto a sofrer o que precisasse sofrer para não entregá-lo. Aquela não era uma escolha que deveria ser feita racionalmente. Não havia escolha a ser feita. Ele tinha que recuperar o seu Eevee, a qualquer preço.

– Deixe-o entrar – disse o garoto, desarmando os punhos e respirando fundo, para tentar se controlar.

Mindy andou até a porta e colocou a mão na maçaneta, parando para respirar fundo antes de abri-la. Jake estava com a mão levantada, pronto para bater novamente, mas olhava para o chão. Seu rosto estava inchado e vermelho, além de bastante molhado. Os estragos causados pelo soco de Dave ainda eram visíveis, mas pareciam consideravelmente melhor do que no dia anterior. O menino perdeu o ar quando viu a porta se abrindo e a menina morena olhando para ele.

– Eu... Eu não achei que vocês iam...

– Entra logo, Jake, antes que eu mude de ideia.

O menino deu um breve sorriso e entrou as pressas, tremendo de nervoso enquanto andava. Ele estava limpo, parecia ter tomado um banho e Mindy suspeitava que ele estava apenas em um outro quarto no Centro Pokémon, e pedira a enfermeira Joy que contasse outra história para o casal. Ainda assim, isso mostrava um mínimo de bom senso do garoto, que percebera que não poderia dividir o mesmo quarto com Dave depois do ocorrido.

– Olha, eu queria muito pedir...

– Desculpas, é eu sei, essa parte eu já entendi, apesar de não acreditar. – disse Dave, com um tom grosseiro que ele nem ao menos sabia ter – Dá pra você me explicar primeiro o que é que aconteceu? E, mais importante que isso, por quê?!

Jake pareceu magoado com as palavras do garoto mais velho, mas não se deixou abater. Olhou do garoto para Mindy, que ainda o encarava duramente, e votou a falar.

– Eu fiz isso tudo por você Mindy...

– Como é que é?! – a menina balançou a cabeça, tentando organizar os pensamentos – Como é que servir de informante para a Equipe Rocket seria um favor para mim?

– Pra te proteger... – voltou a dizer o menino – Tudo começou naquele dia na floresta da névoa, quando fomos capturados, lembra?

Dave se lembrava vividamente da travessia da floresta, que terminava na fronteira com a cidade de Zaffre. Fora lá que Jack e Jody sequestraram seus dois amigos e o obrigara a escolher entre um deles e seu Eevee. Fora lá que Dave escolhera Mindy, e lá que eles haviam se tornado um casal. Agora que parava para pensar, Jake havia dito que escapara sozinho das garras da Equipe Rocket, o que era, de fato, improvável.

– Eu não escapei sozinho como eu havia dito. A Jody conversou comigo sobre você Mindy, e me fez perceber que o Dave estava te colocando em risco desnecessariamente. Ela foi muito legal comigo, de verdade, e me tratou muito bem. Me fez acreditar que estava do meu lado, e que não queria me machucar. Eu achei que ela realmente tinha gostado de mim, entendeu?

– Eu estava colocando a Mindy em risco?! – Dave cerrou novamente os punhos, mas Mindy se colocou ao seu lado e segurou seu braço.

– Olha, eu não estou falando que eu estava certo, ok? Eu só estou dizendo o que passou na minha cabeça naquela hora! Ela disse que não ia me machucar, e ia me deixar fugir, desde que eu fingisse que tinha conseguido fazer isso sozinho. Mas que eu precisava ajudá-la também. Disse que ela ia ser punida por ter me deixado fugir, e que precisaria se recuperar, e que seria muito bom se eu pudesse manter ela informada durante a nossa viagem. Sabe? Só dizer onde estávamos e o que estávamos fazendo. Ela disse que a Equipe Rocket estava querendo observar o Eevee, e não recapturá-lo.

– E você acreditou em toda essa historinha?! – perguntou Mindy, sem acreditar. Jake era novo e inocente, mas nunca parecera burro para ela – E onde é que eu entro nessa história toda?

– Eu não acreditei cem por cento, claro que não! – disse Jake – Mas ela não precisava que eu confirmasse nada naquela hora, e me deixou ir. Disse que confiava em mim, e me deu um numero para que eu entrasse em contato se eu mudasse de ideia...

