Por mais de 16 anos as únicas proteções que a deusa Athena teve enquanto desconhecia sua real identidade, era a deusa Nike na forma de báculo dourado e a Armadura de Sagitário. Mas agora nenhum dos dois podia salvá-la de sua aparente sina.

Agora se sabia que a única maneira de salvá-la era com o escudo da mão esquerda. O escudo da justiça, capaz de repelir qualquer forma maligna que tentasse atingi-la. Somente se apontassem o escudo na direção da deusa antes que as chamas do relógio se apagassem é que a flecha de ouro no seu peito desapareceria por completo.

¬ HÔÔ GENMA KEN!!

¬ GENRÔ MAOU KEN!!

O corpo parou, simplesmente travou. Nenhum movimento era feito enquanto os olhos azuis como o céu noturno assumiam uma tonalidade escarlate, bastante parecida com a cor de sangue fresco.

¬ Agora você não tem vontade própria. Fará apenas o que eu ordenar.— mas primeiro precisava da certeza de que realmente tinha o atingido. – Primeiro, quero que acerte seu próprio braço. Vamos lá, Ikki.— era resistente, não tinha obedecido imediatamente. – Não seja tímido, Ikki. Vamos.

Caio de joelhos enquanto tremia, tentava resistir, mas sem muita serventia. Perfurou a carne do braço esquerdo com dois dedos, atingindo alguns nervos e chegando a tocar o osso. Era uma dor excruciante, capaz de despertar qualquer pessoa, mas ainda estava submisso.

¬ Urgh!— rosnou quando o músculo contraio.

¬ Isso, muito bem.— a risada e a paciência de seu algoz eram irritantemente calmas. – Agora vai traspassar seu coração. Vai acabar com a própria vida.

Tremeu ainda mais, tentando resistir a ordem dada como se fosse um mero “bom dia”. A mão em forma de garra já estava posicionada de forma a acertar o coração em cheio. Tremia e resistia, não aguentaria por muito tempo, logo estaria liquidado.

¬ Não, espere.— no mesmo instante a mão caio ao lado do corpo. – Primeiro, quero que arranque a cabeça de Pegasus por mim. Isso mesmo. Assim não perco tempo.— sorria cruel ao mirar o corpo inerte do rapaz mais novo. – Vamos, arranque a cabeça dele. E depois disso, você vai cometer o suicídio, totalmente arrependido do que fez.

Ergueu-se de forma travada, não queria isso. Não faria isso. Porém, “querer” e “fazer” eram duas coisas completamente diferentes.

Caminhou de forma travada até o mais novo, tentando parar a todo o custo. Agora estava ao seu lado, se ajoelhando e segurando os fios castanhos com força, justamente para não errar o golpe. A mão trêmula se erguendo ameaçadora sobre o pescoço do outro.

¬ Qual seu problema, Ikki?!— estava perdendo a pouca paciência com tanta demora. – Vá em frente! Arranque a cabeça de Pegasus!— continuava a tremer sem mover um único músculo. – AGORA!!

O urro ecoou por toda a construção. Sangue esguichou, manchando paredes e chão com o tom carmesim. Ao mesmo tempo a risada de seu oponente escoava vitoriosa, deliciando-se com o momento.

Ainda segurava a cabeça decepada quando se levantou trêmulo e com o olhar repleto de ódio e dor. As lágrimas grossas manchavam o rosto machucado no momento em que estendeu a cabeça, mostrando que de fato fez o ordenado com maestria.

¬ Bom trabalho, Ikki!!— vangloriava entre risos. – Agora é sua vez. Atravesse seu próprio coração e peça desculpas ao Pegasus no outro mundo!!

A visão então se tornou turva e voltou logo em seguida, mas tinha algo errado. O leonino estava distante, com o mesmo olhar de ódio e o braço ferido, e o menor continuava jogado do chão com sua cabeça no lugar.

¬ Q-Quê...?!— olhava para todos os lados atônito, sem entender nada.

¬ O que foi Gêmeos?— pronuncio-se em tom de desdém depois de longo tempo em silêncio. – Por acaso estava sonhando?

¬ IMPOSSÍVEL!!— o peito inflava de ódio. – Quer dizer que...?! Era uma ilusão?!

¬ Hai...— se aproximou de forma que ficasse na frente do irmão caído e colocou-se em posição de combate. – Mas o que verá agora, Gêmeos, é o seu fim!— rosnou furioso. – E ele está bem longe de ser uma ilusão!

Escadaria abaixo as coisas estavam menos agitadas, mas a preocupação continuava presente. Assim como a sombra da morte, que pairava ameaçadora sobre o pequeno acampamento.

