Crônicas dos Elementais escrita por btfriend
Sylvie ainda estava em choque. Não pelo fato de estar vendo Gustav novamente e sim, por ele ter resolvido procurá-la depois de tantos anos. Ela não mais nutria sentimentos de amor, mas a presença dele evocava muitas lembranças que há tempos ela não se permitia ter.
Gustav ainda estava com bandagens na altura do ombro esquerdo no local onde o dardo havia atingido. O ferimento assemelhava-se a um buraco de agulha, porém o veneno contido no projétil fez com que infeccionasse e a pele ao redor ganhasse um tom mais escuro.Não mais sentia dores mas, devido ainda sentir-se febril ocasionalmente, continuava tomando alguns remédios caseiros para ter certeza que estava fora de perigo.
— Eu não consigo acreditar ... - começou Sylvie se aproximando de Gustav.
— Pode acreditar. Sou eu mesmo. - tentou pegar a mão dela.
— Não! - ela deu um tapa para que ele afastasse. - Eu não acredito que eu me separo de você para não ficar me preocupando com você voltando ferido de batalhas, e depois de tanto tempo, você volta assim!
— Mas que ironia, não é mesmo? - esboçou um pequeno sorriso e deu de ombros. - Mas tinha algo que eu precisava fazer aqui.
— Eu espero que realmente tenha uma boa razão. - rebateu. - Some repentinamente e justo agora resolve aparecer? Como se as coisas já não estivessem complicadas o suficiente.
Gustav tentava falar, mas Sylvie não deixava. Ela precisava colocar tudo o que tinha guardado durante muito tempo. Todas as frustrações que havia acumulado agora vinham em forma de discurso de ataque diante do antigo companheiro.
— Criar duas crianças sozinhas não é fácil, sabia? - trovejou Sylvie. - Eu sei que escolhi seguir desse jeito, mas uma ajuda seria bem vinda! Você disse ter uma razão para se afastar e eu procurei entender, porém isso não significa que seus filhos iriam entender. Na verdade, eu nem dei a chance deles entenderem. Não queria deixar eles com a imagem de um pai que escolheu ficar longe deles!
O oráculo observava a uma pequena distância aquela situação, igual uma criança que presencia a discussão de seus pais. Pretendia deixar que os dois conversassem e só se intrometer se fosse necessário.
— Olha, eu sei que você deve ter muita coisa para falar... - Gustav tentou ser compreensivo.
— E como tenho! - interrompeu Sylvie.
— Você terá tempo para isso, eu te garanto. Mas, primeiro, deixa eu falar o que vim lhe alertar. - anunciou. - Nossos filhos estão em perigo. E, possivelmente, você também!
— Ah, é mesmo? - ela tentou, mas não conseguiu conter uma risada sarcástica.
— Não era exatamente a reação que eu estava esperando. Tem certeza que você entendeu direito o que eu falei? - perguntou confuso.
— Se eu entendi? Acho que já entendi isso tem um dias! - respondeu deixando Gustav sem entender o que estava acontecendo.
— O que aconteceu?
— Pelo que eu entendi, você ficou bastante tempo inconsciente. E nesse tempo, muita coisa aconteceu! - explicou Sylvie. - Em resumo, seu filho foi treinar com as amigas da floresta e, assim como o pai, voltou para casa desacordado. Não posso dizer o mesmo de Amber, uma das meninas que estava com ela, que nem sequer voltou. Foi sequestrada! E, por algum motivo, estou começando a acreditar que foi por engano.
— O que? Ele está bem? - Gustav estava surpreso com a informação dada.
— Por agora, pode guardar sua preocupação. Porque as coisas não terminam aí. - continuou. - Ele já acordou, mas não antes de receber um bela visita em seus sonhos. Isso soa familiar para você?
— Elly. - afirmou. - Mas como?
— Isso eu não sei, mas foi ela quem apareceu para ter uma conversa com ela. Na verdade, ela estava procurando por você. E isso acabou me rendendo um conversa sobre nossa vida com Tyler.
— Ela estava me procurando? Você sabe o motivo?
— Aparentemente você adquiriu a habilidade de desaparecer e não dar notícias. - zombou Syvie. - Ao contrário de Tyler, acredito que sua filha não deve a mesma sorte. Ela foi sequestrada.
— Eu saio da cidade por alguns dias e parece que as coisas que eu tentei evitar, aconteceram tudo de uma vez. - Gustav estava desolado. - Você sabe alguma coisa sobre a irmã dela? Ou sobre a mãe?
— Não sei nada sobre elas, desculpe. O pouco que sei, é o que Tyler me contou sobre o sonho com Elly. Que, por sinal, ele já sabe que é irmã dele. É menos uma coisa para você contar quando se encontrarem.
— Preciso falar com ele logo! Quero saber onde ela está e se todo mundo está bem! - a cada notícia recebida, Gustav ficava mais nervoso e preocupado.
— Falar com ele? Por acaso você aprendeu a entrar em sonhos igual a sua filha? Ou tem poderes de telepatia que eu não estou sabendo? - falou com ironia. - Do contrário, você vai ter que aguardar até finalmente conseguir um momento de pai e filho com ele. Acontece que ele resolveu resgatar a amiga sequestrada.
— E você deixou? Como permitiu isso, Sylvie? Que irresponsabilidade! - repreendeu.
— Deixei! - respondeu sem pensar duas vezes. - Ele estava com ela na hora do incidente e compreendo como deve ter se sentido. Eu faria o mesmo! E, com certeza, você também! Afinal, ele já está crescido. Uma hora ou outra poderia tomar a decisão de deixar Awalles. Talvez se, na hora, ele soubesse que ele era o alvo, a culpa aumentasse e nem tinha esperado escurecer para sair!