– E você mudou?! Quando que você mudou de ideia Jake? – perguntou Dave, usando cada desgastada fibra que tinha para se conter.

– É ai que entra a Mindy...

– Eu?! Eu fiz você mudar de ideia?! – a menina colocou uma mão sobre o peito, sem entender.

– Sim. Quando você resolveu ir atrás deles. Você abandonou a gente, Mindy! E nem me deixou ir com você... E foi atrás da Equipe Rocket. Eu fiz apenas o que eu pude para te proteger. Eu liguei para a Jody e disse que topava, se ela me prometesse que a Equipe Rocket não iria machucar você...

Um pesado silêncio caiu sobre o grupo e os três apenas se entreolharam, sem saber como prosseguir com aquela conversa. Mindy olhava espantada para Jake, tentando lembrar e medir tudo o que acontecera desde que saíra de Zaffre, tendo em vista essa nova informação. Tudo fez muito mais sentido em sua mente. Eu não consigo acreditar...

– Você fez o que?! – explodiu repentinamente a menina, assustando até mesmo Dave ao seu lado – Você contou para a Equipe Rocket que eu e o Rusty estávamos indo atrás deles e confiou que eles não iriam me machucar porque você estava passando algumas informações? Qual é o seu problema, moleque?!

Jake se calou por um momento, também surpreso com a súbita ira de Mindy. Esperava a reação raivosa de Dave, mas a da menina era dez vezes mais potente, e machucava infinitas vezes mais.

– Só para a sua informação, eles me acharam com certa facilidade, e agora eu sei exatamente o porquê! E eles não mantiveram a promessa, queridinho! Eles me machucaram, e muito! E o meu primo também! Você me entregou numa bandeja para eles!

– Eu sei! Me desculpa, Mindy! Não era isso que eu queria fazer, juro! E quando você me contou o que eles fizeram, eu parei de falar com ela. Não mandei mais informação nenhuma, juro! Não fui eu quem disse que estávamos aqui...

– Me desculpa?! Se não fosse a minha mãe eu poderia estar morta, seu moleque! E seria tudo culpa sua!

Jake não se aguentou e começou a chorar copiosamente, tremendo da cabeça aos pés, incapaz de tirar os olhos do ataque de fúria da menina, com que até mesmo Dave estava surpreso. O menino teria controlado a garota, se ao menos conseguisse controlar a si mesmo, mas partilhava de toda aquela raiva por Jake.

– Desculpa... Des-des-culpa... – dizia o menino mais novo, por entre soluços – Eu só fiz isso porque... porque...

– Porque o que?!

– Porque eu te amo...

Mais um segundo de silencio e susto percorreu o quarto, até que Mindy deu um passo a frente e desferiu um pesado tapa de mão direita no rosto do garoto, deixando a primeira lágrima escorrer.

– Eu tenho nojo de você... Desaparece, Jake. Eu não quero te ver nunca mais na minha vida, ou eu prometo que você vai sofrer muito mais do que acredita ser possível...

O menino parecia em choque por um momento, parando até mesmo de soluçar, mas depois de alguns segundos de silencio, ele percebeu que não tinha outra opção que não dar as costas ao casal, talvez para sempre. Entre muitas lágrimas, o menino caminhou lentamente para fora do quarto, e Mindy o seguiu, apenas para fechar a porta com um estrondo quando ele saiu. Ela virou-se então para Dave e o abraçou com toda a força que conseguia, e gritou de raiva contra seu peito, antes de se deixar afogar em mais soluços.

– Nós nunca devíamos tê-lo deixado entrar...

– Eu sei... Eu sei... – era tudo o que Dave conseguia responder, enquanto a abraçava.

*-*-*-*-*-*-*-*-*

O telefone de ambos os quartos tocou duas vezes sem serem atendidos. Mindy e Dave finalmente se separaram e decidiram lavar tudo o que acontecera no dia anterior. Dave saíra do quarto prometendo que voltaria em uma hora, e que se não o fizesse, a menina deveria ir até seu quarto. Queriam evitar o uso do telefone, de modo a não falar com mais ninguém até que estivessem prontos, mas já haviam concordado que deveriam entrar em contato com ao menos com o laboratório Noah ainda naquele dia. Dave ansiava também por noticias de seus pais, mas mantinha em segredo um medo de descobrir o que tinha acontecido, principalmente depois do que ocorrera a Kato.

