De dentro da escuridão escrita por HellFromHeaven


Capítulo 3
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Depois daquela conversa, Kate mostrou-me o restante do templo e o local onde eu iria dormir. Algo interessante, pois antes não precisava fazer isso. Porém, ela me disse que parte do meu “tratamento” consistia em acostumar novamente meu corpo a hábitos humanos. Tentei seguir o conselho dela, mas acabei apenas passando a noite deitado olhando para o teto (até ficar de olhos fechados era um incômodo).

Percebi movimentos pela casa antes mesmo do amanhecer e fui checar. Achei que, por ter que cuidar do templo sozinha, Kate estaria se preparando para começar o dia, mas encontrei apenas Amon caçando alguns esquilos. Como estava cansado de ficar entediado naquela cama, decidi arrumar as coisas por ali. Varri as folhas da escadaria, varri as instalações internas, tirei o pó de tudo e... Enfim, fiz uma faxina geral. Acabei por volta de meio dia e sentei-me na varanda para “descansar” (não estava cansado, mas quis seguir a dica).

Em torno de uma e meia da tarde, ouvi alguns passos atrás de mim e me virei. Deparei-me com Kate. Seus cabelos estavam levemente bagunçados, estava bocejando e usando uma camisola preta. Ela sentou-se do meu lado como se fosse apenas uma pessoa despreocupada e desocupada. Confesso que fiquei indignado com aquela cena, porém me mantive em silêncio.

– Bom dia, senhor morto.

– Bom dia, senhora preguiçosa.

– Lição número cinco! Minha preguiça e a hora em que eu resolvo acordar não são da conta de ninguém. Aliás, vejo que limpou o templo.

– Sério? Seus olhos mal estão abertos. Como sabe?

– Você está cheirando a desinfetante.

– Oh, entendo.

– Enfim, a maioria dos trevosos só se movimenta à noite e você sabe bem disso. Então não há porque eu acordar cedo. Seria um desrespeito com os limites do meu corpo.

– Sei, sei...

– Nunca se esqueça dessa quinta lição. Ela é uma das mais importantes.

– Se você está dizendo...

– Bem, quero que você encontre o Amom e espere com ele na entrada do templo. Vou me trocar rapidinho e logo alcançarei vocês.

– Ué? Não disse que suas caçadas eram noturnas?

– Sim, mas esse é um assunto diferente. Vou explicar melhor a lição número seis assim que chegarmos lá.

– Lá aonde?

– Cacete, apenas pegue a porra do Amom e me espere lá em baixo! Lição número seis! Eu sou facilmente irritável quando acabei de acordar.

– Tudo bem...

Obedeci às ordens de minha nova mestra antes que tivesse o mesmo fim que aqueles Mortos Vivos. Demorei um pouco para achar Amom, que ainda estava perseguindo esquilos e acabou adentrando a floresta, mas finalmente cheguei ao local de espera. Apenas uns dois minutos depois, Kate chegou com a mesma roupa que usava quando a conheci. Pelo jeito era seu “uniforme”.

– Sigam-me.

Depois de dizer estas simples palavras, a sacerdotisa simplesmente começou a andar sem nem ao menos fingir que iria me falar qual era nosso destino. Andamos até o centro da cidade, onde pegamos um ônibus (as pessoas estranharam minha presença, mas apenas ignorei isso). A viagem durou cerca de uma hora e paramos em uma pequena cidade chamada Fallen Stones. As casas de lá eram todas muito humildes e parecidas, exceto por uma grande mansão, localizada no meio da floresta que cercava a cidade.

Atravessamos o centro e pegamos um táxi. Este nos levou por uma estrada pavimentada por paralelepípedos que levava à mansão. A “casa” parecia muito antiga e era totalmente feita de madeira. Possuía vários detalhes de metal e pontas do mesmo material enfeitando toda a estrutura do local. Isto dava um ar sombrio que era complementado pela cor escura dos telhados. O terreno era cercado pro uma cerca viva alta e sua única entrada era um grande portão de ferro (que também possuía pontas).

Ao nos aproximarmos da entrada, o portão abriu sozinho, produzindo rangidos no mínimo, macabros. Kate e Amom entraram como se nada tivesse acontecido, então não tive outra escolha senão acompanha-los. Seguimos por um caminho pavimentado com pedras antigas perfeitamente posicionadas, cercadas por um grande gramado com várias flores e afins. O terreno era enorme e a casa... Bem, nem preciso comentar. Possuía pelo menos uns três andares (era difícil dizer ao certo por causa da arquitetura “antiquada”). As enormes portas da mansão eram feitas de uma madeira escura e envernizada que aparentava ser pesada. Assim como eu esperava, ela abriu sozinha a entramos no local.