Continuava reclinada em uma das ruínas com o pequeno lemuriano ao seu lado, o mais velho estava ao lado da tenda feita para Athena e vivia alterando seu olhar entre a virginiana e a deusa. Não tinha a certeza de nada naquele momento, apenas que o tempo estava acabando, que a lacrima não estava mais ajudando e que seu bebê logo viria ao mundo.

¬ Você também sabe, Mu? Disse Virgem.— o pequeno afinal prometeu que a manteria informada.

¬ Do que está falando, Shaka?— o mais velho respondia como se estivesse do lado de seu companheiro.

¬ Da identidade do Grande Mestre com quem os Bronze estão lutando. Sei que você e o Mestre Ancião ajudaram-nos durante todo esse tempo em que lutaram para salvar a garota Kido. Vocês fizeram isso porque perceberam a verdadeira identidade do Grande Mestre, não é? Disse Virgem.— era grata, ao menos assim saberia o que estava acontecendo.

¬ Vou lhes contar o que sei.— respondeu o ariano com a voz carregada. – O atual Grande Mestre é um impostor! Alguém tomou o lugar do verdadeiro!

¬ Touro, Leão e Escorpião estão desacreditados.— disse o pequeno, apertando sua mão de volta.

¬ Desconfiei disso por mais de 10 anos, mas passei a acreditar após voltar ao Santuário.— seu olhar preocupado foi depositado no relógio. – Desde que senti um cosmo gigantesco vindo da Casa de Gêmeos.

¬ Eles também sentiram o cosmo estranho.

¬ Todos devem se lembrar do Cavaleiro de Ouro que desapareceu pouco antes de Aiolos ser morto por traição, há 16 anos.— o mais velho continuou com seu discurso.

¬ Quem é Aiolos?— não pode evitar a curiosidade. – Urgh... Calma bebê...

¬ Nessa época tínhamos acabado de nos tornar Cavaleiros de Ouro. Disse Virgem.— e o menino também continuou. – Eu me lembro. Ele foi reconhecido como a pessoa mais indicada para ser o novo Grande Mestre. Disse Leão. Está falando do Cavaleiro de Gêmeos?! Disse Escorpião.— ele então a mirou nos olhos. – Aiolos, irmão mais velho de Aiolia de Leão, foi o Cavaleiro de Sagitário. Ele supostamente tentou matar Athena e fugiu logo em seguida, sendo morto por traição pouco tempo depois.

Arqueou de leve com uma nova e forte pontada, atraindo a atenção do ariano mais velho. Este se aproximou e tocou seu ventre com cuidado, assim como sua testa e se afastando pouco depois com o ar ainda mais preocupado.

¬ Sim, mas ele nunca desapareceu e passou 16 anos aqui, no Santuário, escondido sob a máscara do Grande Mestre.— disse ao voltar para sua posição original.

¬ Ele é Saga de Gêmeos. Disse Virgem.— o pequeno parecia chocado. – Estão todos indignados, querem saber por que essa verdade não foi revelada antes.— continuou. – Sem provas e argumentos convincentes, nossa palavra nada vale. Disse Virgem.

Enquanto isso o tão falado geminiano ainda estava tentando entender o que afinal aconteceu para passar tamanho vexame na mão de um mero Bronze. Mas tinha que admitir o potencial do mesmo, apesar de gerar em si tamanho ódio e indignação.

¬ Não esperava que seu ataque pudesse ser tão forte.— disse tentando manter o tom calmo. – Para um novato, lhe devo elogios.

¬ Você não fica atrás, Gêmeos.— respondeu se atentando ainda mais aos movimentos do mais velho, mesmo estes sendo mínimos. – Se sua primeira ordem tivesse sido decapitar o Seiya, certamente eu o teria feito.

¬ Huh... Quer dizer que quanto ao domínio da mente nossos poderes são equivalentes.— então ainda tinha uma vantagem restando. – Pois bem. Venha me enfrentar Fênix! Vejamos quem tem o cosmo mais poderoso!

Tinha que tentar mais uma vez. Se nem mesmo um arranhão causasse, tinha que distraí-lo ao invés de derrotá-lo. Essa era a única chance.

¬ HÔYOKU TEN SHÔ!!

Não teve tempo para se defender. Seu ataque voltou-se contra si com força total, tudo por conta de um único movimento de mão do mais velho.

Acabou por sair voando de tão forte que fora o golpe. Bateu com extrema violência contra o teto, chegando a afundar o corpo quase por completo na rocha, e caio alguns instantes depois formando um pequeno buraco no chão.