Mindy bateu ao quarto de Dave cinco minutos antes do tempo combinado. Não aguentava mais ficar sozinha em seu quarto, remoendo em silencio suas mais novas feridas físicas e emocionais. Por algum motivo sua perna doía e obrigava a mancar. O que lhe parecia estranho era a dor somente se fazer perceber quando ela estava tomando banho, mas agora tentava focar naquela dor e se esquecer de todas as outras.

Dave entreabriu a porta de leve e olhou por uma fresta. Não esperava a menina, mas sabia que era ela assim que ouviu as batidas. Ela é ainda mais bonita com o cabelo molhado pensou ele, enquanto a deixava entrar, em silêncio.

– Você fala com o meu avô. Pode ser? – disse ela, nervosa.

Ele assentiu com a cabeça. Não esperava o pedido da menina, mas assim que ela fez, percebeu que não poderia ser diferente. Ela já sofrera o suficiente ao ver o seu pai ser jogado para a morte no mesmo dia em que o descobrira. Faze-la reconta a história seria o equivalente a uma tortura. Não seria fácil para Dave também, mas ele não aceitaria a ideia de fazê-la reviver aqueles momentos.

– Claro...

– Obrigada – ela disse, tentando sorrir.

Ambos andaram de mãos dadas, lado a lado em direção aos dois telefones do Centro Pokémon. A enfermeira Joy os observou de longe, mas não tentou falar com eles, nem ao menos para desejar bom dia, como lhe era comum. O casal agradeceu o espaço que ela lhes dava, e tentava se preparar para encarar o momento que tinham pela frente.

Imaginavam que, depois de tudo o que passaram no dia anterior, dar as noticias seria o menor dos seus problemas, mas ainda assim Dave hesitou antes de discar o numero que tinha gravado na memória. Nem ao menos conseguia imaginar o que diria para explicar ao Professor e a Susan o que havia ocorrido.

– Aqui vamos nós... – disse o menino, olhando para a menina ao seu lado, fora do campo de visão da câmera que o capturava, mas ainda conseguindo visualizar a tela do monitor.

Ele discou o número e esperou que a chamada fosse atendida. Teve apenas tempo de respirar, pois logo após o primeiro toque, o rosto preocupado de Noah surgiu na tela, de olhos arregalados e olheiras que denunciavam a noite sem dormir.

– Dave! – ele exclamou – Dave! Meu Deus como é bom te ver inteiro garoto!

– Oi professor – disse o menino, tentando sorrir. Afinal, era bom rever um rosto familiar e amigo.

– Gente, é o Dave! – disse o pesquisador, sem tirar os olhos do monitor – Me diga, rapaz, onde está a Mindy? Está tudo bem com a minha neta?

– Sim, está... Ela está bem e comigo, mas preferiu não falar ao telefone.

– O que aconteceu com vocês, garotos?

Dave respirou fundo e se preparou para relatar toda a sua experiência, desde o momento em que decidira ir até o vulcão para conseguir uma pedra do fogo. Pegou ar para falar, mas perdeu-o logo em seguida, quando o rosto de sua mãe surgiu na tela, empurrando o Dr. Noah para o lado.

– Dave, meu filho! Dave! Você está bem querido?!

O rosto da mulher estava inchado, em parte pelas lágrimas que corriam como rios de seus olhos, em parte pelo que ela sofrera há dois dias nas mãos da Equipe Rocket. O estado do rosto de sua mãe provocou em Dave uma ira que ele não sabia explicar. Sentiu-se aliviado por um momento, ao vê-la bem pela imagem, mas aquele sentimento não suprimiu a onda elétrica que o atingiu ao perceber o que tinha acontecido. Eles machucaram a minha mãe. A minha mãe!

Seu pai apareceu logo depois, bastante machucado também, e Dave pensou tê-lo visto mancar. Seu estado era pior que o de Martha, mas Dave sentiu em seu olhar algo mais seguro, apesar das poucas lágrimas que também lhe escorriam. Dave nunca havia visto seu pai chorar. Mindy colocou discretamente a mão em sua perna como apoio, percebendo a expressão fechada que tomara conta de seu rosto, mas nem aquilo lhe serviu de consolo.

– Eu estou bem mãe. O que aconteceu com vocês?! Quem fez isso com vocês?!