Toda a decoração era composta de mobília e quadros antigos. O salão onde entramos possuía duas escadas que iam até o segundo andar. Seus corrimões exibiam detalhes em metal assim como a estrutura da mansão. Subimos por uma das escada e andamos até um grande salão com uma mesa redonda e algumas cadeiras. Mais ao fundo da sala, havia uma garota que aparentava ter uns quatorze anos sentada em uma espécie de almofada vermelha de frente para uma grande estátua de mármore de um ser humanoide com seis braços e orelhas de... Gato ou qualquer outro felino. Sentamo-nos nas cadeiras e aguardamos.

Alguns minutos depois, uma mulher vestida de empregada entrou empurrando um carrinho com bandejas de prata contendo uma refeição. A garota levantou-se e se juntou a nós. Kate e Amom começaram a comer e nossa anfitriã levantou uma taça de cristal e sua servente a encheu com... Sangue. Usava um vestido branco com muitos babados e aquelas coisas espalhafatosas de roupas antigas da “nobreza”. Sua pele era extremamente pálida e seus olhos possuíam um tom muito forte de amarelo. Era quase hipnotizante. Ela balançou o líquido em sua taça algumas vezes e deu um breve gole. Depois disso, bateu na taça com um talher de prata e começou a falar:

– Espero que minha hospitalidade os esteja agradando.

– A carne está macia como sempre. – respondeu Kate.

– Fico feliz em ouvir isso. Agora, quem é o jovem?

– Ah! É o Hiro, um Morto Vivo que achei por aí.

– Achou por aí...

– Entendo. Neste caso, peço perdão por não me apresentar adequadamente.

– Ah... Bem... Não tem problema.

– Meu nome é Margaret Van Shuntz e, como pode ver, sou uma Vampira.

– Sou Hiro Quispiam. Morto Vivo e ajudante da Kate.

– Entendo.

– Bem... – interrompeu Kate. – Lição número sete! A Margaret costuma frequentar o templo uma vez ao mês, ou seja, é totalmente confiável. Ela nos dá informações sobre trevosos que estejam causando algum tipo de distúrbio.

– Espere um pouco... Ela é uma Vampira que visita uma "caçadora de trevosos"?

– Sim, algum problema com isso? – perguntou Margaret.

– Ah... Bem, é inusitado.

– Nem todos os trevosos querem ver o mundo em chamas. Aliás, poderia questionar sua posição do mesmo jeito.

– Tem razão... Desculpe-me...

– Não se preocupe quanto a isso. Temos assuntos mais importantes a tratar. Ah, e antes que surja uma dúvida quanto a isso. O desequilíbrio entre as trevas e a luz não é algo que prejudica apenas os humanos. Nós, vampiros, somos indiretamente afetados porque nosso principal alimento está diminuindo.

– Entendo. E nesse caso, isso se aplicaria a mim também... Infelizmente.

– Exatamente.

– Enfim, chega de apresentações e vamos aos negócios. – disse Kate. – O que tem para a gente hoje?

– Bem, há indícios de que Necromantes têm se reunido em Darkstate. Isso pode estar relacionado àquela seita que lhe mencionei da última vez em que esteve aqui.

– Sei... Bem, um monte desses caras reunidos não pode ser coisa boa. Vamos dar uma olhada. Te informo se descobrir algo.

Saímos da mansão e pegamos outro táxi. Darkstate era um vilarejo rural não muito longe de Fallen Stones, então a viagem durou menos de uma hora. Havia apenas algumas casa e todas eram muito simples. Passamos por todas sem avistar uma alma viva sequer e paramos em frente a uma velha igreja abandonada. Sua torre não existia mais, ou seja, havia um enorme buraco no teto. Todos os vidros estavam quebrados e podia-se notar vários buracos por toda a estrutura de madeira. A energia por toda a cidade era bem pesada, o que estranhamente me fazia sentir mais “vivo”.

Amom farejava o local, em uma tentativa de encontrar pistas sobre... Bem... Qualquer coisa, já que nem os moradores pareciam estar por ali. Porém, quando ele ia se afastar da igreja, Kate o impediu e disse para que esperássemos ali. E assim o fizemos.

