Lobão avistou o casal se beijando, mas não reparou que era João ali. O plano havia dado certo, Lobão passou direto por eles. Mas o beijo durou alguns segundos além da presença do Mestre. Até Bianca se afastar do beijo, bruscamente:

— O que acabou de acontecer aqui? — Sua vontade era gritar, mas sua voz falhou. Estava confusa.

— Desculpa, é que o Vilão... Digo, Lobão passou por aqui, e ele não podia me ver — Tentou justificar a atitude que tomou, deixando transparecer o nervosismo pelo tom de voz.

— E precisava se esconder assim? Desse jeito?... Meu Deus! o Duca... — A menina ficou mais confusa ainda ao lembrar-se do namorado.

— Ele não precisa saber nada, tá bom? Ninguém precisa saber. Isso foi só você ajudando um amigo, ok? Nada além disso! — Ele tentou acalmar a moça, tocando suavemente a maçã do seu rosto.

— Tá bom, então... eu acho melhor eu ir andando — A atriz virou-se, tentando se desvincilhar.Ainda estava incrédula com a situação.

— Você tá louca? Não pode andar sozinha por aí a noite. É perigoso! — Advertiu ele, dando a certeza que a acompanharia até sua casa.

— E você não pode beijar... os outros... desse jeito... Ela tentou o repreender, sem sucesso. Sentiu sua pele corar, ao perceber as palavras que acabara de soltar.

— Não foram "os outros". Foi você! — Falou, tentando melhorar o clima tenso — E também, aquele beijo não foi nada demais. — Ele sorriu. A moça apenas revirou os olhos castanhos e não disse uma palavra.

Os dois caminharam em silêncio durante o percurso. Bianca não sabia o que falar diante da situação. Ela sentia raiva, e não sabia se era de João, pelo que tinha feito e o que aquilo poderia ocasionar, ou de si mesma, por ter correspondido, e até gostado daquele beijo. Além disso, a provocação na ultima frase do "parceiro de caminhada", a acertou em cheio: Como aquele beijo que "não foi nada demais" poderia ser a unica coisa que se passava em sua mente?

João não gostou do silencio que ali se instalou, mas foi se acostumando com ele. Mesmo com a reticência do momento, estava satisfeito: zelava pela donzela, mesmo que ela estivesse furiosa com ele. Vez ou outra o menino deixava escapar um sorriso ao lembrar da cena que acabara de vivenciar. Ele deixou Bianca em casa e os dois se despediram apenas com um gesto de cabeça, devido a estranhez do momento.

Ao chegar em seu quarto, João repousou a cabeça em seu travesseiro, e riu mais uma vez, ao lembrar da Morena revirando os olhos pra ele. Como ela pôde acreditar que aquele beijo não tinha sido nada demais? Se ele não deixara de pensar nisso um instante sequer?

***

Assim que Karina desceu até a academia, Gael percebeu a irritação da menina.

— Karina, tá tudo bem? — O mestre perguntou, tentando saber o motivo de tamanha frustração.

— Ta sim mestre, não foi nada não. Só aquele babaca do Pedro que... A menina bufou. Logo em seguida parou a frase, ao se dar conta de que não gostaria que Gael soubesse o que havia acontecido lá em cima — Foi nada não, esquece...

— Então quer dizer que o desafinado tá te incomodando? Quer que eu vá lá falar umas "poucas e boas" pra ele? — Gael sugeriu á sua nova aluna, que agora sorria com a ideia dele, mas que recusou a proposta.

— Não precisa não mestre, se o senhor me deixar treinar um pouco aqui, fica tudo certo. —Afirmou

— Ah! entendi. Nada melhor pra acabar com o estresse do que um bom treino de Muay Thai. Mas já aviso que vou treinar com você, pode ser?

— Claro! Pode ir se preparando porque hoje eu vou dar cansaço! — A lutadora disse, sorrindo, e colocando os equipamentos para a luta. O mestre assentiu com a cabeça. Os dois treinaram durante um bom tempo naquela noite.

***

Na manhã do dia seguinte, ao se levantar, Bianca percebeu que a situação que passou com João naquele lugar estranho ainda não tinha saído de sua cabeça. A sensação piorou quando ela passou na academia do pai e encontrou com Duca. Cada palavra do namorado entrava por um ouvido e saia por outro. O remorso a consumia e a fazia ficar distante. Não tinha coragem de contar o que ocorreu na noite passada. Além do mais, se Duca descobrisse poderia dar uma surra em João, e por mais que ele merecesse certa repreensão pelo que fez, essa não seria uma punição que Bianca gostaria de dar. Duca não pôde deixar de reparar que a namorada estava diferente:

— BIANCA!, você tá ouvindo o que eu to falando? — O grito do lutador assustou a moça

— Ah, claro que to meu amor. — Mentiu.

— É mesmo? Então sobre o que eu tava falando agora? — Duca encurralou a morena.

— É... Sobre... Muay Thai! — Bianca deu um "chute", nada certeiro.

— Não! Era sobre a minha faculdade. Mas obviamente, além de não prestar a mínima atenção na minha história, você também pensa que eu só falo sobre Muay Thai né? — O rapaz foi ríspido, se retirando do local incrivelmente chateado.

Tão chateada quanto o lutador, estava a filha de Gael, que sentou-se em um degrau da escada e lá permaneceu por um tempo, desanimada. João, que passeava pela academia, percebeu a feição da moça e não conseguiu evitar de se aproximar.