– Isso não importa agora, querido. O que importa é você estar bem... Nós já estamos recuperados – disse Martha, ainda aos prantos. Os hematomas e marcas em seu rosto diziam o contrário.

– Não, mãe. Não está tudo bem! – seu lábio inferior tremia enquanto ele falava, tamanha a sua raiva – Como isso aconteceu? Quem? Quando?

Mindy empurrou-o para o lado e entrou na frente do videofone, se mostrando para o laboratório.

– Bom dia Sra. Hairo. Sou Mindy Noah e é um prazer conhece-la – disse a morena, tentando sorrir.

– Bom... Bom dia – respondeu Martha, pega de surpresa.

– Não acho que o Dave vai conseguir ouvir essa historia direito. Então porque você não conta para mim o que aconteceu?

– Sim... É... Claro... – disse a mulher ainda um pouco confusa.

Dave se surpreendeu com a atitude da menina, mas preferiu não discutir. Levantou-se e foi até o corredor, com os braços esticados em cima da cabeça e os punhos cerrados, se controlando para não gritar. Nunca sentira tanta raiva em sua vida antes, e não achava que seria possível que voltasse a se sentir assim no futuro. Queria quebrar alguma coisa, mas teve que se contentar em socar a parede. Sentiu a dor se infiltrar em seu pulso e se estender até a base do ombro com o impacto contra o concreto, e se aliviou por ter outra coisa em que se focar além da sua raiva.

Quando voltou, segurava um pacote de gelo que pediu a enfermeira Joy contra o pulso que doía, e Mindy ainda conversava com sua mãe, com certa tranquilidade. Ele não queria saber o que tinha acontecido exatamente. Não naquele momento. Tudo o que precisava saber ele já sabia. Fora a Equipe Rocket que fizera aquilo com seus pais. E por causa dele. Por causa do Eevee que ele encontrou. Aquilo tudo era por sua causa.

Ainda com a expressão fechada, ele encarou Mindy, que olhou para seu pulso machucado e resolveu não perguntar. Apenas com o olhar, ela perguntou se ele estava bem, e recebendo um aceno positivo de cabeça, a menina se despediu de Martha e Jonathan e cedeu o lugar a Dave novamente.

– Estamos todos bem, meu filho. Isso é o que importa... – disse Martha com um sorriso, ao rever seu filho.

– Sim, é isso que importa... – Ele não queria falar do que acontecera com seus pais – Mãe, eu preciso conversar com o Dr. Noah, em particular, por favor. Amo vocês, ok?

A mulher parecia surpresa, mas não reclamou. Pelo contrário, se despediu carinhosamente, ainda deixando algumas lágrimas escorrerem como sempre fazia, e deixou o cômodo. Mindy suspirou profundamente enquanto Dave fitava o Prof. Noah concentrado. Não sabia como dizer o que tinha que dizer a seguir, e preferiu ser o mais direto possível.

– Professor, sabemos sobre Kato e sua relação com Mindy. Lamento dizer que ele está morto.

A palavra pesou assim que saiu dos lábios do menino e ele sentiu Mindy estremecer ao seu lado. Ela não voltou a chorar, porém, se controlando apenas com um suspiro alto. O professor, do outro lado, parecia perdido. Deixou o queixo cair brevemente e levou uma das mãos à boca, enquanto perdia o pouco de cor que tinha na pele. A frase de Dave continuou a flutuar como uma placa de metal sobre eles, fazendo com que absorvessem a verdade a força.

– Eu... Como? - Noah parecia lutar para conter as lágrimas.

– Ontem, em uma operação da Equipe Rocket. Blaine nos traiu. Eles levaram Eevee. Kato se foi no vulcão, junto com seu Alakazam...

O homem se afastou alguns centímetros da tela e deixou os olhos caírem para o chão, ainda com a mão em frente à boca. Parecia tremer levemente, e permaneceu em silêncio por quase dois minutos seguidos. Dave deixou que ele assimilasse a notícia por quanto tempo julgasse necessário e deu uma das mãos a Mindy por baixo da mesa, para tentar ajudá-la a se controlar também.

– Mindy, querida, eu sinto muitíssimo... – o avô dela lhe disse, mesmo sem vê-la. Sua voz era tremula e falha – Eu não posso imaginar o que está passando nesse momento... Eu... Eu sinto muito.