O maior se aproximou com passos lentos, erguendo-o facilmente com uma das mãos e um sorriso cruel desenhado no rosto bonito.

¬ Idiota!— deu-lhe um soco tão forte que ao ser solto chegou a quicar no chão. – Quantas vezes preciso repetir que seus ataques são inúteis contra mim?!— o chutou para longe. – Mas você lutou bem, resistiu bem. Considere isto uma recompensa por ter aguentado lutar até agora.

Conseguiu erguer o tronco apesar da dor que dificultava tudo. Só teve o tempo de ver uma forte luz e ouvir o grito de guerra de seu oponente.

¬ GALAXIAN EXPLOSION!!!

Outra forte pontada fora sentida e jurava ter visto luz sair do último templo. A pressão que todos sentiam pelo choque de poderes era cada vez maior e a tensão causada pela verdade era ainda mais esmagadora.

¬ Como todos sabem, a função do Grande Mestre é auxiliar Athena, mas, na prática, ele tem o poder de comandar todos os Cavaleiros. Isso significa que, se quisesse, poderia conquistar o mundo.— o ariano ainda conversava com seus companheiros através do cosmo, como explicado pelo pequeno lemuriano. – Então, o Grande Mestre precisa ter a alma, técnicas e corpo em excelentes condições. Por isso, durante gerações, o Grande Mestre indica pessoalmente seu sucessor entre os Cavaleiros de Ouro. Ele oferece seu posto àquele que considera realmente digno de estar acima de todos os Cavaleiros.

¬ Urgh...— ainda continuava a prender a mão do menino. – Como seu mestre sabe tanto? Urgh!

¬ O Grande Mestre verdadeiro foi o pai de Mestre Mu.— contou apertando sua mão de volta, pela expressão, ele estava tão ou mais preocupado que o mais velho. – Ele não era seu pai biológico, mas sim o de criação, pois seus pais o deixaram ainda bebê, e cuidou dele como se fosse seu de fato. Desde que Gêmeos assumiu o lugar do Grande Mestre, Mestre Mu tem desconfiado.— olhou para o maior preocupado. – Ele diz que o que sente mais falta é dos sorrisos dele e a forma de olhar. Diz que somente quando ele o olhava é que tinha a certeza de que existia.

¬ Urgh!! E o que aconteceu com o verdadeiro Grande Mestre?— essa foi forte. – URGH!!

EU O MATEI!!

A voz que reboou por todo o Santuário estava bem longe de ser humana. Podia ser a voz de um demônio, mas em momento algum seria a de um homem. E pela expressão do dourado, era uma voz relativamente temida.

A chama do relógio estava em Peixes e ainda estava prestes a apagar.

¬ Mestre Mu...— choramingou o pequeno preocupado.

¬ URGH!!— apertou a mão do menor. – Kiki...

ESCUTEM BEM GUERREIROS DO SANTUÁRIO!!

ACABO DE ME LIVRAR DO ÚLTIMO CAVALEIRO DE BRONZE QUE OUSOU INVADIR!!

Sentiu o peito pesar, o último a chegar foi o leonino. As lágrimas escorriam por seu rosto, agora todo o medo que guardara estava livre e se mostrava. As pessoas ao seu redor estavam furiosas, podia ver por seus olhares, mas também temerosas como demonstrava suas posturas.

Seja lá quem fosse o tão falado dourado culpado de toda aquela desgraça, a voz que lhes falava não é dele, do contrário, eles não estariam se comportando daquela forma. Como se temessem aquele ser.

LOGO A CHAMA DO RELÓGIO SE EXTINGUIRÁ!!

ASSIM COMO A VIDA DE ATHENA!!

TUDO ISSO É CULPA DO VERDADEIRO GRANDE MESTRE, QUE NÃO ME ESCOLHEU COMO SEU SUCESSOR!!

Aqueles homens e mulheres não eram covardes em ponto algum, seu temor era justificável. Aquela voz, aquele homem, não era o que conheceram. Aquele não era o mesmo homem forte, de coração tão puro quanto o de um deus encarnado. Não era o homem bom e que não fazia distinção entre as pessoas. Aquele ser era qualquer coisa, menos o homem admirável que conheceram e de quem ela apenas ouviu falar.

AIOLOS ERA UM MALDITO!! TOMOU MEU LUGAR E AINDA ME IMPEDIU DE MATAR ATHENA, FUGINDO COM ELA PARA LONGE!!

O choque e horror tomaram os rostos. Por anos acreditaram numa mentira e lutaram para defendê-la.

