Intransitividade escrita por AmanditaTC


Capítulo 5
Terapia


Notas iniciais do capítulo

Como eu sempre digo, qualquer semelhança com a realidade é mera inspiração...rs...
 
Agradecimento á minha twin linda maravilhosa Betynha q betou o capítulo pra mim e que tem sido meu colo virtual nesses dias difíceis... te amo, viu, twinzoca?



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Mariah roia o canto da unha, nervosa, enquanto balançava uma das pernas num gesto claro de impaciência. Estava sentada ali na sala de espera do consultório da psicóloga. Sua consulta havia sido marcada para as sete da noite, de modo que ela teria tempo de sair da escola, cuidar de Érico e só então ir para o consultório.

 

Mas ela estava esperando havia mais de meia hora e o atraso a deixava ainda mais apreensiva. Lembrava-se das palavras da mãe, contrariada com o fato de ela procurar uma psicóloga:

 

- Filha, para que isso?

 

- Mãe, é simples, eu não estou sabendo lidar com toda essa mudança. É muita coisa de uma vez só.

 

- Se você está arrependida, Mariah, pode voltar com ele. Ele ainda é seu marido e vocês nem assinaram o divórcio.

 

Mariah tentou interromper, mas sua mãe continuava a falar, sem perceber que seus argumentos apenas deixavam a jovem cada vez mais irritada:

 

- Eu não sei o que está acontecendo. Só acho que você agiu sem pensar. Só porque ele teve um caso? Sabe quantos casos o seu pai já teve? Nossa, até perdi a conta, mas é dever da esposa manter a família unida. Veja só, seu pai e eu vamos fazer 35 anos de casados. Essa tal de Carolina logo vai ficar sem graça, vai exigir mais do que o que ele está disposto a dar e ele vai voltar para você.

 

- Mãe! – Mariah falou com a voz elevada – Será que dá pra me ouvir? Não tem nada a ver com a amante dele. E os seus problemas com o papai não me dizem respeito. Mas eu não conseguiria viver uma vida como a sua.

 

- De que adianta viver a vida do seu jeito se desde que chegou aqui, há uma semana e meia você só sabe chorar? Se você sente falta dele, é só voltar atrás. Ninguém vai te julgar...

 

- Não estou chorando por ele, mãe. Por que é tão difícil entender isso? Não sinto falta daquela frieza, do modo distante de conversar comigo, de passar a noite um de costas pro outro, como dois estranhos. Eu sinto falta de mim! Eu sinto saudades da mulher alegre que eu era e é isso que a psicóloga vai me ajudar a achar. Porque eu sei que ela está perdida aqui dentro, soterrada pelo cansaço e pela solidão em que vivi os últimos meses, só precisa de uma mãozinha para vir à tona.

 

Dona Luisa, mãe de Mariah ainda balançava a cabeça contrariada. Não acreditava em psicólogos, não pensava que a filha precisasse de um estranho lhe dizendo como agir. No seu jeito de ser, de mulher “das antigas”, achava que Mariah precisava mesmo era deixar o orgulho de lado e tentar se acertar com o marido.

 

Ela ainda tentou convencer Mariah a mudar de idéia na semana seguinte, mas nada demoveu a professora a desmarcar a consulta. Mas agora que ela estava ali, pensou seriamente em ouvir a mãe, pelo menos na parte de não expor seus problemas pessoais a um estranho.

 

Quando juntou sua bolsa e se preparava para sair dali, a porta se abriu e uma mulher de aparência madura, cabelos arrumados com alguns fios grisalhos e óculos de meia lua, apareceu, se despedindo de um rapaz e chamando seu nome em seguida.

 

Um pouco insegura ela entrou no consultório. Uma sala agradável, com um divã caramelo, uma mesa escura com duas cadeiras de estofado no mesmo tom do outro móvel. A iluminação era discreta, apenas um abajur deixava o ambiente estranhamente acolhedor.

 

- Pode se sentar onde quiser. – disse Celina, a psicóloga.

 

- Ah, bem, ok então! Eu nunca fui a uma psicóloga antes então não sei bem como agir... – justificou-se Mariah.

 

- Não se preocupe, não tem uma fórmula certa. Você só precisa se sentir a vontade.

 

A jovem se sentou no divã, com a bolsa ao colo e assim que Celina tomou assento num pequeno sofá de frente a ela, começou a falar:

 

- Bom, eu vim procurar ajuda para enfrentar uma fase meio conturbada da minha vida. Eu estou me separando do meu marido e viver isso está sendo demais para mim.