— Falando assim... - Gustav esboçou uma expressão de compreensão.
— Mas, novamente, ele está bem. Está com minha mãe em Valmees. Não sei por quanto tempo. - acrescentou. - Já está com a ideia de ir para Balchmont pedir ajuda a seu querido rei.
— Ao rei? Mas ajuda para que?
— Respira e relaxa. Sua filha, junto com Amber, conseguiu escapar da prisão e, segundo a última notícia que tive elas estão seguras num local além das montanhas e ele pretende resgatá-las.
— Mas se elas estão bem, para que eles pretendem conseguir ajuda em Balchmont? - perguntou curioso.
— Essa é a questão! - exclamou Sylvie. - Pensa um pouco que eu acho que você chegará na mesma conclusão que eu cheguei e estou tentando fingir não estar preocupada com isso!
— Eles só precisariam de ajuda, se achassem que podiam correr perigo. - analisou Gustav. - A não ser que eles estão pensando em voltar para prisão por algum motivo.
Somente depois que falou, Gustav se deu conta da situação. Não era apenas uma possibilidade e sim algo que iria acontecer. E isso significava que seus filhos estariam ao alcance dos sequestradores mais uma vez.
— Como eu disse, certas coisas já estão destinadas a acontecer. - o oráculo finalmente se pronunciou. - O filho de vocês tinha que estar naquela prisão, de um jeito ou de outro. Como não foi sequestrado, as coisas aconteceram de outro jeito!
— Você e essa conversa sobre destino traçado novamente! - reclamou Sylvie.
— Mas é muito arriscado! Ele realmente vai precisar de ajuda. - disse Gustav.
— Se pelo menos ele tivesse uma mãe que trabalhou com caçadores e um pai que trabalhou com guerreiros para facilitar essas coisas. É uma pena mesmo! - falou dando tapinhas no ombro dos dois adultos do recinto. - Como eu disse, Valmees estava te aguardando, Sylvie. Era apenas uma questão de tempo até seu retorno.
— Já entendi! Não precisa ficar repetindo a mesma coisa várias vezes. - retrucou a mulher. - O que eu não entendi, é como você sabia que isso tudo iria acontecer.
— Ao contrário do que parece, eu não larguei vocês porque formei uma nova família. - explicou Gustav. - Depois de um tempo, eu comecei a receber ameaças de morte e fiquei sob alerta. Conforme o tempo passou, as ameaças se estender a minha família. Eu não sabia até que ponto isso iria atingir vocês aqui e preferi mandar uma carta avisando que seria meu último contato.
— E depois? Por que não procurou ou continuou mandando cartas? Seria bom manter contato com seus filhos!
— Porque as coisas não se resolveram tão rápido. As ameaças vinham, mas não tinha nenhum tipo de ação depois dela. Demorou alguns anos até que finalmente o primeiro ataque ocorreu, porém mataram o suspeito antes que pudesse ser revelado o objetivo. - contou. - Quando tudo se acalmou, eu fiquei receoso e imaginei que as crianças já haviam crescido bem sem um pai e não queria complicar as coisas.
— Você está certo em dizer que as crianças cresceram bem, mas isso não é desculpa. Eles podem não ter demonstrado, mas acredito que, em parte, era apenas por minha causa. Não sabiam até que ponto poderiam questionar o assunto.
— E não foi melhor assim? Não teve complicação para nós! - concluiu.
— Para nós, sim! Para eles, não! - queixou-se. - Mas continue a história. Quero saber o que te fez, de fato, querer vir nos alertar depois de tanto tempo que esse suspeito foi morto.
— As ameaças voltaram! - anunciou Gustav. - Do mesmo jeito com praticamente as mesmas palavras. A única diferença é que eles deixaram claro que sabiam que eu tinha filho em Awalles e pretendiam vir atrás deles também.
— E, se você pensar um pouco, isso serviu para deixar você dividido. Assim, todos os seus filhos estavam desprotegidos com sua ausência. - completou. - E, de bônus, ainda conseguiram deixar você ferido. Seja lá quem for, conseguiu o que queria.
— Eu não pensei nisso na hora. Meu primeiro instinto foi vir avisar vocês!
— E não podia ter mandado uma mensagem? Talvez fosse mais rápido e não estaria arriscando muita coisa.
— Talvez. - sussurrou Gustav. - Acho que, no fundo, eu também queria vê-los. Fazia tanto tempo que não tinha contato e não sabia como estavam. Queria ter certeza que eles estavam bem.
— Compreensível. Não o julgo por tal decisão. Só não precisava ter aproveitado da situação para realizar tal vontade. Teve tempo antes, afinal.
— Terei tempo depois também, espero. - disse Gustav esperançoso. - Mas, no final das contas, ainda não sei quem está por trás disso tudo.
— Não seja por isso! Fui buscada em casa e me disseram que queriam conversar sobre mim. - falou direcionando seu olhar para o oráculo. - Acredito que não me deixariam sair daqui até que todas as questões fossem debatidas, não é mesmo?
— De fato, está certa! - respondeu. - Não iria deixar que sua vinda aqui fosse em vão. Algumas perguntas merecem ser respondidas sem enrolações.
— Vocês estão sabendo de algo que eu não sei? - questionou o guerreiro.
— Apenas aguarde. Já falei que você perdeu algumas coisas, não foi? - a caçadora caçoou do antigo companheiro.
— Guardas! - chamou o oráculo aumentando o tom da sua voz. - Tragam o prisioneiro!
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