Depois do amor escrita por Hana


Capítulo 10
Pesadelo.


Notas iniciais do capítulo

Presente.



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Sarah me ligou segunda-feira depois do almoço, eu estava na casa de Lia porquê me sentia endividada com ela, e quando atendi ela já disse:

_ Ficamos sabendo de tudo, eu sinto muito mesmo. - Ela provavelmente estava com Jhonatas. - Você está na Lia?

_ Sim, estou. - Disse. - mas eu já estou indo pra casa, meu pai está preocupado, querendo saber o que houve... Sabe né.

_ É a Sarah? - Perguntou Lia, que estava sentada no sofá, assistindo Uma Linda Mulher, usando calças de moletom e uma regata branca, totalmente sem maquiagem. O que é muito raro.

_ Sim, sim. E eu acho que ela vai vir aqui. - Respondi.

_ Estou indo aliás, e estou com Jhonatan. - Disse Sarah. - Então no que deu? Eu ligo e mando mensagem pra Li mas parece que ela nem telefone tem.

_ Jhonatan também está vindo. - Disse para Lia. E ela assentiu com a cabeça.

_ Ela não quer pegar o telefone pra não ver nada desagradável como comentários de gente ignorante na internet. - Respondi. - Bom, fomos na delegacia ontem, fizemos o boletim. Demoramos muito, muito tempo pra convencer Fernando a não tentar se vingar com "suas próprias mãos". Faltamos na escola porquê a tia Leka - Mãe de Lia. - Acha melhor ela ficar afastada durante um tempo, já que todo mundo já sabe do que aconteceu. E... - Falei o mais baixo que pude para Lia não ouvir. - Ela precisa da gente, emocionalmente, dos amigos.

_ Sim, claro! - Disse Sarah. - Eu me sinto culpada. Ontem eu te liguei mas você não atendeu, e mal respondia as mensagens que eu enviava. Pensei até que estavam bravas, eu comprei chocolate para levar e me desculpar.

_ Não, Sah - Disse, e até ri. - É que ontem foi meio corrido, advogado, delegacia e sabe... Aquele choque. O tempo que tinha livre respondia as mensagens, mas fui dormir cedo porquê eu estava muito cansada! - Eu tentei parecer o mais natural possível. - Mas, está tudo bem, eu também me sinto culpada. É estranho pensar que nós poderíamos ter evitado tudo isso.

_ Com certeza, eu... Não sei, se a gente voltar poucas horas no tempo, tudo ficaria bem de novo. - Disse ela. - Preciso vê-la, e deixar ela desabafar, meu Deus, a cabeça de Lia deve estar muito complicada.

_ Está. - Disse. - Mas tenho certeza que ela está muito feliz que você está vindo.

_ Estou mesmo! - Gritou Lia, para que Sarah pudesse ouvir do telefone.

Sarah riu e disse: _ Ok, já, já eu chego. Mas, Amanda, espera eu chegar pra ir embora, ok? Só pra termos nosso momento, nós quatro.

_ Sim, sim, claro, pode deixar. - Disse. - Até daqui a pouco, tchau!

_ Tchau, Amandinha.

SEGUNDA-FEIRA.

Eu estava sentada no ônibus quase vazio, lá no fundo. Encostei minha cabeça na janela de vidro, e fechei meus olhos, me perguntando como tudo isso pode ter acontecido? Era como se fosse comigo, como se o trauma fosse em mim. Claro que eu nunca vou conseguir entender a dor que Lia está sentindo, mas a culpa é muito grande, e obviamente quando machucam alguém que amamos, é como se nos machucassem.

Ontem fui obrigada a ouvir discursos machistas e ignorante de muitas pessoas, inclusive de algumas pessoas na internet, já que todas as pessoas do nosso convívio social estavam sabendo do acontecido. No escritório de advocacia estávamos todos na sala de espera, mas quando fui beber água pude ouvir o próprio advogado comentando com sua secretária que "Como pode falar que é estupro se ela queria dar pra ele? Isso pra mim é coisa de menina safada!". Preferi me manter calada, não deixar Lia mais triste do que já estava. O twitter bombava com comentário ridículos, todos eles defendendo Léo e julgando Li. Me fez refletir de como vivemos em um mundo tão arcaico e machista.