A noite chegou, mas o silêncio continuou a reinar. Em um mundo ferrado como o nosso, aquilo não poderia ser um bom sinal. Geralmente assim que o Sol se põe, todos os trevosos saem de seus esconderijos para caçar ou simplesmente perambular por aí (digo por experiência própria). Essa situação se manteve assim por meia hora, mas foi interrompida por passos sutis vindos da entrada da cidade. Vire-me para verificar o que se esgueirava pela vila e me vi uma mulher ao longe. Media mais ou menos um metro e cinquenta e alguma coisa, possuía cabelos negros, curtos (até o pescoço) e ondulados e olhos azuis. Pele muito pálida e grandes olheiras em seu rosto que, juntamente com seu sorriso largo, davam um toque sombrio a ela. Usava um sobretudo de couro marrom, que ia até suas canelas, botas pretas e calças também pretas. Carregava uma escopeta em uma das mãos e uma adaga na outra.

Estranhei a visão, porém Kate continuou encarando a igreja com seriedade, enquanto murmurava algo segurando um daqueles pedaços de papel. A garota se aproximou de nós, me encarou com um olhar de desprezo, deu de ombros e apontou sua arma para mim. Fiquei realmente confuso ou assustado... Aliás, fiquei confuso por não saber se devia me assustar com aquilo. Amom a encarou, porém continuou em silêncio. Essa situação estranha durou alguns minutos, até que a senhorita hostil decidiu relaxar e baixar sua escopeta.

– Parece que você não está com os Necromantes. – disse a garota.

– Precisou desse tempo todo para descobrir? – respondi indignado.

– Calado. Agora meu assunto é com a sacerdotisa.

– Não sei quem você é, mas também não acho que tenhamos algum assunto pendente. – disse Kate.

– Bem, com você eu realmente não tenho. Porém, parece que estão tentando roubar minhas presas.

– Presas? – perguntei sem entender nada.

– Já falei que não tenho assuntos contigo, cadáver ambulante. – disse a garota sem nem ao menos me olhar.

– Hey! Posso estar morto, mas eu tenho sentimentos.

– Anh? Por acaso você firmou um contrato com esse pedaço de carne podre, sacerdotisa?

– Meu nome é Kate. E sim, ele é meu servo agora.

– Servo? – perguntei confuso.

– Entendo. Espere... Então você é a tal Sacerdotisa Negra?

– Eu... Sou? – Indagou Kate enquanto coçava a cabeça.

– Há rumores sobre uma. Não age com outros sacerdotes e veste preto, logo deve ser você.

– Não sabia que eu tinha uma reputação. Bom saber. Enfim, e quanto a você?

– Ah! Perdoe minha falta de modos. Não posso evitar, já que eles não existem.

– Está perdoada.

– Sou Ruby, uma caçadora de trevosos amaldiçoada e puta da vida.

– Ah, acho que já ouvi falar de você. Não imaginava que fosse tão baixinha.

– É o que todos dizem. Enfim, tenho assuntos pessoais a tratar com aqueles projetos de merda que estão na igreja, então... Se me dão licença...

Fiquei assistindo a conversa enquanto me sentia um pedaço de nada, pois estava sendo totalmente ignorado. Amom também, mas ele não parecia se importar. Kate ameaçou guardar seu pedaço de papel, mas, de repente, o sacou e virou-se para a igreja. Ruby ergueu sua escopeta e guardou a adaga em sua cintura, esboçando um sorriso assustador.

– Parece que vamos ter que dividir essa “refeição”. – disse Ruby.

– Não gostei muito da ideia, mas parece que não há como evitar.

Tentei entender o que estava acontecendo, principalmente porque Amom também virou-se para a velha construção e apenas ficou encarando o local. Mas logo minhas dúvidas se foram, pois toda a vila começou a estremecer. Poucos segundos após o início do tremor, vários gritos familiares começaram a ressoar por todo o local. Logo após, vários Mortos Vivos saíram das casas e as portas da igreja se abriram, tornando possível ver dois Necromantes no altar da mesma. Não tinha pensado que eu entraria em uma situação de combate (mesmo sendo algo óbvio), então fiquei um pouco nervoso. Mas esse nervosismo passou assim que avistei aquele cachorro correndo para cima dos inimigos sem pensar duas vezes apenas para ser chutado para longe. Pensei “se até aquele infeliz está tentando, então não há o que temer”. Seria o início da minha primeira batalha como um Morto Vivo “consciente”.


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Notas finais do capítulo

Bem... não sei bem o que aconteceu porque eu tenho certeza de que tinha postado o segundo capítulo antes. Mas o que importa é que o erro foi corrigido!
Tentarei postar com mais frequência, mas não prometo muitas melhoras.
Enfim... agradeço a quem leu até aqui, espero que estejam gostando e até a próxima =D



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