Mindy tremeu e virou o rosto, deixando mais uma lágrima escorrer pelo rosto antes de voltar a retomar o controle sobre si mesma. Apertou a mão de Dave, e ele não reclamou, deixando que a tristeza embalasse os dois naquele momento. Deu-lhe a oportunidade de responder diretamente ao avô, mas ela permaneceu quieta, e ele retomou a palavra.

– Professor, acredito que ela não vai conseguir falar sobre isso agora. Mas acho que ela precisa saber a verdadeira história dele. O que o senhor pode nos dizer?

Dave sabia que era o que Mindy queria perguntar e temia que aquele não fosse o melhor momento para que ela ouvisse aquela história. Mas tinha o pressentimento de que seria melhor agora, com a ferida fresca, do que voltar a abrí-la no futuro, quando já existir uma cicatriz. Noah, entretanto, parecia pego de surpresa. Dave permitiu que ele levasse quanto tempo quisesse para responder.

– Bom, por onde começar? – O homem parecia incapaz de se decidir o que falar à neta – O conheci quando ele era meu aluno. Era genial, um dos melhores de sua turma, e me saltou aos olhos. Eu e o Professor Carvalho convidamos ele para se juntar às nossas respectivas equipes, quando ele se formou. Fiquei maravilhado quando ele escolheu a mim, mesmo sabendo que era tudo por causa do estupido Dratini que eu vi na zona safari...

Mindy sorriu entre as lágrimas que voltavam a escorrer, levando uma das mãos instintivamente à Pokebola de Dratini.

– Quando ele conheceu Susan, me arrependi. Confesso que os dois formavam um belo casal, mas ela era minha filha entende? Eu tinha ciúmes. Os dois ficaram juntos por dois anos, talvez mais aqui no laboratório, e ele foi um dos motivos dela ter se interessado tanto pelo trabalho daqui. Eram terrivelmente apaixonados. Mas um dia, quando ele voltava de um passeio de férias em família, ele anunciou que deixaria o laboratório.

Dave apertou mais a mão de Mindy e lhe dirigiu um olhara encorajador, mas a menina apenas tinha olhos para a tela do monitor, onde seu avô continuava a contar a história de seus pais.

– Susan ficara arrasada. Sua decisão havia sido completamente inesperada e aquilo significava que eles teriam de se separar. Ele alegou que havia sido oferecido uma oportunidade irrecusável, de trabalhar em algo inovador e que revolucionaria sua carreira, e talvez o mundo Pokémon. E não deu mais informações sobre o projeto, ou ao menos sobre quem o convidou. Susan até mesmo considerou se juntar a ele no projeto, mas ele negou e disse que não queria que ela o acompanhasse – O professor deixou que algumas lágrimas teimosas finalmente escorressem as suas bochechas - Nunca a vi tão destruída quanto ela ficou naquele dia. Colocou-o para fora, dizendo que ele estava morto para ela. E desde então, nunca mais o vimos. Ela só descobriu a gravidez duas semanas depois...

Noah suspirou e enxugou o rosto, sem saber como continuar. Mindy olhou para Dave, que estendeu a mão livre e enxugou o rosto da menina, secando suas lágrimas e lhe dando um sorriso de força. Fez um breve carinho com a mão em seu rosto, e indicou com a cabeça o monitor, para que ela tomasse coragem e falasse com o avô.

– Obrigada – disse a menina, deixando que Dave se levantasse e sentando em seu lugar – Obrigada por finalmente me contar, vovô. Eu realmente precisava saber...

– Não precisa agradecer, querida. Eu sinto muito por sua perda, verdadeiramente. Você já deveria estar sabendo disso há muito tempo...

Ela fez um esforço para lhe sorrir de volta, acenando com a cabeça e concordando com ele. Nunca entenderia porque sua mão fizera tanta questão de manter tudo aquilo um segredo. E agora eles teriam de contar a ela sobre a morte de seu ex-namorado e pai de sua filha. Ela não sabia se estava pronta para isso.

– Como vamos falar para a mamãe, vô?

– Deixe isso comigo, filha... Ela não está aqui agora. Na verdade mandei-a de encontro a vocês, mas aconselhei que fizesse uma parada antes.

– Uma parada? – perguntou a menina, curiosa.