Passei o tempo que pude dando suporte para as lagrimas de Li, mas ela tentava se fazer de forte, principalmente na frente dos pais. Dava pra perceber que ela se envergonhava do que havia acontecido, mesmo não tendo culpa alguma. Domingo foi bem difícil, e tenho certeza que continuará sendo assim durante um bom tempo, mas logo ela estará melhor, disso eu tenho certeza.

Quando Jhonatan e Sarah chegaram no apartamento, logo vieram se desculpar. Lia não entendia o porquê das desculpas mas eu entendia perfeitamente, nós somos amigos e devemos cuidar uns dos outros, é um tipo de responsabilidade silenciosa. Não queria deixa-los, mas tive que ir, já que meu pai não parava de me ligar querendo saber se eu também havia sofrido algum tipo de abuso, mesmo eu já tendo falado para ele que absolutamente nada havia acontecido comigo.

Puxei meu sinal, e não prestei atenção por onde andava, apenas desci aquela rua comprida e cinzenta, até chegar no meu prédio.

_ Oi Seu Luís. - Disse para o porteiro.

_ Amandinha, bom dia. - Respondeu ele. - Ou seria boa tarde?

_ Contando que já é meio dia, - Disse, sorrindo. - eu diria bom dia!

Ele riu, e me deixou passar pelas várias etapas de entrada: portão, porta de aço e porta de vidro. As vezes questiono se é mesmo necessário tantas portas, porquê se alguém planejasse roubar o prédio seria esperto o suficiente para fazer um túnel no subsolo ou pular um muro, e não usar a entrada principal, afinal qual seria a graça?

Subi pelo elevador, sozinha, sempre acompanhando o chão. E quando finalmente entrei pela porta de casa, ouvi um:

_ Mandi!

Uma cabeleira loura usando uma fantasia do super man passou voando pela sala e mesa de jantar, pousando exatamente nos meus braços.

_ Oi, meu grandão! - Disse, haviam poucas pessoas que me faziam sentir como João nesse mundo. Era reconfortante demais estar com ele, eu me sentia amada e parte de alguma coisa. - Eu senti sua falta, sabia?

_ Papai falo que você ia molar com a Lia. - Disse ele na sua inocência de 3 anos. - Não, não. Não. - Disse ele, fazendo um gesto com os dedos. - Você mola aqui!

_ Você achou que eu ia te deixar, grandão? - Disse. - Não, não, não! - Respondia, fazendo o mesmo movimento que ele fez com os dedos.

Ele riu com as bochechas sujas de suco de uva, e eu não pude deixar de aperta-lo com a força de um ogro.

_ Jesus, Amanda, me conte tudo, não me esconda nada! - Disse Magda, aparecendo pela sala e usando um vestido um tanto festivo para estar em casa.

_ Ah, por onde começar... - Disse, colocando minha mochila no sofá e tirando os sapatos.

Contei tudo a ela, sabendo que logo, logo meu pai já estaria ciente de tudo. Enfatizei a parte de que eu não havia sofrido nada! Depois de ouvi-la falar "que horror" "bárbaro" "ogro" "monstro" e deixar bem claro seu ponto de vista sobre como ela não está preparada para deixar seu filho viver em um mundo onde coisas assim acontecem eu finalmente tive meu green card para ir tomar um banho.

Foi o melhor banho, em muito tempo. Pude tirar toda a inhaca, mas naquele ralo também desceu todo o peso que eu estava segurando, toda angustia. É claro que as coisas continuariam as mesmo, mas eu sempre fui o tipo de pessoas que só se sente melhor da tristeza quando chega em casa, e se sente segura. Depois do banho, nem enxuguei o cabelo, só deitei na cama e dormi, tudo o que tinha para dormir.


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Notas finais do capítulo

...



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