 

A psicóloga nada disse, apenas lhe deu um sorriso, encorajando-a a continuar. Mariah relatou sua vida desde que conheceu Fabrício, como ele mudou nos últimos tempos, especialmente depois do nascimento de Érico. E como ela tomou a iniciativa de colocar um fim em tudo aquilo.

 

- E agora, não entendo, mas existe este vazio aqui. Como eu posso sentir falta de uma coisa que me oprimia? – concluiu.

 

- Você ainda o ama?

 

- Não... não amo. Impossível amar alguém que abandona o próprio filho, que não quer saber nem acompanhar o crescimento dele.

 

- Isso não seria o seu lado racional falando? Porque é o que se espera de uma mãe, que ela proteja o filho. Mas você, enquanto mulher, não sente falta da intimidade entre vocês dois?

 

- Que intimidade? Já não existia mais isso há muito tempo. E o pouco de intimidade que tínhamos era, pelo menos pra mim, por pura obrigação de esposa. Não havia desejo, eu ia pra cama com ele contrariada.

 

- Depois que você saiu de casa, ele lhe procurou?

 

- Não. Nenhuma vez, nenhum telefonema, nem ao menos para saber do Érico.

 

- Isso incomoda?

 

- Um pouco. Acho que eu esperava que ele se assustasse com a minha atitude e buscasse um meio de mudar. Mas em vez disso, a mãe dele disse a uma amiga nossa que ele está bem e está com a Carolina.

 

- E não era isso que você esperava...

 

- Não, é que eu acho injusto, sabe? A gente se separa e ele fica com a liberdade e eu fico com a responsabilidade. Sou eu quem tem hora pra chegar, que acorda de madrugada, que troca fralda, que leva para escola, que faz tudo enquanto ele apenas sai de casa pra jantar fora, para passear com essa uma... Eu nunca quis ser mãe solteira. Eu não vou dar conta disso...

 

Mariah soluçava, a voz embargada pelas lágrimas e pela raiva contida no coração. Celina lhe passou uma caixa de lenços de papel e esperou que ela se acalmasse.

 

- Você percebe que tudo o que você diz que ele faz agora é o que ele já fazia antes. A diferença é que vocês já não dividem o mesmo teto. Não precisa ficar envergonhada de perder o controle sobre suas emoções. Pode chorar. Aliás, você deve chorar sempre que sentir vontade, deve assumir para si mesma a condição de solidão que você me relatou há pouco.

 

- Isso não é sinal de fraqueza?

 

- Por que se preocupar com o que é fraqueza? Você é uma mulher sensível e que está ferida. É normal chorar, é normal e humano estar fraca.

 

- Mas eu tenho um filho pequeno que depende de mim.

 

- Sim, e é nele que você vai encontrar a força que precisa para sair dessa. Mas você não vai encontrar essa força imediatamente. Veja, você está enfrentando um processo de perda. Mesmo que o que você tenha perdido seja algo que lhe fazia mal, ainda assim era parte do seu cotidiano, e você estava acostumada com isso. Então, agora você precisa curtir esse luto emocional.

 

- Essa insegurança, esse medo...

 

- Tudo isso vai passar. Mas não é da noite pro dia. Primeiro, é preciso você se permitir sentir essa dor, a raiva, a revolta, a angústia, o medo. É tudo natural diante do novo. Você terá que aprender a andar com as próprias pernas e não mais contar com a ilusão de ter um dia um casamento perfeito.

 

- É, era essa ilusão que me mantinha lá, ao lado dele.

 

- Mas ilusão não sustenta nossa alma, não é mesmo?

 

- Não...

 

- Mariah, o primeiro passo você já deu. Não queira sair correndo para tropeçar na primeira pedra. Você está reaprendendo a andar. Lembre-se disso. E se precisar, eu estou aqui.

 

Mariah saiu do consultório sentindo uma leveza desconhecida. Uma mistura de alegria e tristeza, uma melancolia aconchegante e em todo caminho até sua casa, fez o que Celina aconselhou, não teve vergonha dos seus sentimentos. Chorou e riu e cantou e quando entrou em casa, sentia que ainda iria demorar a se recuperar, mas tinha certeza que a recuperação uma hora aconteceria.

 


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Notas finais do capítulo

Esse capítulo é quase auto-biográfico. E reviews me fariam acreditar que estávalendo a pena fazer essa história... Então que tal dar uma forcinha e "escrivinhar" aí embaixo o que vc está achando????



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