– Sim, uma parada. Você entenderá mais para frente. Existem outras coisas, mais importantes para falarmos agora. Como o restante da sua família por parte de pai.

Mindy arregalou os olhos, surpresa. Nem ao menos havia pensado que encontrar o seu pai poderia significar também encontrar todo um outro lado de uma família que nunca chegara a conhecer. Poderia ter novos avós, tios, primos e até, quem sabe, irmãos. Em toda sua vida, com todo o tempo em que se preocupara em achar seu pai, nunca havia considerado essa outra possibilidade. Aquilo, de certa forma, lhe animou e ela olhou para Dave, quase sorrindo.

– Como assim? – perguntou, ainda estupefata.

– Seu pai tinha uma família, e desconfio que Dave já conheça seu tio e sua tia.

A menina olhou para Dave, que só tinha olhos para o monitor. Estava em choque e tentou se lembrar rapidamente de todos que havia conhecido nessa viagem, obviamente sem sucesso.

– Eu conheço?! – perguntou, assustado.

– Claro que sim. Você conheceu o líder Koga e sua irmã, Aya... Não?

*-*-*-*-*-*-*-*-*

Dave achava que Mindy iria lhe fazer todos os tipos de perguntas que pudesse imaginar sobre a sua nova família, mas ela o surpreendeu, e disse que queria ficar sozinha por um tempo. Disse que iria dar uma volta pela cidade, talvez ir até a ilha em que treinara Dratini, para respirar um pouco de ar fresco com calma e silencio.

Enquanto isso, o garoto preferiu voltar para o seu quarto e pensar no que tinha acabado de ouvir e descobrir. Mindy apenas lhe dissera que a Equipe Rocket tentara extrair dos pais de Dave a localização dele, mas que os dois não disseram uma palavra sequer antes de Susan regatá-los. Ele tinha que se lembrar de agradecê-la eternamente por aquilo.

Mas era outra informação que o deixava intrigado. Kato havia deixado Susan e o laboratório para participar de um projeto de pesquisa revolucionário. Um projeto que poderia mudar o mundo. E ainda assim, não revelou a origem, o assunto, ou nenhum tipo de informação sobre o projeto, nem para a mulher que amava. Só pode ser o Eevee... concluiu ele, confiante. E isso lhe levava a outra conclusão. Se ele disse isso quando voltou das férias em família, Kato talvez pudesse lhe dizer mais.

Ele ligaria imediatamente para Fuschia, mas sabia que deveria esperar Mindy. Tinha certeza de que a menina iria querer conversar o quanto antes com a família que desconhecia, e que iria querer estar presente para avisar aos tios que seu pai havia falecido. Seria uma noticia dura para eles, mas pelo menos eles ganhariam uma sobrinha naquele dia. Dave não sabia se estavam prontos para enfrentar mais aquela barreira. Já haviam passado por fortes emoções nas ultimas vinte e quatro horas.

Ele decidira então voltar a dormir. Fechou os olhos, virou para o lado, e se desligou do mundo em questão de segundos.

*-*-*-*-*-*-*-*-*

Gabrielle entrou triunfante na sala de seu chefe, caminhando com determinação e graça. Tinha um sorriso de finas linhas no rosto, que traduzia mais do que a felicidade. Trazia a mais verdadeira e genuína satisfação. Vinha sozinha, e se sentou na cadeira a mesa do homem sem ao menos esperar ser convidada. Cruzou as pernas enquanto ele a observava de ponta a cabeça, com uma pontada de desejo nos olhos.

– Eu presumo que tenha boas noticias para mim.

– Sem sobras de dúvida – ela disse, deixando os dentes aparecer em seu sorriso pela primeira vez.

O homem retribuiu com um aceno de cabeça, levantou-se e foi até um pequeno armário que tinha ao lado da mesa. Abriu uma das portas e tirou uma garrafa de cristal transparente, com um líquido marrom quase transparente. Serviu dois copos, e levou um à moça.

– Um brinde, então...

A mulher pegou o copo em sua mão e saudou o seu comandante, dando um gole ainda maior que o dele no forte líquido. Saboreou cada gota prazerosamente com os olhos fechados, deixando-se embalar pelo sabor, e voltou a olhar para o homem com o terno laranja. Seu sorriso era tão raro quanto bonito.

– E o fugitivo? Esse problema também foi resolvido?