Julgaram um homem pelo erro que não cometera e adoraram o outro cuja alma e coração já não eram os mesmos. Não souberam distinguir o homem do monstro, e também não souberam ajudar, e agora estavam pagando pelo pecado que cometeram.

MAS AGORA QUE TANTO ELE QUANTO O GRANDE MESTRE VERDADEIRO ESTÃO MORTOS, NADA PODE ME IMPEDIR!!

A risada profunda, quase milenar, e metálica ecoou. Era a risada de quem tinha a certeza de sua vitória. Encolheu-se e soluçou, aquilo era um monstro, não um homem.

¬ Maldito Saga! Agora que foi tudo esclarecido, não posso ficar aqui parado! Eu, Aiolia, não vou perdoá-lo! Disse Leão.— o pequeno lemuriano estava tão atônito quanto os demais, mas manteve sua promessa.

¬ ESPERE AIOLIA!!— bradou o lemuriano mais velho, chegando a sair de seu lugar, como se fosse de fato segurar o companheiro no lugar. – Compreendo seu ódio e sei que o desejo de vingança queima em seu peito, mas você não deve ir. Este é um teste dos céus para Athena. Se ela for derrotada por Saga, então não é a verdadeira Athena. Ela nunca seria capaz de encarar as Guerras Santas que se aproximam.— olhou aflito para o relógio. – E se os Bronze são Cavaleiros de verdade, eles defenderam Athena até o fim, mesmo que custe suas vidas.

¬ URGH!!— estava mais frequente e forte. – Dói... Dói muito... URGH!!— olhou para o relógio e depois para Athena, só dava para ver a penugem da flecha. – A flecha... URGH!!

¬ O relógio... A chama vai apagar...— o pequeno estava em desespero, ainda mais quando sentiu sua mão ser apertada com tanta força. – Esmeralda!

Estava jogado sem forças no chão, por pouco não tinha sido destruído pelo ataque massivo. Seu algoz estava pisando em suas costas e rindo com a vitória certa.

Olhou enfraquecido para o irmão caído. Levanta seu idiota! Pensava e implorava. Ainda tem muito que lutar! Levanta! Os dedos começaram a se mexer e o corpo tentava se levantar. Se você não levantar, eu vou ai e te faço levantar no tapa! O tronco se erguia com dificuldade e as pernas buscavam força. Não me faça ir ai e te chutar! Conseguiu se erguer cambaleante, voltando a cair logo em seguida. MAS QUE DROGA!! LEVANTA!!

¬ O... O quê? Isso é... IMPOSSÍVEL!!

Ele tinha levantado, estava se forçando a ficar de pé. Agora era sua vez de levantar, tinha que segurar o dourado até que o irmão alcançasse o escudo.

Ele começou a andar na direção certa com muito esforço e o dourado parou de pisar em suas costas, agora tinha que levantar, tinha que resistir mais um pouco. Começou a erguer o tronco, mas a mesma dificuldade que o mais novo encontrou, ele também encontrava.

¬ Maldito!— bradou o dourado, se apressando para apanhar o mais novo. – Não deixarei que vá!

Não tinha tempo, tinha que levantar agora.

Reuniu as forças que lhe restavam e jogou o corpo para frente, ficando ajoelhado frente ao dourado e lhe acertando um forte soco na boca do estômago. Este cambaleou e caio em seu ombro, engasgado e tossindo forte enquanto tentava se recuperar.

¬ Não vou deixá-lo passar até que Seiya pegue o escudo de Athena...— rosnou empurrando o maior para trás e abrindo os braços protetor.

Conseguia ouvir os pés no mais novo se arrastando cada vez mais longe, mas ainda não era o bastante. Tinha que deter o maior de qualquer jeito, pois este já se erguia recuperado do soco. Somente se sacrificando teria a confiança dos irmãos de volta e acreditava piamente que valia a pena.

¬ Nenhum moribundo como você vai me deter!— começou a concentrar o cosmo que lhe restava. – GALAXIAN EXPLOSION!!

O teto explodiu, lançando pedras para todos os lados e deixando que a coluna descomunal de poder eclodisse. Foi uma reação tão forte que o chão chegou a tremer e algumas ruínas ainda de pé chegassem a tombar. O estrondo gerado foi tão grande que parecia mais o céu caindo sobre a Terra.

¬ URGH!!— parecia que tinha levado uma facada no meio das costas. – KIKI!!

¬ Sangue..?!— o menino ficou branco na mesma hora. – MESTRE MU!!

O sangue banhou suas vestes enquanto o lemuriano mais velho se aproximava em desespero. E o relógio tinha nada mais do que uma centelha acesa.