– Peter tomou conta dele com bastante eficiência – disse a mulher, deixando-se distrair e virando o rosto – E de seu Pokémon também...

– Isso era mesmo necessário? – perguntou o homem, com um tom mais sério.

– Indiscutivelmente, senhor. O Pokémon poderia vir a nos causar problemas futuros, tentar interceptar nossa saída e nos denunciar aos outros...

– Porque não poderíamos simplesmente captura-lo? – perguntou Geovanni.

– Confesso que não considerei a possibilidade, senhor... – Gabrielle deu outro gole em seu copo – Mas levando em conta a sua idade e o tempo em que passou junto do treinador, acho pouco provável que aceitasse a nova situação.

– Verdade – concordou ele, voltando a beber também – Você ainda tem muito o que aprender, mas fez um ótimo trabalho, supervisora...

– Não me chame assim, por favor... – uma risada surgiu na garganta da mulher – Supervisor G foi o papel mais ridículo que você já me impôs. Aqueles dois não merecia ser chamados de agentes...

– Mas você tem que admitir que eles lhe foram uteis… E aquela era a melhor opção.

– Isso é verdade...

Os dois esvaziaram o copo com um ultimo gole, saudaram mais uma vez o ar, e voltaram a apoia-los na mesa.

– E as crianças? Acha que elas ainda podem tentar alguma coisa?– Geovanni tinha o semblante fechado novamente, sério e preocupado.

– Pouco provável - Ela soava segura e confiante - Eles sofreram um duro golpe, de que não se recuperarão facilmente. Estão perdidos, e, mais do que isso, sabem que não podem bater de frente conosco. Deixei isso bem claro para eles.

Geovanni estudou-a minunciosamente em silencio, tentando perceber algum sinal de que indicasse que ela não tinha certeza absoluta do que dizia. Percebendo a inquietação dele, ela se apressou em continuar.

– Eu coloquei alguns agentes vigiando os dois, pelo menos por alguns dias. Mesmo que eles decidam agir, serão imediatamente interceptados.

– Muito bem, assim ficamos mais seguros - Ele parecia satisfeita, mas algo mais ainda o incomodava - E o quanto eles sabem? Eu odiaria ter que dar a crianças o mesmo destino de Kato...

Gabrielle tentou raciocinar por um momento antes de continuar. Se seu copo estivesse cheio, teria terminado com ele em um só gole.

– É difícil prever, senhor. Kato esteve com eles por muito tempo, pelo que disse a Blaine. Mas jurou ter mantido segredo.

– Entendo...

– O problema é que Kato pode ter lhes dito alguma coisa quando perceberam nossa operação.

– É pouco provável... – disse Geovanni, um pouco mais relaxado.

– Mas ainda assim possível – respondeu Gabrielle, se ajeitando em sua cadeira – Ele devia saber que estava prestes a morrer, e provavelmente não iria querer que o segredo morresse com ele.

Geovanni voltou a estudar a mulher dos pés à cabeça, interessado enquanto brincava com o copo vazio na mão. Gostava do modo como ela pensava, e de seu jeito precavido, cuidadoso e eficiente. Ela era segura, quase inabalável, e não se deixava intimidar. Uma de suas melhores agentes, sem sombra de dúvida, afinal, não tinha sido promovida a sua secretaria pessoa atoa. Mas ainda assim, ela ainda tinha que crescer um pouco mais para chegar ao seu nível.

– Não se preocupe Gabrielle. Mesmo que ele tenha dito alguma coisa, Kato desconhecia todas as implicações de nossos experimentos...

A mulher tentou esconder a surpresa e a pontada de dor com aquela revelação, e esperou que seu comandante explicasse que tipo de segredo somente ele possuía sobre aquele Eevee. Um segredo que ele não compartilhara sequer com ela, seu agente mais próximo. O homem, entretanto, girou na cadeira lhe dando as costas, e fazendo um sinal com a mão.

– Está dispensada, agente. Pode ir comemorar a sua vitória...

Ela saiu, mais satisfeita do que nunca e o homem sorriu verdadeiramente tranquilo pela primeira vez desde que Eevee conseguira fugir.


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam? Prometo que no próximo capítulo as coisas vao acelerar um pouquinho.

Aqui estamos começando a fase final de Evolution, então espero que gostem.

Espero vocês nos comentários! =)



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